domingo, 13 de agosto de 2017

O Brasil sente fome

"A gente não vive, vegeta"

Dona Ester cuida de cadeirantes; Leydiane é mãe, viúva, e suspeita estar grávida; Felipe vive em barraco inflamável
São quatro graus de fome de acordo com a Escala Brasileira de Segurança Alimentar (Ebia), que mensura a percepção das famílias em relação ao acesso aos alimentos, através de questionário aplicado conjuntamente com a Pesquisa Nacional de Amosta de Domicílio (PNAD). 

No Grau 1, as pessoas têm acesso regular aos alimentos. O Grau 2 é leve: há incerteza quanto ao acesso a alimentos no futuro ou qualidade inadequada dos alimentos. Já o Grau 3 aponta para uma situação moderada, com redução quantitativa de alimentos entre os adultos e/ou ruptura nos padrões de alimentação resultante da falta de alimentos entre adultos. Por fim, no Grau 4, a situação é grave: é quando há redução quantitativa de alimentos entre crianças e/ou quando alguém fica o dia inteiro sem comer por falta de dinheiro para comprar alimentos.


Situação de insegurança alimentar: Grau 4 - grave 

Leidyane da Silva, 22 anos | Escolaridade: 7º ano do Ensino Fundamental
Mikaele da Silva, 4 anos. | Escolaridade: Está na pré-escola
Renda fixa familiar total: R$ 141 do Bolsa Família
Bairro do Pina, Zona Sul do Recife


Há três formas de entrar na comunidade de palafitas localizada entre as pontes do bairro do Pina: pela abertura no muro no início da ponte que liga Boa Viagem ao Centro do Recife, por um portão atrás do Centro Esportivo da comunidade ou pela água. São em torno de 30 famílias vivendo na e da maré, quantitativo que cresceu nos últimos tempos.

Esta é uma comunidade de pescadores, famílias que tiram o sustento da água, que vivem entre as pontes. É fácil ver; difícil é entender como vivem a andar pelas vielas suspensas que se equilibram, tábua sobre tábua. Ali, todo mundo tem cachorro, criam galinhas, galos. Os barracos, um colado do outro, têm frestas por onde se vê a água, por onde entram ratos, por onde pode até cair crianças. Ali, as pessoas se ajudam e não morrem de fome por isso, porque, se falta, alguém vai aparecer, de longe ou de perto, para socorrer.

Leydiane da Silva, 22 anos, viúva e mãe, diz que suspeita estar grávida. Fumando, conta que a menstruação está atrasada e que faz dias que não tem notícias do “namorido”. O falecido marido, pai dos dois filhos que teve, foi assassinado poucos meses depois que o caçula morreu afogado na maré. “Descuidei um instante, ‘mulé’. Estava organizando a festinha de um ano dele”, conta. Mikael Marlisson faria um ano no dia seguinte à sua morte. Mikaele, a irmã, de 4 anos, chega perto e diz, sorrindo: “um carro veio e levou meu irmão, levou meu pai”. As duas moram em um barraco, construído pela própria Leydiane, de um vão só. “Olhe, desculpe a bagunça, é que a eu me mudei pra cá na ‘tóra’”.

Leydi só estudou até a 8ª série porque, depois que engravidou, “ficou difícil ir à escola”. Até o começo deste ano, trabalhava em uma empresa de recicláveis, um subemprego sem carteira assinada e que lhe rendia salário inferior ao mínimo, pago por quinzena. Ficou mais de um ano, mas desistiu, cansou de tanta ruindade. Hoje, sobrevive da ajuda dos parentes, da parceria com a prima, Mikeline, e do Bolsa Família de Mikaele. Quando chegamos para conversar, Leydi e Mikeline se organizavam para fazer o almoço, financiada por uma partilha organizada de trocados.

Fizeram fogo debaixo da ponte usando pedaços de madeira e fitas pretas inflamáveis que fazia uma fumaça mal cheirosa que incensou o ambiente, embora aberto. Entre uma pergunta e outra, mexia o feijão, recebia mais um trocado e corria para comprar o complemento do almoço. Naquele dia, uma terça, comeriam feijão e arroz com peixe pescado ali mesmo, mas “inteiraram” macarrão e fígado. “Fazer o fogo aqui já economiza gás”, ensina. Mikeline se queima no “fogão”, mas volta medicada. “É creme de cabelo, não faz mal não”.

