quinta-feira, 26 de abril de 2018

Economia: Brasileiro acha que artesanato é coisa de pobre, diz Ronaldo Fraga


Ronaldo Fraga com bordadeiras de Mariana (MG)Direito de imagemANA COLLA
Image captionEstilista Ronaldo Fraga usou em sua coleção na SPFW o trabalho de bordadeiras da região de Mariana (MG)
O trabalho de bordadeiras da região da tragédia ambiental de Mariana (MG) é o foco da nova coleção do estilista mineiro Ronaldo Fraga, apresentada na 45ª edição da São Paulo Fashion Week, que acontece nesta semana.
Considerado um dos mais críticos estilistas brasileiros, ele defende a moda como "um ato político" e já trabalhou com outros temas atuais em suas coleções, como a questão dos refugiados, da transfobia e da sustentabilidade.
Na edição 2017 da semana de moda de São Paulo, em agosto, ele chegou a usar uma camiseta criticando as políticas ambientais do presidente Michel Temer. E, em edições anteriores do evento, recebeu tanto elogios por incentivar a diversidade ao levar idosos, deficientes e pessoas acima do peso para desfilar moda praia, como críticas dos que consideraram racista e de mau gosto o fato de ele ter enfeitado o cabelo de modelos com palha de aço.
Pioneiro em desenvolver parcerias com comunidades artesãs para a produção de suas roupas, Fraga critica, em entrevista à BBC Brasil, o que vê como preconceito com os produtos artesanais nacionais. "O artesanato brasileiro é visto como coisa de pobre, feito para comprar para ajudar gente pobre", diz.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista:
BBC Brasil - Sua nova coleção traz trabalhos das bordadeiras da região de Barra Longa, atingida diretamente pela tragédia em Mariana (em 2015, o rompimento de uma barragem da mineradora Samarco inundou de lama diversas comunidades da cidade mineira). Há uma preocupação de que esse ofício se perca nesse local? Qual seu objetivo com isso?
Ronaldo Fraga - Gerar emprego e renda com reafirmação e apropriação cultural. É isso que faz com que mantenha-se o corpo e a musculatura do saber. E mais: que estimule a geração que está por vir a enxergar isso como valor.
Modelo do desfile de FragaDireito de imagemMARCELO SOUBHIA / FOTOSITE
Image captionModelo do desfile de Fraga: 'O que interessa é a moda ser entendida como cultura - isso é indiscutível', diz estilista
BBC Brasil - Mas o artesanato brasileiro é visto dessa forma pela nossa sociedade? Há algum tipo de preconceito?
Fraga - Claro. Há muito preconceito do brasileiro com nosso artesanato. O artesanato brasileiro é visto como coisa de pobre, feito para comprar para ajudar gente pobre. As pessoas não têm a educação, o saber e a boa vontade para poder ter o mínimo de esforço em enxergar a ancestralidade, a formação de um povo ali. Isso é muito característico de um país colonizado, porque eternamente vai achar uma renda europeia infinitamente mais bonita do que uma renda brasileira, quando essa renda brasileira conta a história desse povo.
Esse bordado de Barra Lagoa por exemplo, ele veio para o Brasil através dos portugueses no século 18, nos áureos tempos (das cidades mineiras) de Mariana e Ouro Preto. E Barra Lagoa era o polo dessa produção. Após essa tragédia ambiental nós corremos o risco de uma tragédia cultural porque, estigmatizadas, essas pessoas estão largando suas terras, mudando de cidade. Corremos o risco de esse saber desaparecer. Então é preciso que as novas gerações entendam esse valor.
(...) Quando resolvi trabalhar com esse grupo de Mariana, falei: não quero reportar a tinta da tragédia. A marca da tragédia já está aí, você não precisa ir até lá. Mas nós vamos falar de uma população que, passada a tragédia, é estigmatizada por ter feito parte daquilo. As pessoas estão recebendo dinheiro para ir embora e deixar sua terra. Por isso, o risco de esses saberes desaparecerem é muito grande.
BBC Brasil - Você trata da moda como um vetor cultural. Mas a semana de moda de São Paulo também olha para o mercado. Há uma divisão entre a moda mais conceitual, artística e cultural e essa mais comercial?
Fraga - As pessoas costumam dizer: "moda é arte". E eu digo: "alto lá!". Nem sempre a moda é arte, nem sempre a gastronomia é arte, nem sempre a arquitetura é arte. Dependendendo de quem a faz ou a forma como é feita, ela pode ser arte. Mas nem é essa a questão que interessa. O que interessa é a moda ser entendida como cultura - isso é indiscutível. Então a moda que está sendo feita nas lojas de departamento, a moda que é feita por X ou Y: o que está sendo feito ali é cultura, porque o vestir é um documento eficiente do tempo.
(...) E em um país tão diverso como o Brasil é importante que uma semana de moda tenha essa diversidade. Eu acharia ruim se houvesse só o aspecto comercial e acho que as novas marcas que estão entrando na SPFW têm um apelo bem comercial, mas isso também é uma cara desse tempo. Basta olhar as escolas de moda, onde você esperaria ver algo novo, (mas) acontece o contrário: é justamente ali que os alunos estão reproduzindo vitrines de lojas internacionais.
Modelos no desfile de Ronaldo FragaDireito de imagemMARCELO SOUBHIA / FOTOSITE
Image caption'Se o mundo parasse de produzir roupas, a gente teria roupa para mais 300 anos', diz estilista; acima, modelos da sua marca na SPFW
BBC Brasil - Você já fez uma coleção inspirada na Zuzu Angel, estilista que usou a moda não apenas como cultura, mas como uma forma de fazer política, crítica. Hoje em dia, pensando no momento de crise que o Brasil enfrenta em diversos segmentos, inclusive o político, há espaço para essa discussão na nossa moda?
Fraga - Eu sempre defendi que o ato de vestir é um ato político, tanto para quem cria como para quem veste. E as minhas coleções têm delineado uma linha trajetória política.
Nós estamos vivendo um momento de ebulição, de mudança, de desenho de uma nova época, então acho quase impossível ignorar isso. E entender que não é essa política que fica em briga de partido não, entendeu? Temos que pensar a política de uma forma mais ampla.
BBC Brasil - Há uma outra questão "política" no universo da moda que é o consumo exacerbado, influenciado pelas marcas de fast fashion, muitas denunciadas por trabalho escravo. Você acha que isso vem sido discutido da maneira como deve na moda aqui do Brasil?
Fraga - Claro que não! E é muito difícil que seja porque a gente tem um déficit de educação e de cultura geral gigantesco. Como você vai dizer para uma menina pobre de 15 anos que quer um sapato de uma loja onde o par custa 20 reais e um vestidinho 30 reais que essas peças podem até não terem sido produzidas com mão de obra escrava no Brasil, mas na Ásia? Ela quer simplesmente esse vestido com o pouco dinheiro que tem.
(...) E mais: a gente não precisa de mais roupa. Se o mundo parasse de produzir roupas, a gente teria roupa para mais 300 anos. Então é preciso que a gente compre menos e de forma mais consciente. Quanto mais se produz, mais se polui, e esse é o impacto que a gente está gerando.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Encontro histórico entre os líderes das Coreias

O presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, e Kim Jong-un, da Coreia do NorteDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionO presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, e Kim Jong-un vão se encontrar nesta sexta-feira
Kim Jong-un, líder norte-coreano, se reúne nesta sexta-feira pela primeira vez desde que assumiu, em 2011, com o presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in.
O encontro será parcialmente transmitido pela televisão.
Esta é também a primeira vez que Kim - à frente de um país fechado, com relações diplomáticas com poucos países - será publicamente visto em uma situação desse tipo. Recentemente, o líder norte-coreano reuniu-se com o presidente chinês, Xi Jinping, mas as conversas ocorreram de forma secreta e não foram relatadas até que terminassem.
A reunião crucial será a primeira de alto nível entre os líderes das duas Coreias em mais de uma década, e há muito em jogo.
Depois de um ano de crescentes tensões, a situação da península coreana se acalmou, e já se fala sobre a desnuclearização ou um acordo de paz que ponha fim oficialmente à guerra que opôs as Coreias e terminou em 1953 com um armistício.
A situação, no entanto, é difícil. Aqui, contamos algumas das coisas que você pode esperar deste encontro histórico:

1- Kim atravessa para o Sul

Embora não seja a primeira reunião de líderes de ambas as Coreias desde a guerra na península, será a primeira vez que o líder norte-coreano cruza para o Sul.
Kim Jong-il, pai e antecessor do atual líder norte-coreano, reuniu-se com presidentes do Sul em duas ocasiões: primeiro com Kim Dae-jung, em 2000, e depois com Roh Moo-hyun, em 2007, e ambos os encontros ocorreram em Pyongyang.
South Korean President Moon Jae-InDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionMoon já havia tentado um encontro anterior com Kim
Nesta ocasião, espera-se que às 9h30 do horário local (21h30 em Brasília), Kim Jong-un vá para a Zona Desmilitarizada na fronteira intercoreana e atravesse a pé a linha de demarcação que divide os dois países.
Lá, o estará aguardando o presidente Moon Jae-in e ambos serão escoltados por uma guarnição de honra para a chamada "Casa da Paz", o pavilhão onde a cúpula será realizada, no lado sul-coreano daquela parte da fronteira.
As conversas formais começarão uma hora depois, às 10h30 do horário local, de acordo com o Sul. Ambos comerão separadamente, plantarão uma árvore de forma simbólica e depois continuarão as discussões.

