sábado, 30 de setembro de 2017

7 coisas que as mulheres sauditas não podem fazer mesmo após alcançarem direito a dirigir

Mulheres sauditas em feira de entidade de promoção das mulheres em RiadDireito de imagemREUTERS
Image captionApesar da autorização para dirigir, as sauditas ainda não podem fazer ações cotidianas como abrir uma conta no banco
Com o decreto publicado na terça pelo rei da Arábia Saudita, o país poderá deixar de ser reconhecido como o único do mundo onde as mulheres não têm direito a dirigir um carro.
"Conseguimos" ou "começamos de baixo, agora estamos aqui", publicaram dezenas de mulheres sauditas nas redes sociais depois de receber a notícia, que também foi celebrada por governos e organizações defensoras do direitos das mulheres ao redor do mundo.
Mas, até mesmo quando essa medida entrar em vigor e elas deixarem de andar em carros apenas como passageiras - algo previsto para junho de 2018 -, ainda existirão muitas outras práticas cotidianas que continuarão fora do alcance das mulheres em um dos países mais rígidos do mundo.
Entre as coisas que as sauditas não podem fazer sem a permissão de seu "guardião homem" ou tutor (em geral, algum homem da família, como seu pai ou marido), estão sete:
- Solicitar um passaporte
- Viajar ao exterior
- Casar-se
- Abrir uma conta bancária
- Começar alguns tipos de negócios
- Passar por uma intervenção médica
- Sair da prisão depois de cumprir a pena
Rígido sistema de tutela restringe a liberdade das mulheres sauditas
Essas restrições se devem ao sistema de tutela vigente no país. O wahabismo, uma interpretação mais rígida de lei islâmica, é a fé dominante na Arábia Saudita há dois séculos. Depois do violento incidente de 1979 - a tomada da Grande Mesquita -, essas regras foram reforçadas de maneira ainda mais rígida pelo governo.
Isso ajudou a transformar a Arábia Saudita em um dos países com maior desigualdade entre homens e mulheres do Oriente Médio.
Segundo o Índice Global de Desigualdade de Gênero do Fórum Econômico Mundial de 2016, apenas dois países em guerra superam a Arábia Saudita nesse quesito: Iêmen e Síria.

'Um homem é igual a duas mulheres'

Esse sistema de tutela foi duramente criticado por organizações como a Human Rights Watch, que comparou o estado legal das mulheres com o dos menores de idade, já que "não podem tomar decisões-chave para seu futuro por si mesmas".
Algumas fizeram campanhas contra esse sistema, apesar de ser difícil mudá-lo em um país onde elas nem sequer podem andar na rua em público sem a companhia de um homem.
No sistema de Justiça, as mulheres são claramente discriminadas. Como em outros países com uma interpretação rígida da lei islâmica, o depoimento de um homem é igual ao de duas mulheres nos tribunais.
Mulher votando na Arábia SauditaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionHá dois anos, as mulheres conquistaram o direito de votar na Arábia Saudita
Também é difícil para elas ter a custódia dos filhos depois do divórcio se os filhos são maiores de sete anos (no caso dos meninos) ou nove (se são meninas). Essa dificuldade é ainda maior se a mulher não é muçulmana, ou seja, se é uma estrangeira que vive na Arábia Saudita.
No entanto, alguns aspectos da vida das mulheres da Arábia Saudita têm menos restrições do que se poderia esperar.
Elas podem votar desde 2015. A educação é obrigatória para meninas e meninos até os 15 anos e o número de mulheres que se formam nas universidades supera o de homens.
Contudo, apenas cerca de 16% da classe trabalhadora é composta por mulheres.

