terça-feira, 30 de abril de 2024

'Estudantes protestam como contra Guerra do Vietnã': a crise nas universidades dos EUA por conflito em Gaza

 Manifestantes contra a guerra em Gaza na UCLA

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,Na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), o domingo de protestos foi marcado por tensão

"Trouxe meus filhos para inspirá-los", diz Shaan Sethi enquanto levanta as crianças, de 7 e 9 anos, para que possam enxergar o que está além do bloqueio da segurança.

Estamos na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA, na sigla em ingês), uma das mais prestigiosas instituições de ensino superior dos Estados Unidos.

Do outro lado da cerca dupla, vigiada por agentes e "decorada" com faixas que dizem "Palestina Livre" ou "Parem o Genocídio", cerca de duzentos estudantes acampam desde quinta-feira (25/4) para exigir que a instituição se dissocie de empresas e indivíduos que "estão se beneficiando" da operação militar israelense em Gaza.

A incursão militar começou como uma retaliação ao ataque de 7 de outubro perpetrado por militantes do Hamas, que deixou 1.200 mortos e 240 reféns, segundo o governo israelense


"Esta sempre foi uma área aberta, onde os alunos descansavam na grama ou se reuniam entre as aulas", diz Sethi, que se formou em Economia Internacional neste mesmo campus anos atrás.

Ele conta que nunca tinha visto esta área cercada e rodeada por seguranças.

"Então, quis mostrar aos meus filhos, porque é algo inédito mas também para que eles entendam o país está polarizado atualmente", acrescenta.

Os campi universitários tornaram-se o maior reflexo da tensão que a guerra no Oriente Médio gera nos Estados Unidos e da divisão cada vez mais acentuada da sociedade americana frente ao apoio do governo americano a um aliado histórico: Israel.

Protestos e tensão crescente

Os protestos nas universidades americanas devido à guerra em Gaza não são uma coisa nova.

Eles têm ocorrido, com maior ou menor intensidade, desde o ataque do Hamas e o início da ofensiva israelense no território palestino.

Acompanhados de perto por parlamentares democratas e republicanos no Capitólio, fizeram com que vários responsáveis pelos principais centros universitários dos Estados Unidos comparecessem perante o Congresso.

Em janeiro, as polêmicas decorrentes desse conflito acabaram custando à então reitora de Harvard, Claudine Gay, o seu cargo.

Mas as mobilizações ganharam outra dimensão nas últimas duas semanas, depois que a polícia invadiu a Universidade de Columbia, em Nova York, e prendeu uma centena de estudantes pró-Palestina que estavam acampados no campus






Estudante com lenço árabe cobrindo o rosto

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Legenda da foto,Protestos estudantis se espalharam pelos centros de ensino superior em todo o país

Os estudantes continuam com os protestos em Columbia, correndo o risco de serem suspensos por não terem cumprido o prazo de remoção do acampamento estabelecido pelas autoridades da universidade — às 14h locais da segunda-feira (13h pelo horário de Brasília).

E não só as manifestações não pararam em Columbia, como se espalharam por universidades de todo o país, de Yale ao Instituto de tecnologia de Massachusetts (MIT), passando por Emory, Emerson, Tufts, Brown, Stanford e a Universidade do Texas em Austin.

A costa oeste não é exceção. A Universidade do Sul da Califórnia (USC), localizada em Los Angeles e um dos mais importantes centros educacionais privados do Estado, anunciou na quinta-feira que cancelaria sua cerimônia de formatura "dados os riscos de segurança representados pelos protestos".

Confronto de manifestantes pró e anti-Israel no campus da UCLA em Los Angeles em 28 de abril de 2024

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,Confronto de manifestantes pró e anti-Israel no campus da UCLA em Los Angeles em 28 de abril de 2024

Mais a noroeste, no campus da UCLA, o dia de maior tensão ocorreu no domingo, quando manifestantes pró-palestinos se depararam com um contraprotesto promovido pelo Conselho Americano-Israelense.

A organização, fundada com a missão de "construir uma comunidade israelense-americana comprometida e unida que fortaleça a identidade israelense e judaica da próxima geração e o vínculo com o Estado de Israel" proclama em suas redes sociais que é "inaceitável que qualquer campus universitário se torne uma plataforma para atividades pró-terroristas e antiamericanas".

