quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Huck para presidência em 2018. Quem é o grupo que pode lançar o apresentador global?


Luciano Huck
Image captionO movimento se divide em relação à uma possível candidatura de Huck | Foto: Tv Globo/Divulgação

Um encontro improvável. É assim que integrantes do movimento Agora! definem sua composição, que abrange gente como o economista Humberto Laudares, assessor parlamentar do senador Tasso Jereissati (PSDB),o ex-secretário de Justiça da gestão Dilma Rousseff (PT) Beto Vasconcelos, o herdeiro do grupo Iguatemi Carlos Jereissati Filho e o líder indígena Anapuaka Tupinambá.
Fundado no ano passado, o Agora! diz ter por missão encontrar uma agenda de propostas de políticas públicas com as quais pudessem concordar tanto esquerdistas quanto liberais. Uma ideia ousada em tempos de intensa polarização. Não é por isso, no entanto, que o grupo tem chamado a atenção.
Recentemente, o apresentador da Globo Luciano Huck ingressou no movimento, o que provocou rumores sobre uma possível candidatura presidencial dele. Embora nada esteja ainda decidido e, oficialmente, o movimento trate a possibilidade com cautela, integrantes do Agora! debatem abertamente a possibilidade e já há divisões internas em relação ao assunto.

Patrícia Ellen, Leandro Machado, Ilona Szabó
Image captionPatrícia Ellen, Leandro Machado e Ilona Szabó começaram o grupo no ano passado

O grupo foi idealizado pelo cientista político Leandro Machado, pela especialista em segurança Ilona Szabó, próxima ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, e pela empresária Patrícia Ellen, que foi sócia da consultoria McKinsey & Company.
Participam ainda Rafael Poço, cofundador da Rede Sustentabilidade, partido de Marina Silva; o diretor do grupo educacional Somos, Eduardo Mufarej; a presidente do grupo Todos Pela Educação, Priscila Cruz; o secretário de Assuntos Estratégicos de Michel Temer, Hussein Kalout, e o analista político João A. de Castro Neves, da Eurasia Group.
Apesar da amplitude de posicionamentos políticos, a maioria é composta de homens, brancos e ricos - ou de classe média alta - entre 30 e 40 anos.
Em entrevista à BBC Brasil, Leandro Machado reconheceu o problema e disse que o Agora! está trabalhando para aumentar sua diversidade.
"Na verdade o que todos temos em comum é o acesso à educação", diz Patrícia Ellen, que se formou na USP (Universidade de São Paulo) e mora em Alto de Pinheiros, bairro nobre de São Paulo, mas nasceu no Campo Limpo.

Patricia Ellen
Image captionPatrícia Ellen é um das cofundadoras do grupo

"Você percorre uma distância de 20 quilômetros e a expectativa de vida sobe 20 anos. É uma desigualdade com a qual nos preocupamos muito e uma das nossas principais diretrizes é combatê-la", conta.
Com a bandeira da redução da desigualdade, o grupo tem algumas premissas básicas, mas ainda não fechou sua agenda completa de propostas. Os assuntos são discutidos um a um e a ideia é ter uma lista de proposições concretas, não um compêndio de boas intenções ou princípios.
"A discussão hoje é muito superficial. As pessoas falam em Estado Mínimo, mas o que é isso? Não aderimos a conceitos prontos. Sim, queremos aumentar a eficiência do Estado, mas ele não pode ser mínimo na segurança pública, na educação - precisa garantir educação de qualidade para todos", explica Machado.
Boa parte dos membros é formada ou trabalhou em instituições internacionais renomadas. O advogado Ronaldo Lemos, o economista Tomás Lopes Teixeira e a advogada Celina Beatriz Bottino, por exemplo, têm mestrado pela Universidade de Harvard, nos EUA. A econonomista Mônica de Bolle é PhD pela London School of Economics, na Inglaterra. O executivo Rafael Benke já passou pela OEA (Organização dos Estados Americanos) e pela OMC (Organização Mundial do Comércio).
A ideia, segundo o fundador Leandro Machado, é encampar o discurso da renovação política, mas trazendo para o debate pessoas preparadas, e não "aventureiros". "Ninguém é político, mas todos têm histórico de atuação política. Renovação só pela renovação pode ser pior, se vier uma pessoa despreparada ou mal intencionada", afirma.
Ronaldo Lemos concorda: "Pessoas que participaram a vida inteira da busca de soluções, não gente que estava em casa jogando videogame e de repente resolveu virar político".