Regras no modo de se vestir

A roupa que as mulheres usam para trabalhar não depende delas.
As sauditas devem cobrir completamente seus corpos com uma abaya - a típica túnica larga e solta - em lugares onde possam ser vistas por homens que não têm relação com elas.
Para isso, há espaços exclusivos para mulheres como andares específicos em centros comerciais, onde elas podem retirar a abaya. Fora deles, as mulheres que não seguem essa regra podem ser penalizadas.
Mas há exceções: as não sauditas podem adotar um código de vestimenta mais liberal. Se não são muçulmanas, não precisam cobrir a cabeça.
Mas, em geral, as mulheres estrangeiras que vão ao país dizem ter de se cobrir com uma abaya antes de sair do aeroporto. Mas muitas primeiras-damas estrangeiras que visitaram o país não usaram abayas nem cobriram a cabeça.
Melania Trump e Michelle Obama em suas visitas a Arábia SauditaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionTanto Melania Trump como Michelle Obama decidiram usar vestidos de manga longa em suas visitas à Arábia Saudita, mas elas não cobriram a cabeça
Boa parte da vida saudita está segregada por gênero, e essa separação se aplica de maneira ampla, incluindo piscinas ou ginásios de hotéis frequentados por viajantes internacionais.
Ainda que vários países no mundo, como Rússia, China ou Israel, proíbam as mulheres de realizar algumas atividades, sem dúvida poucos são tão rígidos quanto a Arábia Saudita.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Como a Finlândia, país referência em educação, está mudando a arquitetura de suas escolas

Escola de plano aberto na Finlândia
Image captionNas novas escolas finlandesas, as paredes são substituídas por divisões transparentes e o plano aberto ganha protagonismo | Foto: Kuvatoimisto Kuvio Oy
Faz anos que a Finlândia se tornou referência mundial em educação, mesclando jornadas escolares mais curtas, poucas tarefas e exames e também adiando o início da alfabetização até que as crianças tenham sete anos de idade.
E, mesmo com um dos melhores resultados globais no PISA (avaliação internacional de educação), o país continua buscando inovações - inclusive na estrutura física das escolas.
Uma das apostas é o chamado ensino baseado em projetos, em que a divisão tradicional de matérias é substituída por temas multidisciplinares em que os alunos são protagonistas do processo de aprendizado.
Parte das reformas é imposta pela necessidade de se adaptar à era digital, em que as crianças já não dependem apenas dos livros para aprender. E tampouco os alunos dependem das salas de aula - pelo menos não das salas de aula atuais.

Adeus às paredes

Por isso as escolas finlandesas estão passando por uma grande reforma física, com base nos princípios do "open plan", ou plano aberto. A busca é, essencialmente, por mais flexibilidade.
As tradicionais salas fechadas estão se transformando em espaços multimodais, que se comunicam entre si por paredes transparentes e divisórias móveis.
O mobiliário inclui sofás, pufes e bolas de pilates, bem diferentes da estrutura de carteiras escolares que conhecemos hoje.
"Não há uma divisão ou distinção clara entre os corredores e as salas de aula", diz à BBC Mundo (serviço em espanhol da BBC) Reino Tapaninen, chefe dos arquitetos da Agência Nacional de Educação da Finlândia.
Interior da escola Kastelli
Image captionDistinção entre salas de aula e corredores deixam de existir | Foto: Kuvatoimisto Kuvio Oy
Desse modo, explica ele, professores e alunos podem escolher o local que considerarem mais adequado para um determinado projeto, dependendo, por exemplo, se ele for individual ou para ser executado em grupos grandes.
Mas não se trata de espaços totalmente abertos, mas sim de áreas de estudo "flexíveis e modificáveis", agrega Raila Oksanen, consultora da empresa finlandesa FCG, envolvida nas mudanças.
"As crianças têm diferentes formas de aprender", diz ela, e por conta disso os espaços versáteis "possibilitam a formação de diferentes equipes, com base na forma como eles prefiram trabalhar e passar seu tempo de estudo".