Cercas foram derrubadas, houve confrontos verbais, insultos, algumas escaramuças, uma mulher com ferimentos leves na cabeça.

A polícia do campus chegou por volta das 14h30 e as dezenas de pessoas reunidas foram convidadas a se dispersar.

"A UCLA tem uma longa história como local de protesto pacífico", afirmou Mary Osako, vice-presidente de Comunicações Estratégicas, num comunicado divulgado pela assessoria de imprensa da universidade. "Estamos consternados com a violência que eclodiu."

Nesta segunda-feira, só restou a segurança reforçada, uma calma tensa e o enorme telão e alto-falantes que os organizadores do contraprotesto colocaram na véspera no Dickson Plaza, num pedaço de gramado a poucos metros do acampamento estudantil cercado.

Adornada com faixas exigindo a libertação dos reféns e sublinhando o apoio a Israel, o aparato audiovisual continuava a transmitir repetidamente imagens do ataque de 7 de outubro, entrevistas com sobreviventes e mensagens de apoio de figuras da comunidade judaica.

"Queremos educar os estudantes e todos os que por aqui passam, mostrar-lhes o que o Hamas faz e o que este campus apoia quando gritam 'Intifada, intifada, revolução' ou 'Do rio ao mar'", lema que se refere à área geográfica entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo, diz um dos organizadores do contraprotesto, que afirma não ter vínculos com a universidade e pede para manter o anonimato.

Segurança no campus da UCLA em Los Angeles, 19 de abril de 2024

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Legenda da foto,Após os protestos de domingo, houve aumento da segurança no campus da UCLA

'Não me sinto bem-vindo'

"Estou desgostoso, enojado. É incrível que aqueles que se dizem ativistas a favor dos direitos humanos cantem e façam proclamações de morte e destruição”, acrescenta Alex Jacobs, que se identifica como estudante da UCLA, mas prefere não dizer de que faculdade.

Ele usa óculos escuros, boné e máscara para evitar ser reconhecido, enquanto aponta para os campistas.

"Entendo a necessidade de se manifestar, de expressar opiniões, mas como estudante judeu e pró-Israel não me sinto mais bem-vindo nesta universidade onde sempre sonhei estudar", diz Andrew Gerbs, estudante de Sociologia da UCLA, que chegou cedo para observar a situação e que, ao contrário de outros, está aberto a falar com os meios de comunicação e a deixar-se fotografar.

"Acho que posso falar por outros estudantes judeus. Isso nos gera ansiedade, nos distrai dos estudos, porque afinal isso é um centro de estudos", enfatiza, embora reconheça que as aulas continuam sendo ministradas normalmente no campus, algo que a BBC News Mundo, serviço de notícias em espanhol da BBC, também conseguiu verificar.

"Venham, venham conhecer a verdade!", grita uma mulher para vários estudantes que passam em frente à praça.

Mas já é meio-dia e os estudantes a ignoram e correm para outra parte do campus.

Lugar para ideias e debate

Acontece que para este horário, 12 horas, estavam previstas duas marchas simultâneas, convocadas pela Faculdade de Justiça na Palestina, que reúne professores e demais funcionários da universidade, e pelos Estudantes da UCLA pela Justiça na Palestina.

"Estamos com nossos alunos", diz a faixa levada por professores simpatizantes do acampamento.

Ouvem-se palavras de ordem a favor da libertação da Palestina. Outros cantos citam diretamente o primeiro-ministro israelense: "Diga-nos, Netanyahu, quantas crianças matou hoje?"

São dezenas de pessoas e alguns usam suas insígnias acadêmicas enquanto marcham pela rua Plaza Portola.

"A universidade é um lugar de ideias, de debate, e defendemos o direito dos estudantes de expressá-las, seu direito de mobilização", diz Ananya Roy, diretora fundadora do Instituto Luskin sobre Desigualdade e Democracia da UCLA e professora de Planejamento Urbano, Bem-estar Social e Geografia.

"Os estudantes protestam agora por Gaza como fizeram aqueles que protestaram pelo Vietnã", acrescenta.

Ela reconhece as diferenças, mas traça um paralelo com os protestos estudantis que, no final da década de 1960, acabaram por tomar conta da cena política nacional e são lembrados mais e mais entre aqueles que comentam a situação atual nos campi.

