domingo, 22 de setembro de 2019

As polêmicas de Bacurau e o andar das dissonâncias



Certos momentos trazem alguns anúncios de mudanças, apesar dos desconsolos e pessimismos.A necessidade de reavivar sonhos não é coletiva, pois existem conformismos radicais. Há quem se realize com a facilidade em adquirir bens materiais e fuja das complexidades.A história, com seus registros, exibe vitrines sempre renovadas. No entanto, as passividades se esticam numa massificação veloz. Os anúncios de mudanças servem, muitas vezes, para mascarar desconfortos e manter privilégios.A sedução maior é, para muitos, poder disfarçar as dificuldades. Cria-se um culto ao individualismo, se reforçam delírios consumistas.Faz parte das estratégias de dominação o engano ou a verdade cheia de acrobacias confusas. O campo da instabilidade não cessa de se ampliar.
Não há como se sossegar no reino ambíguo das mercadorias. Mesmo que o valor de troca prevaleça, a busca de identidades é frequente e os corpos tremem. A arte balança imaginários, retoma símbolos, investe em invenções de formas e teorias. Toca no que parecia inerte ou definido.Preste atenção aos movimentos nas telas da TV, aos modelos de comportamentos consolidados, às promessas dos políticos , à sutileza de cinismos frequentes. Desconfie. Não fique, apenas, no lugar comum do cotidiano. Há tempos explosivos no meios das calmarias. O filme Bacurau inquietou. Muitos textos foram escritos, as discordâncias se firmaram e os incômodos estão presentes. Imaginar e pensar sobre a sociedade não é simples. Não é à toa que as dissonâncias ecoam e as perguntas se refazem.As inquietações redesenham geometrias, indicam que as respirações não foram lacradas pela opressão. Há reações e análises e não, apenas, a exaltação dos festivais.
Alguns sedimentam quadros nefastos, outros marcam a permanência de alegorias antigas.Resumir tantos significados é um desafio. Meu impacto foi muito subjetivo. Não racionalizei, nem parti para rever teorias. Senti, sentei, escrevi. Há um turbilhão de ideias, rejeições e o ressuscitar de preconceitos. Há multiplicidades imensas que consagram o indefinível. No entanto, o diálogo se apresentou e a aprendizagem quebra paradigmas ou assinala que as identidades flutuam. Quando a homogeneidade se abala, a imaginação transcende a palidez da mediocridade. O filme trouxe ruídos, sem deixar de machucar paradigmas e sacudir memórias de sonhos agoniados.
É a construção da possibilidade histórica sempre armando seus trapézios. Não foge do passado, brinca com ritmos. Não há como esquecer Gláuber, redesenhar estéticas, ressuscitar desencontros, assinalar a intromissão das novas tecnologias, traçar as estradas das peripécias modernistas.Bacurau tem o mérito de não compactuar com a mesmice, de se lançar no voo das ousadias. Mobilizou, provocou conversas, numa sociedade repleta de jogos de mentiras e agitada por polarizações inesgotáveis. Os momentos da história abalam quando não desprezam as simultaneidades. Surgem as dúvidas e os caminhos cobertos de encruzilhas. Os sonhos e os pesadelos assanham companhias, avisam que o inesperado não morreu Os exibicionismos estão próximos e eles atravessam a aventura nossa de cada dia na busca de nomear os vencidos e os vencedores. Como evitar os que se miram em discursos salvacionistas e procuram se apropriar de julgamentos como donos de certezas? A história , talvez, esteja na última utopia desejada.
Paulo Rezende
Professor Edgar Bom Jardim - PE

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