Ter ou não ter candidato

Aventureiro, aliás, é uma categoria na qual Machado não encaixa Luciano Huck. "Ele é pessoa que tem uma experiência grande em lidar com pessoas, e é muito bem visto e querido pelo público", diz Leandro.
Huck se aproximou do movimento através de membros como Ilona Szabó - que foi uma das roteiristas do filme "Quebrando o Tabu", dirigido por Fernando Grostein Andrade, irmão de Luciano.
A entrada do apresentador da Globo foi muito discutida entre os membros do movimento.

Luciano Huck
Image captionO apresentador Luciano Huck se tornou membro do Agora! recentemente | Foto: Movimento Agora!

"Ficamos na dúvida se fazia sentido trazer uma pessoa tão conhecida, sobre o tipo de associação que poderia ser feita. Mas entendemos que ele está realmente interessado nos nossos princípios e propostas de atuação", afirma Ellen.
Era um temor do Agora! desde o começo que o debate sobre propostas fosse sequestrado pela discussão de candidaturas majoritárias, especialmente com a chegada de Huck. Nas próximas semanas, os membros vão deliberar sobre o assunto, o que vai definir os rumos do grupo. É muito possível que haja baixas, especialmente entre os esquerdistas do Agora!.
O produtor cultural Alê Youssef se adiantou ao debate e deixou o grupo nesta semana, incomodado com a associação frequente entre Huck e o movimento.
Casado com a atriz Leandra Leal, Youssef faz parte do time do programa Esquenta! e já foi apresentador na GloboNews. Criador do bloco Acadêmicos do Baixo Augusta, ele também participou da criação da Rede Sustentabilidade, do qual se desligou posteriormente.

Integrantes do Agora!
Image captionO Agora! se reúne mensalmente |Foto: Divulgação

No texto que mandou ao grupo anunciando sua despedida, ele afirma que a associação com Huck - que era amigo pessoal de Aécio Neves e apoiou sua candidatura em 2014 - pode comprometer o caráter plural e diverso do grupo.

Torre de Babel

A posição oficial do movimento é de que Huck é "só mais um".
"O Luciano é um membro como todos os outros. Se ele decidir se candidatar, o apoio do Agora! será discutido. Tudo depende se ele irá se comprometer com nossa agenda", diz Leandro Machado.
"Nosso foco não é a [eleição] majoritária. Queremos concentrar nossos esforços na renovação do Legislativo", afirma o advogado Ronaldo Lemos, co-fundador e um dos principais articuladores do movimento.
Membros do Agora!, no entanto, têm participado das conversas de Huck com o presidente do PPS, Roberto Freire. De acordo com a Folha de S.Paulo, o namoro poderia levar até mesmo a uma mudança de nome do PPS, que adotaria o termo Agora!. Além do PPS, Rede e Livres (antigo PSL) iniciaram conversas com o grupo.
A ideia original do movimento é ser suprapartidário - os integrantes interessandos em se lançar candidatos se encaixariam em legendas diferentes.
"São os partidos que estão abertos ao diálogo. Não vamos aderir às ideologias partidárias. Vamos ter uma agenda, nossas propostas, e a ideia é que nossos candidatos possam levar essa programação à sua candidatura", diz Patrícia Ellen.
Para integrantes da ala mais à esquerda, o Agora! sofre por não entender o funcionamento da política brasileira. Pode acabar usado como massa de manobra. O PPS estaria usando a ingenuidade do grupo para colocá-lo a serviço de sua própria agenda de renovação, segundo um deles, que pediu anonimato.

Como surgiu o Agora!

Machado, Ellen e Ilona já se conheciam por causa de sua atuação no setor de políticas públicas - Ilona é presidente do Instituto Igarapé, que atua na área de segurança e política de drogas; Leandro criou o Cause, consultoria sobre causas sociais para organizações e marcas; e Patrícia liderou a Prática de Setor Público e Social no Brasil da McKinsey & Company.
Quando perceberam que o Brasil não estava sendo representado por membros do governo em diversos congressos internacionais sobre políticas públicas, decidiram se juntar.
"Então começamos a pensar em como poderíamos atuar para mudar esse quadro", diz Machado.
Os três chamaram alguns conhecidos que também atuavam nesse sentido e fizeram uma lista de nomes de pessoas que admiravam e que poderiam contribuir com experiência e conhecimento.
Cada um foi ligando para um e o movimento atingiu o número de 50 membros. Em reunião na semana passada, novos integrantes foram aceitos. Hoje o Agora! tem 90 pessoas.
Para participar é preciso se comprometer a doar pelo menos dois anos de sua vida ao serviço público. Quem tem condições - a maioria - também está contribuindo financeiramente, já que o grupo ainda não começou a arrecadar dinheiro externamente.
Alguns doam milhas para as viagens dos membros para os encontros, outros fornecem os espaços para reuniões, outros dão dinheiro - é o caso de Luciano Huck, que também contribuiu.
Os valores ainda não foram divulgados, mas Ellen diz que o movimento preza pela transparência e que terá uma planilha detalhando as contribuições.