Alguns docentes e funcionários da  UCLA marcham sob uma faixa que diz 'Estamos com nossos estudantes' no campus universitário de Los Angeles na segunda-feira, 29 de abril de 2024

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,Na segunda-feira (29/4), ocorreram duas marchas simultâneas na UCLA, organizadas por professores e alunos

"Onde vamos protestar se não aqui? Este é o lugar ideal para fazer isso", diz um estudante que prefere não revelar seu nome, mas que atua como contato de imprensa para uma coalizão estudantil.

"O que pedimos é que a Universidade da Califórnia pare de investir fundos naqueles que lucram com o genocídio em Gaza. E vamos protestar até conseguir", enfatiza ao lado da biblioteca Powell.

Enquanto isso, do outro lado da área do acampamento, pelos corredores do Royce Hall, centenas de estudantes marcham com a mesma reivindicação, alguns com keffias (lenços árabes) amarradas no pescoço ou cobrindo a cabeça, outros com camisetas pró-Palestina, muitos com máscaras.

"Antissionismo não é o mesmo que antissemitismo", diz uma das faixas que levantam.

"A terra pela qual você mata não lhe pertence", escreveram em outro pedaço de papelão.

"O poder do povo é mais forte do que o das pessoas no poder", diz outro cartaz.

"Invista na educação, não na guerra", clama mais um.

Uma manifestante pró-Palestina segura um cartaz no campus da UCLA em Los Angeles em 29 de abril de 2024

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Legenda da foto,As mobilizações na UCLA foram majoritariamente pacíficas

Não demora muito para perceberem que também há jornalistas entre os estudantes.

"Não fale com a imprensa", diz um dos estudantes que coordena o protesto. "Não deixe que fotos sejam tiradas."

Deixo-os avançar sob os arcos do corredor de onde se avistam as barracas de acampamento multicoloridas, refaço meu caminho e sigo para o outro lado do perímetro de segurança.

Lá, lembro-me da primeira conversa da manhã, com Sethi, o pai que tentava fazer com que seus filhos entendessem o mundo dividido em que vivemos.

"Digo a eles que são como dois times", ele me disse.

"Mas aí, eles me perguntam: 'E nós, em qual estamos?'"

Ao que Sethi respondeu: "Estamos entre aqueles que apoiam a paz."

  • Leire Ventas
  • Role,Correspondente da BBC News Mundo em Los Angeles
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Inscrições para concurso público da Polícia Científica começaram nesta terça-feira (30)




O Governo de Pernambuco divulgou, no Diário Oficial do Estado do último sábado (27), o edital do concurso público da Polícia Científica de Pernambuco, com 213 vagas. O documento contendo as informações da seleção também está disponível no site do Instituto AOCP, banca organizadora do certame, no www.institutoaocp.org.br. As inscrições podem ser realizadas a partir desta terça-feira (30) e seguem até o dia 3 de junho.

Das vagas abertas neste concurso, 76 são para o cargo de agente de medicina legal, 60 para médico legista e 77 para perito criminal. As provas serão realizadas no Recife, no dia 21 de julho. 

De acordo com a secretária de Administração, Ana Maraíza, o Estado ganhará mais um reforço na segurança pública com a realização de mais um concurso. “Nossa gestão está empenhada em promover concursos que fortaleçam o Programa Juntos Pela Segurança e dessa forma trazer mais benefícios para toda a população”, afirmou. 

BANCA - A empresa responsável pela elaboração do concurso, o Instituto AOCP, é uma associação civil de caráter assistencial e educacional com atuação em concursos públicos federais, estaduais e municipais.

OUTROS CONCURSOS - Desde o início da atual gestão, em janeiro do ano passado, o Governo já anunciou concursos para 5.250 vagas para a Polícia Militar e 660 vagas para o Corpo de Bombeiros Militar. O concurso para a Polícia Civil, por sua vez, prevê 445 vagas, que podem chegar ao dobro, de acordo com aditivo ao edital publicado posteriormente.



Gerência de Comunicação da SAD
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Governo Federal proíbe grupos religiosos de tentarem converter detentos em presídio





A resolução também veda a cobrança de contribuições financeiras, como dízimos, aos presos.

O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), vinculado ao Ministério da Justiça do Governo Federal, aprovou uma resolução que visa fortalecer a liberdade religiosa nos presídios brasileiros e proíbe a cobrança de contribuições financeiras, como dízimos, aos detentos.

