quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Por outra democracia: esta não protege a maioria da população brasileira



democracia-coluna-site

Ilustração: Rodrigo Bento/The Intercept Brasil



É preciso encarar: esta democracia não é possível em um país cuja concentração de renda só perde para a do riquíssimo Catar.

FOI EM UM BECO no Alto José Bonifácio, a barriga suja de picolé, que eu ouvi a palavra mágica pela primeira vez: DE-MO-CRA-CIA.

Mil novecentos e oitenta e quatro, morava na zona norte do Recife e via no jornal das oito os cartazes Diretas Já levantados por uma multidão. Na tela, a voz grave do apresentador sugeria que algo muito sério estava acontecendo. Tentava entender aquilo enquanto ouvia Madonna cantando Like a Virgin e Cindy Lauper, Girls Just Wanna Have Fun. Eu tinha dez anos e em algum lugar sabia que aqueles dois movimentos – a mudança política e a música pop – nunca mais passariam batidos por mim.

Os dois significavam possibilidades de revolução.

Assim foi: Tancredo eleito, Tancredo morto, o bigode latino de Sarney, Plano Cruzado, Chernobyl, He-Man, She-Ra, inflação, um sapato que tinha que durar o ano todo, meu pai contando os tostões. Aí, apenas oito anos depois daqueles milhões exigindo eleições diretas, era minha vez de estar nas ruas em meio a centenas de pessoas pedindo o impeachment de Fernando Collor. A barriga suja de picolé tinha dado lugar ao rosto pintado de verde e amarelo.

DEMO-CRACIA: quase 18 anos e agora eu tateava melhor aquela palavra.


Assim foi: Collor indo embora, Itamar Franco chegando, Bill Clinton eleito nos EUA, o grunge de Seattle pipocando, Raça Negra cantando Chitãozinho e Xororó. E teve os 111 homens mortos no Carandiru.

Aquele massacre no extinto presídio de São Paulo disparou o alarme: foi uma aula sobre um Brasil brutal que eu, inocente, pura e besta, até então desconhecia. Mais de uma centena de corpos nus, costurados e expostos em caixões abertos. Vimos as imagens dezenas, centenas de vezes. Fiz uma redação sobre as execuções e entreguei para Tomás, meu então professor de Literatura. Estava certa que haveria uma reação da população contra aquele banho de sangue.

Tomás acabou de ler o texto, levantou os óculos e olhou para mim. “Você acha mesmo que as pessoas vão brigar por essas mortes, Fabiana? Nada é mais perigoso que a elite e a classe média desse país, você vai ver.”

DEMOCRACIA: quando eu finalmente deixei de tatear a palavra, descobri que ela não era para mim. Essa clareza aconteceu enquanto eu via aqueles corpos costurados nos jornais e revistas; enquanto andava pendurada em ônibus lotados saídos da periferia; enquanto meu pai, fotografando a elite recifense, ainda contava os tostões; enquanto a minha mãe, que trabalhava há tanto tempo em um hotel de luxo, se mudava para uma casa sem reboco, janelas e parte do teto.

Nem eu, nem a gente nos morros, no centro, nos conjuntos habitacionais, nos presídios ou nas palafitas que bordavam o Recife fazíamos parte, de fato, desse regime que eu tão amorosamente defendia.


Quase trinta anos depois, estou aqui, usando uma máscara manchada de água sanitária e ouvindo, perplexa, muita gente repetir que “a pandemia revelou o abismo social do Brasil”.

Em que diabos de país estas pessoas moravam, eu não sei.

Assim é: ministro da saúde entra, ministro da saúde sai, o presidente corre atrás de uma ema segurando uma caixa de cloroquina, 7 milhões de testes para Covid-19 perdem a validade, quase 180 mil mortos pelo vírus, intelectuais repetem muito sérios que “precisamos recuperar nossa democracia”.

O fato de um ínfimo bicho descontrolado ter feito com que tanta gente percebesse só agora o quanto somos profundamente, historicamente e reiteradamente desiguais diz muito sobre nossa enorme desconexão entre classes. Mais: diz sobre uma empatia precária, acalentada à base de um ou outro “compromisso social” traduzido em cesta de Natal para a diarista ou o porteiro no final do ano. Diz também sobre como assimilamos mal o sentido de democracia.

Não, nós não precisamos tentar recuperar um regime que nunca foi capaz de proteger efetivamente a maioria da população brasileira.

