As manifestações de rua previstas para hoje, em todo o país, preocupam o Palácio. O receio é de que os protestos sirvam para puxar uma perigosa onda de mobilização pela saída do presidente Michel Temer, como aconteceu com Dilma Rousseff, deposta em agosto. Na avaliação do governo, o Congresso contribuiu, nos últimos dias, para aumentar a tensão política, ao aprovar um pacote que desfigurou as medidas contra a corrupção.
Sem conseguir reduzir sua impopularidade e sofrendo um revés atrás do outro na economia, Temer procura escapar de eventos em locais abertos desde que assumiu o cargo, há seis meses. A “voz das ruas” também foi a justificativa usada pelo presidente, há uma semana, ao anunciar que jamais sancionaria uma proposta de anistia a caixa 2, caso a iniciativa fosse aprovada pela Câmara.
Temer também está atento ao comportamento do PSDB durante essa crise. Na quarta-feira (30), o presidente soube que o senador Aécio Neves (PSDB-MG) participou da articulação para tentar votar, a toque de caixa, o pacote aprovado pela Câmara, no qual foi embutido o crime de abuso de autoridade contra juízes, procuradores e promotores. Gesto tido como prejudicial à imagem do governo.
A manobra foi conduzida pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), mas acabou se transformando em um fiasco. Informações que chegaram ao Planalto – muitas delas vindas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) – dão conta de que Renan, hoje réu em ação penal por peculato, será o principal alvo das manifestações deste domingo.
Interlocutores de Temer apontaram que a desastrada operação do presidente do Senado provocou ainda mais repúdio da população à classe política, respingando no Planalto. O governo esperava esfriar os protestos ao anunciar posição contrária ao caixa 2 e sair das cordas com uma “agenda positiva”, mas, diante de tantos problemas, a semana serviu para elevar a temperatura da crise.
Enquanto a população, comovida, chorava pelas vítimas da tragédia...
"Eu vejo o futuro repetir o passado Eu vejo um museu de grandes novidades O tempo não para..." (Cazuza/ Arnaldo Brandão)
Professor Edgar Bom Jardim - PE
A queda do avião que levava a Chapecoense para disputar sua primeira final internacional na Colômbia também fez com que outros dois times locais perdessem jogos decisivos.
Os jogadores das equipes sub-11 e sub-12 da Chape, garotos de 10 a 12 anos, jogariam as finais de suas respectivas categorias no dia em que souberam da morte dos ídolos do time adulto.
"Sairíamos daqui ao meio-dia para fazer o primeiro jogo da final em outra cidade. Mas quando a gente recebeu a notícia, foi tudo cancelado", disse à BBC Brasil Nívia Bezerra, treinadora das categorias de base da Chapecoense.
"Eles me ligavam chorando, perguntando: 'E agora, profe? Como é que vai ficar a nossa Chape?'. Eu digo para eles que a gente é que vai lutar para reerguer a Chape. Ela não vai morrer."
Na última quarta-feira, durante a homenagem aos jogadores na Arena Condá, o grupo de meninos foi aplaudido e exaustivamente fotografado como o futuro da equipe catarinense.
Mas as fotos os mostravam cabisbaixos e desanimados.
"Apareceram as imagens dos jogadores (no telão), aí não teve como segurar. Foi difícil", disse à BBC Brasil Rodrigo Pires, de 12 anos, que pretende ser um ponta-direita tão bom quanto o ídolo Lucas Gomes.
Mais animados, eles ensaiavam sua participação no funeral dos 51 chapecoenses mortos no acidente, que acontece neste sábado na Arena Condá, quando falaram à reportagem.
"Eles choram muito, mas já querem voltar a treinar", diz a treinadora.
"Desde o acidente, não tivemos treinos. Estamos nos vendo nas cerimônias de homenagem. Mas estamos preocupados, o clube vai disponibilizar psicólogos."
'Erguer a cabeça'
O atacante Jefferson Douglas Pavão, de 12 anos, já fala como jogador de futebol experiente.
Também já adota um corte de cabelo ao estilo de atletas do Barcelona - o "segundo time" onde sonha trabalhar - que joga para o lado ao fazer fotos.
"Agora é erguer a cabeça e fazer de tudo para o time de se erguer de volta. Eu quero ser o novo Cléber Santana, gosto muito do jogo dele", diz. No ultimo campeonato sub-12, Jefferson marcou quatro gols.
Ao descrever as qualidades do jogador falecido, no entanto, ainda usa o verbo no presente.
"Ele toca bastante a bola, chama o time, chama a responsabilidade para ele e conduz o time dentro do campo."
E, ao relembrar o susto ao receber a notícia do acidente, os olhos marejam e o charme de jogador somem do rosto.
