Mostrando postagens com marcador Cultura. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Cultura. Mostrar todas as postagens

domingo, 12 de outubro de 2025

Nossa Senhora Aparecida: Por que mãe de Jesus entrou para a História com mais de mil nomes




Imagem de Nossa Senhora Aparecida, com manto azul e coroa dourada

Crédito,Getty Images

Legenda da foto,Há mais de mil representações da Virgem Maria


São muitos nomes, muitas "nossas senhoras". Mas todas elas se referem a uma mesma pessoa, uma mesma santa católica?

A resposta é sim. O que significa que Nossa Senhora Aparecida, cuja data se comemora em 12 de outubro, é uma representação diferente da mesma santa que também pode ser chamada de Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora de Guadalupe, Nossa Senhora de Lourdes e tantas outras.

Trata-se de Maria, uma jovem judia nascida em Nazaré há pouco mais de 2 mil anos, quando essas terras ao sul de Israel eram parte do Império Romano. Para o cristianismo, ela tem papel fundamental: tornou-se a mãe de Jesus Cristo.

Chamada de virgem por dois dos evangelistas, Mateus e Lucas, acredita-se que ela tinha cerca de 15 anos quando ficou grávida — pela doutrina cristã, por obra do Espírito Santo, ou seja, sem ter tido relações sexuais com homem algum. Na época, Maria já estava prometida em casamento a José, um carpinteiro da mesma cidade, mais velho, já na casa dos 30 anos.

Fato é que desta gravidez nasceria Jesus, o pilar fundador do cristianismo. Mas por que a tradição católica não rende a essa mulher apenas o título de Santa Maria, e são tantas as representações dela pelo mundo?

"Os nomes dedicados a Nossa Senhora dependem muito da forma como ela apareceu. Normalmente são dados pelo nome do lugar onde ela apareceu ou pelas condições em que se deram o aparecimento", esclarece o padre Arnaldo Rodrigues, assessor da Arquidiocese do Rio de Janeiro.

Velas e fiéis na Basílica de Nossa Senhora Aparecida, em Aparecida

Crédito,Getty Images

Conforme explica a cientista da religião Wilma Steagall De Tommaso, coordenadora do grupo de pesquisa Arte Sacra Contemporânea - Religião e História da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e membro do Conselho da Academia Marial de Aparecida, essas nomenclaturas acabam variando a "cada povo, cada região, cada cultura", por conta de "títulos que correspondem aos eventos decorrentes de inúmeras situações".

Ela lembra que muitos desses títulos são os chamados dogmáticos — uma referência aos dogmas da Igreja Católica sobre a Virgem Maria, que pela tradição religiosa são verdades de fé nas quais os fiéis devem acreditar.

É de onde vem, por exemplo, a nomenclatura de Nossa Senhora da Imaculada Conceição — originada em uma bula assinada pelo papa Pio 9º, que "declara Maria imune da mancha do pecado original", ressalta a pesquisadora.

Assim como a ideia de chamá-la de Virgem Maria, já que "o Concílio de Latrão, em 649, preconiza como verdade a virgindade perpétua", da mãe de Cristo.

"Há ainda as denominações decorrentes dos lugares onde houve uma manifestação que deu origem à devoção local, muitas vezes ampliada a outros povos e locais, como Aparecida, Guadalupe, Lourdes, Fátima, Loreto, Montserrat, etc", complementa ela.

A padroeira do Brasil

Autora do livro 21 Nossas Senhoras que inspiram o Brasil (‎Planeta, 2020), a jornalista Bell Kranz conta que a devoção mariana foi trazida ao Brasil já pelas esquadras de Pedro Álvares Cabral — em um dos barcos foi trazida uma imagem da santa.

"[A tradição] chegou essencialmente pelos portugueses, pelos colonizadores", explica. "O Tomé de Sousa [primeiro governador-geral do Brasil] chegou à Bahia já com uma imagem da santa na bagagem… Nossa Senhora da Conceição! E logo erigiu uma capelinha em Salvador, que hoje é a grande catedral Conceição da Praia [Basílica Nossa Senhora da Conceição da Praia]."

