sábado, 3 de agosto de 2019

Pesquisa: Ensino Médio integral aumenta chances de chegar ao Ensino Superior

Estudantes do Ensino Médio reunidos em Jaboatão, Pernambuco

Foto: Pedro Menezes/Secretaria de Educação e Esportes de Pernambuco
Existe um filme já conhecido sobre o Ensino Médio que, invariavelmente, apresenta no roteiro baixa aprendizagem e altos índices de evasão e de distorção entre idade e série. Os personagens podem até mudar, mas os episódios se repetem ano após ano e, pouco a pouco, o público se afasta sem conhecer casos transformadores como o do impacto da política de Educação integral.
Um dos protagonistas dessa última história é Pernambuco. Em 2007, o estado enfrentava uma taxa de abandono de 24%, ou seja, um em cada quatro estudantes não completava a etapa, o que colocava a rede na 26ª posição no quadro nacional. De uma escola em tempo integral, com processo seletivo, aos poucos o projeto foi se abrindo a todos os alunos da rede. Atualmente, segundo dados da secretaria, 412 das 760 escolas de Ensino Médio estão em tempo integral, o que atinge 54% das escolas e 57% das matrículas, antecipando a meta do Plano Nacional de Educação (PNE) prevista para 2024, que prevê que pelo menos metade das escolas ampliem sua jornada.
 “Dez anos atrás o Brasil acreditava que escola integral era um sonho impossível, que o estudante precisava trabalhar, que o custo era impossível de ser pago, que não haveria adesão. Pernambuco mostrou que isso não é verdade a partir do momento que os pais e alunos entenderam que [a Educação integral] pode fazer a diferença na vida deles”, diz o secretário Frederico da Costa Amâncio, que atribui ainda a virada nos resultados educacionais a outros três fatores: monitoramento de metas, gestão por resultado e avaliação das escolas.
Mas como quantificar essa diferença? Com um olhar para além dos rankings dos exames nacionais, um estudo realizado pelo LEARN/FGV (Laboratório de Pesquisa e Avaliação em Aprendizagem da Fundação Getúlio Vargas) e Instituto Sonho Grande avaliou as condições de vida de 2.814 estudantes que concluíram o ensino médio nas escolas estaduais do estado, entre os anos de 2009 e 2014.
Pesquisadores concluíram que alunos formados nas escolas de tempo parcial têm 46% de chance de ingressar no Ensino Superior, enquanto entre os egressos das escolas integrais essa chance sobe para 63%. Outros benefícios estão ligados a equidade e ao empoderamento de estudantes pardos ou pretos no mercado de trabalho. A diferença salarial que chega a 10% na escola parcial desaparece quando se olha para escolas integrais.
E aqueles que completam o Ensino Médio integral optam, com maior frequência, por carreiras com maior valor agregado, tais como atividades ligadas ao setor financeiro (e menos inserção na área comercial), além de maior presença no setor educacional e de saúde.
A escola integral de Pernambuco