Pergunto a Leidyane o que ela faz com os R$ 140 que recebe de Bolsa Família todos os meses. “Compro umas coisinhas e, o resto, pago a televisão. São R$ 131 por mês, mas só faltam dois meses para terminar”, conta. Repito o que ouço, e ela confirma. “Não dá para ficar sem televisão, né, Tati?”. Mas o que não dá são os R$ 9 que sobram. A conta é impossível. “É difícil faltar, sabe? Mas porque a gente é ‘das correrias’. Quando falta comida, a gente vende o que tem. Dia desses foi o micro-ondas. Sururu tá ruim, então rende pouco. Bom, chega a R$ 12, mas do jeito que tá, fica entre R$ 5 e R$ 8 (o quilo)”.

Tia
Ester Gomes da Silva, 50, é tia de Leidyane. Todos os moradores que contaram suas histórias, emendavam o relato com um “pior é aquela mulher ali, que cuida de duas paralíticas”. Era Ester. Ela sobrevive de benefícios sociais, cuidando de uma filha (Evelin Vitória que, ela conta, é “convulsiva”) e a irmã, Marleide (“paralítica depois de uma queda”). As “especiais” têm 16 e 46 anos e estão sobre as costas curvadas, sobre o corpo magro de Dona Ester, uma mulher de olhar extremamente triste e fala lamuriosa. “Vendo sururu e marisco, mas, minha fia, como eu vou trabalhar se tenho que cuidar delas?”.

Marleide está só de passagem pela casa de Dona Ester e, quando voltar pra a dela, levará consigo a maior parte da renda que hoje sustenta a família. São R$ 1.235 (sendo cerca de R$ 900 do benefício de Marleide). “O dinheiro não dá pra nada. Compro fraldas, remédio, arroz, feijão, miojo, farinha, óleo, iogurte. Fruta e verdura, só quando sobra. Geralmente, só tomate e cebola”, conta. O dinheiro acaba ainda no meio do mês. “Aí a gente vai se virando com pão e leite para encher. Quando tenho, compro bastante ovo e salsicha”. Quando a reportagem esteve na casa, a geladeira só tinha peixe.


Situação de insegurança alimentar: Grau 3 -moderada
Ana Lúcia Fernandes, 50 anos. | Escolaridade: 1ª série do Ensino Fundamental
Profissão: marisqueira
Renda mensal: varia, mas até novembro, terá R$ 250 do auxílio aos pescadores

A reportagem foi duas vezes na comunidade entre as pontes e só na segunda conseguiu conversar com Dona Ana Lúcia Fernandes, 50 anos. Inquieta, ela andava de um lado para o outro, mas aceitou a entrevista. Conta que sempre morou na maré, sempre foi marisqueira, e que foi a construção do shopping que a tirou dali por um tempo. “Tenho um apartamento no conjunto Via Mangue I. Chegaram pra tirar a gente do outro lado (da comunidade que foi desapropriada), mas a gente vive de maré. Se tirarem a gente daqui, vamos viver de que?”.

Ficou caro pra Dona Ana continuar no imóvel que recebeu. Só de conta de luz, R$ 150, inviável. “Aqui, não pago nem água nem luz. Fechado, lá, ainda me cobram R$ 16. Imagine lá dentro, usando ventilador”, conta. Como marisqueira, começou a receber o auxílio na “baixa da pesca” (quatro parcelas de R$ 250). Com o dinheiro, compra “massa, leite, fralda, feijão, arroz, macarrão e passa o mês”.

“Fruta? Filha, a gente não vive, vegeta. Se vai para o apartamento, fica pior. Porque ali não tem como ganhar dinheiro”. Dona Ana conta que nunca trabalhou de carteira assinada na vida porque acredita que “trabalhar pra rico é ser escravo de dois”. Em cima de uma mesa, um pedaço de frango descongela para o almoço que seria serviço para cinco pessoas. “Dá uma beirinha pra cada um e todo mundo come, só não morre de fome”, diz, em tom de brincadeira. 
Fonte: Folha de Pernambuco
Publicado em 13/08/2017.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Salário de servidor será congelado.


Com a revisão da meta de deficit deste ano e de 2018 praticamente definida, a equipe econômica prepara medidas para cortar gastos e aumentar receitas. Pelo lado dos gastos, o governo congelará salários de servidores em 2018 para economizar R$ 9,8 bilhões.

Serão atingidos professores, militares, policiais, auditores da Receita Federal, peritos do INSS, diplomatas e oficiais de chancelaria e carreiras jurídicas. Outras categorias poderão ser incluídas. Além disso, o salário inicial de novos servidores ficará restrito a R$ 5.000 e haverá corte de benefícios como auxílio-moradia e ajuda de custo em casos de remoção.

