quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Governo Lula e militares: como será essa relação?




Lula

CRÉDITO,REUTERS

Legenda da foto,

Lula terá o desafio de lidar com as Forças Armadas no governo que começa em janeiro

Depois de mais de uma década de episódios de intromissão indevida na política, as Forças Armadas brasileiras devem ser devolvidas à atribuição constitucional de defesa do território nacional. Para que essa redesignação institucional seja eficaz, princípios como hierarquia e disciplina precisam ser enfatizados e fortalecidos. Mais difícil é prever como se comportarão as próprias Forças - Marinha, Aeronáutica e, sobretudo, Exército - diante desse rearranjo.

Esse é, com matizes e nuanças, o diagnóstico de sete pesquisadores e especialistas em defesa ouvidos pela BBC News Brasil a respeito da relação entre o futuro governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e as Forças Armadas. As diferenças entre os entrevistados residem menos na descrição do quadro atual e mais na interpretação do contexto político e histórico que permitiu a volta da expressão "crise militar" ao noticiário quase 30 anos após o restabelecimento da democracia no país.

Nos últimos quatro anos, o protagonismo verde-oliva no governo foi sublinhado inúmeras vezes, a começar pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, que cunhou a expressão "meu Exército". O maior símbolo desse vínculo foi o aumento do número de militares da ativa e da reserva em cargos e funções civis na burocracia federal desde a chegada de Bolsonaro ao Palácio do Planalto. Em 2020, um levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU) identificou 6.157 servidores oriundos das três Forças nessa condição.

Para o presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (Abed), Eduardo Svartman, a identificação entre Bolsonaro e militares não foi casual, mas tampouco resultou de uma trama conspiratória. "Em política, todo mundo conspira sempre. É preciso entender a ascensão de Bolsonaro e de outros líderes de extrema-direita depois de 2018 nos marcos de uma crise do sistema político", afirma o professor do Programa de Pós-graduação em Estudos Estratégicos Internacionais (PPGEEI) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)



Para Svartman, os protestos de rua em junho de 2013, a reeleição por pequena margem da presidente Dilma Rousseff no ano seguinte, a contestação do resultado eleitoral pelo PSDB e a Operação Lava-Jato contribuíram para fragilizar as instituições políticas. "O fato é que os militares não estavam no centro da política antes do segundo governo Dilma", afirma.

O professor titular de Antropologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Piero Leirner identifica uma ação consciente de uma geração de altos oficiais para "tomada de parte do Estado por meio da utilização de Bolsonaro como um biombo". De acordo com o pesquisador, tiveram um papel importante nesse processo generais como Augusto Heleno, Eduardo Villas Boas e Sergio Etchegoyen. "Eles estruturaram e pavimentaram a candidatura Bolsonaro e depois estabeleceram uma central de controle", assegura.

De acordo com Leirner, "a ideia de que houve uma aliança voluntária e individual por parte de generais que volta e meia são caracterizados como 'bolsonaristas' foi uma dissimulação". Na realidade, opina, existiu uma "operação coletiva" executada "como uma cadeia de comando".



O jornalista e escritor Fabio Victor, autor de Poder camuflado: os militares e a política, do fim da ditadura à aliança com Bolsonaro (Companhia das Letras, 2022), afirma que as distintas gerações de militares têm em comum uma formação profissional que define o golpe civil-militar de 1964 como "contra-revolução democrática". Essa mentalidade é mais arraigada entre os mais antigos e atenuada entre os mais modernos, na mesma proporção do entusiasmo por Bolsonaro. O anticomunismo e o antiesquerdismo continuam sendo, porém, um fator fundamental do ideário militar, dos altos escalões à tropa. "Mesmo os mais jovens, que esperavam por uma terceira via, optaram por Bolsonaro mais uma vez ao terem de escolher entre ele e Lula", resume.

Em abril de 2022, durante encontro com sindicalistas da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Lula disse que, uma vez eleito, pretendia "desmilitarizar" o governo. "Nós vamos ter que começar o governo sabendo que nós vamos ter que tirar quase 8 mil militares que estão em cargos, pessoas que não prestaram concursos", advertiu. O professor da Universidade Católica de Pernambuco e doutor em Ciência Política Antonio Henrique Lucena Silva afirma que a principal medida de afirmação de autoridade do futuro governo na área militar - a nomeação de novos comandantes - tende a transcorrer de forma tranquila e profissional.