A ampliação da jornada para 45 horas semanais, por si só não explica os resultados, segundo explica Vladimir Ponczek, professor da escola de economia de São Paulo da FGV e coordenador do LEARN. “Ampliar horário em sala de aula não traz grandes resultados no longo prazo. Agora, a ampliação de jornada com trabalho com o socioemocional combinado ao cognitivo, aí sim existe um efeito”, explica o professor, que vê a possibilidade de acesso ao Ensino Superior como importante, especialmente no Brasil, em razão da diferença salarial em relação a quem tem apenas a Educação Básica no currículo.
Síntese de Indicadores Sociais 2018, do Instituto Brasileiro de Educação e Estatística (IBGE), mostra que, no Brasil diploma universitário rende salário 2,5 vezes maior do em relação a alguém com Ensino Médio, enquanto em países da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) esse valor é apenas 1,6 vezes maior.
A transformação de uma escola tradicional, com menos horas e pautada pelo conteúdo, para esse outro modelo, mais flexível, exige mudanças na gestão. “No programa iniciado pelo Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE) em Pernambuco foi feita a  revisão e a reforma da infraestrutura da escola, que precisa ter refeitório, quadra, uma biblioteca e sala de informática”, disse Rangel Barbosa, diretor de projeto do Instituto Sonho Grande.
“Também é feita uma revisão do modelo pedagógico para incluir elementos focados no protagonismo do estudante e seu projeto de vida, além de ações para formação do corpo acadêmico”, completa.
Para Amâncio, secretário de Educação do estado, quando o aluno tem a possibilidade de ficar por sete horas na escola, o professor consegue aprofundar o trabalho pedagógico, com vistas ao desenvolvimento de competências. “A gente plantou há 12 anos a semente da Educação interdimensional, do trabalho com protagonismo, projeto de vida e das competências socioemocionais que hoje estão na BNCC (Base Nacional Comum Curricular)”. Após atingir a liderança no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) em 2015, o estado caiu para terceira posição em 2017, ano em que se destacou por apresentar a menor desigualdade de aprendizagem entre estudantes de nível socioeconômico mais baixo e mais alto.
Novo Ensino Médio
Como nas outras redes estaduais, o momento em Pernambuco é de discutir a implantação do Novo Ensino Médio. “Nosso time está discutindo isso agora. Estamos tentando não perder de vista que mesmo a escola regular precisa desenvolver outras competências com os estudantes e criar disciplinas transversais”, disse Amâncio.
Dentro da secretaria, segundo ele, a estratégia é ter uma visão mais ampla sobre os itinerários. “A gente não pode achar que todo esse esforço para Novo Ensino Médio e BNCC foi para ter mais aula da mesma coisa. Por exemplo, iniciação científica, algo que desenvolve habilidades e aprofunda o conhecimento, pode estar presente em qualquer itinerário formativo, não só nos da área de exatas”
POR:
Vinicius de Oliveira, do Porvir*
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Educação:O livro pode se tornar um instrumento valioso para lidar com os conflitos e instaurar o clima de paz


