terça-feira, 24 de setembro de 2019

Presidente da Câmara abre processo de impeachment de Trump



Donald Trump será submetido a um processo de impeachment pelo Congresso americano, anunciou nesta terça-feira, 24, a democrata Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Deputados. Antes cautelosa em relação à abertura do procedimento, Pelosi se viu pressionada pela base de seu partido depois das recusas sucessivas de Trump e de seu governo em prestar informações ao Congresso sobre denúncias de abuso de poder.
“O presidente viola a Constituição dos Estados Unidos, especialmente quando diz que pode fazer o que quer”, afirmou Pelosi, que acentuou ter Trump traído a integridade da Carta Magna do país. “Ele está pedindo a um governo estrangeiro para ajudá-lo em sua campanha (eleitoral, o que é uma traição a seu juramento como presidente.”
Trump será o quarto presidente dos Estados Unidos submetido a um processo de impeachment. O mais emblemático caso foi o do republicano Richard Nixon, que renunciou antes da conclusão dos procedimentos, em 1974. O democrata Bill Clinton sobreviveu ao processo, em 1999, assim como James Buchanan, em 1860, e Andrew Johnson, em 1868.
O estopim foi a recente pressão de  Trump sobre o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenski, para que investigasse negócios em sue país do ex-vice-presidente americano Joe Biden, pré-candidato democrata à Casa Branca em 2020, e de seu filho. Em troca, o líder dos Estados Unidos havia  prometido liberar ajuda militar de 250 milhões de dólares a Kiev, que pouco antes havia oportunamente congelado
Segundo o jornal The New York Times, em uma reunião a portas fechadas com a bancada democrata, Pelosi já tomou as primeiras medidas. Pediu aos presidentes de comitês da Câmara para reunirem os argumentos em favor do impeachment e entregá-los ao Comitê de Assuntos Judiciários, que compilará o pacote final a ser apresentado ao plenário.
 A presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosy: limite de paciência superado – 24/09/2019
A presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosy: limite de paciência superado – 24/09/2019 (Tom Brenner/Reuters)
Em meio aos discursos e encontros bilaterais nas Nações Unidas, Donald Trump, tentou abortar a iniciativa dos democratas ao anunciar que disponibilizará ao público a transcrição completa da conversa por telefone que manteve com Zelensky.
“Estou neste momento nas Nações Unidas representando nosso país e autorizei a divulgação da transcrição completa e sem alterações da minha conversa por telefone com o presidente da Ucrânia, vocês vão ver que foi uma conversa apropriada e amigável”, informou  pelo Twitter.
O debate sobre o impeachment de Trump havia perdido força após a divulgação do relatório final sobre a interferência russa na campanha republicana de 2016, mas voltou aos holofotes com o vazamento à imprensa da conversa de Trump com o presidente ucraniano.
A investigação gira em torno da suposta participação de Hunter Biden em um esquema de corrupção na empresa energética ucraniana Burisma, quando integrava o quadro de funcionários. Em 2014, Joe Biden teria pressionado o então líder da Ucrânia Petro Porosheko a demitir o procurador que estava encarregado no caso. Caso contrário, cortaria a ajuda financeira  americana ao Exército da Ucrânia, que enfrentava na época uma insurgência separatista no leste de seu território apoiada pela Rússia


 O pré-candidato democrata à Casa Branca e ex-vice-presidente dos EUA Joe Biden: ‘Trump não tem outra escolha senão ser impedido’ – 24/09/2019
O pré-candidato democrata à Casa Branca e ex-vice-presidente dos EUA Joe Biden: ‘Trump não tem outra escolha senão ser impedido’ – 24/09/2019 (Olivier Douliery/AFP)
Biden endossou a proposta de impeachment de Trump em discurso nesta terça-feira no estado de Delaware. “Ele não tem outra escolha senão ser impedido”, afirmou. “Se nós permitirmos um presidente escapar retalhando a Constituição dos estados Unidos, isso vai repercutir para sempre”, completou.
Segundo o ex-vice-presidente, Trump tem de parar de emparedar todas as investigações sobre seus alegados atos ilícitos e entregar as informações requeridas legalmente pelo Congresso sobre suas ações. “Se o presidente não concorda com esta demanda do Parlamento, ele continua a obstruir o Congresso e a escapar da lei. Donald Trump não deixará ao Congresso outra opção, na minha opinião, que iniciar o impeachment”, afirmou. “Isso seria uma tragédia. Mas uma tragédia gerada por ele mesmo.”
As chances de aprovação do impeachment de Donald Trump pelo Senado americano, onde a maioria é republicana, são praticamente nulas. Ainda assim, o processo aberto pela Câmara deverá provocar estragos na campanha de reeleição do presidente americano em 2020 – e os democratas contam com isso.
Veja
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Artista restaura cor de brasileiros fotografados às vésperas da abolição