Esta democracia precisa ser superada.

Na real, de que regime falamos quando a renda média de mais de 60% das trabalhadoras e dos trabalhadores do país, mais de 54 milhões de pessoas, era menor que um salário mínimo lá em 2018 – e agora, com a pandemia, essa mesma renda caiu em média 20,1%, indo para R$ 893?

De que democracia falamos quando, só este ano e no Rio de Janeiro, 12 crianças – todas negras – foram assassinadas por “balas perdidas”? Aliás: onde está a democracia em balas perdidas que acham preferencialmente um corpo preto? Ou em um país de maioria negra que sustenta um dos sistemas judiciários mais caros do mundo, formado por 85% de magistrados brancos?

É possível mesmo falar de democracia para a população indígena brasileira?

Nós vamos continuar a reduzir esse regime a um sistema de voto e representação política partidária enquanto filhos de domésticas caem dos prédios de suas empregadoras?

Consenso nunca fez parte do sentido lato da democracia: seja na política institucional ou fora dela, é saudável que existam perspectivas diferentes, heterogêneas.

Não faz muito tempo, até ensaiamos, como sociedade, soletrar bem a palavra. Instituímos leis que tornam as universidades mais pretas e indígenas, entendemos que uniões homoafetivas devem ser respeitadas legalmente, que miséria não é escolha nem destino e precisa ser dirimida pelo estado. Passamos a ensinar a história e cultura da África no ensino fundamental e médio. Aumentamos a renda da população mais pobre. Esse avanço foi, por tudo o que significava, atacado. Hoje, passa por processo de desmanche.

Agora, há todo um movimento, uma estratégia, para buscarmos uma democracia mais “ativa” fingindo, por exemplo, que #somos70porcento. Mas o fato de sermos uma maioria entendendo que autoritarismo não é a melhor saída para nos gerir enquanto sociedade não significa que estamos em um mesmo barco. Nossos salários, nossos gêneros, nossos bairros, nossas raças, nossas saúdes, nossas formas de viver e morrer há muito nos dizem isso. E mesmo se todos vestirmos amarelo, essas condições não vão mudar.

Insistir nesse totem é coisa de quem de certa maneira esteve protegido por esse sistema manco – gente com plano de saúde, alimentação satisfatória, uma segurança ao menos mediana.

Nessa mesma manobra de resgatar e sustentar uma democracia que sempre foi um lençol curto para a maioria da população brasileira, há também o entendimento de que o melhor para o país é que sempre exista um grande consenso sobre seus rumos – e consenso nunca fez parte do sentido lato da democracia: seja na política institucional ou fora dela, é saudável que existam perspectivas diferentes, heterogêneas.

Não esqueçam: foi o consenso que produziu uma de nossas aberrações históricas, a Lei da Anistia (1979) que concedeu o perdão “a todos quantos […] cometeram crimes políticos ou conexos com estes”, incluindo aí o time mais repressor do estado brasileiro. Hoje, somos uma das poucas “democracias” na América Latina que celebram uma ditadura. Foi também a ideia de consenso que nos brindou com o conceito absurdo de “democracia racial”.

Com minha máscara manchada de água sanitária, eu fico sinceramente torcendo para que o recente descobrimento do abismo social do país (a distopia como cotidiano) se traduza em um novo e coletivo soletrar da palavra: DE-MO-CRA-CIA.

É preciso encarar: ela não é possível em um país cuja concentração de renda só perde para a do riquíssimo Catar. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, o PNUD, nossa parcela 1% mais rica concentra 28,3% da renda total do país. Já os 10% mais ricos do Brasil concentram 41,9%.

Ela também não é possível em um lugar que nega seu passado escravocrata, autoritário, repressor; não é possível quando uma imprensa fere a si mesma se recusando a chamar as coisas – candidatos ou presidentes da República – pelo o que elas são.

Assim vai ser: um país que não quer superar seu passado, mas que antes aprenda a entendê-lo para não repeti-lo. País onde seja possível viver o presente e desenhar um futuro. País onde “o sonho fecunda a vida e vinga a morte”.

DE-MO-CRA-CIA.

Fabiana Moraes

theintercept.com

Professor Edgar Bom Jardim - PE

‘Para que essa ansiedade, essa angústia?’, diz Pazuello ao lançar plano de vacinação da Covid-19



Foto: EVARISTO SA / AFP

FOTO: EVARISTO SA / AFP


"Nós estamos trabalhando', disse o ministro. Pazuello não deu mais detalhes do plano em coletiva com Bolsonaro.

