sábado, 4 de março de 2023

É preciso investir no combate à crise climática como fazemos na guerra da Ucrânia, diz John Kerry





John Kerry de perfil em reunião, com feição séria

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No Brasil, Kerry reconheceu que tem sido mais fácil convencer o Congresso americano a liberar recursos para a guerra na Ucrânia do que para enfrentar a crise climática

"Precisamos colocar maiores somas de dinheiro na crise climática, assim como colocamos dinheiro na crise da Ucrânia".

A afirmação é do enviado especial dos Estados Unidos para o clima, John Kerry, em entrevista exclusiva à BBC News Brasil, na terça-feira (28/2).

Ele reconheceu que tem sido mais fácil convencer o Congresso americano a liberar recursos para a guerra na Ucrânia do que para enfrentar a crise climática, que ele próprio classifica como uma "ameaça existencial" à humanidade.

A admissão de dificuldades para obter mais recursos para o combate às mudanças climáticas resume, de certa maneira, a tônica de sua passagem por Brasília, nesta semana


Kerry chegou ao Brasil no domingo (26), reuniu-se com o vice-presidente, Geraldo Alckmin, e com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva

Sua passagem pelo Brasil foi marcada pela expectativa de um possível anúncio de mais recursos para o Fundo Amazônia, que financia medidas para o combate ao desmatamento.

No início do mês, os americanos se comprometeram a fazer uma doação ao Fundo Amazônia. Oficialmente, o valor da doação ainda não foi divulgado, mas fontes do governo americano disseram à BBC News Brasil que o montante chegaria a US$ 50 milhões.

Apesar de ser a primeira contribuição dos Estados Unidos ao fundo, o valor é considerado baixo por ambientalistas que levam em conta o tamanho da economia americana e o fato de o país ser o segundo maior emissor de gases do efeito estufa, atrás da China.

A expectativa por mais dinheiro, porém, não se concretizou e um segundo anúncio de recursos não veio.

Kerry disse que a liberação de mais dinheiro depende da aprovação pelo Congresso americano. O cenário é ainda mais difícil agora, uma vez que os democratas perderam a maioria na Câmara dos Representantes, casa legislativa que define o orçamento do governo.

A frustração em torno de uma viagem sem anúncios concretos reflete, em alguma medida, o tamanho do desafio dado pelo presidente Joe Biden a Kerry, dono de um dos currículos mais profícuos da política americana.

Kerry e Marina Silva rindo em reunião, lado a lado diante de mesa

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John Kerry e a ministra Marina Silva em reunião nesta terça-feira (28/2)

Kerry costuma comparar sua vida à do personagem Forrest Gump, interpretado no cinema por Tom Hanks e famoso por suas passagens por momentos críticos da histórica recente dos EUA e do mundo.

Ele lutou na Guerra do Vietnã e depois virou um ativista contra o conflito. Depois, abraçou a vida política e foi senador por 28 anos pelo Estado de Massachusetts.

Em 2004, disputou a Presidência dos Estados Unidos pelo Partido Democrata, mas perdeu para o republicano George W. Bush.

Em 2013, voltou à cena ao assumir o Departamento de Estado, durante o segundo mandato de Barack Obama.

Ficou no cargo até 2017. Em 2021, a convite de Joe Biden, assumiu o cargo de enviado especial para o clima, tema que está entre as prioridades do democrata.

Sua missão tem sido convencer a comunidade internacional e o público interno sobre a urgência para a adoção de medidas para combater os efeitos do aquecimento global. Até agora, porém, sua atuação divide opiniões.

Apesar de tentar convencer países e empresas a aplicarem dinheiro em projetos que diminuam as emissões de gases do efeito estufa, Kerry tem precisado lidar com as dificuldades domésticas em conseguir os recursos prometidos por seu chefe, o presidente Biden.

Leia, a seguir, a entrevista de Kerry à BBC News Brasil.