Trabalho de base

O grupo fez sua primeira reunião de "escuta" em São Paulo na semana passada. Entender onde se situa a opinião pública e ouvir as pessoas é um dos cinco pilares de atuação - os outros são "pensar", "falar", "engajar" e "agir".
Em um Centro Cultural na divisa entre o Campo Limpo e o Capão Redondo, na periferia da cidade, Patrícia Ellen apresenta o grupo.
Também está presente o professor e historiador Thiago Rocha de Paula, que foi candidato a vereador em Santo André em 2016, pelo PV, e deve ser uns dos nomes do movimento para as eleições proporcionais.
Convidado por Leandro Machado para o grupo, ele conta que recebeu a ligação para uma das reuniões sem saber muito do que se tratava. "Cheguei lá no apartamento e tinha o cara que aparece no jornal, um monte de cara conhecida e gente da TV. Pensei: que que eu tô fazendo aqui?", conta, rindo.
Hoje ele é um dos principais articuladores do trabalho de base do Agora! e foi um dos responsáveis por trazer outros membros que não moram nas áreas mais ricas da capital.

Thiago Rocha
Image captionUm dos membros que deve sair candidato às proporcionais é Thiago Rocha de Paula | Foto: Movimento Agora!

Patrícia pede para as cerca de 20 pessoas na sala votarem em qual assunto querem discutir.
Entre uma lista existente, moradores do bairro grudam post-its em "educação", "redução da desigualdade" e "segurança pública".
Depois de uma hora de desabafos sobre os problemas da educação no país, a mediadora faz uma pausa.
"Falamos dos problemas, mas agora vamos todos fechar os olhos e pensar qual é a educação que a gente quer, qual nosso sonho para a educação no Brasil", disse Ellen.

Reunião no Campo Limpo
Image captionReunião feita com moradores do Campo Limpo é parte de um dos pilares de atuação do movimento: a "escuta" | Foto: Movimento Agora!

A maior parte não entra no clima e fica de olho aberto, ligeiramente sem graça. Mas todos compartilham suas ideias.
Parte do Agora! é fã de meditação: o economista Fabio Toreta, além de estar no movimento, também é voluntário do Awaken Love, iniciativa do guru hinduísta Sri Prem Baba.
No próximo fim de semana, o movimento participará de uma mesa no II Congresso Internacional de Felicidade, em Curitiba, onde Prem Baba também fará palestra.

Estudo e discussão

O método de discussão usado no encontro de escuta, segundo Patrícia, é parecido com o que o grupo usa em suas reuniões mensais.
Para organizar a agenda de propostas com pessoas de posições políticas tão amplas, um grupo – em geral de pessoas que já trabalharam com o assunto - é responsável por pesquisar um tema e apresentar os problemas para o movimento.
Os integrantes fazem leituras e pesquisas prévias e discutem as soluções presencialmente.
O foco é a análise de políticas públicas e a polarização é evitada.
"A gente nunca discutiu se foi ou não foi golpe. O grupo foi criado depois do impeachment, justamente porque vimos que algo precisa ser feito sobre a situação do país e a polarização não estava levando a nada", afirma Ronaldo Lemos. "São todos voluntários, que estão abertos ao diálogo."
O grupo evita também avaliações pessoais sobre figuras como presidente Michel Temer ou o deputado federal Jair Bolsonaro.
Um dos últimos temas analisados foi a Reforma da Previdência.
"Embora as pessoas tenham discordado sobre os meios, chegamos ao consenso que é necessária uma reforma. E como? Acabando com privilégios de diversos setores. A reforma precisa ser eficiente e justa", diz Ellen.
Já sobre reforma trabalhista, por exemplo, ainda não houve consenso - há quem apoie as alterações implementadas por Temer e quem veja perda de direitos aos trabalhadores.
Leandro Machado diz que ter uma agenda concreta de propostas é a garantia de que o grupo - que tem empresários com interesses próprios entre os membros - não se tornará um grande lobista de interesses pessoais.
Ronaldo Lemos reconhece que será um desafio fazer campanha política sem apresentar respostas fáceis e slogans populares - correndo o risco de alienar tanto a esquerda quanto a direita.
"Queremos menos marketing e mais enfrentamento da realidade. Não é fácil, mas não podemos subestimar a capacidade de entendimento das pessoas", diz.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