Embora tenha desistido de aumentar o Imposto de Renda, benefícios tributários devem ser revistos para melhorar a arrecadação. O Ministério do Planejamento espera o envio da nova proposta de reoneração da folha de pagamento para o Congresso. A medida provisória que tratava do assunto enfrentou resistência, iria perder a validade nesta semana, e o governo decidiu revogar o texto para que o tributo referente a julho não fosse cobrado das empresas.

Outra aposta é o Refis. A equipe econômica aposta em reverter as mudanças feitas por comissão da Câmara, que alterou a medida provisória e concedeu mais benefícios do que o planejado. A previsão era obter R$ 13,8 bilhões, mas só entraram R$ 3,5 bilhões, e o prazo de adesão vence em 31 de agosto.

Sem esses recursos, a conta não fecha e ficará difícil cumprir as metas de deficit que devem ser anunciadas na segunda-feira (14). Para 2017, a meta passará de R$ 139 bilhões para R$ 159 bilhões. Para 2018, de R$ 129 bilhões também para R$ 159 bilhões. 
Publicado em 13/08/2017.
Com Folha de Pernambuco/
Professor Edgar Bom Jardim - PE

A extrema-direita está em ascensão nos EUA?


Membros da Ku Klux Klan em protesto em Charlottesville, neste semanaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionExistem dezenas de grupos afiliados à KKK nos EUA, de leste a oeste

A violência que tomou conta das ruas de Charlottesville, uma cidade universitária no conservador estado da Virgínia, nos EUA, no sábado, tem como pano de fundo o dramático aumento na proeminência de grupos de extrema-direita no país.
A eleição de Donald Trump para a Casa Branca é citada como um fator que reenergizou ativistas e grupos que não apenas rejeitam ideologias de esquerda, como também do establishment conservador.
Ao mesmo tempo, sites de mídia social colaboram para a promoção destas visões de mundo.
A organização em prol dos direitos civis Southern Poverty Law Center (SPLC), que monitora mais de 1,6 mil grupos com discurso de ódio no país, diz que os pensamentos de extrema-direita foram "os mais bem sucedidos" em ganhar espaço no discurso político dominante.
Mas quem são esses grupos? Quão populares são? E o que querem conquistar?
A BBC Brasil reúne algumas das mais agremiações mais proeminentes nos EUA hoje em dia.



Homem atropela manifestantes antirracismo em cidade dos EUA

Alt-right

Eles adoram provocar, deploram o politicamente correto e idolatram Donald Trump.
São conhecidos pelo termo alt-right - uma abreviação de alternative right, ou direita alternativa - que muitos críticos descrevem como nacionalistas brancos ressentidos pelo avanço dos direitos civis de negros, mulheres e gays nas últimas décadas.
O movimento existe principalmente online mas, como não requer afiliação formal, não é possível dizer quantos membros possui.
Segundo Allum Bokhari e Milo Yannopoulos, do site de extrema-direita Breitbart - influente na ideologia de Trump -, facções da alt-right incluem os "intelectuais", "conservadores naturais" e a "equipe de memes" - jovens ativistas dispostos a trollar os rivais nas mídias sociais.
Os pilares da ideologia são a "identidade branca" e a "civilização ocidental tradicional", segundo Richard Bertrand Spencer, que criou o termo em 2008. Liberdade, liberdade de expressão e o direito a ofender também estão na sua cartilha.
O crescimento da alt-right foi impulsionado pela campanha presidencial de Trump, no ano passado.
Em julho de 2016, então pré-candidato republicano à Casa Branca, Trump tuitou uma imagem de Hillary Clinton ao lado de uma estrela de seis pontas - parecida com a estrela de Israel - e a seguinte frase: "A Candidata Mais Corrupta da História!"
Ao longo da campanha, ele seria acusado de anti-semitismo, machismo, anti-islamismo e puro e simples racismo.