Colagem com retrato antes e depois da restauraçãoDireito de imagemMARINA AMARAL
Image captionLegenda da foto original diz apenas 'tipos negros'
Nada se sabe sobre o homem de cabelos grisalhos e olhar triste na foto acima, retratado pelo fotógrafo alemão Alberto Henschel no Brasil por volta de 1869, alguns anos antes da Lei Áurea. A legenda do retrato original, à esquerda, diz apenas "tipos negros".
O retrato à direita foi restaurado e colorido pela artista brasileira Marina Amaral e é uma das 22 fotografias que a artista está recuperando para sua série "Escravidão no Brasil".
"Quando a gente olha para os números e para a escala enorme do que foi a escravidão, fica tudo meio abstrato. Mas quando consegue olhar para as pessoas... Ver cada rosto deixa tudo menos abstrato, cria uma conexão", disse à BBC News Brasil.
A mineira de 25 anos é artista digital especializada em colorir fotos antigas em preto e branco – ficou conhecida mundialmente por dar cor a fotos das vítimas dos campos de concentração de Auschwitz. Ela diz que sempre teve vontade de criar um projeto sobre história do Brasil, mas tinha dificuldade de encontrar um arquivo que tivesse fotos em alta resolução.
"Até descobrir esses 22 retratos através de uma biblioteca de Berlim", diz ela à BBC News Brasil. Encontrar fotografias de escravos do século 19 é algo raro. Nas poucas vezes em que eram retratatos, era como parte da propriedade de algum grande senhor de escravos.
Legenda dizia apena 'moça cafuza', nome que se dava a mestiço de negro e índioDireito de imagemMARINA AMARAL
Image captionPelas roupas e adereços desta moça retratada, e possível que ela fosse livre
Mesmo sobre o ensaio de Alberto Henschel não há muitas informações. "O que se sabe é que elas chamaram muita atenção na época porque ele tentou retratá-los com um certo nível de dignidade que não era comum", diz Marina.
Henschel era um fotógrafo profissional alemão que se tornou um dos pioneiros da fotografia no Brasil no século 19 e chegou a retratar a a monarquia brasileira, incluindo o imperador Dom Pedro 2º e sua família. Seus primeiros estúdios foram em Recife e em Salvador. A partir de 1870, ele passou a atuar também no Rio de Janeiro e em São Paulo.
É possível que entre os negros retratados por Henschel também houvesse homens e mulheres livres — sua luta por liberdade era constante e muitos conseguiram conquistar sua própria liberdade antes das leis que foram progressivamente abolindo a escravidão, até o seu fim definitivo com a Lei Aurea, em 1888.

O processo de colorir

Para Marina, colorir as fotos ajuda a trazer o observador para mais perto das pessoas retratadas.
"Aplicar cores a esses fotos permite que as pessoas criem uma empatia maior, humaniza as vítimas. Fotos monocromáticas parecem uma coisa quase irreal, parece que aconteceu há tanto tempo, que não foi de verdade", afirma.
Retrato original diz apenas 'moça cafuza'Direito de imagemMARINA AMARAL
Image captionEste retrato foi o primeiro colorido por Marina Amaral para sua série sobre escravidão no Brasil
"Mas, com cor, ainda mais em um mundo tão cheio de estímulos, é mais fácil de entender, aproxima. Eles passam a ser pessoas como a gente, e não só personagens de livros."
Marina passa cerca de três a cinco horas colorindo cada foto - caso os originais estejam em bom estado. As que estão mais danificadas e precisam de restauração antes demoram muito mais.
"A segunda foto da série (veja abaixo) demorou entre 10 e 12 horas, porque tive que limpar as partes danificadas."
Marina explica que o processo de descobrir as cores em fotos antigas é uma mistura de pesquisa histórica com escolhas artísticas.
Para retratar o tom de pele de cada um, ela faz uma interpretação a partir da escala de cinza das fotos originais.
Segunda foto da série, tirada em RecifeDireito de imagemMARINA AMARAL
Image captionEsta é a segunda foto da série e foi tirada em Recife
"Como não temos muitas informações sobre as pessoas, é uma interpretação mais artística", diz ela.
"No caso da roupa dos escravos, sei que eles jamais poderiam usar tons muito chamativos. Usavam muito branco e creme. Uso como referência pinturas históricas e desenhos que foram feitos na época", explica.
"Olhando para as fotos também é possível saber onde as roupas estavam mais desgastadas e sujas."

