quarta-feira, 14 de maio de 2014

As curtições e os sentimentos desfiados

Paulo Rezende.

Os registros dos desenganos possuem amplo espaço na sociedade contemporânea. Mas sempre fica a pergunta: explorações, desconfortos, invejas não ameaçam a continuidade da história? Quem observa a conversas dos tempos não deveria duvidar que há travessias diversas e as ambiguidades lidam com rebeldias que prometem ânimo. Há quem curta, quem se divirta e procure correr dos pessimismos. Lembro-me dos filósofos gregos menos conhecidos e censurados pela chamada história do vencedor. Leiam os sofistas, os epicuristas, os estoicos e analisem outras dimensões da convivência. Há novidades simuladas e é preciso ter mais cuidado com o que foi vivido.

Se a sociedade mostra um desenho de explorações e uma supremacia da grana dos privilegiados, existem também lugares de combate. As minorias estão articulados e se municiam para segurar o poder. Suas estratégias vestem-se de sutilezas. Não há quem não  se sinta incomodado. Falar da curtição merece olhares especiais. Não se trata de condenar as acrobacias das redes sociais. Nelas há desfiles de sentimentos e valores que atiçam a perplexidade. Acho que a multiplicidade de julgamento traz reflexões, define contrastes, embora, às vezes, jogue apenas com as vaidades.
Os espelhos, portanto, não são construídos para acolher as mesmas imagens. Eles têm suas armadilhas, gostam das máscaras, sabem mover distinções. Não pense que eles estão, sempre, pendurados em paredes. Eles se espalham pelas vitrines, avenidas, celulares… A forma como curtimos os objetos diz muitos dos compromissos de cada um. Se há uma socialização de divertimentos narcisistas, os sonhos são empurrados para territórios labirínticos. Não é proibido o riso, nem a tristeza é uma permanência fatal.
A vida é complexa, porque o inesperado assusta. Surgem mudanças não programadas. Há quedas e as pedras que estão meio dos caminhos se redefinem. Os cenários históricos avisam que somos atores. O nosso talento não é questionado. Vivemos dramas, comédias, espetáculos circenses. Reclamamos das desigualdades, porém o movimento da história não é lento, nem escravos de mesmices fundamentais. A invenção mantém a cultura acesa, mesmo que as distrações variem suas táticas e consagrem o perfume do efêmero.
Num mundo de multidões crescentes, as profecias não morrem, nem o juízo final tem data marcada. O profano busca garantir seu lugar e se mistura com o sagrado. Dê uma olhada nos cultos religiosos ou ligue sua televisão. A disputa por audiência é feroz e não deixa de apresentar os benefícios do mercado. Tudo é complexo, pois a competição responde pela astúcia do discurso. Salve-se quem puder?  A modernidade entrelaçou Agostinho com Aristóteles, Calvino com Locke.
As escritas revelam opiniões. Tenho até dúvidas se existem saberes. Será que alguém se interessa com a profundidade dos encantos da vida? Será que as curtições firmam momentos e desprezos por mais densidade nas respostas? Trago perguntas. Não sei passar sem elas, nem tampouco promovo o império das angústias perenes. Nas escritas, persistem dimensões lúdicas. Não pertencem, apenas, aos seus autores. São traços marcantes de sociabilidade e apego aos chamegos e às esfinges da história. Eles me acodem, vadio e desconfiado.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

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