Diferentes ambientes

O conceito de plano aberto deve ser entendido de forma ampla - não só sob perspectiva arquitetônica, mas também pedagógica.
Segundo a consultora, isso significa que não se trata apenas de um espaço aberto no sentido físico, e sim de um "estado mental".
Alunos em escola de plano aberto na Finlândia
Image captionMobiliário passa a incluir sofás e pufes em vez de tradicionais carteiras | Foto: Kuvatoimisto Kuvio Oy
Tradicionalmente, as salas de aula "foram projetadas para satisfazer as necessidades dos professores", afirma Oksanen.
"A abertura (física) almeja que a escola responda às necessidades individuais dos alunos, permitindo a eles que assumam a responsabilidade por seu aprendizado e aumentem sua autorregulamentação", diz ela. "Os próprios alunos estabelecem metas, resolvem problemas e completam seu aprendizado com base em objetivos."
Vale destacar que a ideia do plano aberto não é totalmente nova.
Na própria Finlândia, as primeiras escolas com esse modelo foram idealizadas nos anos 1960 e 70, como grandes salões separados por paredes finas e por cortinas, explica Tapaninen, da Agência Nacional de Educação da Finlândia.
Escola de plano aberto na Finlândia
Image captionConceito de "plano aberto" não se refere apenas ao ambiente físico, mas a um conceito pedagógico, dizem especialistas | Foto: Kuvatoimisto Kuvio Oy
Mas na aquela época a cultura de aprendizado e os métodos de trabalho não estavam adaptados a esse tipo de ambiente. Além disso, havia reclamações quanto ao barulho e à acústica. Por tudo isso, nos anos 1980 e 90 o pais retomou o modelo de salas de aula fechadas.
Agora, um dos objetivos da reforma do sistema educacional finlandês é desenvolver novos ambientes de aprendizado e métodos de trabalho.
A ideia é que espaços físicos inspirem o aprendizado, mas não é preciso limitar-se à escola ou mesmo a um lugar físico.
"(As aulas) devem usar outros espaços, como a natureza, museus ou empresas", explica Tapaninen.
"Videogames e outros ambientes virtuais também são reconhecidos como ambientes de aprendizagem. A tecnologia tem um papel crescente e significativo nas rotinas escolares, permitindo aos alunos envolver-se com mais facilidade no desenvolvimento e na seleção de seus próprios ambientes."
Alunos em escola de plano aberto na Finlândia
Image captionPlano aberto visa, por exemplo, incentivar a autonomia dos alunos | Foto: Kuvatoimisto Kuvio Oy

Sem sapatos

A escolha pelo modelo trouxe desafios: o barulho e a luz intensificados pelo plano aberto, por exemplo, precisam ser levados em conta na criação de um bom ambiente de aprendizado.
"O uso de carpete no chão eliminou o ruído causado pelos móveis e pelo caminhar das pessoas", explica o arquiteto.
E as escolas se converteram em espaços "sem sapatos": os alunos ficam descalços ao entrar ou usam calçados leves.
Escolas mais abertas podem ser também mais vulneráveis, o que desperta preocupações com segurança.
"Já tivemos na Finlândia casos de invasores que atacaram escolas, matando estudantes e professores", explica Tapaninen.
Ele se refere, por exemplo, ao caso de um estudante de 18 anos que dez anos atrás disparou contra seus colegas em uma escola em Tuusula, deixando oito mortos.
Por conta disso, cada escola finlandesa é obrigada a ter um plano de segurança com base na análise de riscos, criar rotas de fuga em cada espaço e fazer simulações de ataques para preparar os alunos.
Fachada da escola Kastelli, projetada pelo escritório de arquitetura Lahdelma & Mahlamäki
Image captionFachada da escola Kastelli; segundo arquiteto, centros de ensino têm autonomia para escolher modelos que considerem mais apropriados | Foto: Kuvatoimisto Kuvio Oy
Mas, segundo Tapaninen, a abertura das escolas "ajuda a orientação a rotas de fuga, mais do que em salas de aula fechadas e em corredores".
A Finlândia tem 4,8 mil centros de ensino básico e superior. Anualmente, o país está reformando ou construindo entre 40 e 50 espaços, explica o arquiteto. E a maior parte deles segue o conceito de plano aberto.
"As escolas e seus usuários podem escolher livremente seu próprio conceito de ambiente de aprendizado, dependendo da visão local, do plano de estudos, da cultura de trabalho e de seus métodos", diz ele. "Aparentemente, a tendência de abertura nos ambientes educativos está se tornando a favorita (das escolas)."
Professor Edgar Bom Jardim - PE

sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Menina de 10 anos grava seu próprio estupro para que adultos acreditem em denúncia

