A Revolução Russa (1917-1928) foi constituída de uma série de eventos responsáveis por derrubar a monarquia que comandava o Império Russo até então e criar a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), o primeiro país socialista do mundo. Essa revolução não é importante apenas na história da Rússia, pois trata-se de um período que impactou todo o andamento do século XX. Que tal entender mais sobre esse momento?
O QUE ACONTECEU ANTES DA REVOLUÇÃO RUSSA?
É comum que revoluções sejam antecedidas por períodos de grande insatisfação popular e isso não foi diferente com a Revolução Russa. Os principais fatores que levaram o povo a derrubar o governo foram os seguintes:
Persistência do absolutismo
Antes da Revolução Russa, cuja concretização foi em 1917, o sistema político que organizava o país desde o século XVI era o czarismo. Tratava-se de uma forma de absolutismo, no qual o czar (imperador) concentrava em suas mãos todos os poderes.
Ao czar estavam submetidas todas as classes sociais, desde os servos até a nobreza – conhecida como boiardos – e a Igreja Católica Ortodoxa. Esses dois últimos grupos eram considerados mais livres do que os servos, mas mesmo assim tinham suas liberdades controladas pelo Império. A Ochrana – polícia política – vigiava e controlava a educação e os tribunais; no país também não existia liberdade de imprensa. Já os camponeses viviam em extrema miséria e ainda pagavam altos impostos para manter o sistema czarista.
Pobreza e miséria
No século XIX a Rússia, juntamente com Reino Unido, Alemanha, França e Áustria-Hungria, era um dos principais países da Europa. Contudo, os russos ficaram para trás na Revolução Industrial e viram seus vizinhos modernizarem-se e investirem na indústria, enquanto a Rússia continuava sendo uma economia agrícola. O Império Russo a era conhecido como o “Gigante dos Pés de Barro”, uma vez que sob o sistema feudalista – organização política-social na qual servos trabalhavam para donos de terra, os quais geralmente tinham laços com a nobreza –, os senhores feudais não tinham interesse em modernizar as plantações ou investir em indústrias,.
Quando a Rússia foi derrotada na Guerra da Criméia (1854-1856) por conta dos problemas sociais e econômicos que enfrentava, o czar Alexandre II instituiu algumas mudanças. Em 1861 houve a abolição da servidão, junto com a ocupação de novas terras, vendidas aos camponeses. Isso permitiu o país a aumentar sua produção e tornar-se um exportador de grãos. Com as medidas, também houve um crescimento populacional que acabou aprofundando os problemas sociais na Rússia. Com mais pessoas morando no país, o desemprego cresceu e a produção agrícola insuficiente para alimentar a população gerou fome e revoltas.
Buscando contornar a situação, o czar passou a estimular a industrialização, financiada por investimentos estrangeiros. Com a instalação de indústrias na Rússia, cresceu a migração no país. Tanto estrangeiros quanto pessoas de outras regiões russas mudaram-se para as novas cidades industriais, como Moscou e Petrogrado, em busca de emprego. Assim, nas últimas décadas do século XIX o Império Russo finalmente se modernizou. Contudo, o absolutismo e as precárias condições de vida persistiram no campo e na cidade, onde os operários recebiam salários muito baixos.
A política antes da Revolução Russa
Como a industrialização foi feita com capital inglês e francês, majoritariamente, naquele momento a Rússia não viu surgir uma burguesia local que pudesse alterar a dinâmica política do país. Em contrapartida, os operários – que ainda formavam um grupo pequeno – passaram a se organizar cada vez mais. Os operários, que recebiam influência de ideias vindas da Europa Ocidental e mantinham contato com os camponeses, formaram grupos de oposição ao czarismo. Mesmo os partidos políticos sendo proibidos, vários existiam clandestinamente. O Partido Operário Social-Democrata Russo (POSDR), inspirado nos ideais marxistas e liderado por Plekhanov e Lenin, era o mais famoso deles.