2- A irmã

Na equipe que acompanhará o jovem líder norte-coreano destaca-se sua irmã, Kim Yo-jong.
Kim Yo-jong ocupa o cargo de diretora de propaganda do governo e, no ano passado, teve um papel de destaque na agenda política do regime.
Ela foi encarregada de viajar para a Coreia do Sul em fevereiro durante as Olimpíadas de Inverno, com o objetivo de abrir caminho para que a cúpula de líderes pudesse ser realizada.
O presidente sul-coreano vai realizar um jantar em homenagem a Kim na sexta-feira e, embora eles saibam até os detalhes do cardápio, a presença das esposas dos líderes ainda é uma incógnita.

3 - Armas nucleares

Um homem assistindo a um discurso de Kim Jong-unDireito de imagemAFP
Image captionEm março, Kim Jong-un afirmou que estava comprometido com a 'desnuclearização'
A desnuclearização da Coreia do Norte será uma das questões mais importantes na mesa.
Desde 2006, Pyongyang realizou seis testes atômicos - o último e mais poderoso foi em setembro de 2017. Logo depois, o regime norte-coreano declarou que havia completado seus objetivos nucleares.
Kim Jong-un mostrou disposição para falar sobre a desnuclearização, mas analistas receberam esse sinal com ceticismo.
"Eu acho que este será um bom jogo para ambos os líderes. Mas se isso realmente vai levar à desnuclearização, ainda não está tão claro", disse James Kim, diretor do Instituto Asan de Estudos Político, à jornalista da BBC na Ásia, Virginia Harrison.
Na semana passada, o líder norte-coreano anunciou a suspensão dos testes nucleares e balísticos, além do fechamento do centro de testes nucleares no norte do país, que foi seriamente danificado após o teste de setembro.
No entanto, especialistas consideram essa declaração uma oferta simbólica, que pode ser revogada a qualquer momento e que mostra um país seguro, disposto a mostrar que atingiu suas metas e não precisa mais realizar testes.
Como moeda de troca, o presidente sul-coreano fez menção ao complexo de Kaesong, um dos raros pontos de cooperação entre as Coreias, onde milhares de trabalhadores norte-coreanos são empregados por fábricas sul-coreanas.
O complexo foi fechado em 2016 por iniciativa de Seul, sob o argumento de que o Norte estava confiscando os salários pagos a funcionários norte-coreanos para investir em seu programa nuclear, e Moon disse que está disposto a reabri-lo caso ocorra algum progresso em direção à desnuclearização.

4 - Acordo de Paz?

Donald Trump e Kim Jong-unDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionKim Jong-un e Donald Trump devem se reunir nas próximas semanas
Outro dos pontos destacados por Seul é a possibilidade de estabelecer uma paz permanente entre as duas Coreias.
Seul e Pyongyang seguem tecnicamente em guerra, pois o conflito entre os dois países acabou em 1953 com um cessar-fogo, mas não com um acordo formal de paz.
"As esperanças de Moon para esse encontro são claras", diz Harrison.
O presidente sul-coreano diz que "um acordo de paz deve ser buscado" para finalmente pôr fim ao conflito iniciado em 1950.
O armistício que interrompeu a guerra foi assinado pela Coreia do Norte, seus aliados chineses e o comando da ONU liderado pelos Estados Unidos, que apoiou o Sul nos combates.
"Não há nenhuma dúvida de que Moon deseja que a reconciliação seja parte de seu legado", diz Ji-Young Lee, professor assistente da escola de estudos internacionais da Universidade Americana, em Washington.
Entre outras questões, encontros entre famílias coreanas separadas pela guerra, que estavam suspensos desde 2015, podem ser retomados.

