quinta-feira, 2 de julho de 2020

A sociedade e as desconexões


Lembro-me quando adolescente de profecias maravilhosas. Afirmavam que a tecnologia mudaria radicalmente o mundo.Teríamos dias de descanso, sem preocupações com o trabalho e as guerras seriam inibidas pelas amizades internacionais. Mas não me esqueço que havia ditaduras militares e desigualdades sociais permanentes.Portanto, a desconfiança me invadia. Já avistava ambiguidades e ambições que consolidavam o capitalismo. Gostaria que as harmonias acontecessem, porém como firmar futuros?

Hoje, escuto ruídos constantes. As insatisfações são grandes e não se espera sossegos. Mascara-se o rosto com cores escuras. Parece que a ficção mais tenebrosa quer sacudir o cotidiano. Muitos desencontros, mente-se com fôlego, formam-se milícias. Há quem defenda armas e critique generosidades. Há governos genocidas e retornos aos fascismos com trevas violentas. Não sei se cabem sonhos, embora não se possa jogar a sociedade nos abismos medonhos. Somos seres cercados por instabilidades e relações tensas. Tudo embaralhado e os medos atiçam insônias e exclamações.

A memória não deixa que o passado se apague. Ela seleciona e inquieta. As épocas históricas se entrelaçam, não há como fixar fantasias progressivas e esperar a animação de máquinas companheiras. Os objetos são inventados para suprir lacunas, trazem imagens inesperadas e podem esvaziar sentimentos, Se o tempo se lança e desafia, a história celebra possibilidade de dias homogêneos e desejos que se completam.Se tempo se desfia, o desconhecido incomoda e a vida se esconde na intriga justificada.

Não adianta ter uma escrita sintonizada. Ela deve seguir curvas. O homogêneo significa fraternidade e não a morte das diferenças. Não há medidas determinadas. Por isso que surgem desertos, mares com ilhas estranhas, narrativas soltas. Pense nas viagens de Ulisses, pense numa embarcação sem cais iluminado, pense na nostalgia. A literatura se encerraria sem a despedida. Ela existe , porque as desconexões são fortes. Como não citar as tatuagens invisíveis e estimular a construção de outras estradas sem as travessuras dos poetas?

A astúcia de Ulisses
Professor Edgar Bom Jardim - PE

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