"Eu diria que o Brasil foi escolhido por Nossa Senhora, não é fanatismo dizer isso", comenta Lira. Para ele, há uma "predileção especial de Nossa Senhora para com esta terra".

"Nossa Senhora da Conceição, Nossa Senhora das Dores, Nossa Senhora das Candeias (a mesma da Candelária e da Purificação), Nossa Senhora Aparecida (que é a mesma Conceição), penso que são as mais importantes para o Brasil pela veneração que o povo lhes atribui", acrescenta o hagiólogo.

"É claro que cada Estado brasileiro tem sua devoção. Por exemplo, na Bahia há uma forte devoção à Nossa Senhora da Boa-Morte. Em Minas Gerais, Nossa Senhora da Piedade que é a mesma Nossa Senhora das Dores e por aí vai. No Pará, em Belém, temos a linda manifestação à Nossa Senhora de Nazaré que anualmente leva milhões ao Círio de Nazaré. Aqui no Ceará é interessantíssima a devoção a Nossa Senhora das Dores, em Juazeiro do Norte, por exemplo", enumera Lira.

"E qual a razão? Não dá para explicar concretamente. É algo meio que filial mesmo. Amor de filho à sua mãe e uma mãe que é mãe de todas as mães, pais e filhos."

Kranz atenta para o fato de que, dada a religiosidade católica inerente à própria construção da nação brasileira, "desde a colonização, Nossa Senhora está presente em todos os momentos de nossa história".

E a ligação brasileira com a santa é umbilical. Isto porque, como bem lembra a jornalista, em 1646 o então rei português Dom João 4º "consagrou todo o reino, incluindo aí as colônias, a Nossa Senhora".

"Aí, 217 anos depois do descobrimento do Brasil, ela apareceu lá para os pescadores [Nossa Senhora Aparecida]", acrescenta Kranz.

Nossa Senhora

Maria se tornou "Nossa Senhora", assim chamada, somente no fim do período medieval. Mas, historicamente, a Igreja já a reconhecia como "Mãe de Deus" muito antes — mais precisamente a partir do século 5, depois do Concílio de Éfeso, em 431.

"[É quando] Maria recebe o título de Thotòkos, a Mãe de Deus, dogma que define explicitamente a maternidade divina de Maria. Daí em diante, ela passa a ocupar, por exemplo, o posto principal, o conteúdo da imagem do presépio se amplia e praticamente esse ícone resume a história da salvação", esclarece De Tommaso.

De acordo com o mariologista Guimarães, Maria "ganha destaque sociológico, cultural e religioso" no período medieval. É quando ela adquire "caráter de poder", tornando-se "aquela que destrói o mal".

Assume características fortes, "ganha rosto de rainha". Assim, passa a ser invocada como "guerreira", "a mulher que combate o mal e, com poder militar, destrói as heresias".

"Maria passa da dimensão cultural para a política", compara ele. "No período feudal, diante da opressão, Maria se torna a padroeira para os que nela buscam auxílio, e em troca de proteção, o fiel a louva com oração e atos de caridade."

A santa passa a ser invocada "como a mãe que protege diante da ira de Deus, por algum pecado cometido, não só de forma individual mas também comunitária".

"Com o surgimento das ordens mendicantes, Maria se aproxima das pessoas, ela é tirada do trono de realeza, onde fora colocada pela teologia monástica, e se faz irmã, pobre e vizinha das pessoas", diz Guimarães.

Ao fim do período medieval, Maria já era um ícone consolidado dentro do catolicismo, tema constante das pregações e protagonista de tradições como medalhinhas, procissões, novenas e outras manifestações.