BBC News Brasil - Em 2020, durante a corrida presidencial, o então candidato Joe Biden prometeu US$ 20 bilhões para países em desenvolvimento como o Brasil para reduzir a velocidade de destruição da região amazônica. Alguns analistas, no entanto, têm dito que este governo tem prometido muito e entregado pouco. Por que o seu governo se comprometeu a doar apenas US$ 50 milhões para o Fundo Amazônia até agora?

John Kerry - Os US$ 50 milhões que o presidente (Biden) anunciou quando a visita ocorreu em Washington foram simplesmente um adiantamento dos fundos disponíveis. O presidente queria dizer: "Estou falando sério sobre estar envolvido no Fundo Amazônia".

Mas, obviamente, entendemos muito bem que o presidente Biden entende que são necessários bilhões de dólares para poder fazer esse trabalho. Quando ele concorreu à Presidência, deixou claro que esperava poder conseguir US$ 20 bilhões ou algo assim para fazer isso.

Em nosso sistema de governo, como aqui no Brasil, é preciso ser capaz de obter a aprovação do Congresso. E agora há projetos (sobre o assunto) no Congresso.

Dois senadores, um republicano e outro democrata, propuseram US$ 4 bilhões. Na Câmara, houve uma proposta de US$ 9 bilhões. E isso terá que passar pelo processo legislativo. É uma luta e não há certeza de aprovação.

Então, o presidente (Biden) também está empenhado em reformar os bancos de desenvolvimento multilaterais para que possamos obter mais dinheiro dessa fonte. Ele também me pediu para ajudar a organizar com entidades filantrópicas, o setor privado e o mercado voluntário de carbono para que tenhamos a capacidade de conseguir mais dinheiro.

Entendemos muito bem que é crucial ser capaz de levantar fundos, obter o dinheiro. É assim que ajudaremos o Brasil. É uma das formas. Não é o único caminho.

Faremos transferência de tecnologia. Trabalharemos na assistência. Também vamos procurar maneiras pelas quais possamos cooperar na aplicação da lei, nos esforços para reduzir a atividade criminosa que vem impactando a Amazônia.

Ninguém deveria olhar para isso e dizer: "Oh! Os Estados Unidos estão limitados a uma contribuição de US$ 50 milhões de dólares". Nosso presidente pretende lutar totalmente pelo dinheiro necessário para poder realizar essa tarefa.

BBC News Brasil - Mas existe um plano para os Estados Unidos doarem mais dinheiro para o Brasil ou para o Fundo Amazônia em um futuro próximo?

Kerry - Sim. Vamos juntar o dinheiro que achamos necessário e acertamos com o Brasil. Não estamos fazendo isso unilateralmente. Esse é o conjunto de escolhas do Brasil. Esta é a floresta do Brasil. Essa é uma decisão do Brasil. Mas vamos trabalhar o mais próximo possível do Brasil e vamos brigar pelo dinheiro que acharmos necessário para tentar fazer isso.

E, obviamente, isso requer contribuições muito maiores para o Fundo Amazônia e, além do Fundo Amazônia, estamos trabalhando para trazer entidades filantrópicas e outros países e empresas para a mesa e usar o mercado para ajudar a fornecer parte do financiamento de que precisamos.

Vista aérea de floresta ao lado de área desmatada

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Área desmatada perto de Uruará, no Pará

BBC News Brasil - O senhor acabou de descrever a dificuldade política para que alguns projetos sejam aprovados nos Estados Unidos. Essa é uma dificuldade doméstica. Como os Estados Unidos querem convencer a comunidade internacional a se envolver na luta contra as mudanças climáticas se, internamente, vocês não conseguem convencer o Congresso americano a liberar esse recurso para países em desenvolvimento?

Kerry - Acabei de explicar que esta não é a única fonte de dinheiro. Os Estados Unidos e a comunidade internacional frequentemente mobilizam dinheiro e você pode mobilizar dinheiro de outras fontes. Se você não conseguir que o Congresso aprove (a liberação de recursos), você ainda tem maneiras de levantar fundos no mercado, no setor privado, na filantropia e nos bancos multilaterais de desenvolvimento.