O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello apresentou nesta quarta-feira 16 o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a Covid-19, que detalha as fases previstas até então para a campanha futura.

Alinhado com o presidente Jair Bolsonaro em um discurso de ‘união’ com governadores – também presentes – e sociedade civil, Pazuello chegou a dizer que não entendia a “ansiedade” e “angústia” pela chegada da vacina da Covid-19.

Segundo o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass), o coronavírus já matou 182.799 brasileiros e infectou outros 6,9 milhões. Os dados mais recentes indicam uma tendência de alta no número de mortes e casos nas últimas semanas.

“Senhores, vamos nos orgulhar da nossa capacidade. Ela não foi feita por mim, ela já está lá. Foram nossos antecessores que criaram o SUS [Sistema Único de Saúde] e fizeram o Plano Nacional de Imunização, então vamos levantar a cabeça. Acreditem: o povo brasileiro tem capacidade ter o maior sistema de saúde do mundo. Para que essa ansiedade, essa angústia? Nós somos a referência na América Latina e tamo [sic] trabalhando.”

Pazuello também alfinetou a imprensa ao dizer que os jornalistas deveriam “divulgar informações reais”, e quis passar um tom de tranquilidade em relação à complexa logística de distribuição do futuro imunizante.

Para ele, assim que vacinas aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária [Anvisa] forem aprovadas, a “logística é simples” e será compartilhada com a capilaridade dos estados na distribuição aos municípios.

Termo de responsabilidade

Na coletiva, Pazuello afirmou ainda que não será necessário que as pessoas assinem termo de responsabilidade para serem vacinadas.

“Autorização de uso emergencial não é uma campanha de vacinação. Ela é limitada a grupos específicos e esses grupos são voluntárias. Não é uma campanha que as pessoas vão chegar na porta do posto de vacinação e vão ter que assinar um termo de consetimento livre e esclarecido. Não será exigido termo algum nos postos de vacinação para nenhum brasileiro quando disponibilizarmos as vacinas registradas seguras e garantidas pela Anvisa”, disse.

A afirmação confronta o que o presidente Jair Bolsonaro declarou a apoiadores.

“[A vacina] não é obrigatória. Vocês vão ter que assinar o termo de responsabilidade, se quiserem tomar. A Pfizer é bem clara no contrato: ´Não nos responsabilizamos por efeito colateral’. Tem gente que quer tomar, então toma. A responsabilidade é sua. Para quem está bem fisicamente, não tem que ter muita preocupação. A preocupação é o idoso, quem tem doença”, afirmou.


Carta Capital

Professor Edgar Bom Jardim - PE

Sem emprego nem auxílio: o Brasil que enfrentará a fome na contramão da recuperação do PIB



Favela em Manaus, Amazonas

Ao mesmo tempo em que a economia brasileira dá os primeiros passos para sair do buraco, um cenário bem diferente se desenha para o ano novo dos brasileiros mais pobres.

A falta de emprego e o fim do auxílio emergencial compõem a fórmula que levará mais brasileiros a caírem em situação de extrema pobreza no começo de 2021, segundo especialistas em economia e transferência de renda.

A pobreza extrema deve atingir, em janeiro, uma taxa entre 10% e 15% da população brasileira, de acordo com projeção calculada pelo economista Daniel Duque, pesquisador do Ibre-FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), a pedido da BBC News Brasil.

Isso significa que a proporção de brasileiros vivendo na extrema pobreza (ou seja, com menos de US$ 1,90 por dia) pode dobrar em relação a 2019, quando a taxa foi de 6,5% da população — ou 13,7 milhões de pessoas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).


Para a pobreza (quem vive com menos de US$ 5,50), Duque projeta que a taxa ficará entre 25% e 30% no começo do ano que vem. Em 2019, ela foi de 24,7%, ou mais de 51 milhões de brasileiros.

"A taxa de pobreza extrema será muito alta devido a dois fatores: a população mais pobre depende basicamente de programas sociais e do mercado de trabalho, que foi muito impactado negativamente para ocupações de menor escolaridade e rendimento", diz Duque.

O economista explica que a projeção considera o fim do auxílio emergencial e pressupõe um reajuste de 15% no Bolsa Família.