Essa reportagem foi publicada originalmente em 12 de outubro de 2021

Fonte: BBC Brasil





Professor Edgar Bom Jardim - PE

sexta-feira, 18 de julho de 2025

3ª Bienal Bom Jardim Arte celebra a Cultura Popular e a Memória Social a partir do dia 22 de julho



A cidade de Bom Jardim, no Agreste Setentrional de Pernambuco, se prepara para receber mais uma grande celebração artística e cultural: a 3ª edição da Bienal Bom Jardim Arte, que terá início na próxima terça-feira, dia 22 de julho, e seguirá até o dia 23 de agosto de 2025, no Museu de Bom Jardim.

Com o tema “Museus, Memória Social e Cultura Popular”, o evento propõe um mergulho na riqueza das tradições, saberes e expressões artísticas populares, destacando a importância da preservação da memória e dos mestres da cultura popular — que serão os grandes homenageados desta edição.

A programação da Bienal contará com uma diversidade de atividades para todos os públicos: exposições de artes integradas, rodas de conversa, exibição de vídeos, Feira Cultural, oficinas e apresentações culturais. Mais de trinta artistas e expositores, vindos de diferentes cidades pernambucanas, apresentarão seus trabalhos, proporcionando um panorama vibrante da produção artística do estado.

Com classificação livre e entrada totalmente gratuita, a Bienal estará aberta ao público de segunda a sábado, nos horários das 8h às 12h e das 15h às 17h. A iniciativa convida moradores, estudantes, artistas, pesquisadores e visitantes a participarem dessa imersão cultural e educativa.

Idealizado e proposto pelo professor Edgar Severino dos Santos, do Museu de Bom Jardim, o projeto da 3ª Bienal Bom Jardim Arte foi contemplado com incentivo financeiro do Edital da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB), promovida pelo Ministério da Cultura do Governo Federal, com coordenação da Secretaria de Cultura e Governo de Pernambuco.

A Bienal Bom Jardim Arte já se consolida como um dos mais importantes encontros culturais da região, reforçando o papel dos museus como espaços vivos de memória, criatividade e cidadania.

Para mais informações, acompanhe as atualizações pelas redes sociais do Museu de Bom Jardim ou visite o espaço, na rua Manuel Augusto/Centro, durante o período do evento. 

Fonte: 

dimassantos.com.br/3a-bienal-bom-jardim-arte-celebra-a-cultura-popular-e-a-memoria-social-a-partir-do-dia-22-de-julho/

Professor Edgar Bom Jardim - PE

domingo, 1 de junho de 2025

Anitta barra cachês milionários de prefeituras. Ministério Público de olhos em shows milionários dos sertanejos






A Justiça do Mato Grosso decidiu esta semana que o cantor Leonardo terá que devolver R$ 300 mil aos cofres da Prefeitura de Gaúcha do Norte, a 595 km de Cuiabá. O sertanejo recebeu, há um ano, R$ 750 mil para um show no município. O valor, segundo o Ministério Público Estadual (MPE), foi superfaturado.

Por mais bizarro que pareça, os cachês milionários — com dinheiro público — só começaram a ser barrados no Brasil depois que Zé Neto (da dupla com Cristiano) atacou a cantora Anitta: “A gente não precisa fazer tatuagem no ‘toba’ para mostrar se a gente está bem ou mal. A gente simplesmente vem aqui e canta, e o Brasil inteiro canta com a gente”.

Para bajular Jair Bolsonaro, em plena campanha eleitoral à reeleição, Zé Neto ainda repetiu a tese do presidente sobre a “mamata da Lei Rouanet”.

Anitta reagiu com humor à crítica sobre a tatuagem no “tororó” — como ela prefere definir na sua lição informal de anatomia —, mas acabou falando também sobre esquemas de desvios de verbas municipais por intermédio de cachês superfaturados.

A produtora dos seus shows havia recebido propostas do gênero. “Falei não”, disse ela.

A partir desse momento, o Ministério Público de vários Estados iniciou uma série de investigações sobre shows com valores suspeitos. Graças ao “efeito tororó”, o assunto nunca mais saiu da lupa dos procuradores.