O que é importante é que o presidente dos Estados Unidos é comprometido com essa questão que é vital não apenas para os Estados Unidos, mas para o mundo inteiro, e principalmente para o povo do Brasil. Esta é a floresta do Brasil. Este é o patrimônio do Brasil.

E se o Brasil for tomar a decisão de não deixar seu pessoal cortar toras ou cultivar em uma área específica ou ser capaz de minerar ouro ilegalmente ou qualquer outra coisa… se o Brasil se posicionar e disser "estamos preparados para proteger esta floresta, mas precisamos da sua ajuda", teremos a obrigação de entrar em ação e fazer a nossa parte.

Eu garanto a você que há muitos membros do Congresso dos Estados Unidos e muitas pessoas nos Estados Unidos totalmente preparadas para encontrar maneiras de tentar ajudar.

BBC News Brasil - Há uma grande quantidade de pessoas no Brasil que é contra a a atuação internacional para preservar a Amazônia. Eles temem algum tipo de "internacionalização da Amazônia". Como o senhor responderia a essa crítica?

Kerry - Precisamos fazer o que o povo do Brasil quer que façamos e não o que queremos fazer. Este é um importante reconhecimento da soberania do Brasil. Cabe ao Brasil decidir como eles acham que a cooperação pode ocorrer da melhor maneira. Eu vim aqui para ouvir. Não vim para dizer às pessoas o que elas têm que fazer, mas para ouvir pessoas como Marina Silva (ministra do Meio Ambiente), que trabalhou nisso por anos, que entende perfeitamente como é complicado.

E tivemos reuniões muito construtivas montando um grupo de trabalho com uma série de áreas-alvo, inclusive o desmatamento. Mas existem outros biomas que também precisam de proteção no Brasil e pretendemos trabalhar com os órgãos competentes do Brasil para ser uma das entidades cooperativas, juntamente com outros países do mundo que queiram ser apoiados.

Por que isso é importante? Porque não há como o mundo manter a elevação da temperatura da Terra em 1,5º C, que é o que precisamos fazer para evitar as piores consequências da crise climática, sem trabalharmos juntos para proteger vários ativos ao redor do mundo e da floresta tropical.

A Amazônia é um desses ativos. Mas é o Brasil que está decidindo que quer protegê-lo. Eles precisam de ajuda para fazer isso. Temos que tomar a decisão de que estamos preparados para ajudar e vamos ajudar. E é por isso que estou lutando. É por isso que o presidente Biden está lutando. E, obviamente, temos que cumprir nossa palavra.

Kerry de perfil, caminhando em corredor

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'Precisamos fazer o que o povo do Brasil quer que façamos e não o que queremos fazer', diz Kerry

BBC News Brasil - O senhor frequentemente diz que a mudança climática é uma ameaça existencial para a humanidade. Mas os números mostram que o governo dos Estados Unidos liberou aproximadamente US$ 46 bilhões para a guerra na Ucrânia, recentemente. Por outro lado, não vimos o mesmo ritmo em termos de liberação de dinheiro para o combate à mudança climática. Por que é tão aparentemente mais fácil convencer o Congresso dos Estados Unidos a liberar dinheiro para uma guerra e não para o combate às mudanças climáticas?

Kerry - Esta é uma pergunta muito boa e muito justa. Em primeiro lugar, o presidente colocou mais dinheiro nisso. Ele colocou US$ 12 bilhões na mesa para um programa de adaptação de emergência chamado Prepare. Ele colocou vários bilhões de dólares na mesa para ajudar na adaptação (às mudanças climáticas). Então, estamos fazendo mais do que apenas lidar com a Floresta Amazônica, mas é (uma ameaça) existencial.

Mas a luta na Ucrânia também. A (guerra na) Ucrânia é uma luta hoje para manter o acordo global que as pessoas fizeram após a Segunda Guerra Mundial, de que respeitaremos as fronteiras uns dos outros, de que viveremos de acordo com o direito internacional, respeitaremos o estado de direito.