Supremacistas brancos e grupos antirracismo entram em confronto nos EUA

Ku Klux Klan (KKK)

O grupo supremacista branco mais temido da história americana foi formado por ex-Confederados após a Guerra da Secessão (1861-65), na qual os estados escravagistas do sul saíram derrotados.
A KKK se multiplicou no sul americano no início do século passado e daí se projetou nacionalmente. Membros encapuzados, marchando à luz de tochas e batendo às portas das casas de seus inimigos para "julgá-los" pelos seus crimes viraram uma ocorrência comum nessa época.
Durante esse turbulento período, grupos supremacistas brancos promoveram linchamentos, enforcamentos e assassinatos de negros.
Além de discriminar contra afro-americanos, judeus e imigrantes, mais recentemente a KKK se posiciona contra gays, lésbicas e a população LGBT de forma mais ampla.
Tornou-se um movimento com o objetivo de evitar que esses grupos alcancem as mesmas liberdades e direitos civis que outros americanos. Suas facções o descrevem como "uma organização branca, patriótica e cristã enraizada na Ku Klux Klan do início do século 20."

Supremacistas brancos em marcha de extrema-direita em Charlotesville, na VirgíniaDireito de imagemREUTERS
Image captionSupremacistas brancos foram vistos usando uniformes militares e carregando armas

Segundo o Southern Poverty Law Center, há grupos afiliados à KKK em quase todos os Estados americanos, reunindo entre 5 mil e 8 mil membros.
No ano passado, o grupo disse que estava experimentando "um forte aumento no número de afiliados no Sul profundo", os rincões dos Estados sulistas americanos.

Neonazistas

Embora o nazismo original de Adolf Hitler não se retratasse nem como esquerda nem direita - propunha ser, segundo os historiadores, uma "terceira via" - os neonazistas de hoje se colocam assumidamente na extrema direita.
Com isso, compartilham ideais anti-semíticos e veneram a Alemanha nazista de Adolf Hitler. São protegidos pela Primeira Emenda da Constituição americana e decisões judiciais tomadas nas cortes americanas.
Em um caso proeminente, o Supremo americano invocou a Primeira Emenda para garantir o direito de um grupo neonazista de protestar na cidade predominantemente judia de Skokie, Illinois, portando suásticas.
Há diversos grupos neonazistas nos EUA, incluindo o Partido Nazista Americano e o Movimento Socialista Nacional (NSM, sigla em inglês). O mais visível deles, porém, é a Aliança Nacional (NA), cujo braço Vanguard America participou dos eventos em Charlottesville.
Os números mais recentes estimam que havia 2,5 mil afiliados em 2012, embora uma reportagem no New York Times de 2011 falasse em 400.
Muitos deles estão na Virgínia, embora seu alcance chegue a 32 dos 50 Estados americanos. Segundo o SPLC, também aumentam os vínculos entre neonazistas europeus e americanos.

Outros grupos

Movimento Socialista Nacional (NSM, sigla em inglês) - Fundado em 1994, é um dos maiores grupos neonazistas dos EUA, com braços em mais de 30 Estados.
Conselho de Cidadãos Conservadores: Fundado em 1985 e originado a partir de movimentos pró-segregação nos Estados do sul americano.
Partido da Liberdade Americano: Fundado em 2009, com origens na Califórnia. A agremiação defende uma agenda racista e anti-migratória.
Fonte: BBC Brasil.
Publicado em 13/08/2017.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

sábado, 12 de agosto de 2017

Foto da Semana

Semana do Estudante
Colégio Sant'Ana - Bom Jardim.
Publicado em 12/08/2017.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