O primeiro escândalo foi descoberto em Roraima, em 2022. A prefeitura de São Luiz, município com 8.232 habitantes, contratou o cantor Gusttavo Lima por R$ 800 mil.

Depois de muita polêmica e investigação do MPE, o mesmo cantor teve um contrato de R$ 1,2 milhão cancelado em Conceição do Mato Dentro, em Minas Gerais.

Outro inquérito foi aberto na cidade de Magé, no Rio de Janeiro, onde Lima faria mais um show do milhão. Na Bahia, o Tribunal de Justiça cancelou uma apresentação na Festa da Banana de Teolândia — o cachê seria de R$ 704 mil.

A decisão levou a prefeita Rosa Batinga (PP) ao choro. “A minha dor é muito grande, vocês não têm ideia. Eu queria estar hoje, de vermelho e preto, arrumada para o Embaixador (apelido de Gusttavo Lima)”, disse, em lágrimas.

Conhecido informalmente como “CPI do Sertanejo”, o escândalo provocou debate no país inteiro. Em Alagoas, o MP pediu cancelamento de uma apresentação do ídolo popular Wesley Safadão que levaria R$ 600 mil da prefeitura de Viçosa. No entendimento dos procuradores, esse gasto com as festas não deveria ultrapassar o limite de R$ 100.

Acossado pela maioria das investigações, Gusttavo Lima chorou, em um live no Instagram.  “Sou um cara que faz poucos shows de prefeitura. E quando a gente faz algum, a gente é massacrado como bandido, como se fosse um ladrão que estivesse roubando dinheiro público. E não é isso”.

No ano passado, reportagem de Deborah Magagna e Chico Alves no ICL Notícias revelou que shows de Gusttavo Lima consumiam até 50% de orçamento de cultura de pequenas cidades.

O senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, prestou solidariedade ao cantor. “Fique firme, meu irmão! Você é um cara do bem! Deus proverá”, escreveu nas redes sociais. A essa altura, o “efeito tororó” havia provocado o cancelamento de 40 shows.

A bendita tatuagem — com a palavra Love em destaque —  tem feito um bem danado aos cofres públicos.

Fonte: ICL Notícias. Por: Xico Sá


Professor Edgar Bom Jardim - PE

sábado, 14 de dezembro de 2024

Cultura: Prefeitura de Bom Jardim prorroga prazo para inscrição da PNAB





Agora os fazedores de cultura de Bom Jardim - PE, poderão se inscrever nos editais da Política Nacional Aldir Blanc até o dia 19 de dezembro. 
Os editais irão destinar mais de 300 mil reais para artistas, grupos culturais, instituições e fazedores de cultura que estejam em atividades comprovadas nos últimos três anos de existência.  Para saber mais procure a Secretaria de Esportes, Cultura e Turismo.



Local: Centro Educacional e Cultural Profª Marineide Braz

Período: Ate 19 de dezembro

Horário: Das 8h às 17h

Os editais estão disponíveis no link: https://bomjardim.pe.gov.br/pnab-bom-jardim/ 


Professor Edgar Bom Jardim - PE  com informações da prefeitura de Bom Jardim.

sábado, 9 de novembro de 2024

Artistas de João Alfredo serão contemplados com a Lei Aldir Blanc






Músicos, artesãos, movimentos culturais como: maracatu, caboclinho, mestre de capoeira e da religião de Matriz Africana, serão contemplados

Atenção artistas e fazedores de artes do município de João Alfredo, localizado no Agreste Pernambucano, começou nesta terça-feira (05) as inscrições para o Programa Nacional de Apoio à Cultura Aldir Blanc (PNAB). A iniciativa visa estruturar o sistema federativo de financiamento à cultura mediante repasses da União aos Estados, Distrito Federal e Municípios de forma contínua. Com isso, será possível investir regularmente em projetos e programas, não só de modo emergencial como aconteceu em outros programas, como foi a Lei Aldir Blanc 1 e na Lei Paulo Gustavo.