5 - O Twitter de Trump

Kim Jong-unDireito de imagemKCNA VIA REUTERS
Image captionPara analista, futuro encontro com Trump será vitória para Kim Jong-un
O presidente Donald Trump será uma das figuras levadas em conta na sexta-feira, mesmo que não participe do encontro diretamente.
O mandatário acompanhará de perto o que vai ocorrer na península coreana e, de acordo com o governo de Seul, o presidente Moon vai telefonar para Trump logo após o fim do encontro.
Espera-se que o presidente americano, acostumado a emitir opiniões pelo Twitter, se reúna com o próprio Kim Jong-un em meados de maio ou início de junho - ainda não se sabe a data ou local onde o encontro pode ocorrer.
Caso se confirme, será a primeira reunião entre um presidente americano e um líder norte-coreano desde 2009, quando Bill Clinton visitou Kim Jong-il em Pyongyang em busca de um acordo para libertar dois jornalistas americanos presos pelo regime.
De acordo com o especialista do Instituto Asan, a Coréia do Norte vê sua relação com a Coreia do Sul como "a única maneira de Washington falar com eles" sobre questões como as sanções que pesam sobre o país, por causa de seus numerosos testes nucleares e de mísseis.
Por outro lado, o professor Lee da Universidade Americana acredita que o mandatário norte-coreano quer ser tratado como um líder "igual aos americanos".
"Normalmente pensamos que os ditadores podem fazer o que quiser, mas na realidade eles também ficam sob pressão. Kim pode estar preocupado com sua própria legitimidade na Coreia do Norte", diz.
Da BBC
Professor Edgar Bom Jardim - PE

quarta-feira, 25 de abril de 2018

Pernambuco: Patteo Olinda Shopping abre as suas portas esta quarta-feira


Em evento prestigiado, foi inaugurado na noite dessa terça-feira (24) o Patteo Olinda Shopping. Considerado o maior empreendimento privado da cidade da Região Metropolitana do Recife, com aporte de R$ 500 milhões, o centro de compras abre esta quarta-feira (25) as portas para o público e já chega com a proposta de levar para mais de 400 mil habitantes o que há de melhor em lazer e entretenimento da região. A cerimônia de inauguração contou com a presença de autoridades, a exemplo do governador de Pernambuco, Paulo Câmara e do prefeito de Olinda, Professor Lupércio, além de representantes do setor empresarial, como o diretor executivo da Folha de Pernambuco, Paulo Pugliesi.

“O Patteo nasceu a partir de uma decisão fundamental de pessoas que acreditaram que, apesar da crise, valia a pena fazer um empreendimento desse porte em Pernambuco”, afirmou Paulo Câmara. Com 137 mil m² de área construída e 51 mil m² de área bruta locável (ABL), o Patteo conta com cinco pisos de lojas e mais três de estacionamento com capacidade para 2.300 vagas. Entre as âncoras estão operações da Riachuelo, Renner, Saraiva, Le Biscuit, além da Uninassau. O espaço ainda contará com academia Smart Fit e dois polos gastronômicos - no térreo, com restaurantes, e a praça de alimentação, com grandes redes de fast food . 

Olinda é uma grande cidade e pedia um empreendimento como o Patteo. Contamos com uma localização privilegiada, em um ponto de chegada e saída do município, no coração do centro comercial da cidade”, afirma José Luiz Muniz, diretor do Grupo CM, que é o empreendedor do espaço junto com a HBR Realty.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

terça-feira, 24 de abril de 2018

Índios yanomamis apostam no turismo para afastar ameaça de garimpo e ganhar autonomia


A aposta dos yanomami no turismo para afastar ameaça de garimpo e ganhar autonomia
Fechado a turistas desde 2013, o Pico da Neblina - ponto mais alto do Brasil, a 2.994 metros acima do nível do mar - está sendo reaberto à visitação.
A montanha, próxima à fronteira com a Venezuela, deve receber os primeiros grupos de turistas até o fim do ano. A atividade será gerida por comunidades do povo yanomami, cujo território se sobrepõe a boa parte do Parque Nacional do Pico da Neblina.
A BBC visitou aldeias yanomamis da região de Maturacá em novembro, quando acompanhava uma expedição pioneira de biólogos da USP ao Pico da Neblina - chamado pelos indígenas de Yaripo.
As comunidades ficam a alguns dias de caminhada do pico e são vizinhas do 5º Pelotão Especial de Fronteira, uma base do Exército dentro da Terra Indígena Yanomami.
Dezenas de homens e mulheres foram treinados nos últimos anos para receber os turistas, iniciativa apoiada pelo Instituto Socioambiental (ISA) e órgãos do governo.
As comunidades esperam que o turismo dê mais autonomia às comunidades e afaste os apelos do garimpo, que já deixou sequelas na região.
Anciãos yanomamis na aldeia Maturacá
Image captionTerritório yanomami sofreu grande invasão de garimpeiros nos anos 1980