A norma do governo foi publicada no Diário Oficial da União nesta segunda-feira, 29 de abril.

A medida tem como objetivo criar um ambiente de respeito e tolerância entre as diferentes crenças dentro do sistema penitenciário do Brasil.

A resolução também proíbe qualquer tentativa de converter detentos a uma religião diferente da que professam ou de mudar a opinião dos presos sem religião que não adotam uma crença específica. O ato visa garantir que suas visitas tenham como objetivo oferecer assistência sócio-espiritual.

A base legal para esta resolução encontra respaldo na Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, que assegura o direito à liberdade de pensamento, consciência e religião, bem como na Constituição Federal do Brasil, que proíbe qualquer aliança entre o Estado e instituições religiosas.

Por: Everthon Santos
Portal de Prefeitura



Professor Edgar Bom Jardim - PE

sábado, 13 de abril de 2024

A origem da rivalidade entre Israel e Irã e como ela está sendo intensificada pela guerra em Gaza




Partidários do Hezbolá protestam contra Israel em Beirute

CRÉDITO,MANU BRABO / GETTY

Legenda da foto,A inimizade entre o Irã e Israel tornou-se uma das principais fontes de instabilidade no Oriente Médio

*Esta reportagem foi publicada originalmente em 8/4 e atualizada em 13/4

A escalada bélica no Oriente Médio teve um grande desenvolvimento com um ataque de drones lançado pelo Irã contra Israel.

Forças de Defesa de Israel anunciaram no sábado (13/4) que o ataque estava em curso e disseram que as forças israelenses estavam em alerta máximo e “monitorando todos os alvos”.

O ataque era esperado - o Irã havia prometido uma resposta após vários de seus altos comandantes militares morrerem em um ataque contra o consulado do país em Damasco, atribuído a Israel




Além disso, o Exército suspendeu todas as dispensas de soldados, e os serviços de GPS foram bloqueados para atrapalhar a navegação de drones e mísseis intrusos.

Esse é o mais recente episódio de uma inimizade já antiga.

Israel e Irã estão há anos em uma rivalidade sangrenta que virou uma das principais fontes de instabilidade no Oriente Médio e cuja intensidade varia de acordo com o momento geopolítico.

Para Teerã, Israel não tem o direito de existir. Os governantes iranianos consideram o país o "pequeno Satanás", o aliado no Oriente Médio dos Estados Unidos, que chamam de "grande Satanás", e querem que ambos desapareçam da região.

Já Israel acusa o Irã de financiar grupos "terroristas" e de realizar ataques contra seus interesses, movidos pelo antissemitismo dos aiatolás.

A rivalidade entre os "arqui-inimigos" já fez um grande número de mortos, muitas vezes em ações secretas em que nenhum dos governos admite sua responsabilidade.

E a guerra em Gaza só fez as coisas piorarem.

Soldados e homens armados, montam guarda junto a um edifício de Teerã com um pôster de Khomeini colado no fundo

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,O triunfo da Revolução Islâmica de 1979 no Irã marcou o início da rejeição iraniana a Israel

Como começou a rivalidade entre Israel e Irã

As relações entre Israel e o Irã foram bastante cordiais até 1979, quando a chamada Revolução Islâmica dos aiatolás conquistou o poder em Teerã.

E embora tenha se oposto ao plano de fatiamento da Palestina que resultou na criação do Estado de Israel em 1948, o Irã foi o segundo país islâmico a reconhecer Israel, depois do Egito.

O Irã era uma monarquia na qual reinavam os xás da dinastia Pahlavi e um dos principais aliados dos Estados Unidos no Oriente Médio. Assim, o fundador de Israel e seu primeiro chefe de governo, David Ben-Gurion, procurou e conseguiu a amizade iraniana como forma de combater a rejeição do novo Estado judeu de seus vizinhos árabes.

Mas a Revolução de Ruhollah Khomeini, em 1979, derrubou o xá e impôs uma república islâmica que se apresentava como defensora dos oprimidos e tinha como principais marcas a rejeição ao "imperialismo" americano e a Israel.