O governo do presidente Jair Bolsonaro chegou a considerar a criação de um novo programa, que ganhou até nome: Renda Brasil. A expectativa era de que ele fosse uma reformulação de programas sociais e que substituísse o auxílio emergencial, criado no contexto da pandemia de covid-19 e considerado fundamental para a proteção da população mais vulnerável nesse período.

Embora batizado, esse programa não chegou a virar uma proposta de fato. E o governo também avisou que não vai prolongar o pagamento do auxílio emergencial.

Bolsonaro afirmou, em entrevista à Band na terça-feira (15/12), que não haverá prorrogação do auxílio ou a criação de um novo programa e disse que quer "tentar aumentar um pouquinho" o Bolsa Família.

O presidente defendeu que não pode haver desequilíbrio nas contas. "Eu tenho pena, tenho compaixão da população, dos mais humildes, mas se o Brasil se desequilibrar com nova prorrogação do auxílio emergencial, tudo pode ir embora."

"O legado que podemos deixar na economia para o povo é uma economia estável", disse Bolsonaro. "Quem dá emprego não sou eu. Eu só dou emprego quando crio cargos ou faço concurso público. Fora isso, é o empresariado."

Casas em Paraisópolis, com prédios ao fundo
Legenda da foto,

Populações mais pobres foram afetadas mais duramente pela crise causada pela pandemia

Sem emprego e sem movimento

Se houvesse perspectiva de um mercado de trabalho aquecido, que pudesse absorver a mão de obra dos trabalhadores mais afetados pela pandemia, o cenário não seria tão ruim. Mas não é o que se espera, como aponta Duque.

"Um dos impactos bastante previsíveis é que muitas pessoas que tinham deixado de procurar emprego devido à pandemia vão acabar voltando. Com isso, a taxa de desemprego vai aumentar, porque nem todo mundo vai encontrar emprego."

Além de o fim de 2020 não prometer as antes tão comuns contratações de fim de ano, Duque lembra que o começo de ano é tradicionalmente pior para o emprego. "A taxa de desemprego no primeiro trimestre geralmente é a mais alta do ano, o que vai se somar a esses fatores negativos", diz.

E mesmo quem ganha a vida com alguma atividade informal depende de uma economia aquecida e de trabalhadores circulando.

Antes da pandemia, Vanda Sousa, de 44 anos, trabalhou por três anos, de segunda a sábado, vendendo lanches (café, tapioca, chá, suco, bolo) no bairro Couto Fernandes, em Fortaleza.

Mãe de dois filhos que dependem dela, Vanda passou a contar com a ajuda do auxílio emergencial durante a pandemia. Conseguiu comprar comida, pagar gás e luz, além do remédio para diabetes, que "sempre está em falta no posto de saúde".

Vanda Sousa
Legenda da foto,

Com dinheiro do auxílio, Vanda conta que conseguiu comprar comida, pagar gás e luz, além do remédio para diabetes, que "sempre está em falta no posto de saúde"

Agora, sem perspectiva de receber o auxílio, está preocupada com o começo do ano porque os clientes dela são exatamente as pessoas que trabalham na região, que não é mais tão movimentada quanto antes.

"Eu estou pensando como vai ser, porque janeiro vai começar e nada de emprego. Como vendo merenda na beira de uma pista que tem sucata (oficinas e lojas de autopeças), quando fecha, eu já não vendo. E se eu cozinhar para não ter pra quem vender, aí que perco totalmente", diz. "Até então a pandemia continua aqui. E ainda tem muita coisa fechada, tá muito difícil mesmo."

'Baque muito grande'

O problema não é apenas o auxílio emergencial chegar ao fim, mas também o fato de o corte ser considerado brusco. Quem estuda programas de transferência de renda aponta que o mais indicado seria ter feito uma redução gradual no valor para facilitar a adaptação das famílias e incorporá-las a outro programa social.

A socióloga Letícia Bartholo, especialista em programas de transferência de renda, aponta que o auxílio, para muitas pessoas, "é uma questão de sobrevivência".

"Idealmente, haveria um processo de saída paulatina do auxílio — ou seja, com redução desses R$ 300 ao longo dos meses, até pra avaliar em qual tempo será a retomada econômica — e essas pessoas, conforme a renda, seriam incorporadas ao Bolsa Família ou a alguma iniciativa de transferência de renda não contributiva", diz ela.

No entanto, da forma como está, Bartholo define a situação dos brasileiros mais pobres no ano novo como "um buraco".