Segundo Alex Lima, Diretor Municipal de Cultura de João Alfredo, as inscrições seguem até o próximo sábado, dia 09 de novembro, e será necessário o comprovante de residência de cada candidato no ato de inscrição. “Deixando bem claro, que cada artista de João Alfredo precisa apresentar o seu comprovante de residência, porque isso é uma Lei que cada município tem. E cada um contempla o seu artista local”, afirmou Alex.

Antes do início das inscrições, a Diretoria de Cultura de João Alfredo realizou duas escutas culturais, para os lançamentos dos editais, com músicos, artesãos, representantes de movimentos culturais como: maracatu, caboclinho, mestre de capoeira e da religião de Matriz Africana, dentre outros. A segunda escuta aconteceu na última sexta-feira, dia 01 de novembro, reunindo aproximadamente 80 disseminadores de artes, na sede da Diretoria de Cultura.

Serão mais de 120 artistas joãoalfredenses contemplados com o PNAB, Alex Lima explica como será a divisória por categoria. “Cerca de 40 músicos, 50 artesãos e vários projetos da cultura e de fazedores de artes serão contemplados com a Lei Aldir Blanc. Isso marca um grande momento para a cultura joãoalfredense na gestão do prefeito João Martins”, destacou o diretor de cultura.

Alex ressalta a importância de cada artista comprovar através de arquivos, que são verdadeiramente fazedores de cultura. “Por isso que pedimos uma comprovação mais recente, por exemplo, sou artesão e participei da Feira “Mostra Tua Arte, João Alfredo”, mostram as fotos da sua participação no evento”, explicou.

Após as inscrições cada projeto e artista passam por uma comissão julgadora que pontuarão cada iniciativa. O mês de dezembro é a previsão de pagamento para os fazedores de artes contemplados com a Lei Aldir Blanc.
 

As inscrições acontecem na sede da Diretoria de Cultura de João Alfredo, localizada na Av. Meira Vasconcelos, próxima à Assembleia de Deus e ao Banco do Brasil, das 8h às 16h. E seguem até o próximo sábado, 09 de novembro, no horário das 8h às 13h.

Informações de: oreporterquechegaprimeiro.blogspot.com/



Professor Edgar Bom Jardim - PE

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

João Cabral de Melo Neto: há 25 anos, morria o poeta engenheiro das palavras



João Cabral de Melo Neto

Crédito,Arquivo Nacional

Legenda da foto,João Cabral de Melo Neto é reconhecido como um dos maiores nomes da literatura brasileira

Preciso. Exato. Ciente do valor, do peso e da forma de cada palavra, cada expressão, cada verso.

O pernambucano João Cabral de Melo Neto (1920-1999), antítese da ideia de que poesia é resultado de uma inspiração mágica, tornou-se um dos maiores poetas da língua portuguesa justamente porque perseguiu, com afinco, determinação e rigor, a inalcançável beleza da perfeição.

Fazia versos como quem matematiza. Rimava como quem resolve das palavras uma equação.

Debilitado pela cegueira e sofrendo de crises de depressão, João Cabral morreu em 9 de outubro de 1999 no Rio de Janeiro, onde vivia


Já estava imortalizado pela vasta e importante obra, pelos prêmios recebidos em vida e pelo ingresso na Academia Brasileira de Letras — desde o fim dos anos 1960 ocupava a cadeira 37 — e na Academia Pernambucana de Letras

Especulado como candidato ao Prêmio Nobel de Literatura, o poeta tinha vários outros reconhecimentos, entre eles o Prêmio Neustadt, o Prêmio Rainha Sofia de Poesia Iberoamericana e o Prêmio Camões.