E ninguém faz nada


O Brasil do gol
pe adentrou agosto. São 16 meses de práticas implacáveis de desmonte do Estado de Direito. E o povo brasileiro, rumo ao precipício, lembra o diálogo poético de Bertolt Brecht com Vladimir Maiakovski, pois ouve a falácia de que o País está quebrado e que, por isso, haverá cortes na carne.
Depara-se, porém, com a prática contraditória do aumento do percentual de cargos comissionados a ser ocupados na administração pública por não-concursados, reajuste nos salários do Judiciário, diplomatas, ministros do Supremo Tribunal Federal, entre outros cargos do alto escalão, licitações para a contratação de avião para um governo inadimplente.
Para sangrar o povo, decreta-se o congelamento por 20 anos nos investimentos em políticas sociais, retira-se o financiamento em pesquisas, asfixia-se as universidades públicas, pratica-se o calote no pagamento de salários de servidores públicos.
E ninguém faz nada. Talvez pela incerteza de se estar vivo daqui a 20 anos, talvez por crer que o golpe só prosseguirá até as eleições de 2018, talvez por não se reconhecer usuário das políticas sociais, estudantes e funcionários da administração pública.
Lá se vai o pré-sal nas mãos internacionais e para as mesmas mãos caminham o aquífero Guarani e as terras da Amazonas.
E ninguém faz nada. Talvez por não perceber a presença e o peso do petróleo e de seus derivados em seu próprio dia-a-dia. Talvez por não saber que as maiores reservas de água do planeta estão nos aquíferos brasileiros. Talvez por não entender a importância da floresta amazônica.
Abrindo mais as veias da nação brasileira, aprovam a contrarreforma trabalhista, arquivam a denúncia de corrupção passiva do chefe do Executivo e garantem a manutenção dos mesmos com a aprovação de uma escandalosa contrarreforma política, o “distritão”.
E ninguém faz nada. Talvez por não se perceber trabalhador, trabalhadora, afetado por essa contrarreforma. Talvez por saber que, com ou sem processo, a justiça nunca alcança aqueles que estão no poder. Talvez por desacreditar na política brasileira.
Enquanto tudo isso acontece, as esquerdas brasileiras batem boca e deixam a UERJ e os funcionários do estado do Rio de Janeiro na agonia. Fracionadas, apenas de quando em quando erguem suas frágeis bandeiras em marchas cívicas que convocam para as avenidas de sempre. As esquerdas não se apresentam, ou, no máximo, aparecem tímidas à resistência de categorias trabalhistas, dos povos indígenas, de populações periféricas. Acantonadas, soltam as vozes que culpam o povo por não reagir. As esquerdas investem na fé, na crença de que o golpe desembocará na foz de eleições democráticas em 2018.
De Carta Capital
Publicado em 12/08/2017.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Ideias de satanás resistem


Supremacistas e nacionalistas carregam tochas em protesto em Charlottesville, VirginiaDireito de imagemREUTERS
Image captionProtestos carregando tochas marcam a história de grupos supremacistas como a Ku Klux Klan

Centenas de homens e mulheres carregando tochas, fazendo saudações nazistas e gritando palavras de ordem contra negros, imigrantes, homossexuais e judeus.
Foi a cena - surreal, para muitos observadores - que desfilou aos olhos da pacata cidade uinversitaria de Charlottesville, no Estado americano de Virgínia.
O protesto, na noite da sexta-feira, foi descrito pelos participantes como um aquecimento para o evento "Unir a Direita", que acontece na tarde deste sábado na cidade e promete reunir mais de mil pessoas, incluindo os principais líderes de grupos associados à extrema direita no país.
A cidade, de pouco mais de 50 mil habitantes e a apenas duas horas de Washington, foi escolhida como palco dos protestos após anunciar que pretende retirar uma estátua do general confederado Robert E. Lee de um parque municipal.
Durante a Guerra Civil do país (1861-1865), os chamados Estados Confederados, do sul americano, buscaram independência para impedir a abolição da escravatura. Atualmente, várias cidades americanas vêm retirando homenagens a militares confederados - o que tem gerado alívio, de um lado, e fúria, de outro.

Cartaz contra a Ku Klux KlanDireito de imagemAFP
Image captionManifestantes contra o movimento abertamente fascista, que incluiu grupos supremacistas brancos como a Ku Klux Klan

Os participantes do protesto desta sexta-feira carregavam bandeiras dos Confederados e gritavam palavras de ordem como: "Vocês não vão nos substituir", em referência a imigrantes; "Vidas Brancas Importam", em contraposição ao movimento negro Black Lives Matter; e "Morte aos Antifas", abreviação de "antifascistas", como são conhecidos grupos que se opõem a protestos neonazistas.
Estudantes negros do campus da universidade da Virginia, onde ocorreu a marcha, e jovens que se apresentavam como antifascistas tentaram fazer uma "parede-humana" para impedir a chegada dos manifestantes à parada final do marcha, uma estátua do terceiro presidente americano, Thomas Jefferson.
"Fogo! Fogo! Fogo!", gritavam os manifestantes, enquanto se aproximavam do grupo de estudantes.
Em número bem menor, o grupo que fazia oposição à marcha foi expulso da estátua em poucos minutos. A reportagem flagrou homens lançando tochas sobre os estudantes, enquanto estes, por sua vez, dispararam spray de pimenta nos olhos dos oponentes.
A polícia, que acompanhou todo o protesto de longe, interviu e separou os dois grupos, enquanto ambulâncias se deslocavam ao local para socorrer feridos pelo confronto.
"Esta manifestação é ilegal", afirmou um dos oficiais aos manifestantes, que se afastaram. A polícia não confirmou se houve presos.