Pessoa escreve em um caderno de capa dura preta com pessoas desfocadas ao fundo
Foto: Getty Images
A escola é um lugar dinâmico e rico, principalmente no plano das interações sociais. No entanto, toda essa efervescência não existiria sem alguns instrumentos básicos para a aprendizagem e para a regulação das relações. Dois bons exemplos disso são o caderno do aluno e o livro de ocorrências, duas coisas tão naturalizadas na cultura escolar que geralmente não damos a devida atenção a elas.
Tanto o caderno do aluno quanto o livro de ocorrências são dois instrumentos que estão se consolidando como objetos de pesquisa no meio acadêmico. Embora a gente não se dê conta disso, o caderno do aluno é um instrumento complexo que requer o desenvolvimento de algumas habilidades para que ele seja utilizado adequadamente, especialmente quando se trata de crianças em processo de alfabetização. Sobre o livro de ocorrências não é diferente e é dele que falaremos nesse texto.    
O que é o livro de ocorrências?
No Brasil, o livro de ocorrências disciplinares se tornou um dos principais dispositivos criados para lidar institucionalmente com os conflitos na escola, especialmente quando se trata de problemas mais sérios como o desrespeito ao/à professor/a e as atitudes que atentam contra a dignidade dos colegas de escola. O registro de uma ocorrência ou de um conflito é feito para marcar um rito e significa que a mediação deve ser mais cuidadosa, tanto para acolher adequadamente a pessoa que se sentiu desrespeitada quanto para cuidar para que o impasse seja resolvido.
Esse rito que envolve a narrativa de uma discórdia registrada em livro e que, portanto, soa mais sério, passou a ser incorporado na rotina escolar, a ponto de se tornar importante para os profissionais da escola, para os alunos e até mesmo para as suas famílias, uma vez que a exigência de escrever sobre o ocorrido também pode partir dos estudantes e dos seus pais ou responsáveis.
A perpetuação desse tipo de conduta institucional nas escolas se deve ao fato de o livro de ocorrências disciplinares ter se tornado um traço importante da tão conhecida cultura escolar, que, nas palavras do sociólogo norte-americano Willard Walter Waller, é uma cultura que se distingue daquela existente em qualquer outra instituição, devido aos seus valores, práticas e sistema simbólico. É nesse sistema simbólico que o livro de ocorrências se enquadra e, por isso, ele se tornou um objeto tão peculiar e tão essencial na rotina escolar.
Afinal, o livro de ocorrências é bom ou ruim?     
Esta é uma boa pergunta para os/as diretores/as e para os/as professores/as das escolas brasileiras, e não só para aquelas escolas que adotaram o livro de ocorrências. Em tese, como qualquer outra coisa, o livro, por si só, não é bom e nem é ruim. Depende do uso que se faz dele. Em alguns lugares esse registro não passa de algo meramente burocrático, ao passo que em outros ele se tornou uma fonte preciosa de informações para a gestão, para os educadores e para as famílias.
O fato incontestável é que o livro de ocorrências pode ser um instrumento de coleta de dados indispensável para se tomar conhecimento do que acontece no dia a dia da escola, principalmente quando se trata dos problemas de relacionamento entre crianças e jovens. Para que isso ocorra, é importante tomar consciência desse potencial e decidir coletivamente sobre o uso que deve ser feito desse instrumento, até mesmo para saber o que extrair dele.
O que pode ter de importante no livro de ocorrência?
Para que o livro de ocorrências cumpra um papel fundamental na mediação dos conflitos e se torne um instrumento de coleta de dados para ajudar a compreender alguns problemas na escola ele deve ser pensado em duas etapas que são, a um só tempo, diferentes e complementares.
Em primeiro lugar, a maneira de descrever os acontecimentos deve ser considerada. Se o livro de ocorrências é um lugar de narrativas estas devem ser feitas na perspectiva de quem quer entender e esclarecer o ocorrido, não um relato de quem está fazendo um julgamento parcial, que pode comprometer a legitimidade da mediação que está sendo feita. Nesse sentido, a crença dos alunos no valor do instrumento passa pela imparcialidade da narrativa e do senso de justiça da pessoa que está mediando o conflito.