Profissionalmente, Cabral foi diplomata. De 1945 a 1990, período em que serviu ao Itamaraty, viveu em 14 cidades diferentes: Barcelona, Londres, Brasília, Sevilha, Marselha, Madri, Genebra, Berna, Assunção, Dacar, Quito, Tegucigalpa, Porto e Rio de Janeiro

Sua estreia na literatura ocorreu em 1942, com a publicação de Pedra do Sono. A produção poética se tornaria uma constante até o fim de sua vida. Entre as principais obras do pernambucano destacam-se O Engenheiro de 1945, Psicologia da Composição com a Fábula de Anfion e Antiode, de 1947, O Cão Sem Plumas, de 1950, O Rio ou Relação da Viagem que Faz o Capibaripe de Sua Nascente à Cidade do Recife, de 1953, Uma Faca Só Lâmina, de 1955, A Educação Pela Pedra, de 1966, Museu de Tudo, de 1975, e Tecendo a Manhã, de 1999. Além, é claro, do seu maior sucesso: Morte e Vida Severina, publicado originalmente em 1955.

"Ele é um dos maiores poetas brasileiros de todos os tempos. Sua obra é mais vasta e muito mais diversa do que imaginam aqueles que pensam que ele é apenas o autor de Morte e Vida Severina", diz à BBC News Brasil o poeta e professor de literatura Frederico Barbosa.

Barbosa destaca que essa obra mais conhecida de Cabral costuma ser "mal lida", vista "apenas como um panfleto sobre a miséria do sertão". Mas que o poeta "deixa muito claro que [essa pobreza] não vem da natureza, vem das precárias distribuições de renda e terra".

"João Cabral é certamente um dos maiores poetas do nosso país. Eu considero talvez o maior", enfatiza à reportagem a tradutora, pesquisadora e professora de literatura Sandra Mara Stroparo, docente na Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Reitor da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), o escritor e professor Miguel Sanches Neto diz à BBC News que o autor de Morte e Vida Severina "é um poeta único na tradição de língua portuguesa, marcada pela exacerbação do eu".

"Contra a tendência lírica, ele construiu uma poesia objetual, em terceira pessoa, em que o outro e as coisas ocupam o centro da experiência lírica", analisa.

"É um poeta em que o crítico literário e de cultura se manifesta, e não uma individualidade. Outro aspecto disruptivo é ser moderno usando formas fixas, herança da geração de 45", acrescenta Sanches Neto, citando o grupo da terceira geração do modernismo.

"Com isso, matou a inspiração ou a genialidade como fatores poéticos. Nesse sentido, é um poeta único."

Seu estilo marcado pelo rigor técnico e pela busca da exatidão fez com que ele acabasse sendo chamado de "engenheiro".

Mas de forma alguma isso pode ser confundido com insensibilidade ou frieza. "A obra poética de João Cabral destaca-se pela busca de uma forma rigorosa e estruturada, refletindo seu conhecimento sobre temáticas sociais. O regionalismo é central, com ênfase na vida e nas dificuldades do povo nordestino, especialmente em relação à seca, que simboliza a luta e a resistência", comenta à reportagem o professor Vicente de Paula da Silva Martins, docente na Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA).

O poeta e tradutor André Capilé, professor de Literatura Brasileira na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), explica à BBC News Brasil que há na literatura de Cabral "um plano de concisão e investimento na palavra mais precisa, mais justa, em termos de composição" e este estilo veio em um momento em que "a poesia brasileira ia ficando muito pastosa, muito prolixa”.

“Ele nos traz de novo uma espécie de grande aterramento do espaço da palavra", diz.

"Sua linguagem é simples, mas rica em metáforas originais, conectando a natureza como um agente ativo na vida humana. Cabral se via como um engenheiro das palavras, transmitindo mensagens claras e objetivas. Além disso, aborda a condição humana, a solidão e a busca por sentido", complementa Martins.

Barbosa situa o livro A Educação Pela Pedra como a obra-prima cabraliana e "um dos maiores livros de poesia que já foram escritos no mundo".

"É um livro de um poeta já maduro que consegue fazer uma obra matemática com idas e vindas, algumas relações escondidas que ainda não foram devidamente estudadas e reveladas, as relações entre os poemas, os versos. Cada poema do livro tem duas partes, essas partes se relacionam e se relacionam com outras partes de outros poemas", detalha.