Nazis

"Sim, eu sou nazista, eu sou nazista, sim", afirmou um homem, em frente à reportagem, durante uma discussão com um dos membros do grupo opositor.
Ao contrário das especulações anteriores, a marcha incluiu muitas mulheres, que também seguravam tochas.

Tensão em protesto em Charlotteville, EUADireito de imagemREUTERS
Image captionManifestação rodeia grupo de anti-fascistas que tenta proteger a estátua do ex-presidente ameticano Thomas Jefferson

A BBC Brasil conversou com um pai e uma mãe que levaram a filha de 14 anos ao protesto. "Eu aprendi com meu pai que precisamos defender a raça branca e hoje estou passando este ensinamento para a minha filha", afirmou o pai.
"Se não fizermos algo, seremos expulsos do nosso próprio país", disse a mãe. A conversa foi interrompida por um homem forte e careca. "Vocês estão falando com um estrangeiro. Olha o sotaque dele!", afirmou, rindo, em referência ao repórter.
A família se afastou e se juntou ao coro, que cantava "Judeus não vão nos substituir". Os três seguravam tochas.
Outro homem afirmou que estava ali porque "têm o direito de se expressar".
"Gays, negros, imigrantes imundos, todos eles se manifestam e recebem apoio por isso. Porque quando homens brancos decidem gritar por seus direitos e sua sobrevivência vocês fazem esse escândalo?", questionou o homem a um grupo de jornalistas.
Perto dali, sozinho, um rapaz jovem estendia a mão e fazia uma saudação nazista, enquanto era fotografado por fotojornalistas e gritava: "Vocês não vão nos substituir".
As tochas são uma marca da Ku Klux Klan, grupo fundado pouco depois da guerra por ex-soldados confederados - derrotados no conflito. Originalmente concebida como um clube recreativo, a KKK rapidamente começou a promover a violência contra populações negras do sul dos EUA.
Por muitas décadas, grupos supremacistas brancos promoveram linchamentos, enforcamentos e assassinatos de negros.

Richard Spencer, fundador do termo alt-right, que estará presente nos eventos deste sábadoDireito de imagemREUTERS
Image captionRichard Spencer, fundador do termo alt-right, que estará presente nos eventos deste sábado

Não houve referências ao presidente americano Donald Trump durante todo o ato. Mas as críticas à imprensa eram constantes e faziam coro com o slogan de Trump: "Não temos medo de 'fake news', seus mentirosos".
Chorando muito, uma estudante era amparada por amigos. "É pior do que a gente pensava. É muito pior. Isso vai virar um inferno."
"A negra está assustada!", gritou uma mulher, rindo junto a um grupo de homens portando tochas.

Alt-right

O prefeito de Charlottesville divulgou uma nota após a marcha, classificando o ato como "uma parada covarde de ódio, fanatismo, racismo e intolerância".
"A Constituição permite que todo mundo tenha o direito de expressar sua opinião de forma pacífica, então aqui está a minha: não só como prefeito de Charlottesville, mas como membro e ex-aluno da universidade de Virginia, fico mais do que incomodado com essa demonstração não-autorizada e desprezível de intimidação visual em um campus universitário".
Para o protesto deste sábado, são esperadas figuras como Richard Spencer, criador do termo alt-right, uma abreviação de "alternative right", ou "direita alternativa", em português. O grupo é acusado de racismo e antissemitismo e têm representantes no governo de Donald Trump.
Esta é a segunda vez que a cidade se torna sede de protestos de grupos supremacistas. Em 8 de julho, aproximadamente 40 membros da sede local da Ku Klux Klan também acenderam tochas em Charlottesville.
Presidente de um organização que define como "dedicada à herança, identidade e ao futuro de pessoas de ascendência europeia nos EUA", Spencer ganhou visibilidade internacional por fazer a saudação "Hail Trump, hail nosso povo, hail vitória", logo após a eleição do republicano.
Formado em filosofia política na Universidade de Chicago, Spencer já declarou que o ativista negro Martin Luther King Jr. era uma "fraude" e um símbolo da "desconstrução da Civilização Ocidental".
Também disse que imigrantes latinos nos EUA estavam "se assimilando ao longo das gerações rumo à cultura e ao comportamento dos afro-americanos" e lamentou que o país estivesse se tornando diferente da "América Branca que veio antes". DE BBC.

"Sou nazista, sim": O protesto da extrema-direita dos EUA contra negros, imigrantes, gays e judeus. Fonte:BBC

Publicado em 12/08/2017.
Professor Edgar Bom Jardim - PE