As divergências ideológicas dentro do partido fizeram surgir dois grupos essenciais na Revolução Russa:
- Mencheviques: palavra russa para “minoria” do POSDR, liderados por Plekhanov, acreditava que era possível chegar ao poder de maneira pacífica, como por meio de eleições. Apesar de defender a implantação do socialismo na Rússia, os mencheviques acreditavam que a transição para esse tipo de governo deveria ser gradual e feita por reformas políticas e econômicas.
- Bolcheviques: a “maioria”, os bolcheviques eram liderados por Lenin e defendiam a necessidade de uma revolução armada para tirar o czar do poder. Os bolcheviques também pretendiam instalar o socialismo no país, mas de maneira imediata.
Entendeu as divergências entre os dois grupos? Guarde essa informação porque mais a frente ela será necessária!
Leia mais: o que é social democracia?
Domingo sangrento
Em 1904, a Rússia entrou em conflito com o Japão pelos territórios da China e da Manchúria. Em 1905, a Guerra Russo-Japonesa acabava com a derrota russa e a oposição ao czar ganhou força. Descontente com a desorganização da economia gerada pelo conflito e humilhados pela derrota, o povo iniciou a Revolução de 1905. O movimento não tinha liderança ou objetivos claros, mas um de seus episódios marcou a história do país: o Domingo Sangrento.
Nesse dia, um protesto pacífico organizado pelo padre Gregori Gapone, que tinha como finalidade entregar um abaixo assinado com uma série de exigências ao czar, foi violentamente repreendido. O czar Nicolau II ordenou sua guarda, que abriu fogo contra os manifestantes e deixou centenas de mortos.
A tragédia fortaleceu a oposição de vários setores da sociedade ao czar. Operários, camponeses e soldados formaram conselhos chamados de sovietes, já a burguesia que nascia no país pressionou o czar para que um Parlamento fosse criado. A fim de acalmar os ânimos, o líder russo promulgou uma Constituição e convocou eleições para a Duma (Parlamento). Dessa forma, a Rússia passava a ser uma monarquia constitucional, na qual o czar continuava concentrando grande parte do poder e o Parlamento tinha suas ações limitadas.
Com essas medidas o czar conseguiu conter as revoltas e entre 1907 e 1914 o país viveu certa tranquilidade.
Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918)
Em 1914, após o assassinato de Francisco Ferdinando, a Áustria-Hungria declarou guerra à Sérvia. O czar Nicolau II partiu em defesa dos aliados sérvios e logo lutava com a Tríplice Entente na Primeira Guerra Mundial. Os gastos com o conflito aprofundaram a pobreza no país e prejudicaram a Rússia nos campos de batalha, pois até mesmo com falta de munição as forças russas sofriam.
Estoura a Revolução Russa
A crise socioeconômica e a insatisfação do povo foi, então, o estopim para uma série de acontecimentos que formariam a Revolução Russa.
Revolução de Fevereiro de 1917
Em fevereiro de 1917, uma marcha pelo dia das mulheres transformou-se em um protesto geral, no qual o povo invadiu o palácio e forçou o czar a renunciar. Assim, começava a Revolução Russa. Esse primeiro episódio, em específico, ficou conhecido como Revolução de Fevereiro e levou os mencheviques – grupo moderado, apoiado pela burguesia russa – ao poder.
Após o acontecimento, também conhecido como Revolução Menchevique, um governo de caráter liberal foi instalado na Rússia – a República de Duma. Na liderança do governo estava o príncipe Lvov, que manteve a Rússia na Primeira Guerra mesmo sofrendo sucessivas derrotas. Seu fracasso levou à substituição de Lvov por um socialista moderado (menchevique), Alexander Kerensky, que também não retirou a Rússia da guerra.
O governo de Kerensky adotou algumas medidas que agradaram à burguesia, como a anistia para presos políticos, redução da jornada de trabalho para oito horas e a liberdade de imprensa. Entretanto, os mencheviques não atenderam às reivindicações dos camponeses – por terras – e nem dos operários – por melhores salários.