E o desafio com a perda de vidas na Ucrânia é muito agudo. E assim o presidente está defendendo a democracia, defendendo o estado de direito, defendendo a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), defendendo as Nações Unidas, defendendo o direito internacional. E isso é fundamental.

A crise climática, que é uma crise, vem crescendo significativamente no último ano. E muito mais pessoas agora estão entendendo que é uma crise imediata. E também existencial para muitas pessoas. Vocês acabaram de ter enchentes em São Paulo e, por favor, aceitem nossas condolências. Mas precisamos responder muito mais rápido. Precisamos colocar maiores somas de dinheiro na crise climática, assim como colocamos dinheiro na crise da Ucrânia.

Nós podemos fazer isso. É que algumas pessoas estão optando por não fazê-lo. E o presidente está ocupado, fazendo hora extra, tentando persuadir mais pessoas no Congresso e no mundo sobre a urgência de podermos lidar com duas ou três crises ao mesmo tempo. Digo três porque também ainda temos uma pandemia e temos o potencial de outra pandemia chegar.

BBC News Brasil - O senhor reconhece que tem sido mais fácil para essa administração convencer o Congresso a liberar dinheiro para a guerra em vez de liberar dinheiro para combater as mudanças climáticas?

Kerry - Tem sido mais fácil. E eu me perguntava sobre o motivo disso. Eu e o presidente Biden, em particular, vemos a crise climática como imediata, mas nem todo mundo vê. E então eu fui ao Congresso e conversei com alguns de meus ex-colegas no Senado e na Câmara. Eu disse: "Por que vocês não veem isso? O que está acontecendo é algo imediato".

E a resposta é que muitos dos nossos colegas veem isso como algo que vai acontecer no futuro: "A gente lida com isso".

E, obviamente, nossa tarefa e a do presidente Biden, em particular, é persuadir as pessoas de que isso (o combate às mudanças climáticas) não é algo que você possa adiar. Não é algo que ainda está para acontecer. Está acontecendo agora em todo o mundo. E algumas das ameaças da crise climática são irreversíveis. Já ouvi cientistas me dizerem que podemos ter atingido cinco pontos críticos onde passamos do ponto de não-retorno.

Eles dizem que, possivelmente, o ponto de não-retorno já passou para o Mar de Bering, para os recifes de coral, para o permafrost (terrenos que se mantiveram congelados nos últimos milhares de anos), para o Ártico e a Antártida. E se isso for verdade, isso é realmente ameaçador para todos nós. Portanto, esperamos poder persuadir as pessoas da urgência de lidar com o que agora é uma crise real e presente.

[NOTA DA REDAÇÃO: o ponto de não-retorno é um conceito usado por cientistas que estudam os efeitos das mudanças climáticas. Ele significa que, em razão do aumento da temperatura do planeta já registrado, algumas regiões já sofreram danos que não poderiam ser mais revertidos e que, por isso, não teriam mais capacidade de regeneração].

  • Leandro Prazeres
  • Role,Da BBC News Brasil em Brasília

Professor Edgar Bom Jardim - PE

terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

Teresa Leitão: volta do Consea é importante para o combate à fome







O presidente Lula assinou nesta terça-feira um decreto que recriou o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. O Consea havia sido extinto em 2019, no primeiro mês do governo de Jair Bolsonaro.

 

Para a senadora Teresa Leitão (PT-PE), "a recriação do Consea é um passo importante para o combate à fome no país, pela sua representatividade social e pela sua capacidade de diálogos intersetoriais para a garantia da segurança alimentar no Brasil”.

 

A senadora lembrou ainda que “no seu discurso logo após vencer o segundo turno das eleições de 2022, Lula afirmou que o combate à fome e à miséria seria o seu compromisso número um”.

Pelo decreto, os conselheiros e a presidente do Consea, Elisabetta Recine, vão reassumir os cargos. O Conselho é um importante órgão de apoio à Presidência da República na formulação, monitoramento e avaliação de políticas públicas de segurança alimentar e nutricional.

