Deputados e senadores foram ao Supremo Tribunal Federal (STF) na tarde da quarta-feira (05/02) pedir o impeachment do atual ministro da Educação, Abraham Weintraub.
O grupo acusa Weintraub de ter cometido crime de responsabilidade ao contrariar princípios definidos pela Constituição para o serviço público — como os da impessoalidade e da eficiência. Weintraub também teria quebrado o decoro em suas manifestações em redes sociais e na Câmara dos Deputados.
Uma das subscritoras do pedido é a deputada Tábata Amaral (PDT-SP). No começo do ano passado, ela ficou conhecida ao confrontar o antecessor de Weintraub no cargo, o teólogo Ricardo Vélez Rodríguez.
- Em 4 pontos, os erros que transformaram o Enem 2019 em crise
- A briga judicial em torno das notas do Enem: 'Sensação de que não adiantou nada o esforço'
Agora, diz a deputada, o Ministério da Educação está nas mãos de um gestor "muito pior" que Vélez.
"Enquanto o Vélez não fez nada, o Weintraub fez o pior Enem que a gente teve últimos anos", resume ela, em referência aos problemas no Exame Nacional do Ensino Médio.
"Qual era a nossa principal crítica ao Vélez? A inação. Ele tinha um monte de polêmica, de desmandos, e não fazia nada. Já o Weintraub não fez nada pela educação, mas fez tudo pela sua ideologia (de direita), pelos apoiadores do governo. Fez de tudo na luta contra o fantasma que ele mesmo criou", disse ela à BBC News Brasil.
"O Weintraub passou de todos os limites. Na forma como ele lida com os cidadãos, na maneira como conduziu o Enem, na maneira como conduziu a área de alfabetização (do ministério)", diz ela.
A reportagem da BBC News Brasil procurou o ministro da Educação para comentários, por meio de sua assessoria. Ele não se manifestará.
A lei brasileira diz que ministros de Estado estão sujeitos ao impeachment, caso cometam crime de responsabilidade (Lei 1.079 de 1950).
Atualmente, já tramita no STF um pedido de impeachment do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
Em dezembro de 2019, o relator do caso de Salles no STF, ministro Edson Fachin, liberou o pedido para julgamento no plenário. Cabe agora ao presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, marcar a data.
Na tarde desta quinta (06/02), o STF sorteou o ministro Ricardo Lewandowski para atuar como relator do pedido contra Weintraub. Caberá a ele analisar o assunto e liberar o caso ao plenário do STF, mas a corte não tem prazo para decidir sobre o tema.
Entre os signatários estão deputados da Rede, do PSB, do PDT, do PT, do MDB, do PSDB e do Cidadania (antigo PPS). Além de deputados, assinam a petição os senadores Fabiano Contarato (Rede-ES) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
'Dinheiro ficou parado por falta de gestão', diz relator
O pedido de impeachment de Weintraub também se baseia no relatório de uma comissão da Câmara criada para acompanhar o trabalho do Ministério da Educação.
Segundo o relator do colegiado, Felipe Rigoni (PSB-ES), o primeiro ano do MEC no governo de Jair Bolsonaro foi marcado pela falta de gestão — o ministério perdeu, por exemplo, R$ 1 bilhão encaminhado à pasta pela força-tarefa da Lava Jato, fruto de uma multa paga pela Petrobras.
"O que o nosso relatório constatou é que existe um completo estado de inação no MEC, que a gestão do órgão foi comprometida. Tivemos baixa execução orçamentária em áreas fundamentais, e uma total falta de critérios em várias decisões importantes", diz Rigoni à BBC News Brasil.
Em 2019, o MEC foi uma das pastas que mais ficaram com recursos "empoçados", isto é, dinheiro que estava disponível, mas não foi gasto.