terça-feira, 21 de novembro de 2017

Secretário de Educação ofende Taís Araújo no Dia da Consciência negra: 'Idiotice racial'

Atriz Taís Araújo havia declarado: "A cor do meu filho faz as pessoas mudarem de calçada". Foto: Globo/Reprodução
Atriz Taís Araújo havia declarado: "A cor do meu filho faz as pessoas mudarem de calçada". Foto: Globo/Reprodução


O depoimento da atriz Taís Araújo, símbolo da luta pela igualdade racial e do empoderamento negro, durante evento do TEDx em São Paulo se tornou um dos relatos mais marcantes do Dia da Consciência Negra (a segunda-feira, dia 20). A artista se valeu de frases contundentes para exemplificar como é difícil criar os filhos em uma sociedade racista: "No Brasil, a cor do meu filho faz com que as pessoas mudem de calçada, escondam as suas bolsas e blindem seus carros. A vida dele só não vai ser mais difícil do que a da minha filha".

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A frase se somou a outras proferidas durante a data para inspirar reflexão sobre a discriminação contra negros no país. Mas, para o secretário de Educação do Rio de Janeiro, Cesar Benjamim, o depoimento se tratou de "idiotice racial". Em postagem no Facebook, ele escreveu: "Nossa maior conquista - o conceito de povo brasileiro - desapereceu entre os pensantes. Qualquer idiotice racial prospera. A última delas é uma linda e cheirosa atriz global dizer que as pessoas mudam de calçada quando enxergam o filho dela, que também deve ser lindo e cheiroso. Vocês replicam essa idiotice".

O secretário atribuiu a desconstrução da tese de democracia racial - o pensamento apoiado na existência, no Brasil, de uma convivência pacífica e igualitária entre negros e brancos - a uma criação do "Departamento de Estado dos Estados Unidos". Benjamim sugeriu uma reflexão para contrapor as declarações de Taís Araújo. "Se os brasileiros mudassem de calçada quando vissem uma pessoa morena ou negra, viveriam em ziguezague. Nunca chegariam a lugar nenhum".

Veja a postagem:

Postagem do secretário de Educação. Foto: Facebook/Reprodução
Postagem do secretário de Educação. Foto: Facebook/Reprodução
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Mundo:Robert Mugabe: de herói guerrilheiro a líder autoritário, as muitas faces do presidente que renunciou hoje


Do ativismo político ao poder autoritário: quem é Robert Mugabe
À medida que a economia do Zimbábue foi de mal a pior e, finalmente, se tornou desastrosa, a morte política e, até mesmo física, de Robert Mugabe foi prevista muitas vezes. Mas ele sempre confundiu seus críticos - pelo menos até hoje.
No entanto, ao ficar ao lado de sua mulher, Grace, na batalha pela sucessão, Mugabe pareceu ter ido longe demais, e perdeu o apoio dos líderes militares que o mantinham no poder. Eles então mudaram de lado e intervieram em nome do ex-vice-presidente do Zimbábue, Emmerson Mnangagwa, que fez carreira nas forças de segurança.
Mnangagwa, que foi demitido por Mugabe há cerca de duas semanas, foi apontado líder do partido no poder no país, o Zanu-PF, no domingo.
Com 93 anos, a saúde de Mugabe tem se deteriorado visivelmente no último ano, apesar de que, oficialmente, ele ainda fosse candidato à reeleição no próximo ano.
Antes das eleições de 2008, Mugabe disse: "Se você perde uma eleição e é rejeitado pelo povo, é hora de deixar a política". Mas depois de ficar atrás de Morgan Tsvangirai no primeiro turno, Mugabe se mostrou desafiador, jurando que "apenas Deus" poderia removê-lo do cargo. E para ter certeza, foi desencadeada uma resposta violenta para preservar seu controle sobre o poder.
Para proteger seus apoiadores, Tsvangirai se retirou do segundo turno. Embora Mugabe tenha sido forçado a dividir o poder com o seu rival há anos, ele permaneceu - até agora - como o presidente do país, cargo que ocupa desde 1980.
Robert Mugabe à esquerda, o representante da ANC Georges Silundika e o líder do partido Zanu-PF (União dos Povos Africanos do Zimbábue) Joshua Nkomo, em reunião em Dar Es Salaam, Tanzania.Direito de imagemGETTY IMAGES
Image captionRobert Mugabe, em 1960, foi fortemente influenciado pelos ideais pan-africanos
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Os marcos da vida de Robert Mugabe