"O cenário para janeiro de 2021 para as pessoas mais vulneráveis é um buraco. Eu sinto muito que assim seja, mas infelizmente o Estado brasileiro não foi capaz de coordenar alguma solução."

Jair Bolsonaro ao lado de Paulo Guedes
Legenda da foto,

'Quem dá emprego não sou eu. Eu só dou emprego quando crio cargos ou faço concurso público. Fora isso, é o empresariado', disse Bolsonaro

Duque também aponta que deveria ter sido criado, durante o segundo semestre deste ano, uma expansão permanente nos programas sociais.

"Foi desperdiçado um tempo importante em que a gente poderia ter feito com que a partir de janeiro as famílias que tivessem algo que fosse minimamente compensar o fim do auxílio. Vai ser um baque muito grande. Além da questão do auxílio acabar, a transição é muito repentina", diz o economista.

"O ideal teria sido uma transição mais suave, com benefício se reduzindo ao longo do tempo. Acabou que essa não foi a opção do governo."

As primeiras parcelas do benefício foram de R$ 600. Inicialmente, o governo propôs pagar R$ 200 mensais, mas o Congresso ampliou o benefício a ser pago a trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados que cumprem determinados requisitos, como renda familiar per capita de até meio salário mínimo (R$ 522,50) ou com renda total de até três salários mínimos (R$ 3.135).

Em setembro, foi anunciada uma prorrogação do benefício, mas com redução do valor para R$ 300.

Inflação mais alta

arroz e feijão
Legenda da foto,

Aumento dos preços dos alimentos em domicílio pressiona inflação sentida pelas famílias mais pobres

A alta nos preços já vem sendo sentida pelas famílias pobres e deve continuar no início do próximo ano.

"O poder de compra de quem está recebendo auxílio caiu muito, porque ele não é reajustado e a inflação está mais forte para alimentos e bens e serviços que são mais consumidos pela classe baixa", explica Duque.

De janeiro a novembro de 2020, a inflação para as famílias de renda mais baixa foi de 4,56%, segundo o Indicador Ipea de Inflação por Faixa de Renda. No mesmo período, a alta inflacionária para as famílias mais ricas foi de 1,68%.

O principal motivo para esta diferença está no forte aumento dos preços dos alimentos em domicílio. Até setembro, a inflação para as famílias mais pobreza chegava a ser dez vezes maior que para as mais ricas.

Recuperação econômica

Ao mesmo tempo em que se desenha esse cenário para as famílias mais vulneráveis, há outros indicadores que apontam para o Brasil, de forma geral, começando a sair da crise econômica.

O IBC-Br, índice do Banco Central que é considerado uma espécie de "prévia" informal do Produto Interno Bruto (PIB), teve em outubro a sexta alta consecutiva, de 0,86% na comparação com setembro. Em relação a outubro de 2019, no entanto, houve queda de 2,61%.

Isso indica uma recuperação, mas ainda longe da situação pré-pandemia.

Depois da divulgação de um aumento de 7,7% no PIB do terceiro trimestre, o ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a dizer que a economia estava "voltando em V" — termo utilizado para indicar uma recuperação intensa após uma grande queda na atividade.

Na verdade, embora tenha mostrado um aumento em relação ao trimestre anterior — fortemente afetado pela pandemia —, o resultado ficou abaixo das expectativas dos economistas do mercado e do próprio governo.

"A economia estar melhorando não significa que estará no nível de antes da pandemia. Mas, sem dúvidas, no ano que vem, enquanto boa parte das famílias vão melhorar de situação, os mais pobres terão uma piora no começo devido ao fim do auxílio", diz Duque.

"Espera-se que chegue ao nível pré-pandemia no fim do ano que vem ou só 2022. A gente está se recuperando de um tombo muito grande."

Os industriais brasileiros esperam um cenário favorável para os próximos meses. O mais recente índice de confiança do empresário industrial, medido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), aponta que eles "seguem confiantes pelo quinto mês consecutivo, marcando a continuidade do otimismo".

Sem horizonte

Casas precárias, sem pintura, na beira de canal poluído no Rio de Janeiro
Legenda da foto,

Pandemia do coronavírus levou o governo a criar o auxílio emergencial para proteger a população mais vulnerável

O presidente da Central Única das Favelas (Cufa), Preto Zezé, diz que a falta de perspectiva é um grande problema nas atuais condições.