"Eu estava dormindo, aí minha mãe me acordou e falou que o avião da Chapecoense tinha caído. Eu chorei muito em casa, fui para o colégio e chorei lá também. Vi os meus amigos chorando, não aguentei e chorei junto."
Geração Chape
Luiz Felipe Hubner, de 10 anos, se emociona, ainda, ao relembrar o momento em que soube do acidente.
"Eu pensei que era mentira. Mas minha mãe me mostrou as fotos e eu comecei a chorar", diz, com a voz embargada.
Hubner é gaúcho e foi criado em Chapecó, mas não sonha com os clubes maiores do seu Estado natal.
Segundo Nívia Bezerra, a preferência pelo time local, que até pouco tempo sequer disputava a série A do campeonato brasileiro, é algo novo, e cada vez mais comum, na cidade.
"Os pais deles ainda torcem para Grêmio ou Inter e têm a Chapecoense como segundo time. Eles não. A geração deles é Chape."
Agora, Luiz Felipe tem mais um motivo para querer crescer no time - ocupar o lugar do goleiro Danilo.
"Os reflexos dele eram muito rápidos, né. Aquela bola do San Lorenzo…"
A "bola do San Lorenzo" também é objeto de reflexão filosófica para o zagueiro (que gostaria de ser volante) Tiago Cóser, de 12 anos.
A defesa de Danilo impediu o avanço do time argentino na Copa Sul-Americana, tornou Danilo um herói local e garantiu a ida da Chapecoense para a Colômbia.
Por isso, entre as crianças, e alguns adultos, passou de mocinha a vilã da história.
"Tem gente que fala: 'Por que o Danilo não deixou aquela bola (do San Lorenzo, na semifinal) entrar?'", diz Tiago.
"Mas quem sabia que ia acontecer isso? Ele fez o milagre dele, mas não tinha como saber." Fonte: BBC.
A queda do avião que levava a Chapecoense para a tão sonhada disputa da final da Copa Sul-Americana gerou comoção no mundo inteiro. Mas além do Brasil, um outro país em especial acolheu a dor da tragédia como se fosse dele também.
Palco do acidente aéreo que deixou 71 vítimas na terça-feira, a Colômbia mostrou solidariedade e respeito aos brasileiros com diversas homenagens ao longo da semana.
A mais impressionante delas veio justamente no dia e horário do jogo que não aconteceu.
Na quarta-feira, data da primeira partida da final da Copa Sul-Americana - que seria disputada por Atlético Nacional e Chapecoense em Medelín -, a bola não rolou no estádio Atanasio Girardot, mas as arquibancadas se encheram como se ela estivesse no centro do gramado.
Mais de 40 mil pessoas vestiram branco e, com uma vela na mão, passaram 90 minutos cantando "Vamos, Vamos Chape" ou ainda "Que escutem em todo o continente, para sempre lembraremos da campeã Chapecoense" - a música que eles próprios fizeram em homenagem ao time brasileiro
Quem esteve tanto do lado de fora - onde outras dezenas de milhares de pessoas se reuniam - como do lado de dentro relata que nunca viveu uma experiência igual.
"A tragédia nos converteu em uma só torcida, em uma só voz", disse a repórter esportiva da TV colombiana RCN e apresentadora do Notícias RCN, Melissa Martinez.
A BBC Brasil conversou com ela sobre como a tragédia com o voo da Chapecoense impactou a vida dos colombianos do outro lado da fronteira.
Confira o depoimento:
"Recebi a notícia da tragédia de uma forma muito impactante, porque quando desapareceu o avião eu já estava dormindo. Eu costumo dormir muito cedo, meu turno no trabalho começa às 4h da manhã. Quando levantei às 3h, li a notícia de que só tinham resgatado 6 pessoas com vida. A única coisa que fiz foi pegar duas camisas pretas e correr para o trabalho. Às 5h já estava no aeroporto.
Eu já havia feito uma outra cobertura forte, da explosão de uma mina na Colômbia, em uma região que se chama Sardinata. Mas naquele lugar não foi permitido às famílias se aproximarem, então foi de alguma forma menos dramático. Agora foi muito duro. Foi a experiência mais difícil que já tive na minha carreira.
No caso da mina, foi algo muito diferente, porque era uma mina de extração de carvão e eles entendem que podem estar expostos a esse tipo de acidente.
Mas quando alguém vem por um sonho e isso se torna algo tão traumático como foi essa tragédia, a gente começa a pensar... se o (goleiro) Danilo não tivesse tirado aquela bola (na semifinal, contra o San Lorenzo) no último minuto, a história poderia ser diferente.
Cheguei ao estádio na quarta muito cedo. Desde às 6h da manhã, e as homenagens já estavam começando. O sentimento era muito estranho, porque eu só havia ido lá para transmitir os jogos do estádio no fim de semana, como repórter de campo. Nunca havia sentido antes algo parecido.