Ruhollah Khomeini cumprimenta a multidão em Teerã

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Legenda da foto,Khomeini e outros líderes da Revolução Islâmica simpatizavam com a causa dos palestinos contra Israel

O novo regime dos aiatolás rompeu as relações com Israel, deixou de reconhecer a validade do passaporte de seus cidadãos e tomou posse da embaixada israelense em Teerã para cedê-la à Organização para a Libertação da Palestina (OLP), que então liderava a luta por um Estado palestino, contra o governo israelense.

Alí Vaez, diretor do Programa para o Irã do International Crisis Group, um centro de análise, disse à BBC Mundo que "a aversão a Israel foi um pilar do novo regime iraniano porque muitos de seus líderes haviam treinado e participado de ações de guerrilha com palestinos em lugares como o Líbano e tinham uma grande simpatia por eles".

Mas além disso, acredita Vaez, "o novo Irã queria se projetar como uma potência pan-islâmica e levantou a causa palestina contra Israel, que os países muçulmanos árabes tinham abandonado".

Assim, Khomeini começou a reivindicar a causa palestina como sua própria. E grandes manifestações pró-Palestina, com apoio oficial, tornaram-se habituais em Teerã


Homens queimam bandeiras israelenses em manifestação em Teerã

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,As manifestações contra Israel tornaram-se habituais em Teerã

Vaez explica que "em Israel a hostilidade ao Irã só começou mais tarde, na década de 1990, porque antes o Iraque de Saddam Hussein era percebido como uma maior ameaça regional."

Tanto é que o governo israelense foi um dos mediadores que tornou possível o chamado Irã-Contra, o programa pelo qual os Estados Unidos desviaram armamento para o Irã, para que usassem na guerra contra o vizinho Iraque, entre 1980 e 1988.

Mas, com o tempo, Israel começou a ver no Irã um dos principais perigos para sua existência. E a rivalidade entre os dois passou das palavras para os fatos.

Uma 'guerra nas sombras'

Vaez observa que, enfrentando também a Arábia Saudita, outra grande potência regional, e consciente de que o Irã é persa e xiita em um mundo islâmico maioritariamente sunita e árabe, "o regime iraniano percebeu seu isolamento e começou a desenvolver uma estratégia destinada a evitar que seus inimigos pudessem um dia atacá-lo em seu próprio território".

Assim, proliferou uma rede de organizações alinhadas a Teerã que realizavam ações armadas favoráveis aos seus interesses. A libanesa Hezbollah, listada como terrorista pelos Estados Unidos e pela União Europeia, é a mais proeminente. Hoje, o chamado "Eixo da Resistência" iraniano se estende pelo Líbano, Síria, Iraque e Iêmen.

Israel não ficou de braços cruzados e trocou com o Irã e seus aliados ataques e outras ações hostis, muitas vezes em outros países, onde financia e apoia grupos armados que combatem os pró-iranianos.

O estado da relação entre o Irã e Israel foi descrito como uma "guerra nas sombras", na qual ambos já realizaram ataques mútuos sem que, em muitos casos, nenhum dos governos tenha admitido oficialmente sua participação.

Em 1992 o grupo Jihad Islâmico, próximo ao Irã, atacou a embaixada israelense em Buenos Aires, provocando 29 mortes. Pouco antes, o líder do Hezbollah, Abbas al-Musawi, tinha sido assassinado, em um atentado amplamente atribuído aos serviços de inteligência de Israel.

Para Israel, sempre foi uma obsessão minar o programa nuclear iraniano e evitar que chegue o dia em que os aiatolás tenham armas nucleares.

Em Israel não se acredita que o programa nuclear iraniano tenha apenas fins civis. E é amplamente aceito que foram os serviços israelenses que, em colaboração com os Estados Unidos, desenvolveram o vírus de computador Stuxnet, que causou sérios danos às instalações nucleares iranianas na primeira década de 2000.

Um guarda de segurança monta guarda ao lado do reator nuclear de Bushehr, no Irã.

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,Um segurança monta guarda ao lado do reator nuclear de Bushehr, no Irã.

Teerã também denunciou a inteligência israelense como responsável pelos atentados contra alguns dos principais cientistas encarregados de seu programa nuclear.

O caso mais conhecedo foi o assassinato em 2020 de Mohsen Fakhrizadeh, considerado o principal responsável pelo programa. Mas o governo israelense nunca aceitou seu envolvimento nas mortes de cientistas iranianos.