 

Quando foi extinto pelo governo Bolsonaro, em 2019, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) se manifestou, demonstrando preocupação com a interrupção do órgão que, segundo ela, tinha um papel essencial nas políticas públicas de combate à fome.

 

Um levantamento de junho de 2022, feito pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, apontou que o Brasil tem cerca de 33,1 milhões de pessoas sem ter o que comer diariamente


Professor Edgar Bom Jardim - PE

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

Os países que garantem licença menstrual em lei





Mulher olhando para uma mesa com um modelo de anatomia pélvica feminina

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A Espanha se tornou o primeiro país ocidental a oferecer licença médica para mulheres que sofrem com fortes cólicas menstruais.

A lei, que foi aprovada por 185 votos a favor e 154 contra, tem como objetivo quebrar o tabu em relação ao tema.

"É um dia histórico para o avanço feminista", tuitou a ministra da Igualdade da Espanha, Irene Montero, que diz que a medida é um movimento para resolver um problema de saúde que foi amplamente varrido para debaixo do tapete.

A legislação permite que funcionárias que sofrem com cólica menstrual tirem o tempo que for necessário — mas, assim como nas licenças médicas remuneradas por outros motivos de saúde, é exigido um atestado médico. A duração da licença não está especificada na lei.


São poucos países ao redor do mundo que garantem legalmente alguma forma de licença menstrual para mulheres no mercado de trabalho — a maioria está na Ásia, incluindo Japão, Taiwan, Indonésia e Coreia do Sul, além da Zâmbia. A primeira legislação sobre licença menstrual remonta à União Soviética, onde foi introduzida em 1922.

Os defensores da medida dizem que é tão importante para as mulheres quanto a licença maternidade, como um reconhecimento de um processo biológico básico. Mas os críticos afirmam que reforça estereótipos negativos e pode até desencorajar alguns empregadores de contratar mulheres.

A BBC 100 Women conversou com mulheres em alguns dos países que possuem políticas relacionadas à licença menstrual, em maio do ano passado, quando a Espanha apresentou o projeto de lei, para descobrir se está funcionando.

'Só fui criticada por alguns colegas homens'

 Irine Wardhanie

CRÉDITO,IRINE WARDHANIE

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Irine Wardhanie conta que até mesmo pedir um absorvente para outras mulheres pode ser visto como um tabu na Indonésia

"Antes da minha menstruação descer, eu sinto muita dor. Fico exausta e tenho enxaqueca. Depois, quando minha menstruação desce, eu sinto muita cólica, fico enjoada e com febre. Isso geralmente dura de dois a três dias", diz Wardhanie.

"Imagina ter que pedir permissão a um homem para tirar licença menstrual."

"No começo, fiquei preocupada com o que os outros poderiam pensar, mas foi tão simples quanto enviar um e-mail para meus gerentes, e eles me apoiaram bastante", afirma.

“Na minha empresa é bem fácil, só preciso enviar um e-mail para meu supervisor no dia D e avisar quem faz a escala. Só isso."

"Só fui criticada por alguns colegas homens que argumentaram que não era justo."

Diferentemente de Irine, muitas mulheres na Indonésia não estão cientes da existência de uma lei que permite às mulheres tirar dois dias de licença remunerada quando estão menstruadas.

"Falei com outras mulheres que trabalham na área de mídia na Indonésia que não foram informadas sobre a política e, portanto, se obrigam a trabalhar sofrendo com cólica."

Mulher usando máquina de costura

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As funcionárias de fábrica na Indonésia têm direito de tirar licença menstrual, conforme previsto na Lei Trabalhista 13/2003

Os empregadores têm que fornecer até 24 dias de licença menstrual remunerada por ano na Indonésia, mas a política é mal aplicada.

"A concessão é, na prática, arbitrária. Muitos empregadores permitem apenas um dia por mês, outros nenhuma licença menstrual", informou a Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Vivi Widyawati trabalha pelos direitos das mulheres no setor de vestuário do país e diz que para as trabalhadoras de fábrica tirarem licença menstrual é ainda mais difícil do que para profissionais que atuam no varejo ou no setor de serviços.