"Tivemos também uma instabilidade extrema nos cargos. Enquanto outros ministérios já estabilizaram suas equipes, o MEC seguiu trocando os profissionais o tempo todo. E, no geral, a atual gestão do ministério tem menos pessoas com experiência na área de educação que gestões anteriores. Tem também menos pessoas com experiência na área que outros ministérios deste governo", avalia Rigoni.
Do que o ministro é acusado?
Para os congressistas, Weintraub teria quebrado o princípio da impessoalidade (Art. 37 da Constituição) quando mandou que o presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) verificasse problemas na prova do Enem da filha de um apoiador do governo, que o interpelou no Twitter.
O ministro também teria cometido crime de responsabilidade ao supostamente se omitir em algumas das áreas de responsabilidade do MEC — como a política de alfabetização. Weintraub também deixou de aplicar recursos que estavam disponíveis para o MEC, o que configuraria uma afronta ao princípio da eficiência.
Além disso, os parlamentares também acusam Weintraub de agir de forma "incompatível com a dignidade, honra e decoro do cargo" de ministro.
O professor "tem se valido de sua prerrogativa de chefe de uma pasta de altíssima relevância para se manifestar publicamente, sobretudo por meio das redes sociais, de maneira incompatível com a dignidade" da posição que ocupa.
Fora da internet, um destes "excessos" teria acontecido no dia 11 de dezembro — na ocasião, Weintraub participou de uma audiência na Câmara dos Deputados, na qual acusou as universidades públicas de manterem "plantações extensivas" de maconha nos campi.
O advogado criminalista e professor de processo penal na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Fernando Castelo Branco explica que "os crimes de responsabilidade do funcionário público estão definidos nos Artigos 313 a 326 do Código Penal". São crimes como advocacia administrativa (interceder em favor em alguém), prevaricação (deixar de fazer algo a que esteja obrigado) e peculato (se apropriar de dinheiro público), entre outros.
Castelo Branco diz ainda que, embora o impeachment de ministros não seja julgado na Câmara, este tipo de procedimento tem sempre uma carga política — mesmo que a base seja jurídica.
Impopular no Congresso, mas apoiado por Bolsonaro
Weintraub é hoje um dos ministros menos populares no Congresso.
A pressão sobre ele aumentou desde dezembro, quando ele removeu uma pessoa indicada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), do comando do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação). O FNDE é a autarquia do MEC responsável por liberar recursos e dar apoio técnico a Estados e municípios no uso de verbas destinadas à educação.
Os problemas na realização do Enem de 2019 também contribuíram para aumentar a irritação de deputados e senadores com o ministro. Uma falha na correção de pouco menos de 6 mil provas acabou afetando as provas de 3,9 milhões de candidatos que participaram do exame.
No fim de janeiro, Maia disse que o Brasil "não tem futuro" com Weintraub. Na segunda-feira (03/02), o presidente da Câmara voltou a disparar contra o ministro.
"Eu só trabalho com bandeira branca. O problema é que o grupo que o ministro representa é a bandeira do ódio. E eu não posso negociar com quem tem a bandeira do ódio de forma permanente atacando e agredindo as pessoas em redes sociais", disse o parlamentar carioca.
Em 2020, o Ministério da Educação terá uma série de desafios no Congresso — inclusive a discussão sobre o percentual de contribuição do governo federal para o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).
Apesar das críticas de parlamentares, Weintraub parece contar com o apoio do presidente Bolsonaro e de seus filhos — nesta terça (04/02), o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) disse que Weintraub era o "melhor ministro da Educação de todos os tempos".
"O ministro Weintraub e o presidente Maia têm um atrito por conta do FNDE. Isso que está acontecendo, isso é desdobramento normal deste atrito", disse Eduardo.
Na segunda-feira, o ministro viajou com Bolsonaro para o lançamento da pedra fundamental do Colégio Militar de São Paulo, que será o 14º do tipo no país.
0 >-->Escreva seu comentários >-->:
Postar um comentário
Amigos (as) poste seus comentarios no Blog