Invasão garimpeira

Nos anos 1980, dezenas de milhares de garimpeiros invadiram o território yanomami em busca de ouro. Muitos foram expulsos, mas a atividade jamais foi totalmente erradicada.
A trilha que dá acesso ao pico passa por vários antigos locais de garimpo. A mineração desviou riachos e provocou o surgimento de lagos e praias de pedregulhos. Em alguns garimpos desativados há décadas, a vegetação começa a se regenerar.
O Exército disse à BBC que a região está livre de garimpo há um bom tempo. Porém, nossa equipe encontrou sinais de atividade recente em alguns acampamentos de garimpeiros, como pilhas descartadas e uma embalagem de comida fabricada em 2016.
Em Maturacá, mulheres yanomamis relataram que garimpeiros têm oferecido 21 gramas de ouro (o equivalente a R$ 3 mil) a indígenas para que levem comida até um garimpo do lado venezuelano da fronteira.
O Pico da Neblina
Image captionPico da Neblina fica dentro do território yanomami, perto da fronteira com a Venezuela
O acesso ao local é feito a pé pela mesma trilha que dá acesso ao Pico da Neblina. Há relatos sobre a presença de garimpeiros de São Gabriel da Cachoeira (AM) na área.
O ouro circula pela região livremente. Numa loja vizinha à base do Exército em Maturacá, é possível comprar mercadorias com o metal, pesado numa balança sobre o balcão.
Analista do ICMBio (órgão federal que gere o Parque Nacional do Pico da Neblina), Flávio Bocarde diz que o garimpo é um fator de "grave erosão cultural" na região.
"O pai fica fora da casa por longos períodos, deixando para trás a mulher e os filhos. Quando começa a negociar só com ouro, passa a vendê-lo em troca de comida, o que altera totalmente sua relação com a alimentação. A caça e a agricultura tradicional são abandonadas", afirma.
A atividade também gera o risco de contaminação por mercúrio, normalmente usado pelos garimpeiros para identificar o ouro.
Em 2016, um estudo do ISA em parceria com a Fiocruz e a FGV (Fundação Getúlio Vargas) revelou índices preocupantes de contaminação por mercúrio em aldeias yanomamis próximas a garimpos em Roraima.
Numa delas, o índice de moradores com altos níveis de mercúrio no sangue chegou a 92%.
A substância está associada a problemas motores e neurológicos, perda de visão e danos em fetos.

Lobby pró-mineração

Hoje a mineração em terras indígenas é ilegal. Em 1996, o senador Romero Jucá (MDB-RR) propôs um projeto de lei para regulamentar a atividade. A proposta tramita desde então. Nos últimos anos, o movimento ganhou um novo articulador - o deputado estadual amazonense Sinésio Campos, do PT.
Entre os apoiadores da causa está o indígena e ex-garimpeiro Clóvis Curubão (PT), atual prefeito de São Gabriel da Cachoeira, município onde fica parte do território yanomami.
"A maioria da população indígena daqui não tem acesso a benefícios do governo. São as pessoas mais esquecidas do Brasil. A única solução para o município, onde 98% da população é indígena, é a mineração", diz Lucas Duarte, aliado de Curubão e presidente das Cooperação Indígena para Extrativismo de Recursos Naturais e Minerais, em São Gabriel da Cachoeira.
As principais associações yanomami, porém, são contra a mineração em áreas indígenas.
"Os garimpeiros não estão mais conosco", diz Antônio Yanomami, líder da comunidade Maturacá.
Caçadores yanomamis cumprimentam visitantes em ritual na aldeia Maturacá
Image captionPesquisadores cumprimentam caçadores yanomamis em ritual na aldeia Maturacá
"Eles costumavam ganhar dinheiro aqui, mas destruíram a terra. Agora não permito mais que a terra seja destruída. Nossos jovens nos ensinaram como solicitar a força policial e agir mais rapidamente."

'Velhos tempos'

Em Maturacá, muitos yanomamis dizem esperar que o turismo afaste de vez os garimpeiros.
"Nos velhos tempos, eu mesmo pensei que nosso futuro estava no garimpo", diz Salomão Mendonça Ramos, um dos yanomamis à frente do projeto de turismo.
"Ainda há algumas pessoas que garimpam um pouco, sem danificar a natureza. Esperamos que essas pessoas deixem de lado esse trabalho sem futuro e se juntem ao ecoturismo", ele afirma.
O Pico da Neblina já recebeu turistas, mas as expedições costumavam ser organizadas por agências externas, modelo que estava gerando conflitos nas comunidades. Agora, os próprios yanomamis administrarão a atividade.
"O pagamento era muito pequeno. Agora queremos que os turistas paguem mais, para que possamos melhorar a vida das famílias dos guias e carregadores", completa Ramos.

Professor Edgar Bom Jardim - PE