Impacto

"Foi a primeira que eu fiz algo relacionado à história do Brasil que gerou um impacto tão grande", diz Marina, sobre a reação positiva que os dois primeiros trabalhos da série tiveram nas redes sociais.
Inicialmente, ela ia apenas postar as fotos em sua rede, mas quando viu a reação decidiu fazer algo maior. "Resolvi convidar alguns professores e autores brasileiros parar dar um contexto para as fotos. A idéia principal é apresentar a história do Brasil para os meus seguidores de fora, já que a maior parte do meu público é da Europa e dos Estados Unidos", diz ela. As legendas são publicadas em inglês e português.
"E também que falem dos impactos desse período nos dias de hoje, porque vivemos as consequências da escravidão todos os dias."
Não foi a primeira vez que emoção contida em fotos antigas chamou a atenção da artista. Seus trabalhos mais famosos, em que coloriu as fotos das vítimas dos campos de concentração de Auschwitz, também causaram grande impacto.
"Você pode ver o quanto ela está sofrendo, no entanto, ela tem uma coragem assombrosa em seu olhar", disse Marina à BBC quando restaurou a imagem de Czesława Kwoka (abaixo), em 2018.
Foto de Czesława Kwoka feita no campo de concentração de Auschwitz e colorida digitalmente por Marina AmaralDireito de imagemMARINA AMARAL
Image captionCzesława Kwoka foi uma das vítimas dos campos de concentração de Auschwitz cujas fotos Marina coloriu digitalmente
Czesława tinha apenas 14 anos quando foi levada ao campo de concentração, em 13 de dezembro de 1942. Foi morta três meses depois, uma das 11 milhões de vítimas do holocausto.
Marina também tem outros trabalhos conhecidos, como a colorização de fotos históricas, como as do dia D, quando os aliados desembarcaram na França durante a Segunda Guerra Mundial.


Professor Edgar Bom Jardim - PE

domingo, 22 de setembro de 2019

É possível ser anônimo na era da internet?

Ilustração que mostra uma mulher ao lado de uma arte gráfica baseada em códigos binários de informática
Image captionProfessor do Oxford Internet Institute diz que hoje temos mais aparelhos tecnológicos com sensores para captar dados sobre nós
"No futuro, todo mundo terá seus 15 minutos de anonimato." É o que disse o artista Banksy. Mas com tudo online, de status de relacionamento a destinos de férias, é mesmo possível ser anônimo – mesmo que brevemente – na era da internet?
Esse dizer, uma brincadeira com a famosa frase de Andy Warhol dos "15 minutos de fama", foi interpretada de várias formas por fãs e críticos. Mas sublinha a real dificuldade de manter algo privado no século 21.
"Hoje, nós temos mais aparelhos digitais do que nunca, e eles possuem mais sensores para captar mais dados nossos", diz Viktor Mayer-Schoenberger, professor do Oxford Internet Institute.
E isso importa. De acordo com uma pesquisa da empresa de recrutamento Careerbuilder, nos Estados Unidos, no ano passado, 70% das empresas usaram as redes sociais para analisar candidatos a vagas, e 48% checaram a atividade dos funcionários nas redes sociais.
Instituições financeiras também checam perfis em redes sociais quando decidem se dão empréstimos ou não.