"O cara trabalhador, pobre, de favela, ele es tá ali acreditando que vai virar o jogo, tem perspectiva de que algo vá mudar a seu favor — ele está jogando esse jogo mesmo sendo injusto e desigual. Mas na medida em que não tenho perspectiva, horizonte, as condições ficam bem mais tensas e bem mais complicadas."

Ele aponta que não há "um projeto de tirar os pobres da recessão", enquanto se pensa em benefícios para empresas.

"Até aqui, você não teve saque, quebra-quebra, nem nada, mas a situação se agravando, meu Deus do céu, não gosto nem de pensar nesse cenário. Aí tem uma questão séria. O mundo político, as elites econômicas do país, ou elas compartilham as riquezas nesse momento ou nós vamos todos compartilhar as tragédias que a concentração dessa riqueza gera."

  • Laís Alegretti -
  • Da BBC News Brasil em Londres
Professor Edgar Bom Jardim - PE

sábado, 12 de dezembro de 2020

Teatro do Parque restaurado e modernizado para o público




A noite da sexta-feira (11) marcou o retorno do Teatro do Parque para os recifense. Unindo equipamentos de última geração com preservação e respeito à memória do projeto de 1929, a Prefeitura do Recife promoveu evento de reabertura do equipamento, com a encenação da peça Vozes do Recife, da Companhia Fiandeiros. A cerimônia foi limitada a poucos convidados, como forma de evitar aglomeração.

Neste sábado (12), a programação de estreia continua, com a exibição, às 16h, de cópia telecinada e digitalizada do filme O Canto do Mar, de 1952, do diretor Alberto Cavalcanti. A ocupação da Teatro do Parque ficará limitada a 100 pessoas, entre convidados (50) e público espontâneo (50). A distribuição dos ingressos será a partir das 15h, na bilheteria do Parque.

O espetáculo apresentado na noite de ontem para uma emocionada e saudosa plateia, convidou o espectador a passear por versos poéticos de Joaquim Cardozo, Manuel Bandeira, Carlos Pena Filho, João Cabral de Melo Neto e Ascenso Ferreira, com o texto e a direção de André Filho.

Antes do decreto do Governo do Estado, publicado esta semana com limitações a realizações de shows, a agenda do primeiro dia oficial de reabertura ao público previa concerto da Banda Sinfônica do Recife, que tem na casa secular sua sede oficial para ensaios e apresentações. O músico, professor e maestro Nenéu Liberalquino, maestro da Banda, esteve presente ao evento, assim como outros artistas e autoridades.

O presidente da Fundação de Cultura da Cidade do Recife, Diego Rocha, cumprimentou todos os presentes e fez menção especial aos antigos funcionários do Teatro do Parque, que há mais de 30 anos se dedicam à casa. Também ressaltou a presença de Fernando Aguiar, neto do comendador Bento Aguiar, que construiu com recursos próprios o teatro, em 1915.


"Essa obra não só resgata a aparência arquitetônica, do início do século passado, como também é uma verdadeira máquina do tempo. Pois estamos aqui, ambientados como em 1929, e ao mesmo tempo com equipamentos dos mais modernos". Diego Rocha também exaltou a memória do cineasta pernambucano Alberto Cavalcanti, cuja cinemateca que leva seu nome volta ao Parque, com acervos valiosos ligados à memória da cidade e do estado.

A atriz e secretária de Cultura do Recife, Leda Alves, ponderou a necessária restrição do teatro lotado, visto que o evento de abertura contou com público limitado, devido à pandemia da covid-19. Leda lembrou que é em lugares como o Teatro do Parque onde cidadãos e cidadãs estabelecem fortes ligações de afeto. "Ele renasceu para ser o lugar do encontro das pessoas", disse.  De cima do palco, onde viveu grandes emoções trabalhando como artista, ela declarou aos presentes: "Olhar daqui e ver vocês é repetir uma sensação e uma alegria que me movem até aqui".

A secretária de Cultura reverenciou ainda a memória de Manoel Albino da Silva, flautista da Banda Sinfônica do Recife, falecido recentemente e bastante querido pelos companheiros músicos.

Virtual

O Teatro do Parque também ganhou um website onde é possível ter acesso à história, notícias, programação, galeria de fotos, informações sobre a Banda Sinfônica, entre outros temas.  

Com Folha de Pernambuco
Professor Edgar Bom Jardim - PE