"É algo que ainda está por ser devidamente analisado, devidamente dissecado."

O professor Martins comenta que nesse livro "o poeta utiliza a pedra como símbolo da resistência nordestina, estabelecendo uma relação entre forma e temática que enriquece sua obra".

"Sua linguagem, repleta de imagens concretas e musicalidade, reflete um compromisso com a identidade cultural brasileira. Além disso, a intertextualidade com poetas contemporâneos enriquece o diálogo literário, ressaltando sua influência", acrescenta.

"A voz de Cabral é crucial para a literatura do século 20, propondo novas formas de entender a realidade brasileira e solidificando seu legado na poesia contemporânea."

João Cabral de Melo Neto, em sua posse na ABL, em 1969

Crédito,Arquivo Nacional

Legenda da foto,João Cabral de Melo Neto, em sua posse na ABL, em 1969

Ecos cabralinos

Essa forma sui generis de fazer poesia se tornou seu principal legado. Sanches Neto diz que João Cabral "não deixou discípulos, porque os gênios são figuras solitárias". Pode ser verdade.

Mas verdade também é, que como apontam diversos críticos, a poesia brasileira tem outros exemplos que seguem a trilha aberta pelo pernambucano. Sebastião Uchoa Leite (1935-2003), por exemplo.

Mais recentemente, nomes como o do admirador confesso Frederico Barbosa, também recifense. A eles, se juntam ainda os cariocas Paulo Henriques Britto e Felipe Fortuna, o mineiro de Juiz de Fora Edimilson de Almeida Pereira e o paulistano Arnaldo Antunes.

"Há, depois de João Cabral, muitos ecos de sua poética os quais se perpetuaram e continuam dando bons frutos. O modo como manipula a palavra autoriza-nos mesmo a dizer que o próprio concretismo bebe nessas fontes criadoras do autor de Morte e Vida Severina. Mas há outros aspectos que alimentam a poesia brasileira posterior a ele: o exercício da metalinguagem, os processos experimentalistas que incidem sobre o léxico até o limiar da palavra na era digital e o formalismo que não cerceia, mas liberta de qualquer obrigação em nome de oferecer, também pela ocupação do espaço, inusitadas maneiras de produzir sentido", afirma à BBC News Brasil o professor de literatura Emerson Calil Rossetti, criador do canal no YouTube Elite da Língua.

"Para dar um toque mais 'moderno' e talvez subversivo ao meu exemplo, citaria uma referência ainda fora do cânone tradicional: a obra de Arnaldo Antunes que, emergindo da linguagem potencialmente expressiva, edifica-se numa arquitetura em que os sentidos poéticos jamais colidem com a racionalidade da forma, antes tiram dela o exato proveito para o deleite de quem lê, vê e ouve as composições do tribalista", acrecenta Rossetti.

Martins comenta que Fortuna "dialoga com o estilo" de Cabral ao refletir "seu rigor formal e concisão". "Ambos os poetas incorporam elementos cotidianos que provocam reflexões profundas", argumenta.

"Fortuna utiliza questionamentos que evocam a voz inquisitiva de Cabral, transformando objetos comuns em símbolos de temas universais, como a vida e a morte. A dualidade entre preservação e efemeridade, presente em suas obras, destaca a complexidade da experiência humana. Por fim, o tom filosófico das criações [dos dois] convida o leitor a ponderar questões existenciais, revelando uma sensibilidade compartilhada na exploração da realidade."

Autor do livro O Gosto dos Extremos: Tensão e Dualidade na Poesia de João Cabral de Melo Neto, de Pedra do Sono a Andando Sevilha, o professor de literatura Waltencir Alves de Oliveira, da UFPR, vê "a presença de princípios compositivos e modos de operar com a palavra poética” ao estilo cabralino até “mesmo em poetas que refutam a existência de um diálogo com sua poesia".