Uma TV rosa com o logo: "No futuro, todo mundo será anônimo por 15 minutos", do show de Banksy, Los Angeles, 2006
Image captionÉ mesmo possível ser anônimo na era da internet?
Outras empresas, por sua vez, estão criando modelos com hábitos de compras, visões políticas e usam, inclusive, inteligência artificial para prever hábitos futuros com base em perfis de redes sociais.
Uma maneira de tentar obter controle é deletando redes sociais, o que algumas pessoas fizeram depois do escândalo da empresa Cambridge Analytica, quando 87 milhões de pessoas tiveram seus dados usados secretamente para campanhas políticas.
Mas, ainda que deletar contas em redes sociais seja a maneira mais óbvia para remover informações pessoais, isso não terá impacto nos dados guardados por outras empresas.
Felizmente, alguns países oferecem proteção.
O Brasil tem o Marco Civil da Internet, aprovado em 2014, e a Lei Geral de Proteção de Dados, aprovada em 2018. A lei, que entrará em vigor em 2020, proíbe o uso indiscriminado de dados pessoais. Além disso, garante aos cidadão o direito de saberem como e para o que as suas informações serão usadas.
A União Europeia tem sua versão: o GDPR, que regula a proteção dos dados, e inclui o "direito de ser esquecido" – basicamente, que um indivíduo tem o direito de ter informações pessoais removidas de onde quiser.
No ano passado, houve 541 pedidos de que informações fossem removidas no Reino Unido, segundo apuração da BBC, ante 425 do ano anterior e 303 em 2016-17. Os números reais podem ser mais altos, já que o Information Commissioner's Office (Departamento de Informação) só se envolve depois que uma reclamação inicial à empresa que guarda os dados é rejeitada.
Mas Suzanne Gordon, do Departamento de Informação, diz que isso não é necessariamente objetivo: "O GDPR fortaleceu os direitos das pessoas de pedirem que organizações deletem seus dados se acreditam que não são necessários. Mas o direito não é absoluto e em alguns casos deve ser balanceado contra outros direitos e interesses competidores, como, por exemplo, a liberdade de expressão."
O "direito de ser esquecido" ficou notório em 2014 e levou a vários pedidos de que informações fossem removidas – um ex-político que procurava a reeleição e um pedófilo são alguns exemplos –, mas nem todos foram aceitos.
Empresas e indivíduos que tenham dinheiro para tal podem contratar especialistas para ajudá-los.
Uma indústria inteira está sendo construída ao redor da "defesa de reputação" com empresas desenvolvendo tecnologia para remover informação – por um preço – e enterrar notícias ruins de mecanismos de busca, por exemplo.
Uma empresa, Reputation Defender ("defensora da reputação"), fundada em 2006, diz que tem um milhão de clientes, como profissionais e executivos. Ela cobra cerca de 5.000 libras (cerca de R$ 25 mil) pelo pacote básico.
Ela utiliza seu próprio software para alterar os resultados do Google sobre seus clientes, ajudando a colocar as notícias ou textos menos favoráveis mais para o fim dos resultados e promovendo as histórias favoráveis no lugar.
Imagem de um homem com o logotipo do Google refletido várias vezes em seu rostoDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionEmpresas de defesa de reputação querem remover informações pessoais de bancos de dados e sites
"A tecnologia foca no que o Google vê como importante quando indexa sites no topo ou na parte de baixo dos resultados de busca", diz Tony McChrystal, diretor da empresa.
Geralmente, as duas maiores áreas que o Google prioriza são credibilidade e autoridade que a página tem, e quantos usuários se engajam com os resultados de busca e o caminho que o Google vê que cada usuário único segue.
"Trabalhamos para mostrar ao Google que um maior volume de interesse e atividade estão ocorrendo nos sites que queremos promover, sejam sites novos que criamos ou sites estabelecidos que já aparecem nos resultados das buscas, enquanto sites que queremos suprimir mostram um percentual mais baixo de interesse."
A empresa diz que atinge seu objetivo em 12 meses.
"É impressionantemente efetivo", ele diz, "já que 92% das pessoas não navegam depois da primeira página de resultados do Google e mais de 99% não passam da segunda página".
Mayer-Schoenberger, de Oxford, aponta que, enquanto empresas de defesa de reputação possam ser efetivas, "é difícil entender por que só pessoas ricas podem ter acesso a isso, e por qual razão isso não pode beneficiar todo mundo".
Um membro da equipe do British Museum faz os ajustes finais para uma seleção de uma obra de Andy Warhol, em fevereiro de 2017Direito de imagemGETTY IMAGES
Image captionAndy Warhol previu uma vez que todo mundo teria 15 minutos de fama
Então, será que podemos nos livrar de todos nossos rastros online?
"Se formos responder de uma maneira simples, não", diz Rob Shavell, cofundador e chefe executivo do DeleteMe, um serviço de assinatura que remove dados pessoais de bancos de dados públicos, corretoras de dados e sites de busca.
"Você não pode se apagar completamente da internet a não ser que algumas empresas e indivíduos que operem serviços de internet sejam forçados a mudarem fundamentalmente como eles operam", afirma.
"Estabelecer regulamentações fortes para permitir que consumidores tenham autonomia para decidir como sua informação pessoal pode ser recolhida, compartilhada e vendida já é um bom caminho para encarar o desequilíbrio de privacidade que temos agora."
Professor Edgar Bom Jardim - PE

