sábado, 28 de dezembro de 2019

''Este, em menos de um ano, é um governo de retrocessos'', diz Marina Silva

(foto: NELSON ALMEIDA / AFP)
Leia entrevista com Marina Silva:

Como avalia o ano e a política ambiental de 2019?

Foi um ano em que o governo se revelou por inteiro. Às vezes, você tem um governo que assume e vai se revelando aos poucos. Às vezes, avançam em umas coisas e retrocedem em outras. Este, em menos de um ano, se revela inteiramente um governo de retrocessos. E todos eles muito bem delineados. Já durante a campanha e no governo de transição, ele (Jair Bolsonaro) dizia que acabaria com o Ministério do Meio Ambiente, que ia acabar com a indústria da multa e que, no governo dele, o Ibama e o ICMBio não teriam vez. Tudo isso foi se concretizando no desmonte do Ministério do Meio Ambiente; no enfraquecimento do Ibama e do ICMBio; na tentativa de desmoralização do órgão capaz de diagnosticar os problemas de desmatamento, que é o Inpe; nas iniciativas legais encaminhadas ao Congresso Nacional, como é o caso, agora, desta medida provisória que institucionaliza o crime da grilagem; na iniciativa que encaminhou querendo aprovar mineração nas terras indígenas; no fim da Secretaria Nacional de Mudanças Climáticas; na transferência do serviço florestal para o Ministério da Agricultura; e, por último, no vergonhoso papel que desempenhou da COP 25, criando todos os empecilhos para que as negociações não avancem, se revelando claramente um governo negacionista, com uma postura mercenária, ao dizer que só vai fazer o dever de casa em relação ao desmatamento e na redução da emissão de CO2 se os países ricos pagarem para que o Brasil faça suas obrigações. Todas essas situações reforçadas pelo corte dramático do orçamento do ministério. Mais do que retrocesso, é um governo que produz uma regressão, que é pior do que um retrocesso.

Como ex-ministra do Meio Ambiente, qual conselho a senhora daria para o atual chefe da pasta, Ricardo Salles? 

Não imagino que o Ricardo Salles seja uma pessoa que ouça conselho de quem tem compromisso ambiental. Ele só ouve conselho dos ruralistas e dos negacionistas. Ele é uma pessoa com uma formação acadêmica de qualidade, uma capacidade e uma inteligência, com certeza, à altura de compreender tudo o que está em jogo, mas ele, deliberadamente, fez uma escolha de ser um ministro antiambientalista. Tanto que compra briga com todos os cientistas que estudam a questão ambiental. Quem atua na defesa do meio ambiente, ele considera inimigo, e se relaciona, quase que exclusivamente, com aqueles que têm por objetivo separar a economia da ecologia. Então, não acho que é o caso de ficar dando conselhos. O ministro demonstrou muito claramente a quem escuta.

A senhora afirma que, em menos de um ano, o ministro conseguiu desmontar o que foi feito ao longo de mais de três décadas. Como recuperar isso?

Tem uma parte que é irrecuperável. Os quase 10 mil km² de florestas que foram destruídos é irrecuperável, a quantidade de CO2 que foi emitida são irrecuperáveis também. O desmonte que vem sendo feito, eu diria que tem uma forma de barrar sua continuidade e seu aprofundamento. O Congresso Nacional pode fazer isso. O Congresso pode não permitir e não aprovar todas essas medidas de mineração em terras indígenas; pode não permitir que se tenha uma atitude contrária à demarcação de terras indígenas e à criação de unidades de conservação; pode ampliar o orçamento para fortalecer o Ibama, o ICMBio e o Inpe. A sociedade civil tem feito a sua parte, e a comunidade científica tem apresentado os diagnósticos e uma série de sugestões. Isso é uma contribuição relevante. Agora, o prejuízo de ter ficado com o Fundo Amazônia todo esse tempo parado, enquanto a floresta era derrubada e queimada, isso já é impossível de reverter. Eu espero que a pressão da sociedade continue barrando o prejuízo e crie alguma forma de se recuperar as políticas que foram abandonadas. Por exemplo, o sistema de monitoramento por satélite em tempo real já provou que é possível controlar esse desmatamento agindo antes de o leite ser totalmente derramado. Boas propostas não faltam, e elas vinham sendo implementadas e dando certo. O ministro tem esse acervo, o presidente tem esse acervo todo. A ação dos governadores também pode fazer a diferença. Os governadores podem fazer planos estaduais de controle do desmatamento.

Diante deste primeiro ano de governo Bolsonaro, para onde vai a política ambiental do Brasil em 2020?

A medir pela forma irresponsável como o governo vem se comportando diante dessas tragédias, não vejo que tenha acontecido nenhum aprendizado. Ele continua dizendo que a política ambiental brasileira está maravilhosa. Se não reconhece a realidade e a gravidade que a compõe, não vejo que tenha aprendizado algum. É uma atitude arrogante dizer que não teve problemas.

Como avalia os resultados da COP 25? Como está a imagem da política ambiental do Brasil no mundo?

Tudo que era para ter sido decidido na COP 25 foi empurrado para a próxima conferência. Praticamente não teve resultado, foi uma protelação e um adiamento das decisões. A postura das pessoas diante da imagem do Brasil é de perplexidade. Elas não compreendem como o Brasil, em tão pouco tempo, esteve em posições que vinham sendo conquistadas com muito respeito, desde a Rio-92 esteja, agora, nessa situação. As pessoas veem o Brasil, hoje, como um problema na área ambiental.
correiobraziliense.com.br/
Professor Edgar Bom Jardim - PE

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