Não se pode dizer o mesmo, adverte o pesquisador, da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e das Polícias Militares nos Estados. "Lula deve provavelmente fazer um grande acordo no sentido de que, se alguém vai ser responsabilizado, deve ser Bolsonaro e não as Forças Armadas. Pode-se utilizar a desculpa de que ele sempre se colocava como comandante-em-chefe, 'um manda e outro obedece'", prevê.

Senhora na rua levanta cartaz com foto de militares e pedido em inglês por 'Federal intervention'

CRÉDITO,EPA

Legenda da foto,

No Rio de Janeiro, apoiadora de Jair Bolsonaro mostra cartaz em inglês pedindo 'intervenção federal'

Para Ana Carolina Assis, doutoranda em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a maior mudança sob Lula deve ficar por conta da redução do número de ministérios ocupados por militares. De acordo com a pesquisadora, o compromisso das Forças Armadas como um todo é com o Estado e não com governos específicos. "O novo governo não deverá isolar a instituição e comprometer-se a adotar diálogo, mesmo com a anunciada nomeação de um civil (José Múcio Monteiro) para o Ministério da Defesa", completa. A possibilidade de oficiais expressarem opinião política ou diferenças em relação ao governo existe, afirma Ana Carolina, mas é considerada "fora da conduta habitual da instituição".

Autora de A cruz haitiana: como a Igreja Católica usou o seu poder para esconder religiosos pedófilos no Haiti (Tagore, 2020), a jornalista Iara Lemos afirma que todos os altos oficiais com quem tem conversado preveem um período de mais disciplina e não o contrário. "Para eles, separar a política dos quartéis, como fizeram desde o fim da ditadura, é o que precisa ser feito", sintetiza. O futuro governo deve encontrar na Região Sul o ambiente mais hostil no interior das Forças Armadas, conforme a jornalista. "No Sul, nenhuma das Forças se mostra favorável às ações de Lula", explica.

O professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) Juliano Cortinhas afirma que o principal desafio de Lula é reforçar o Ministério da Defesa como órgão de execução técnica de políticas de defesa, com carreira funcional específica, ao qual as três Forças devem ser subordinadas. Ele compara o caso brasileiro aos de Reino Unido - 150 mil militares e 58 mil civis lotados na Secretaria de Defesa, equivalente ao Ministério da Defesa brasileiro - e França - 200 mil militares e 60 mil civis no Ministério da Defesa. No Brasil, há 370 mil militares na ativa em 2022, enquanto o Ministério da Defesa abriga 1,5 mil servidores civis.

"Esses dois países (Reino Unido e França) têm economias semelhantes à nossa, poderio militar muito superior e praticamente metade do efetivo militar. No mundo inteiro, a curva de pessoal militar está caindo porque o número de equipamentos está aumentando", argumenta. Segundo Cortinhas, no Brasil, Forças Armadas menores e profissionais deixariam de ser uma ameaça à democracia. "Esse processo não vai se dar do dia para a noite, mas passa pelo fortalecimento do Ministério da Defesa", sugere.

Mais uma amostra de como as relações entre os militares e o futuro governo Lula deverão ser complexas ocorreu nesta semana.

A equipe de transição do petista articulou para que os novos chefes das três forças militares fossem trocados antes da posse de Lula, no dia 1º de Janeiro de 2023, como prevê a tradição quando há mudança no chefe do Executivo.

Entretanto, até agora, apenas a troca do comando do Exército foi oficializada. Saiu o general Marco Antonio Freire Gomes e foi nomeado o general Julio Cesar Arruda. Há expectativa de que o comando da Aeronáutica também seja trocado nos próximos dias.

Na Marinha, porém, não houve acordo e o almirante Marco Sampaio Olsen, indicado pela equipe de Lula para comandar a força, só assume o comando da Marinha após a posse do petista.

Nesse sentido, um dos sinais preocupantes emitidos pela Equipe de Transição, de acordo com o professor da UnB, foi a inexistência de um Grupo de Trabalho de Defesa. No Relatório da Transição divulgado na quinta-feira, o termo "Ministério da Defesa" é citado em último lugar entre os 12 ministérios, secretarias ou órgãos com status de ministério da configuração Defesa da Democracia e Reconstrução do Estado e Soberania. Do ponto de vista operacional, o documento atribui à pasta pouco mais do que um papel auxiliar do Ministério da Justiça no combate à proliferação de armas.