As polêmicas de Bacurau e o andar das dissonâncias



Certos momentos trazem alguns anúncios de mudanças, apesar dos desconsolos e pessimismos.A necessidade de reavivar sonhos não é coletiva, pois existem conformismos radicais. Há quem se realize com a facilidade em adquirir bens materiais e fuja das complexidades.A história, com seus registros, exibe vitrines sempre renovadas. No entanto, as passividades se esticam numa massificação veloz. Os anúncios de mudanças servem, muitas vezes, para mascarar desconfortos e manter privilégios.A sedução maior é, para muitos, poder disfarçar as dificuldades. Cria-se um culto ao individualismo, se reforçam delírios consumistas.Faz parte das estratégias de dominação o engano ou a verdade cheia de acrobacias confusas. O campo da instabilidade não cessa de se ampliar.
Não há como se sossegar no reino ambíguo das mercadorias. Mesmo que o valor de troca prevaleça, a busca de identidades é frequente e os corpos tremem. A arte balança imaginários, retoma símbolos, investe em invenções de formas e teorias. Toca no que parecia inerte ou definido.Preste atenção aos movimentos nas telas da TV, aos modelos de comportamentos consolidados, às promessas dos políticos , à sutileza de cinismos frequentes. Desconfie. Não fique, apenas, no lugar comum do cotidiano. Há tempos explosivos no meios das calmarias. O filme Bacurau inquietou. Muitos textos foram escritos, as discordâncias se firmaram e os incômodos estão presentes. Imaginar e pensar sobre a sociedade não é simples. Não é à toa que as dissonâncias ecoam e as perguntas se refazem.As inquietações redesenham geometrias, indicam que as respirações não foram lacradas pela opressão. Há reações e análises e não, apenas, a exaltação dos festivais.
Alguns sedimentam quadros nefastos, outros marcam a permanência de alegorias antigas.Resumir tantos significados é um desafio. Meu impacto foi muito subjetivo. Não racionalizei, nem parti para rever teorias. Senti, sentei, escrevi. Há um turbilhão de ideias, rejeições e o ressuscitar de preconceitos. Há multiplicidades imensas que consagram o indefinível. No entanto, o diálogo se apresentou e a aprendizagem quebra paradigmas ou assinala que as identidades flutuam. Quando a homogeneidade se abala, a imaginação transcende a palidez da mediocridade. O filme trouxe ruídos, sem deixar de machucar paradigmas e sacudir memórias de sonhos agoniados.
É a construção da possibilidade histórica sempre armando seus trapézios. Não foge do passado, brinca com ritmos. Não há como esquecer Gláuber, redesenhar estéticas, ressuscitar desencontros, assinalar a intromissão das novas tecnologias, traçar as estradas das peripécias modernistas.Bacurau tem o mérito de não compactuar com a mesmice, de se lançar no voo das ousadias. Mobilizou, provocou conversas, numa sociedade repleta de jogos de mentiras e agitada por polarizações inesgotáveis. Os momentos da história abalam quando não desprezam as simultaneidades. Surgem as dúvidas e os caminhos cobertos de encruzilhas. Os sonhos e os pesadelos assanham companhias, avisam que o inesperado não morreu Os exibicionismos estão próximos e eles atravessam a aventura nossa de cada dia na busca de nomear os vencidos e os vencedores. Como evitar os que se miram em discursos salvacionistas e procuram se apropriar de julgamentos como donos de certezas? A história , talvez, esteja na última utopia desejada.
Paulo Rezende
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Reforma da Previdência: saiba o que muda na proposta atual