“As mulheres que trabalham no setor informal muitas vezes não sabem sobre o direito à licença menstrual. Uma das barreiras para essas mulheres é que elas primeiro precisam obter um atestado médico”, diz Widyawati.

"Elas podem enfrentar assédio sexual ou se sentir muito constrangidas ao solicitar a licença. E tem mais: muitas empresas não querem pagar salário durante a licença menstrual."

O que é dismenorreia?

  • A maioria das mulheres que menstruam sente dor como parte do ciclo, mas algumas podem sofrer de dismenorreia grave, uma forma de dor que pode ser debilitante;
  • Geralmente consiste de fortes cólicas abdominais, que podem se espalhar para as costas e as coxas, assim como náusea, diarreia e enxaqueca;
  • Há várias causas para a dismenorreia — por exemplo, um desequilíbrio nos níveis do hormônio prostaglandina, produzido pelas células do revestimento do útero, pode fazer com que ele se contraia. Quanto mais alto for o nível, mais fortemente o útero se contrai, gerando a dor;
  • Pesquisas mostram que a dismenorreia é muito comum e pode ser forte o suficiente para interferir nas atividades diárias de até 20% das mulheres;
  • Uma pesquisa do YouGov de 2016 com mil mulheres para a BBC Radio 5 mostrou que 52% haviam tido dismenorreia que afetava sua capacidade de trabalhar, mas apenas 27% haviam dito à chefia que a cólica menstrual era a responsável.

'Ainda é tabu'

Ativistas segurando embalagens de absorvente

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A Minna No Seiri tentou introduzir a licença menstrual nas escolas japonesas sem sucesso

No Japão, a licença menstrual existe há mais de 70 anos — foi concedida como um direito industrial para mineiras e trabalhadoras de fábrica na ausência de banheiros adequados em seus locais de trabalho. Ainda assim, ativistas dizem que a adoção é atualmente baixa.

"Uma porcentagem muito pequena de mulheres tira licença menstrual no Japão", diz Ayumi Taniguchi, copresidente da Minna No Seiri, organização de ativismo menstrual no país.

De acordo com os dados mais recentes do governo, apenas 0,9% de toda a força de trabalho feminina solicitou licença menstrual de abril de 2019 a março de 2020.

“Há um estigma em torno da menstruação, as mulheres que menstruam acham difícil se abrir sobre isso, especialmente em um ambiente de trabalho dominado por homens”, explica Ayumi Taniguchi.

"E a maioria das empresas não oferece licença menstrual remunerada, o que significa que muitas mulheres apenas tiram férias remuneradas, em vez de usar o direito à licença menstrual. É quase como se não valesse a pena pedir por causa do tabu."

Mulher sentada no sofá segurando a barriga com dor

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A Coreia do Sul adotou a licença menstrual em 1953.

Em 2001, o país ratificou o artigo 73 da sua Lei de Normas Trabalhistas, que garante um dia de licença sem vencimento por mês, concedido a pedido do empregado.

Em 2021, um ex-CEO de uma companhia aérea que se recusou a permitir que funcionárias tirassem a licença menstrual, protegida pela lei trabalhista, foi obrigado por um tribunal da Coreia do Sul a pagar uma multa de US$ 1,8 mil.

Kim Min-ji trabalha para uma organização que promove a conscientização em relação à menstruação na Coreia do Sul.

"Na empresa em que eu trabalhava antes, as funcionárias apenas suportavam (a dor) ou usavam as férias anuais. Não tive escolha a não ser suportar também", diz ela.

"A Coreia do Sul é uma sociedade altamente competitiva que considera que você deve ser capaz de controlar a dor, então é esperado que você suporte (a dor). A maior barreira é a atmosfera social — é difícil falar sobre licença menstrual aqui."


Professor Edgar Bom Jardim - PE