Em segundo lugar, o livro deve ser um instrumento vivo e dinâmico a ser utilizado pela escola para conhecer os problemas a partir dos dados que ele reúne e que podem se tornar informações valiosas para interpretar adequadamente fenômenos como a indisciplina e a violência, e até mesmo outros fenômenos mais complexos como a repetência dos alunos. Basta verificar para saber que boa parte dos alunos que protagonizam os conflitos na escola já passaram pela experiência da reprovação.
Que informações podem conter no livro de ocorrências?
Se os gestores escolares e os educadores chegarem à conclusão de que o livro de ocorrências não deve se tornar um mero objeto voltado para a lógica de disciplinamento dos estudantes, mas que ele deve ser um instrumento de coleta de dados que servirão para analisar e interpretar o ambiente de aprendizagem, várias informações estarão à disposição da escola. O livro de ocorrências pode nos dizer o que está acontecendo na escola. Nele podemos separar a indisciplina da violência e do bullying, só para citar um bom exemplo.
O aspecto de gênero
A primeira descoberta interessante que fazemos no livro de ocorrências é sobre o gênero dos estudantes que mais se envolvem nos eventos registrados. Geralmente, os meninos são os recordistas e isso nos informa sobre os tipos de masculinidades por trás desses comportamentos. Nesse caso, vale a pena saber também qual é a proporção de meninos e de meninas nas ocorrências e quais são os eventos mais protagonizados de acordo com o sexo dos estudantes.  
Os alunos mais recorrentes nos registros
Em relação a isso, duas coisas podem ser observadas. Primeiro, que nem todos os meninos estarão presentes no livro de ocorrências da escola e, segundo, que alguns serão mencionados mais frequentemente, enquanto outros aparecerão, no máximo, em dois registros, pois esse tipo de mediação tem a sua eficácia. 
A relação da faixa etária com certos tipos de eventos
O livro de ocorrências geralmente corrobora resultados de pesquisas sobre indisciplina e violência, ao constatar que certos tipos de conflitos ou de violências são mais comuns em alguns níveis de ensino, ou seja, os eventos protagonizados pelos alunos do 1º ao 5º ano serão diferentes daqueles protagonizados pelos alunos do 6º ao 9º ano e assim por diante, pois a idade do aluno diz muito sobre o que ele faz, sem desconsiderar que o sexo também é marcante nessa circunstância.   
Os acontecimentos mais comuns
Alguns eventos se repetem mais frequentemente e localizá-los em algumas categorias pode ser extremamente útil. Quando se identifica os eventos mais comuns nota-se que os seus protagonistas também apresentam algumas características semelhantes e isso ajuda a compreender melhor cada um desses problemas.    
O livro de ocorrência tem mesmo toda essa importância?
Sobre isso eu posso afirmar, com razoável segurança, que o livro de ocorrências é um instrumento muito valioso para lidar com os conflitos e para instaurar o clima de paz na escola. Para tanto, ele não pode se tornar uma fonte de ameaça e de medo para os alunos. Como bem já afirmou Ana Lúcia Silva Ratto, uma das pesquisadoras do tema, o livro de ocorrências não pode servir para objetivar os indivíduos e nem pode ser uma forma de explicá-los, classificá-los, avaliá-los ou defini-los. Tampouco deve ser visto como o lugar da escrita que vai isentar a escola de responsabilidades em conflitos mais graves que requerem a presença dos pais ou dos responsáveis. Não deve ser o lugar da confissão, seja através da palavra da criança ou assinando o livro e conferindo veracidade ao que nele consta, seja através daquilo que o adulto confessa por ela. Ao contrário de tudo isso, o livro de ocorrências deve ser uma fonte de pesquisa, onde os dados são transformados em informações, em virtude da relevância que eles apresentam.
Claudio Marques da Silva Neto é diretor da EMEF Infante Dom Henrique, em São Paulo. Tem experiência em direitos humanos, formação docente, cultura escolar, indisciplina, violência e gênero. É mestre e doutorando em Educação pela Universidade de São Paulo (USP).
POR:
Cláudio Neto
Professor Edgar Bom Jardim - PE

