Fake news, apropriação e vazamento de dados pessoais, censura a conteúdos, viralização de discursos de ódio, racismo e fascismo, guerra híbrida. Efeitos colaterais das novas tecnologias da informação e comunicação aí postas. Como combater? As tecnologias em software livre – ou seja, em código aberto, sem apropriação do capital privado – sempre se mostram como o caminho para que, de fato, a tal revolução tecnológica fosse colocada a serviço das transformações sociais.
O contexto é, pois, propício para que resgatemos ao debate a defesa das tecnologias abertas. Já experimentamos momentos em que o software livre esteve em pauta – e investimentos de governos populares na esfera federal e em alguns estados na primeira década do ano 2000 construíram soluções até hoje referências. O software de declaração de Imposto de Renda da Receita Federal e os telecentros (lan houses públicas) espelhadas pelo interior do Paraná e que democratizaram o acesso à internet são alguns entre tantos exemplos.
Fruto dessa época, e que hoje se reposiciona como foro de compartilhamento de experiências e intercâmbio de ideias em tecnologias abertas, é a Latinoware – Congresso Latino-americano de Software Livre. Criado em 2004 pelo Parque Tecnológico de Itaipu, da Itaipu Binacional, o evento chega neste ano à 16ª edição. Está sendo realizado nesta semana, de 27 a 29 de novembro, em Foz do Iguaçu, com mais de 100 atividades, em que tecnologias da informação e comunicação livres são apresentadas como caminho para soluções em diversas áreas da vida.
Na abertura, um dos maiores nomes do mundo em software livre, o norte-americano Jon “Maddog” Hall, diretor do Linux Professional Institute, convocou os participantes a reverberarem exemplos aos montes que comprovam como o software livre é caminho para desenvolvimento tecnológico soberano, e aliado à geração de conhecimento, emprego e renda. “O software livre está empoderando pessoas a abrirem suas empresas e fazerem negócios”, assinalou.
Maddog coordena duas iniciativas no Brasil, atualmente: o Projeto Cauã, criado há 14 anos e voltado a oferecer oportunidade de emprego e renda a universitários, e o “Caninos Loucos”, que desenvolve computadores, hardwares e softwares para a Internet das Coisas (IoT), em parceria com o Laboratório de Sistemas Integráveis Tecnológico (LSI-TEC) e a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP).
As tecnologias livres também foram tema de uma das atividades do Fórum Social da Baixada Santista, realizado em Santos entre os dias 8 e 10 de novembro. Com o título “Por um Vale do Silício Santista”, uma mesa-redonda defendeu que o desenvolvimento de software livre é o caminho para que o Parque Tecnológico de Santos, em fase de implantação pelo poder público e que deverá articular instituições como universidades e empresas, represente oportunidade de emprego e renda com inclusão econômica e social.
Os participantes questionaram parcerias com gigantes como Amazon, Google e Facebook, no desenvolvimento de aplicativos e programas para serviços públicos, fato que tem sido comum em administrações pelo Brasil. Ocorre que, embora pareçam vantajosas – geralmente dispensam maiores custos financeiros -, elas escondem um prejuízo enorme: a perda da soberania tecnológica, uma vez que a expertise das soluções engendradas fica sob a guarda dessas corporações, e não da coletividade.
Diante de tantas urgências – desemprego, retirada de direitos, atentados à democracia – parece faltar fôlego para mergulharmos em mais uma luta. Pode até soar secundária, inclusive. Não é. Em tempos de guerra híbrida, deter as tecnologias da informação e comunicação é fundamental para a defesa dos demais direitos.
Com Carta Capital
Professor Edgar Bom Jardim - PE
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