"Difícil, contudo, listar nomes de possíveis seguidores, uma vez que os modos de apropriação, citação e menção acionados pela poesia contemporânea podem tornar o diálogo com a tradição implícito, ou até mesmo escamoteado. Sobretudo porque, em alguns aspectos, pode se verificar mais um falar contra do que um falar com, em ambos os casos o poeta e sua poesia parecem ter se convertido em pedágio quase obrigatório para quem deseja passar e construir uma poesia original e com marcas singulares", diz ele, à BBC News Brasil.

"Dizendo, em outras palavras, novas facetas e interpretações dadas ao mesmo poeta foram assegurando a ele um lugar de destaque, possibilitando que vários matizes fossem se acrescentando a essa poesia a cada novo e nova poeta que, ao assimilá-lo o altera significativamente", completa Oliveira.

A professora Stroparo ressalta que sendo "muito da linguagem que ele criou" específico e especial, "muitos são tributários dele hoje". Tem ainda os poetas marginais [dos anos 1970], com suas reações negativas [frente a Cabral]. Eles gostavam de se posicionar dizendo que queriam uma linguagem mais fácil, mais direta. Era uma maneira de dizer 'eu sou anticabralino'", lembra ela.

"Mas acho que o principal nome da poesia contemporânea que a gente pode ligar ao João Cabral é o do poeta Paulo Henriques Britto. Considero-o a melhor junção da voz do [Carlos] Drummond [de Andrade] com a voz do Cabral, que aparece na sintaxe da poesia do Britto, nas escolhas formais da poesia do Britto", comenta a professora.

Capilé define Cabral como "uma influência incontornável dos anos 50 em diante" na poesia brasileira. "Em maior ou menor grau, ele sempre vai voltar como uma espécie de grande fantasma ao contemporâneo imediato", pontua.

Arnaldo Antunes

Crédito,Getty Images

Legenda da foto,Arnaldo Antunes é um dos que seguem a trilha de João Cabral de Melo Neto, apontam especialistas

Um fazer poético de que poucos são capazes

Menos do que apontar nomes, o poeta Barbosa ressalta que o legado de Cabral é "a ideia de que poesia não é emoção, não é sentimento, não vem de um frenesi".

"Mas que é algo muito elaboradora. O que é uma coisa óbvia, […] mas as pessoas tendem a desconsiderar isso e até hoje muita gente pensa que poesia é sentimento. João Cabral colocou a ideia da poesia como elaboração profunda, a busca de uma linguagem adequada. Muita gente ainda rejeita isso", salienta.

Para Rossetti, "é preciso ainda destacar a habilidade da poesia cabralina em se equilibrar com maestria entre a cultura popular e a erudita", um "feito que poucos poetas são capazes de realizar".

Oliveira conta que em seu livro a respeito da obra de Cabral buscou explicar essas características, mergulhando na "feição do poeta como autor que refutava o lirismo-amoroso, recusava a explicitação da subjetividade" e pleiteava "para si mesmo um lugar de recusa de um ideal poética, do qual, talvez a estética romântica fosse, segundo o próprio Cabral, a principal disseminadora".

Ele reconhece que livros, ensaios e entrevistas do próprio poeta "insistiam na afirmação, por vezes categórica por parte dele, de uma poesia cerebrina, racional e assentada sobre forte ideal construtivo", e isto acabou por "lhe render epítetos como 'poeta engenheiro', 'poeta arquiteto', 'geômetra', etc.".

"Sua influência persiste no século 21, dialogando com poetas contemporâneos e reafirmando sua relevância na literatura", resume Martins.

"Assim, Cabral consolida sua voz única, essencial para entender a poesia moderna e contemporânea. Assumindo o papel de historiador da literatura brasileira, afirmo que, no que diz respeito à autenticidade e originalidade, a literatura nacional pode ser compreendida em duas fases distintas: antes e depois de Cabral de Melo Neto."



  • Edison Veiga
  • Role,De Bled (Eslovênia) para a BBC News Brasil
Professor Edgar Bom Jardim - PE