O povo colombiano está familiarizado com desastres naturais, também sofremos muito com a violência que deixou milhares e milhares de vítimas, acidentes aéreos por conta de erros humanos e também por conta de terrorismo. Mas a Colômbia mostrou que não perdeu a sensibilidade para esse tipo de acontecimento.
Eu fiz a cobertura de centenas de jogos e viajava com a equipe. Mas nunca antes tinha estado em um estádio cobrindo um time que cantava músicas para o seu rival.
Fiquei extasiada. Assim como todos os que estavam lá vendo tudo aquilo. Porque a Colômbia sempre teve uma fama ruim por causa do narcotráfico, mas o que mostramos é que somos pessoas sensíveis. Pessoas boas, solidárias. E diante de tudo, diante da nossa história dramática e de superação, jamais perdemos a sensibilidade.
Image copyrightAFPImage caption'A tragédia nos converteu em uma só torcida, em uma só voz', disse a repórter colombiana
A percepção dos colombianos da tragédia é que ela afetou todo mundo. Você encontra taxistas na rua que dizem que não conseguem dormir à noite. As pessoas falam que 'se o goleiro não tivesse salvado aquela bola no último minuto, talvez nada disso teria acontecido'.
No meu caso, até fico pensando que, se no último minuto aquela bola tivesse entrado, nós poderíamos ter voado para a Argentina no voo com o Nacional. Com a mesma empresa, com o mesmo avião, com o mesmo piloto. E talvez nós mesmos, jornalistas, que sempre acompanhamos o Atlético Nacional, teríamos sido as vítimas. Talvez teria sido com alguns dos meus companheiros.
Mas mais uma vez o esporte mais popular do mundo faz com que a gente se dê conta de que devemos permanecer unidos. Que devemos viver em alegria e que devemos deixar de lado a mesquinharia ou esse ódio a torcidas rivais. (A tragédia) nos converteu em uma só torcida, em uma só voz. E à Colômbia, deixou um exemplo claríssimo de união, de afeto. Para o mundo, foi uma perda terrível." Fonte:BBC
No domingo 1° de novembro de 1914, às 16:30 da tarde, foram ouvidos os primeiros canhões na Baía de Coronel, no sul do Chile.
É uma guerra europeia frente à costa sul-americana.
A frota alemã, integrada por cinco cruzadores e dirigida pelo almirante Maximilian von Spee, forma uma espécie de cerco na Baía de Coronel, deixando as quatro embarcações inglesas, comandadas por Sir Christopher Cradock, fora de águas neutras.
O cruzador alemão S.M.S Scharnhorst é o primeiro a abrir fogo contra o cruzador britânico H.M.S Good Hope, que começa a queimar rapidamente.
O mesmo aconteceria em seguida com o H.M.S Monmouth, que foi alvejado por duas embarcações alemãs.
Relatos da época dão conta de que as labaredas dos navios ingleses alcançaram 60 metros, algo como um edifício de 20 andares.
Quando caiu a noite, a frota de von Spee já era tida como vencedora. As embarcações britânicas que conseguiram se salvar retornaram avariadas ao porto de Coronel. Nesse momento, três navios alemães já haviam partido vitoriosos para a cidade de Valparaíso.
A batalha de Coronel ou "do Dia de Todos os Santos", foi o acontecimento bélico mais sangrento na costa chilena por seu grande número de mortos (1.590).
O historiador naval Germán Bravo Valdivieso, autor do livro "A Primeira Guerra Mundial na costa do Chile: uma neutralidade que não foi assim", explica à BBC Mundo que esta derrota não foi "só mais uma" para os britânicos.
"Esta é a primeira derrota do Reino Unido depois de mais de um século invictos, e com a qual perderiam logo o controle do Pacífico Sul", disse à BBC Mundo.
A derrota foi um golpe duro. Nem sequer o almirante Cradock conseguiu sair vivo das águas. A Armada do Chile enviou um transporte marítimo em busca de náufragos, mas não foram encontrados sobreviventes.
Brincadeira interrompida
Uma testemunha da época, ainda que muito jovem, foi o já falecido avô de Manuel Gutiérrez González, historiador chileno, que se interessou em investigar mais sobre esse episódio.
Manuel González Espinoza tinha 7 anos quando presenciou a batalha do setor de Buen Retiro, na cidade de Coronel.
Seu pai, Manuel González Thompson, era administrador das minas de carvão de Buen Retiro e por conta disso sua casa ficava no topo de um morro com ampla vista para o mar.
As lembranças de Manuel González Espinoza começam quando brincava à tarde com seu irmão menor, Francisco.
A brincadeira foi interrompida por um chamado apressado de seu pai, que os levou à varanda e pediu que olhassem para o horizonte.