- 1924: Nasceu
- 1964: Foi preso pelo governo da Rodésia.
- 1980: Ganhou as eleições pós-independência
- 1996: Casou-se com Grace Marufu
- 2000: Perdeu o referendo, milícias pro-Mugabe invadem fazendas de brancos e atacam apoiadores da oposição.
- 2008: Ficou em segundo lugar no primeiro turno das eleições, atrás de Tsvangirai, que se retira do segundo turno em meio a ataques aos seus apoiadores
- 2009: Em meio a um colapso econômico, empossou Tsvangirai como primeiro-ministro, em um conturbado governo nacional que durou quatro anos
- 2017: Retirou do poder o antigo aliado Emmerson Mnangagwa, então vice-presidente, abrindo caminho para que sua mulher, Grace, o sucedesse. Forças armadas intervêm e Mugabe é retirado do comando do partido e acaba renunciando
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Ícone da luta de libertação

Mesmo depois de 37 anos no poder, Mugabe ainda mantinha a mesma visão de mundo - as forças socialistas e patrióticas do Zanu-PF ainda estavam lutando contra os "irmãos maus" do capitalismo e colonialismo.
Qualquer crítico era considerado como "traidor e vendido" - um retorno à guerra de guerrilhas, quando esses rótulos podiam representar uma sentença de morte.
Em 2000, diante de uma forte oposição pela primeira vez, Mugabe destruiu o que um dia já foi uma das economias mais diversificadas da África, com o objetivo de reter o poder. Confiscou fazendas de proprietários brancos, que eram a espinha dorsal da economia do país, e assustou doadores internacionais. Mas, em termos meramente políticos, ele venceu seus inimigos - continuou no poder.
Mugabe sempre colocou a culpa dos problemas econômicos do Zimbábue em uma trama armada pelos países ocidentais, comandados pelo Reino Unido, para retirá-lo do poder devido ao confisco de fazendas cujos donos eram brancos. Já seus críticos culpam o próprio Mugabe, dizendo que ele demonstrou não compreender como uma economia moderna funciona.
Manifestantes queimam notas sem valor em 2016Direito de imagemAFP
Image captionManifestantes queimam notas sem valor em 2016 em Harare, capital do Zimbábue.
Mugabe disse uma vez que o país nunca iria quebrar - parecia que ele estava disposto a testar sua teoria até o limite, com o Zimbábue registrando a mais rápida queda econômica do mundo e uma inflação de 231 milhões por cento em julho de 2008.
O professor Tony Hawkins, da Universidade do Zimbábue, observou que, com Mugabe, "sempre que a economia se metia no caminho da política, a política ganhava".

Poder a qualquer custo

As táticas que Mugabe e seus apoiadores usaram vinham da guerra de guerilha.
Depois de ter sofrido a primeira derrota eleitoral de sua carreira, em um referendo de 2000, Mugabe liberou sua milícia pessoal - veteranos de guerra apoiados pelas forças de segurança - para usar violência e assassinato como estratégia eleitoral.
Robert Mugabe cumprimenta apoiadores em 2013Direito de imagemAFP
Image captionMugabe diz que está lutando pelos direitos do povo negro do Zimbábue
Oito anos depois, uma situação parecida ocorreu quando Mugabe perdeu o primeiro turno das eleições presidenciais para o seu antigo oponente Morgan Tsvangirai.
Quando necessário, todas as ferramentas do Estado - as forças de segurança, os serviços civis, a mídia estatal - que eram controlados principalmente por membros do partido Zanu-PF, foram usados em benefício do partido no poder.
O homem que lutou pelo "um homem, um voto" introduziu uma exigência de que eleitores provassem seu local de residência com uma conta de consumo, o que os jovens e desempregados apoiadores da oposição não costumam ter.
Na verdade, os sinais da sua atitude em relação à oposição estavam visíveis desde o início dos anos 1980, quando membros de uma brigada treinada pela Coreia do Norte foram enviados para Matabeleland, região de origem do seu rival de então, Joshua Nkomo. Milhares de civis foram mortos até que Nkomo aceitasse dividir o poder com Mugabe - episódio precursor do que viria a ocorrer com Tsvangirai.
Um dos inegáveis avanços de Mugabe, que se formou professor antes de se tornar presidente, foi a expansão da educação. O Zimbábue tem a mais alta taxa de alfabetização da África, de 90% da população.
O cientista político Masipula Sithole, já falecido, disse certa vez que ao expandir a educação, Mugabe estava "cavando sua própria cova". Os jovens com acesso a educação poderiam analisar os problemas do Zimbábue por si próprios. E a maioria culpou a corrupção do governo e a má administração pela falta de empregos e o aumento dos preços.