"A única agenda do governo eleito em matéria de Defesa, até o momento, é restabelecer a disciplina, baixar a temperatura. O ministro anunciado tem agido nesse sentido, apesar das manifestações em frente a quartéis e das declarações de militares da ativa, que são proibidas", sintetiza Svartman. Ele situa as decisões de nomear futuros comandantes das Forças com base no critério de antiguidade e de não criar Grupo de Trabalho de Defesa na equipe de transição como parte dessa lógica de distensionamento. "Dependendo de como for equacionado, esse é também um problema para o futuro. Como será a política de defesa do novo governo? Como serão as relações civis-militares? Seria importante que isso fosse debatido publicamente", argumenta.

  • Luiz Antonio Araujo
  • De Porto Alegre para a BBC News Brasil
  • BBC

Professor Edgar Bom Jardim - PE

domingo, 27 de novembro de 2022

Consciência Negra: EREM Raimundo Honório e Ciranda Maravilhosa na comunidade quilombola de Brejinhos



Dia da Consciência Negra em Brejinhos, João Alfredo - PE - Canal Museu de Bom Jardim - YouTube

A Comunidade Quilombola de Brejinhos, município de João Alfredo - Pernambuco, é uma referência de resistência cultural afro-brasileira, no agreste setentrional pernambucano.

Com o apoio do governo municipal, por meio das secretarias de Assistência Social, Secretaria de Educação, Diretoria de Cultura, Secretaria de Saúde, Escola Heliodoro Gonçalves, Maracatu Nação Odara, Movimento Religioso e da Associação de Moradores, estão sendo desenvolvidas diversas atividades de assistência social com ações e políticas públicas afirmativas de valorização dos direitos humanos e combate ao racismo estrutural. Constam também na programação do evento, mostra cultural, apresentações artísticas, projeto educacional [Re]contando Brejinhos.

 

Estudantes da EREM Raimundo Honório, da cidade de Bom Jardim, visitaram o espaço Casarão dos Arrudas, dançaram com o grupo musical Ciranda Maravilhosa do Museu de Bom Jardim, se encantaram com a mostra cultural alusiva à memória local. O evento que comemora o mês da Consciência Negra movimenta escolas da rede municipal, rede particular e rede estadual de João Alfredo e região. Deste modo, ampliam-se em campo, as reflexões já firmadas no chão da escola sobre racismo, empoderamento da mulher negra, cultura afro e importância das cotas para o acesso às Universidades.

Estudantes da EREMRH visitam o Casarão dos Arrudas, uma viagem no tempo 


Nesta perspectiva, o Museu de Bom Jardim tem agregado extremo valor às pautas mencionadas, tendo em vista que em parceria com os músicos da cidade, cria, projeta, difunde e fortalece a tradição da ciranda   no território pernambucano, ao levar para diversas cidades o Grupo Musical Ciranda Maravilhosa, Projeto Cultural de valor reconhecido.

 

Por Edgar S. Santos / Elizabete Pedrosa.

Produção Cultural: Edgar S. Santos

Idealização: Museu de Bom Jardim Pernambuco

Imagens: Akires Sabino

Música: Canto das Três Raças - Clara Nunes

Participação Especial: Grupo Cultural Ciranda Maravilhosa

Parceria: Prefeitura Municipal de João Alfredo – PE / Museu de Bom Jardim/

EREM Raimundo Honório

Comunidade de Brejinhos

Agradecimentos Especiais: Zé Martins, Solange Chaves, Elizabete Pedrosa, Ana Maria, José Nilton, Verônica Cabral, Emiliana Arruda, Genilson Severino, Casarão dos Arrudas, Maracatu Nação Odara, Ciranda Maravilhosa: Neto, Marcelino, Douglas, Mac, Moisés, Mikael, Lucas, Felipe, Adrielle, Betânia Chaves, Fabíola Ferreira, Daniele Monteiro, Cleiton Estudantes e professores das escolas participantes, Equipe gestora da EREM Raimundo Honório, artistas e comunidades participantes deste documentário.

Este vídeo comemorativo é um documentário cultural e histórico, tem objetivos educacionais.