Israel, juntamente com seus aliados ocidentais, acusam o Irã de estar por trás dos ataques com drones e foguetes sofridos por seu território, bem como de ter realizado vários ataques cibernéticos.

Outro motivo de confronto foi a guerra civil desencadeada na Síria a partir de 2011. A inteligência ocidental aponta que o Irã enviou dinheiro, armas e instrutores para apoiar as forças do presidente Bashar Al-Assad contra os insurgentes que tentavam derrubá-lo. Isso disparou o alerta em Israel, que acredita que a vizinha Síria é uma das principais rotas por onde os iranianos enviam armamentos e equipamentos para o Hezbollah no Líbano.

De acordo com o portal de inteligência americano Stratfor, tanto Israel quanto o Irã realizaram ações na Síria destinadas a dissuadir o outro de lançar um ataque em larga escala.

Em 2021, a "guerra nas sombras" chegou ao mar quando Israel apontou o Irã como responsável pelos ataques contra navios israelenses no Golfo de Omã. E o Irã, por sua vez, acusou Israel de atacar seus navios no Mar Vermelho.

Soldados iranianos ajoelhados diante do caixão do responsável pelo programa nuclear de Teerã

CRÉDITO,HAMED MALEKPOUR / GETTY

Legenda da foto,O Irã acusa Israel de ser responsável pelo assassinato do chefe de seu programa nuclear

Como estão as coisas agora

Desde os ataques de 7 de outubro de 2023 realizados pelo Hamas contra Israel, e a ofensiva militar massiva lançada pelo Exército israelense em Gaza em resposta, analistas e governos de todo o mundo expressam preocupação de que o conflito pudesse provocar uma reação em cadeia na região, e um confronto aberto e direto entre iranianos e israelenses.

Os conflitos entre forças israelenses e milicianos supostamente ligados ao Hezbollah na fronteira com o Líbano aumentaram nos últimos meses. Os choques com manifestantes palestinos nos territórios ocupados da Cisjordânia também.

Até os mais recentes desenvolvimentos, tanto Irã quanto Israel vinham evitando elevar a hostilidade e os combates em grande escala.

Um tanque israelense avança em Gaza

CRÉDITO,MENAHEM KAHANA / GETTY

Legenda da foto,A ofensiva israelense em Gaza reativou a hostilidade entre Israel e o Irã

Para Vaez, “a ironia é que ninguém quer um conflito em grande escala agora. Israel está há seis meses em sua devastadora guerra contra o Hamas em Gaza, que afetou muito negativamente sua reputação no cenário internacional e o deixou mais isolado do que nunca. Com essa missão ainda por concluir, ela teria que encarar o Irã, que é um ator estatal e, portanto, muito mais poderoso do que o Hamas".

"O Irã, por sua vez, tem muitos problemas econômicos e seu governo sofre uma crise de legitimidade interna", depois de meses de protestos liderados por mulheres, fartas de restrições religiosas.

Assim, o país também não está nas melhores condições para se colocar contra uma potência militar como Israel, que conta com o apoio dos EUA em caso de guerra declarada.

Os escombros do consulado iraniano em Damasco

CRÉDITO,AMMAR GHALI / GETTY

Legenda da foto,O ataque ao seu consulado em Damasco, no qual vários generais morreram, enfureceu o Irã

Mas o ataque à sua sede diplomática em Damasco, que deixou 13 mortos, incluindo alguns dos mais proeminentes altos comandantes iranianos, como o general da Guarda Revolucionária Mohammad Reza Zahedi e seu adjunto, Hadi Hajriahimi, bateu forte em Teerã.

O Ministério das Relações Exteriores iraniano prometeu "um castigo ao agressor" e seu embaixador na Síria, Hossein Akbari, anunciou que a resposta seria "decisiva".

Com o ataque lançado por Teerã contra o território Israelense, a situação se agrava e está evoluindo rapidamente, com os governos de todo o Médio Oriente reagindo às notícias dos ataques de drones.

A Jordânia, o Líbano e o Iraque, três países localizados na provável trajetória de voo destes drones, fecharam o seu espaço aéreo.

O Irã e Israel também fecharam os seus para todos, exceto aeronaves militares



BBC BRASIL  
  • Guillermo D. Olmo
  • Role,BBC News Mundo

Professor Edgar Bom Jardim - PE