Figura caricata

Mugabe frequentemente alegava estar lutando em prol dos camponeses pobres, mas a maior parte da terra que ele confiscou acabou nas mãos de pessoas do seu círculo pessoal.
Veteranos de guerra em 2000 marcham em um campo, segurando enxadasDireito de imagemAFP
Image captionMugabe não tinha receio de usar violência para se manter no poder
O arcebispo sul-africano Desmond Tutu disse uma vez que o longevo presidente do Zimbábue tinha se tornado uma figura caricata do arquétipo do ditador africano.
Durante a campanha presidencial de 2002, ele começou a usar camisas coloridas e brilhantes estampadas com seu rosto - um estilo copiado por muitos governantes africanos autoritários.
Ao longo dos 20 anos anteriores, esse homem conservador só tinha sido visto em público vestido de terno e gravata ou em trajes de safari.
Muitos ficaram se perguntando porque ele não colocava os pés para o alto e aproveitava seus últimos anos ao lado de sua jovem família.
A picture taken on February 21, 2017 shows a cake bearing a portrait of Zimbabwe's President Robert Mugabe during a private ceremony to celebrate Mugabe's 93rd birthday in Harare.Direito de imagemAFP
Image captionRobert Mugabe comemorou seu aniversário de 93 anos no começo deste ano
Mugabe afirma ser um católico convicto. Fiéis da Catedral Católica de Harare eram ocasionalmente surpreendidos por tropas de segurança quando o então presidente aparecia para a missa de domingo.
Teve dois filhos com Grace, sua então secretária, quando era casado com Sally, sua popular primeira mulher. Mas foi Grace, que depois virou sua companheira, que no fim das contas provocou sua queda.

'Rei'

Embora Mugabe tenha vivido além de muitas previsões, a crescente tensão nos últimos anos cobrou seu preço e sua aparência até então impecável começou a revelar sinais de severo envelhecimento.
Em 2011, um telegrama diplomático dos Estados Unidos vazado pelo Wikileaks sugeriu que Mugabe estivesse com câncer de próstata.
Mas ele sempre teve um estilo de vida saudável. Grace já afirmou que ele acorda às 5 da manhã para fazer exercícios, inclusive yoga. Ele não bebe álcool ou café e é vegetariano.
Mugabe tinha 73 anos quando teve seu terceiro filho, Chatunga.
Ex-presidente Robert Mugabe e a ex-primeira-dama Grace Mugabe durante a comemoração dos 37 anos de independência do país, em abril de 2017, na capital Harare.Direito de imagemAFP
Image captionEx-presidente Robert Mugabe e a ex-primeira-dama Grace Mugabe durante a comemoração dos 37 anos de independência do país, em abril de 2017, na capital Harare.
Sempre foi um homem orgulhoso de si mesmo.
Ele dizia que só sairia do poder quando a "revolução" estivesse terminada. Estava se referindo à redistribuição das terras que um dia pertenceram aos brancos. Mas ele também queria escolher seu sucessor, que deveria vir, com certeza, dos quadros do partido Zanu-PF.
Didymus Mutasa, que já foi um dos companheiros mais próximos de Mugabe, disse à BBC que, na cultura do Zimbábue, reis só eram substituídos quando eles morriam "e Mugabe é o nosso rei".
Nem mesmo seus aliados mais próximos estavam preparados para a conversão do Zimbábue em uma monarquia, com o poder nas mãos de uma única família.
Fonte:bbc
Professor Edgar Bom Jardim - PE

II Justulino Cultural

CONVITE
 Contamos com a presença de todos.
Professor Edgar Bom Jardim - PE