Realização: Museu de Bom Jardim, 25 de novembro 2022.

Professor Edgar Bom Jardim - PE

domingo, 20 de novembro de 2022

Museu de Bom Jardim promove reflexão sobre a importância da Consciência Negra




Museu de Bom Jardim: Dia da Consciência Negra - YouTube

Canal Museu de Bom Jardim


O Museu de Bom Jardim vai pra rua promover o bom debate, fazer o bom combate, refletir sobre a Consciência Negra. O Brasil foi construído pelas mãos dos povos originários, dos africanos que foram violentamente obrigados à condição de escravos. Sempre houve resistência e luta. Zumbi dos Palmares, Dandara e tantos outros enfrentaram a tirania do branco colonizador. Resistir, lutar, reconhecer quem somos é nosso ponto de partida para nossa independência. Nós, o povo negro, somos fundamentais para o Brasil e o mundo. Nós sabemos fazer, sabemos cuidar, sabemos criar, sabemos alegrar, sabemos desenvolver tecnologias, sabemos empreender, sabemos governar. Somos o berço da humanidade, fizemos pirâmides, diques, canais, estradas, templos, criamos linguagens, números, ciência, medicina, somos reais, somos fortes, somos gente de alegria e queremos nossos direitos e paz. Há em cada um de nós um Zumbi, comandante guerreiro! Comandante guerreiro na educação, saúde, cultura, ciência, ambiente, esportes, comércio e produção de riquezas. Tivemos que enfrentar a violência do cativeiro, violência da guerra, do trabalho forçado, da humilhação de ser mal tratado pelos detentores do capital, que se apossaram dos nossos corpos.Durante muito tempo, nos negaram a liberdade, a terra, a comida, o salário, o emprego, as riquezas que tanto produzimos. A Consciência Negra é pra gente saber quem somos, o que fomos , o que poderemos ser. Poder para os negros em todos os lugares. Democracia, cidadania, prosperidade e paz. Consciência Negra é pra dizer não ao racismo estrutural! Basta de preconceito e discriminação. Não podemos permitir que tirem nossos direitos, não podemos negar nossa ancestralidade, não podem apagar nossa memória, A cada dia estamos superando a máquina da destruição. Vamos celebrar a vida, vamos festejar nossa vitória com consciência. A coisa vai ficar boa porque vai ficar preta. Viva Zumbi dos Palmares, Nelson Mandela, Martin Luther King Jr, Carolina Maria de Jesus, Levino Ferreira, Luiz Gonzaga, Chico Science, Gilberto Gil, Luiz Gama, Rosa Parks, Abdias do Nascimento, Joaquim Nabuco, Paulo Paim, Jesus Cristo, Clara Nunes, Marielle Franco, Elza Soares, Marina Silva, Bezerra da Silva, Alcione, Maju, Leci, Maria, Edgar, Elizabete, Severino, Raimundo, Valdemir, Cabral, Luzia, Dona Maria, Josias, Nivaldo, Cleonice, Ruty, Josélia .... Por Museu de Bom Jardim Pernambuco. Edgar Severino dos Santos - Edgar Severino dos Santos - Produtor Cultural de PE. Professor EREM Raimundo Honório e EREM Justulino Ferreira Gomes.. Semana da Consciência Negra - Novembro, 2022.

Zumbi dos Palmares
Imagem de Zumbi dos Palmares

Professor Edgar Bom Jardim - PE

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

Líder das manifestações antidemocráticas em Pernambuco é solto após assinar termo


Manifestantes contrários ao resultados das eleições protestam em frente a quartel no Recife

Um homem que havia sido preso nessa quarta-feira (2), suspeito de liderar manifestações antidemocráticas em rodovias federais em Pernambuco, foi solto após assinar Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO).

De acordo com a Polícia Federal (PF), o homem, que não teve o nome divulgado, tem 35 anos, é natural do município de Gameleira, na Mata Sul, e reside em Toritama, no Agreste.


O suspeito foi autuado pelos crimes de incitação e desobediência, com penas que podem somar 4 anos e 15 dias de detenção.

Segundo a PF, o homem foi encaminhado à Delegacia de Polícia Federal em Caruaru, no Agreste, onde assinou um TCO e foi liberado. O investigado terá que comparecer ao juizado especial federal quando intimado.