ilustração reforma previdência
Depois de passar pela Câmara, está em análise no Senado a proposta de reforma da Previdência para trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos civis.
Antes de entrar em vigor, o texto precisa ser votado pelos senadores em plenário — onde passa por dois turnos de votação e precisa ter o apoio de pelo menos 49 dos 81 senadores. Se a PEC for modificada, volta à Câmara. Se for aprovada, pode ser promulgada pelo Congresso e começa a valer.
Confira as principais mudanças nas regras de aposentadoria e pensão a seguir, numa comparação que mostra o que vale hoje e o que prevê o relatório da reforma da Previdência (PEC 6/2019) apresentado pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).
Como é Hoje?
  • São três modalidades mais comuns: por tempo de contribuição, por idade e por invalidez.
  • Homens com 35 anos de contribuição e mulheres que recolheram por pelo menos 30 anos para a Previdência têm direito à aposentadoria, independentemente da idade.
  • Quem não se encaixa nessa modalidade se aposenta por idade, aos 65 anos para homens e 60 anos para mulheres, com no mínimo 15 anos de contribuição.
  • Aposentadoria por invalidez não tem idade mínima e é paga aos trabalhadores considerados incapacitados permanentemente.
  • Como fica? 
  • A PEC 06 acaba com a modalidade por tempo de contribuição e mantém a aposentadoria por idade, com exigência de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres, além de elevar o período mínimo de contribuição de 15 para 20 anos para homens. Para mulheres, são pelo menos 15 anos de contribuição.
  • A proposta inicial também previa aumento do período mínimo para mulheres, mas ela caiu na Câmara.
  • São quatro possibilidades de transição para aposentadoria por tempo de contribuição e uma para aposentadoria por idade. O segurado poderá optar pela forma que considerar mais vantajosa:
  • 1. A primeira soma tempo de contribuição - de pelo menos 35 anos para homens e 30 anos para mulheres - com a idade do segurado. O aumento é progressivo. Para as mulheres, a soma vai de 86 em 2019 a 100 em 2033. Para os homens, de 96 em 2019 a 105 em 2028. Isso quer dizer, por exemplo, que uma mulher com 56 anos de idade e 30 de contribuição poderia se aposentar neste ano.
  • 2. A segunda modalidade de transição exige tempo mínimo de contribuição de 35 anos para homens e 30 anos para mulheres com idade mínima - que começa em 56 anos para mulheres e sobe gradualmente até 62 em 2031, e em 61 anos para homens, chegando a 65 anos em 2027.
  • 3. A terceira forma é para mulheres com mais de 28 anos de contribuição e homens com mais de 33. Eles poderão optar pela aposentadoria sem idade mínima se cumprirem um "pedágio" de 50% sobre o tempo faltante. Exemplo: uma mulher de 56 anos com 29 anos de contribuição poderá se aposentar se contribuir por mais um ano e meio (o ano que falta e mais 50% sobre esse período). Nesses casos, aplica-se o fator previdenciário para o cálculo do benefício.
  • 4. A Câmara criou uma quarta possibilidade de regra de transição, válida para todos os atuais segurados. Homens podem se aposentar aos 60 anos e mulheres, aos 57, caso acumulem 35 anos de contribuição (homens) ou 30 anos (mulheres). Nesse caso, há a possibilidade de “pagar” um pedágio de 100% do tempo que faltaria para atingir esse tempo mínimo, contado a partir da data de promulgação da emenda. Ou seja: se falta um ano para uma mulher atingir os 30 anos de contribuição, ela teria que contribuir dois anos. Para essa regra, o valor da aposentadoria será de 100% da média dos salários de contribuição desde julho de 1994.
  • 5. Na transição para quem hoje já se aposentaria por idade, a idade mínima para os homens segue em 65 anos. Para as mulheres, a idade mínima sobe seis meses a cada ano, a partir de 2020, chegando aos 62 anos em 2023. Para ambos, é exigido tempo mínimo de contribuição de 15 anos.
  • Para professores vinculados ao regime geral de Previdência, as idades mínimas serão de 57 anos para mulheres e 60 para homens, com 25 anos de contribuição para ambos.
  • Vale lembrar: as mudanças não afetam quem já está aposentado ou quem já tem condições de se aposentar pelas regras atuais.
Contribuição
  • Passa a ser progressiva, com alíquotas efetivas que vão de 7,5%, incidente sobre rendimentos até um salário mínimo, a 11,69%, que recai a fatia do salário de contribuição de R$ 3.001 a 5.839,45.
Faixa salarial (R$)Alíquota efetiva
Até um salário mínimo (SM)7,5%
R$ 998,01 a R$ 2.000,007,5% a 8,25%
R$ 2.000,01 a R$ 3.000,008,25% a 9,5%
R$ 3.000,01 a R$ 5.839,459,5% a 11,69%
  • Ao contrário da modalidade atual, as alíquotas mais altas não incidem sobre o valor total do salário de contribuição, mas em escalas, como acontece com o imposto de renda.
  • Exemplo com um salário equivalente ao teto do INSS, de R$ 5.839,45:
Parcela do salárioAlíquota nominalContribuição
R$ 998,007,5%R$ 74,85
R$ 1.001,999%R$ 90,17
R$ 999,9912%R$ 119,99
Soma total
R$ 5.839,45
Alíquota efetiva
11,69%
Soma total
R$ 682,54