Com os russos ainda lutando a Primeira Guerra e a pobreza agravando-se no país, a oposição bolchevique se fortaleceu. Leon Trotsky, que liderava o soviete de Petrogrado, organizou a Guarda Vermelha – composta por operários bolcheviques. Lenin, que estava exilado na Finlândia, voltou à Rússia clandestinamente e também passou a organizar os sovietes. Para Lenin, os operários deveriam tomar o poder por meio da revolução.
Com lemas simples como “pão, paz e terra”, “todo o poder aos sovietes” e promessas de reforma agrária, os bolcheviques recrutavam mais operários e camponeses para sua causa.
Revolução de Outubro de 1917
Após meses de organização, os bolcheviques – apoiados pelo povo – derrubaram a República da Duma e instalaram o Conselho dos Comissários do Povo, presidido por Lenin. Começava, assim, a nova fase da Revolução Russa.
A partir desse episódio, conhecido como Revolução de Outubro ou Revolução Bolchevique, iniciaram-se mudanças no sistema econômico russo. Terras da Igreja, nobreza e burguesia foram desapropriadas e concedidas aos camponeses, as indústrias passaram a ser controladas pelos operários e os bancos foram estatizados. Essas ações eram guiadas pela ideia marxista de que sem propriedade não existiriam exploradores (proprietários) e explorados (trabalhadores).
Em março de 1918 a Rússia finalmente assinava um tratado de paz com a Alemanha e deixava a Primeira Guerra Mundial, aceitando entregar a Polônia, Ucrânia e Finlândia aos alemães. Além disso, os bolcheviques também instituíram o unipartidarismo no país – ou seja, apenas o Partido Comunista Russo (antigo POSDR) era permitido.
Ao proibir demais partidos políticos e perseguir qualquer outro tipo de oposição, o governo mostrava-se crescentemente autoritário e afastava-se dos ideais de igualdade e liberdade.
Guerra Civil na Russia (1918 – 1921)
Claro que os mencheviques não ficaram satisfeitos em perder o comando da Rússia e se aliaram aos aristocratas (a antiga família real). Assim, apoiados pelo Reino Unido, França, Japão e Estados Unidos – países que tinham investido capital na Rússia e/ou temiam que uma onda socialista se espalhasse em direção ao Ocidente –, os mencheviques reagiram. O Exército Branco (mencheviques) então entrou em confronto direto com o Exército Vermelho (bolchevique – antiga Guarda Vermelha) e, em 1918, o país mergulhou em uma guerra civil.
Como não recebiam financiamento externo, os bolcheviques implantaram uma política econômica chamada de “comunismo de guerra” para conseguirem combater o Exército Branco. Assim, o governo confiscou toda a produção russa para destiná-la à guerra e perseguiu a oposição, considerada “anti-revolucionária”.
Em 1921 o Exército Vermelho derrotou seus inimigos e “salvou” a Revolução Russa, mas teve que pagar um alto preço: a paralisação quase completa da economia por conta do comunismo de guerra. Tentando reverter os efeitos do comunismo de guerra, Lenin estabeleceu a Nova Política Econômica (NEP), uma série de medidas capitalistas temporárias. Assim, o governo autorizou a entrada de capital estrangeiro no país para que o “terreno” fosse preparado para a instalação do socialismo.
Mesmo conferindo algumas liberdades econômicas ao povo – como permissão para criação de empresas privadas e comércio em pequena escala –, o Estado mantinha-se extremamente presente. A NEP deu resultados, alimentando o crescimento industrial e agrícola na Rússia, mas também aprofundou a desigualdade social.
Surge a União Soviética
Ao mesmo tempo em que acontecia a Revolução Russa, outro país nas proximidades revoltava-se contra seu governante: a Ucrânia. Em 1918, iniciou-se a Revolução Ucraniana, que buscava instalar um sistema anarquista no país. O Partido Comunista Russo, temendo avanços dessa revolução para dentro de seu território, anexou a Ucrânia em 1921. Nascia assim a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, ou apenas URSS.
A Revolução Russa só foi acabar em 1928, quando Stálin chegou ao poder e passou a ampliar a União Soviética, anexando mais e mais territórios. Esse regime é conhecido como stalinismo.
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