"Percebi um ruído, logo vi as labaredas no horizonte, perto da ilha Mocha, onde era possível ver o combate", contou Manuel González há exatos 18 anos ao neto Manuel Gutiérrez.
Image copyrightCORTESIA DE GERMÁN BRAVO VALDIVIESOImage captionAs chamas dos navios alcançaram 60 metros
Ainda que não exista uma localização precisa de onde a batalha ocorreu, historiadores como Germán Bravo estimam que pode ter ocorrido entre 10 e 20 milhas (entre 16 e 32 quilômetros) da costa.
"Pode ter acontecido ali pela dificuldade que os britânicos tiveram de ver os navios alemães no pôr do sol e ao se confundirem com a costa", conta Bravo à BBC Mundo.
Com essas distâncias estimadas, as labaredas das embarcações avariadas, como o H.M.S Good Hope o H.M.S Monmouth, podiam ser facilmente avistadas.
A revanche
Mas a estratégia do Almirante von Spee, somada a uma série de eventos que poderiam ser considerados de "azar", fizeram com que a vitória alemã não durasse muito tempo.
"O almirante Von Spee queria chegar à Alemanha com seus navios e poderia ter pulado as Falklands, mas quis tomá-las e instalar um governador, destruindo as instalações", conta à BBC Mundo Germán Bravo.
Nas Malvinas-Falklands, von Spee estava seguro de que seus navios eram suficientes para afundar a frota britânica, mas estava errado.
Novas embarcações britânicas haviam chegado à região: o H.M.S Invincible e o H.M.S Inflexible. Isso daria vantagem aos britânicos.
Image copyrightFELIPE ROA PAREDESImage captionA Baía de Coronel atualmente
O S.M.S Scharnhorst, o navio alemão que durante a batalha de Coronel foi o primeiro a abrir fogo, recebeu a revanche britânica.
Nesta embarcação ficaram presos o almirante Maximilian von Spee e os 795 homens que afundaram.
A batalha, desta vez no Oceano Atlântico, também resultou em milhares de mortos.
A batalha das Malvinas-Falklands deu a vitória absoluta aos britânicos e somente um navio alemão conseguiu escapar do combate: o S.M.S Dresden.
Esse navio afundaria em março de 1915 no Arquipélago de Juan Fernández, sul do Chile, pelos próprios alemães, quando se viram encurralados pela frota britânica.
Os mais de 300 tripulantes alemães sobreviventes desse barco seriam mais tarde internados por quatro anos em uma ilha do centro-sul do Chile chamada Quiriquina.
Quase neutralidade
Um tema de discussão no Chile durante a Primeira Guerra Mundial foi sua neutralidade.
"O Chile se declarou neutro, mas ajudou abertamente às forças aliadas, inclusive o Ministro Plenipotenciário Britânico tinha muitos vínculos com a Armada do Chile", assegura Germán Bravo.
"Mas o que mais podiam fazer os chilenos? Se o Chile intervisse teria que apoiar a um ou a outro e com ambas nações tinha vínculos estreitos. Por exemplo no Exército com os alemães e na Marinha com os ingleses", acrescenta.
Mas não apenas a neutralidade foi questionada. Os chilenos e os britânicos que viviam no Chile se mostravam muito preocupados com a guerra que presenciavam em suas próprias costas.
"Em 1914 meu avô era um menino, mas depois da batalha, já adolescente, soube que as pessoas tinham muito medo que os conflitos afetassem o tráfego de carvão", conta Gutiérrez.
Durante mais de um século a mineração foi a principal atividade econômica nas regiões de Coronel e Lota, devido às vastas jazidas encontradas ali.
Rastros que falam
Image copyrightFELIPE ROA PAREDESImage captionConstrução inglesa na cidade chilena de Coronel
Mais de um século depois, na cidade de Coronel permanecem alguns rastros, sobretudo da forte influência britânica, refletida em algumas construções.
Com o auge das minas de carvão, os britânicos estiveram muito presentes na região, desde o final do século 19 até aproximadamente 1930.
O censo chileno de 1907 ressalta que entre os imigrantes de Lota e de Coronel (que representavam 10% da população), 8% eram cidadãos ingleses.
Atualmente, o bairro Maule de Coronel conserva fachadas com estilo inglês.
Também na Praça 21 de Maio, na mesma cidade, está um relógio de quatro esferas, doado pelo empresário do carvão Federico Schwager, que o trouxe da Inglaterra em novembro de 1881.
Nessa mesma praça um memorial de pedra pela Batalha de Coronel tem desenhado em relevo os dois navios afundados. Em frente ao monólito uma emotiva frase pelas vítimas diz: "seu único sepulcro é o mar". Fonte:BBC