Cálculo da Aposentadoria
  • O valor do benefício por idade será calculado levando-se em conta 60% da média dos salários de contribuição, mais 2% por ano a mais de contribuição - ou seja, contados a partir de 20 anos de contribuição para os homens e de 15 anos de contribuição para as mulheres.
  • Na prática, a mudança dificulta o acesso a benefícios de mais alto valor. Primeiro, porque toma como parâmetro a média de todos os salários de contribuição, e não apenas dos 80% maiores, como ocorre hoje. De outro, exige 40 anos para que o segurado tenha como benefício 100% da média dos salários de contribuição, se homem, e 35 anos para mulheres.
  • A PEC manteve como piso para as aposentadorias o salário mínimo, hoje de R$ 998.
Aposentadoria Rural

A proposta inicial igualava a idade mínima para homens e mulheres em 60 anos, com pelo menos 20 anos de contribuição pela regra geral ou 20 anos de contribuição sobre a produção. A Câmara, porém, voltou atrás e manteve as regras vigentes hoje.

BPC e ABONO

  • A proposta de reforma inicialmente elevava a idade mínima para acesso ao BPC de 65 para 70 anos e criava uma faixa intermediária, entre 60 e 65 anos, na qual idosos em situação de miserabilidade teriam direito a um benefício de R$ 400.
  • A Câmara excluiu esse artigo e apenas reforçou os critérios de acesso ao benefício – renda per capita domiciliar de até um quarto de salário mínimo –, fixando-os na Constituição.
  • No relatório apresentado por Jereissati, foram eliminadas quaisquer menções ao BPC - ou seja, as regras atuais ficam mantidas e o BPC não passará a ser regulamentado pela Constituição.
  • No caso do abono, a proposta inicial dificultava o acesso ao benefício, que seria pago apenas aos trabalhadores com remuneração de até um salário mínimo. A Câmara aumentou esse limite, fixando-o em R$ 1.364,43, valor referente ao salário-família.
Além do relatório, com alterações que suprimem pontos do texto que veio da Câmara, Jereissati apresentou um texto que ficou conhecido como "PEC paralela".
Entre outros pontos, essa proposta paralela altera regras de pensão e o cálculo na aposentadoria por incapacidade em caso de acidente. Também prevê a inclusão de estados, Distrito Federal e municípios na reforma — ponto que inicialmente era previsto na proposta enviada pelo Executivo.
A ideia foi deixar as mudanças maiores para o texto paralelo, de forma que o relatório principal não tenha de voltar para nova avaliação na Câmara.
Outro texto que tramita no Congresso é a proposta que altera as regras para os militares. O Projeto de Lei que reestrutura a carreira e o sistema dos militares das Forças Armadas foi enviado ao Congresso em março, mas só em agosto foi instalada a comissão especial da Câmara que vai analisá-lo.
A proposta, que também tem de passar pela análise do Senado, aumenta o tempo de serviço dos oficiais da ativa e a alíquota de contribuição da categoria, mas também aumenta gratificações para os militares.
BBC.
Professor Edgar Bom Jardim - PE