Os bloqueios em rodovias federais em Pernambuco foram iniciados na segunda-feira (31), um dia após as eleições do segundo turno elegerem Luiz Inácio Lula da Silva o próximo presidente do Brasil. 

As manifestações antidemocráticas são contra o resultado das urnas. Os participantes - apoiadores de Jair Bolsonaro -, pedem intervenção militar e fechamento do Supremo Tribunal Federal.

De acordo com a PRF, todos os bloqueios em Pernambuco já foram encerrados após ação de agentes de segurança.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Fim de sigilo de 100 anos? As decisões de Lula que poderão afetar Bolsonaro após posse




Lula e Bolsonaro durante debate da TV Bandeirantes no dia 16 de outubro

CRÉDITO,ALEXANDRE SCHNEIDER/GETTY IMAGES

O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, já deixou claro que pretende derrubar com rapidez os sigilos de cem anos que o governo de Jair Bolsonaro adotou sobre uma série de informações, como o cartão de vacinação do presidente ou as vezes que seus filhos estiveram no Palácio do Planalto.

"Eu vou ganhar as eleições, e quando chegar dia primeiro de janeiro, eu vou pegar seu sigilo e vou botar o povo brasileiro para saber por que você esconde tanta coisa. Afinal de contas, se é bom, não precisa esconder", prometeu o petista, no debate do segundo turno da TV Bandeirantes.

Além do fim desses sigilos, outras decisões do próximo governo também poderão afetar a família Bolsonaro, como a troca de comando da Polícia Federal e a escolha do novo Procurador-Geral da República em setembro do próximo ano. O presidente enfrenta acusações de ter interferido nessas instituições para evitar investigações contra si e seus filhos.

Entenda melhor a seguir as decisões que Lula tomará e como elas podem impactar o futuro ex-presidente.


Sigilo de cem anos

A imposição de sigilo de um século ocorreu em situações que ganharam destaque durante o governo Bolsonaro, como nesses quatro casos:

- O cartão de vacinação de Bolsonaro foi colocado em sigilo, em meio à pandemia de covid-19 e no contexto de que o presidente questionava eficácia e segurança dos imunizantes;

- O governo determinou sigilo de cem anos sobre informações dos crachás de acesso ao Palácio do Planalto emitidos em nome dos filhos Carlos Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro;


- A Receita Federal impôs sigilo de cem anos no processo que descreve a ação do órgão para tentar confirmar uma tese da defesa do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, sobre a origem do caso das "rachadinhas";

- O Exército impôs sigilo de cem anos no processo que apurou a ida do general da ativa e ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello a um ato no Rio de Janeiro com o presidente Jair Bolsonaro e apoiadores do governo.

As decisões de manter o tema em sigilo são feitas em resposta a pedidos apresentados por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), geralmente sob alegação de que documentos continham informações pessoais.

Também há caso em que o governo tentou manter a informação secreta e depois mudou de ideia — como os dados sobre visitas ao Palácio do Planalto de pastores suspeitos de favorecer a liberação de verbas do Ministério da Educação para prefeitos aliados.

O sigilo de no máximo cem anos, decretado em resposta a pedidos de informação do governo, está previsto na lei que acabou com o sigilo eterno de documentos oficiais — a Lei de Acesso à Informação. Ela foi sancionada em 2011 pela então presidente Dilma Rousseff — e foi assinada junto com a lei que criou a Comissão da Verdade.

No artigo 31, a lei prevê que informações pessoais relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem tenham acesso restrito pelo prazo de até cem anos.

Também está lá um trecho que busca conter o uso dessa medida: o texto diz que a restrição de acesso de "informação relativa à vida privada, honra e imagem de pessoa não poderá ser invocada com o intuito de prejudicar processo de apuração de irregularidades em que o titular das informações estiver envolvido, bem como em ações voltadas para a recuperação de fatos históricos de maior relevância".

Vacina contra covid sendo aplicada em Volta Redonda, em 5 de novembro de 2021

CRÉDITO,ERNESTO CARRIÇO/NURPHOTO VIA GETTY IMAGES

Legenda da foto,

Em meio à pandemia de covid-19, Bolsonaro questionou a eficácia e segurança das vacinas — e seu cartão de vacinação foi colocado em sigilo

Para o advogado Bruno Morassutti, fundador da agência especializada em transparência Fiquem Sabendo, pessoas que ocupam importantes cargos públicos, como a Presidência da República, não devem ter o mesmo nível de proteção de sua privacidade que cidadãos comuns.