sexta-feira, 2 de agosto de 2019

No Instagram, João Campos denuncia invasão de celular

Deputado federal João Campos, do PSB
Deputado federal João Campos, do PSBFoto: Humberto Pradera/PSB
Parlamentares continuam denunciando hackeamento de celulares no Congresso Nacional. Desta vez, o deputado federal João Campos afirma, em uma postagem nos stories do instagram que teve um celular do gabinete invadido. 

"Atenção, hackearam o nosso número de divulgação do mandato. Quem receber informações por esse contato, quais quer que sejam, desconsidere.Já estamos resolvendo a situação e avisaremos assim que recuperarmos o número", diz a mensagem.

A reportagem da Folha de Pernambuco teve acesso a uma mensagem enviada pelo celular de divulgação do deputado, perguntando se a pessoa usa o aplicativo do Banco do Brasil, pelo celular ou computador. 

Confira:
joão


joão campos
Por: Juliano Muta em 02/08/19 às 14H42, atualizado em 02/08/19 às 15H38
Folha de Pernambuco.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Olhares:Após 'Cristo desgovernado', imagem do Brasil no exterior sofre nova baixa




Capas da The Economist sobre Brasil
Image captionBrasil ganhou novamente destaque no noticiário internacional, mas sendo retratado como principal ameaça aos esforços globais de combate ao aquecimento global
Em 10 anos, o Brasil passou de promessa de futura potência econômica para país com economia desgovernada e, mais recentemente, nação que ameaça os esforços mundiais de combate ao aquecimento global e de preservação do planeta.
Pelo menos é essa a narrativa estampada em alguns dos principais jornais e revistas estrangeiras.
É difícil esquecer a icônica capa de 2009 da prestigiada revista britânica The Economist em que a estátua do Cristo Redentor aparece subindo aos céus como foguete, com o título "Brazil takes off" ou Brasil decola, na tradução para o português.
Quatro anos depois, em 2013, a revista conhecida pelo pensamento liberal na economia e progressista nos costumes, substituiu o otimismo por uma reportagem repleta de críticas ao país.
Na capa, o Cristo que antes decolava aparecia em queda desgovernada. O título questionava se o Brasil havia jogado fora a chance de ser o "país do futuro".
Nesta sexta (2), o Brasil voltou a estampar a capa da Economist. Dessa vez, como principal ameaça ao meio-ambiente. Uma imagem de toco de árvore com o formato do mapa do Brasil ilustra o título dramático "Vigília da morte para a Amazônia"
O texto diz que o presidente Jair Bolsonaro "deixou claro para os infratores (desmatadores) que eles não têm nada a temer".
A política ambiental do governo brasileiro, que prevê a possibilidade de mineração em terras indígenas e de expansão de atividades econômicas na Amazônia, também teve destaque - não exatamente positivo - em jornais americanos.
Em 28 de julho, um dos principais jornais dos Estados Unidos, o The New York Times, publicou artigo com o seguinte título: "Sob líder de extrema-direita brasileiro, proteções à Amazônia são cortadas e florestas caem".
O artigo diz que, se antes o Brasil era visto como liderança na área de meio-ambiente, agora o governo Bolsonaro coloca essa imagem em xeque.
Artigo do The New York Times sobre BrasilDireito de imagemREPRODUÇÃO
Image captionThe New York Times aponta que desmatamento na Amazônia acelerou durante governo Bolsonaro
Empresas de marketing e pesquisa também calculam a evolução (ou involução) da "marca Brasil" no exterior. A consultoria de imagem e marketing FutureBrand, que tem escritórios nos EUA, na Europa e na América do Sul, faz todo ano um ranking dos países com melhor imagem internacional.
O Brasil caiu quatro posições de 2014 a 2019, figurando em 47º na lista de 69 países analisados. Segundo o relatório da FutureBrand, embora nosso país ainda se mantenha entre as 10 maiores economias do mundo (é a nona maior), "há previsão de nuvens carregadas no horizonte".
"A nação se dividiu com a eleição de Jair Bolsonaro e a turbulência continua a afetar o Brasil, podendo influenciar o desempenho do país nos próximos rankings."
Mas quais foram os momentos-chave que ajudaram a moldar e transformar a imagem do Brasil no exterior? E seriam justas essas avaliações da imprensa estrangeira sobre o nosso país?

