segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Narcisismos, solidão, vitrines, culturas


Por Antônio Rezende
As vitrines espalham-se por todos os lugares. Não possuem uma única forma, nem pertencem a um só tempo. O individualismo garante que Narciso corre por travessias imensas sem intervalos. Não se afastou das idas e vindas do humano. Institui e compõe suas aventuras.. Os mitos permanecem, apesar de algumas especulações intelectuais contrárias. Eles nos ajudam a tentar decifrações e aprofundamentos. Projetam-se, renovam representações, deitam-se em divãs, desenham imagens literárias. Narciso, portanto, ganha cenários especiais, voa nos trapézios dos circos sem cerimônias.
As singularidades registram sociabilidades diferentes. Somos animais coletivos, vestimos fantasias variadas, sem cores fixas. Existem as coincidências e os diálogos,. Se as distâncias fossem constantes, a cultura não teria moradia na história. A cultura movimenta significados, não dispensa as desigualdades do tempo. Há passados que antecipam ilusões. Há presentes que consagram pessimismos e juízos finais.. Daí, a complexidade e as surpresas, as gramáticas e as filosofias, as indeterminações e os imaginários..
No mundo contemporâneo, a confusão não se eliminam as buscas. A fabricação contínua de objetos, as invenções tecnológicas, as ousadias estéticas, a exaltação do luxo aumentam as dificuldades de compreender se há caminhos de fuga para evitar espetáculos efêmeros. No meio das mercadorias, as novidades fazem Narciso mudar melancolias e remontar  ideias de destino. Sobram espelhos e imagens. Cada um se ornamenta, reforça a quantidade, se sente fascinado pela lógica do monopólio. Há resistências e recusas que sedimentam tradições, aparentemente, ultrapassadas.
Numa sociedade onde o discurso da prática da acumulação prevalece é preciso fôlego. A solidão não é incomum, porém se estende na velocidade da produção. Tornou-se indispensável. É território de exílio. Os deslocamentos são constantes. Desencantam, agitam, intimidam. Individualismos são fortalecidos sem o auxílio de máscaras. Narciso não é apenas um símbolo da beleza incomunicável e egocêntrico. Ele aprisiona as memórias primordiais do suicídio, mas também se contempla nas páginas virtuais do facebook. A vaidade é extrovertida e não combina com a sabedoria, gosta de circular na ironia mais rasa.
Os valores do capitalismo exigem quebras de solidariedade, atiçamento de competições. Narciso sobrevive nas inconstâncias das hierarquias, nas felicidades programadas. A  concentração de riquezas segue o vaivém das bolsas, naturaliza comportamentos, sacraliza as mídias do sucesso, cultiva arrogâncias com sutilezas. Na construção das possibilidades históricas, o refazer dos significados é fundamental para que as rupturas ganhem ânimos. Os narcisismos também sofrem suas quedas. A uniformidade é uma isca astuciosa..
Os mitos não morrem, respondem às perguntas, envolvem-se com circunstâncias. Hoje, arrastam-se no mundo das trocas, da rapidez. Não custa revê-los nas tragédias de Sófocles. A experiência traz ensinamentos e a escuta das vozes dos outros.. Há tensões, descuidos, alertas. Quando a autonomia consegue retomar espaços é sinal que os sonhos se entrelaçam com a vida.. Os sentimentos de solidão não são exclusivos. Lembram desamparos e podem firmar incertezas.. Desprezar o outro é o perigo. Narciso gosta de redesenhar sua imagem e não foge das feridas do tempo. Somos nós que inventamos as histórias e seus malabarismos. Estamos próximos dos mitos rascunhando as travessias.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

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