Dessa forma, ele avalia que o governo Lula poderá, sim, revisar com facilidade os sigilos decretados pela gestão Bolsonaro.

"O presidente poderia, diante de alguns casos concretos, determinar a abertura das informações, já que ele é o chefe do Poder Executivo e tem competência jurídica para fazer isso. Ou, eventualmente, ele pode orientar o ministro da Transparência e os membros da Comissão Mista de Reavaliação de Informações a revisar essas decisões de acordo com critérios que ele estabelecesse", afirma.

A Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) é um órgão colegiado composto por nove ministérios: Casa Civil; Justiça e Segurança Pública; Relações Exteriores; Defesa; Economia; Mulher, Família e Direitos Humanos; Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; Advocacia-Geral da União e Controladoria-Geral da União.

Além dessas ações, Morassutti também diz que o governo pode alterar o decreto que regulamenta a LAI ou enviar uma proposta de alteração da lei ao Congresso para que seja adotada uma nova redação que impeça um uso inadequado do sigilo.

"A lei, interpretada da forma correta, não permitiria esse tipo de sigilo. Acontece que ela foi interpretada de uma forma que a torna muito restrita. É uma visão que não interpreta a lei junto com o restante da legislação e com o que a Constituição diz sobre acesso à informação pública", ressalta.

Na sua avaliação, o potencial de impacto do fim desses sigilos vai depender do que for revelado.

No caso das visitas dos filhos do presidente ao Palácio do Planalto, por exemplo, o advogado acredita que há um interesse em saber se houve alguma atuação em encontros com ministros que poderia ser enquadrada como advocacia administrativa, que consiste no crime de patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública.

Os inquéritos contra Bolsonaro

Bolsonaro enfrenta acusações de interferir na Polícia Federal, órgão que tem inquéritos abertos contra o presidente e seus filhos. Uma dessas investigações apura acusações de interferência levantadas pelo ex-ministro Sergio Moro em 2020, quando pediu demissão do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Assim que assumir o cargo, em primeiro de janeiro de 2023, o petista poderá nomear um novo diretor-geral para a Polícia Federal. O novo chefe da instituição, por sua vez, deve escolher novos nomes para postos chaves, como as superintendências regionais.

Cerimônia de inauguração da nova sede da Polícia Federal, em Brasília, em 25 de março de 2022

CRÉDITO,MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL

Legenda da foto,

A troca de comando da Polícia Federal é outra decisão que pode afetar a família Bolsonaro ao garantir autonomia às investigações

Para o professor de direito penal da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Davi Tangerino, a gestão petista não vai promover uma "perseguição" à família Bolsonaro, tentando direcionar a atuação da PF contra o antigo clã presidencial, mas deve dar autonomia para que a polícia toque as investigações que julgar pertinentes.

Tangerino lembra que os governos do PT garantiram independência a órgãos de investigação, algo que até expoentes da operação Lava Jato já reconheceram, como o próprio Moro.

"É certo que o governo na época tinha inúmeros defeitos, aqueles crimes gigantescos de corrupção que aconteceram naquela época, mas foi fundamental a manutenção da Polícia Federal para que fosse feito o bom trabalho, seja de bom grado ou por pressão da sociedade, mas isso (a autonomia) foi mantido", disse o ex-juiz da Lava Jato, ao deixar o governo Bolsonaro.

Atualmente, há quatro inquéritos autorizados pelo STF em que o presidente é investigado pela Polícia Federal por suspeitas de diferentes crimes:

- Sobre divulgação de notícias falsas sobre a vacina contra covid-19 (INQ 4888);

- Sobre vazamento de dados sigilosos sobre ataque ao TSE (INQ 4878);

- Inquérito das fake news, sobre ataques e notícias falsas contra ministros do STF (INQ 4781);

- Sobre interferência na Polícia Federal (INQ 4831).

Bolsonaro sem foro

Bolsonaro também enfrenta as acusações de crimes feitas pela CPI da Covid, que estão em apuração pela Procuradoria Geral da República (PGR).