A linha do tempo da imagem do Brasil no mundo

Em entrevista à BBC News Brasil, o professor de Relações Públicas Internacionais Christopher Sabatini, da Universidade Columbia, em Nova York, lembrou alguns episódios e momentos que ajudaram a forjar a forma como o nosso país era visto no exterior.
Segundo ele, antes de Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva se tornarem presidentes, a visão sobre o Brasil era concentrada em aspectos culturais e na ideia de um país diplomático e amigável.
Trump e BolsonaroDireito de imagemREUTERS/KEVIN LAMARQUE
Image captionNo governo Bolsonaro, Brasil passa a ser visto como país que não se compromete com o combate ao aquecimento global
"O Brasil era visto como fonte de riqueza cultural, não só com samba, mas com a MPB, Bossa Nova, Caetano Veloso e outros excelentes músicos", disse.
"E muitos reconheciam o potencial diplomático do Brasil, a boa tradição diplomática do Itamaraty. Quem trabalhava com política e diplomacia sabia da capacidade de soft power e de negociação."
Soft power é um termo que descreve a influência de um país em decisões internacionais por meio de sua capacidade de persuasão, sem uso de coerção, poder econômico ou militar.
A diretora do Programa de Estudos Brasileiros da Universidade Oxford, Andreza de Souza Santos, diz que "o mito" de que o Brasil era uma "democracia racial", ou seja, um país aberto à miscigenação e sem racismo, também contribuiu para que o país fosse percebido como aberto, liberal e tolerante.
"O Brasil nunca encarou profundamente o seu legado de escravidão e desigualdade, mas a imagem que se tinha no exterior era a de que havia tolerância religiosa e racial."

Brasil como potencial de ser líder regional

Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso o Brasil passou a ser encarado mais seriamente como país com potencial de influência internacional e liderança regional, diz o professor americano Sabatini, que também integra a Chatham House, uma das instituições de pesquisa mais respeitadas do Reino Unido..
"FHC era um acadêmico de proeminência internacional que corrigiu os rumos da economia quando estava no poder. Ele não recebe os créditos devidos, mas foi responsável por dar maior importância e peso ao Brasil internacionalmente."
Já o ex-presidente Lula seria a "personificação" das expectativas que o mundo tinha em relação ao Brasil.
"A história de Lula representava essa ascensão e modernização do Brasil. Ele é um homem que veio da pobreza num dos países mais desiguais do mundo", diz Sabatini.
"E a nossa percepção é a de que os brasileiros são carismáticos. Lula era muito carismático. Então, ele personalizava o que muitos estrangeiros pensavam sobre o Brasil."
Além disso, nos dois mandatos de Lula, o Brasil viveu um momento de estabilidade financeira e crescimento ecomômico, impulsionado pelo boom no preço das commodities.
floresta desmatadaDireito de imagemRAPHAEL ALVES/AFP
Image captionHá menos de 10 anos, o Brasil era visto como líder na proteção ambiental
Nessa época, lembram Christopher Sabatini e Andreza dos Santos, o Brasil se firmou como liderança ambiental, se comprometendo voluntariamente a reduzir a emissão de gases poluentes.
Com a crise econômica no governo de Dilma Rousseff, a imprensa estrangeira passou a classificar as conquistas econômicas anteriores do Brasil como "bolhas" ou "voo de galinha".
"Muitos perderam a esperança de que o país está destinado ao sucesso e concluíram que foi apenas outro voo de galinha", dizia artigo de 2013 da Economist.
Já no governo Bolsonaro, o Brasil passou a estampar as capas dos jornais como país que não mais se compromete com o combate às mudanças climáticas e cujo líder coloca em xeque direitos de minorias.
As falas de Bolsonaro sobre a comunidade LGBT, mulheres e negros foram amplamente noticiadas no exterior.
Andreza Santos observa que, quando o Cristo apareceu "desgovernado" na capa da Economist de 2013, o foco das críticas ao Brasil era a gestão econômica.
Agora, o noticiário questiona grande parte dos valores antes associados ao Brasil.
"A crítica em 2013 focava no crescimento econômico fraco, na desaceleração, nos problemas orçamentários. Enfim, pintava a imagem de um país bagunçado na gestão financeira", ressalta Santos.
"Agora é muito diferente, é como se os alicerces de imagem do Brasil estivessem se rompendo. Na questão diplomática, por exemplo, o Brasil passou a optar por decisões de confronto com antigos parceiros, quebrando uma tradição consolidada de agir com neutralidade."

Mas é justa a imagem que a imprensa estrangeira faz do Brasil?