No entanto, a partir do momento em que deixar a Presidência da República, Bolsonaro perde o foro privilegiado e passa a responder por suspeitas na Justiça Comum.

A Polícia Federal poderá continuar as investigações sem autorização do Supremo. As apurações que estão sendo feitas pela Procuradoria Geral da República passarão para a competência de instâncias inferiores do Ministério Público. Os processos no TSE passam para o TRE da região onde houve a suspeita.

Se o Ministério Público decidir fazer uma denúncia contra Bolsonaro, ele será julgado por um juiz de primeira instância.

Uma exceção a essa regra, porém, pode ocorrer no caso do inquérito das fake news, já que nesse caso pessoas sem foro privilegiado estão sendo investigadas no STF, suspeitas de ataques contra a própria Corte e o Estado Democrático de Direito.

Enquanto Bolsonaro perderá o foro privilegiado, seus filhos Eduardo Bolsonaro (deputado federal) e Flávio Bolsonaro (senador) continuam tendo foro especial no STF em casos de supostos crimes relacionados ao seus mandatos. Eduardo Bolsonaro é alvo também do inquérito das fake news.

Dessa forma, ambos podem ser afetados por uma provável mudança no comando da PGR, que hoje é chefiada por Augusto Aras, visto como um aliado do presidente. Seu mandato acaba em setembro.

Quando Lula foi presidente entre 2003 e 2010, sempre escolheu como Procurador-Geral da República o primeiro de uma lista tríplice elaborada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). O petista inaugurou essa tradição, vista como determinante para garantir a independência do Ministério Público Federal.

Dilma Rousseff manteve o procedimento, enquanto Michel Temer nomeou a segunda pessoa da lista tríplice. Já Aras foi nomeado por Bolsonaro sem ter sido selecionado para a lista da categoria.

Lula não se comprometeu na campanha a respeitar novamente a lista, mas Davi Tangerino acredita que ele pode resgatar a tradição, já que a escolha de Aras acabou gerando um desgaste grande para o Ministério Público Federal.

"Foi Lula quem começou (a nomear o PGR pela lista tríplice). Por que mudar agora, justamente para substituir um Procurador-Geral sobre quem sempre pesou a acusação de ser muito dócil com quem o indicou? Eu acho que é um ônus que o Lula não precisa", avalia o professor da FGV.

Flávio Bolsonaro, por sua vez, é alvo de investigação por um suposto esquema de rachadinha (desvio de recursos) em seu antigo gabinete de deputado estadual no Rio de Janeiro. Essa investigação, porém, tramita na Justiça do Rio.

  • Mariana Schreiber - 
  • Da BBC News Brasil em Brasília
Professor Edgar Bom Jardim - PE

quarta-feira, 2 de novembro de 2022

Alienados e sem razão eleitores bolsonaristas estimulam golpe militar e fim da paz social em Pernambuco.




Manifestantes contrários ao resultados das eleições protestam em frente a quartel no Recife
A caminho do bairro do Curado, no viaduto que liga a avenida Abdias de Carvalho à BR-232, no Recife, o fluxo de carros é intenso nesta manhã de quarta-feira (2), feriado de Dia de Finados

De carro, em motos, em bicicletas e até mesmo a pé, apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL), derrotado nas urnas nas eleições presidenciais, se deslocam até a frente do Comando Militar do Nordeste, onde já há a concentração do protesto que não reconhece o resultado do pleito

Aos gritos de “Intervenção Federal”, “O Brasil é Nosso” e “Não validamos o STF”, os manifestantes seguem vestidos de verde e amarelo, carregando bandeiras e fazendo buzinaço.

No caminho, também há apoiadores levando fardos de água para levar até o local da concentração.

Não há bloqueio total da BR-232, mas, de acordo com a PRF, são cerca de 2,5 km de congestionamento na via


Um dos motivos que aumenta o trânsito no local é a realização de uma obra de recuperação do asfalto na via, bem em frente ao CMNE.

A presença da PRF tem auxiliado na fluidez, ainda que lenta, do fluxo de veículos no local.

O tempo inteiro os manifestantes reforçam que a movimentação é pacífica e busca apenas a "justiça". Aos gritos de "Eu Autorizo", eles pedem, a todo instante, intervenção federal

Com Informações da Folha de Pernambuco
Professor Edgar Bom Jardim - PE