Para o professor Sabatini, os discursos do presidente Bolsonaro sobre meio-ambiente e direitos de minorias prejudicam a imagem consolidada do Brasil como país tolerante, aberto às diferenças e vanguardista na proteção ambiental.
Mas ele também critica o que chama de exageros e "bipolaridade" da imprensa internacional ao escrever sobre Brasil. Para Sabatini, a Economist exagerou no otimismo e agora exagera no pessimismo e na "generalização" dos problemas brasileiros.
Ele argumenta que, em 2009, a revista britânica subestimou, por exemplo, o fato de que a economia brasileira ainda se baseava na exportação de produtos básicos, como alimentos, e negligenciou a existência de corrupção no sistema político.
"De certa maneira, aquela capa não foi justa com o Brasil porque não apontou as fragilidades institucionais da economia brasileira e não considerou que muitas daquelas conquistas foram construídas com práticas corruptas", disse.
"Ou seja, a primeira reportagem superestimou as conquistas e ignorou as vulnerabilidades do Brasil. A segunda capa, do Cristo em colapso, é injusta com o Brasil, porque é uma consequência do próprio erro anterior da Economist ao analisar o Brasil."
Para Sabatini, a imprensa estrangeira em geral, ao se propor a fazer reportagens analíticas sobre o Brasil, continua a errar no tom e na "generalização" das responsabilidades.
Assinatura de acordoDireito de imagemEPA/FRANCK ROBICHON
Image captionUnião Europeia adverte que acordo com Mercosul depende de cumprimento de compromissos ambientais pelo Brasil
"Claro que o ritmo do desmatamento é preocupante e é um fato que o governo Bolsonaro deu sinal verde, direta ou indiretamente, para que isso acontecesse. Mas essa é parte da história e não reflete a prática de grande parte da agricultura praticada no Brasil. Esse aspecto de produção sustentável não é retratado pela imprensa", diz Sabatini.
O professor lembra ainda que alguns anos atrás o Brasil era celebrado pela produção de alimentos e visto como nação necessária para garantir a segurança alimentar do mundo.
"Há um comportamento bipolar. Antes, o Brasil era divulgado como o país que ajudará a combater a fome no mundo. Agora, a imprensa estrangeira exclama que o país está destruindo a floresta e culpa a agricultura."
Na reportagem sobre os riscos para a Amazônia no governo Bolsonaro, a Economist faz um apelo para que os países compradores de produtos brasileiros condicionem parcerias comerciais a um "bom comportamento por parte do Brasil".
Recentemente, a União Europeia fez um alerta ao Brasil ao dizer que o acordo de comércio entre Mercosul e União Europeia, que ainda precisa ser ratificado, está condicionado ao compromisso com a proteção ambiental e dos povos indígenas.

Que consequências a erosão da imagem do Brasil pode ter?

Andreza Santos, da Universidade Oxford, afirma que a redução do prestígio internacional do Brasil pode influenciar negativamente a capacidade de o país atrair investimentos, turistas e parcerias.
Apesar de não ter grande poderio militar nem estar entre as cinco maiores economias, o Brasil conseguiu usar o soft power para ter destaque em organismos internacionais e obter vantagens econômicas em negociações comerciais com grandes potências.
Atualmente, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e a Organização Mundial do Comércio (OMC) são presididas por dois brasileiros: José Graziano da Silva e Roberto Azevêdo, respectivamente.
"A imagem do Brasil no exterior afeta parcerias comerciais, cooperação cientifica e tecnológica, e o turismo", lista Santos.
Sabatini compartilha essa opinião.
"Embora eu enxergue equívocos na cobertura da imprensa internacional, é verdade que o nacionalismo de Bolsonaro, seus planos sobre demarcação indígena e o discurso sobre minorias geram uma preocupação genuína", diz.
"Os aspectos que tornavam o Brasil atrativo para muita gente, como a imagem de progressista, de potencial líder do hemisfério sul e de ser uma liderança na cultura e na proteção ambiental, estão se desfazendo", conclui o professor americano.
Professor Edgar Bom Jardim - PE