Menina assustadaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionCaso chocou a sociedade uruguaia e promotora pediu que ele sirva de alerta para que as crianças sejam escutadas com mais atenção
"É algo que deve envergonhar a todos nós", disse a promotora uruguaia Mariela Nuñez sobre um caso de abuso sexual que chocou seu país: o de uma menina de dez anos que gravou os estupros a que foi submetida pelo pai de uma amiga para que os adultos acreditassem nela.
A menina costumava brincar e escutar música na casa da amiga da mesma idade, na cidade de Artigas, norte do Uruguai.
Segundo Nuñez, o pai da amiga "aproveitava momentos em que a esposa estava trabalhando, mandava a filha ao mercado para ficar a sós com a menina e começava a tocar suas partes genitais".
O abuso se repetiu diversas vezes ao longo de um ano, tendo sido testemunhado pela filha do abusador em alguns momentos, de acordo com as investigações.
Tanto que as duas meninas articularam juntas o plano de gravar os estupros.
"(A filha) disse à amiguinha que sabia o que seu pai estava fazendo com ela, que tinha muito medo do pai e que ninguém acreditaria nelas, motivo pelo qual planejaram filmar tal situação, algo que conseguiram fazer depois de várias iniciativas", afirmou Nuñez, de acordo com a imprensa uruguaia.
Notebook como o distribuído pelo governo uruguaio aos estudantes do paísDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionMeninas gravaram abusos com a 'ceibalita', como é chamado o notebook distribuído pelo governo uruguaio aos estudantes do país

'Mais frequente do que acreditamos'

Em comunicado, a promotora uruguaia pediu que o caso sirva de alerta para que as crianças sejam escutadas com mais atenção.
"Esse ato valente de uma menininha estuprada deveria servir não apenas para que se faça justiça, mas sim para que toda a sociedade tome consciência de que essas coisas acontecem com mais frequência do que acreditamos e que as crianças não mentem, não inventam", afirmou, segundo a imprensa local.
"É um caso extremamente doloroso que mostra a visão das crianças sobre o mundo adulto. Essa visão de que não acreditamos em sua palavra, a ponto de (a menina) submeter-se voluntariamente à violação para registrá-la. Não dá para separar o lado de promotora do de mãe e avó. (...) As consequências desse caso são imensuráveis. Arruinou a vida de duas meninas."
Nuñez disse também que o acusado era "uma pessoa respeitada, de classe média, de quem ninguém suspeitaria uma atitude semelhante. Ele só negava (o estupro), mesmo diante das provas. Custou muito até que admitisse e não deu uma explicação. Eu mesma tive de sair do interrogatório para conter minha própria ira e cumprir com a minha função".

Laptop escolar

As meninas, que não foram identificadas, gravaram os abusos com uma "ceibalita", como são chamados os notebooks que o governo uruguaio entrega a todos os estudantes do país.
O caso chegou à Justiça depois que a menina mostrou os vídeos à tia. Em seguida, o pai da vítima denunciou os abusos.
O acusado, identificado apenas pelas iniciais JCSB, é um homem de 62 anos, sem antecedentes criminais. Ele foi preso. Se condenado, sua pena pode variar de dois a seis anos de reclusão.
Sua mulher e outro filho também chegaram a ser detidos, mas foram libertados, segundo a Justiça, pela ausência de "elementos que demonstrassem que eles tinham conhecimento dos fatos".
Menina cobrindo o rostoDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionCrianças são comumente desacreditadas por adultos na hora de denunciar abusos, diz especialista
Especialistas no tema explicam que casos de abuso infantil muitas vezes ocorrem dentro de casa - e muitas vezes não são denunciados. Há também os casos que, mesmo reportados, deixam de ser punidos por falta de provas.
Segundo Andrea Tuana, da associação uruguaia El Paso, que combate a violência doméstica e sexual, "a realidade é que conhecemos pouco da magnitude real do problema", já que existe uma subnotificação de casos.
"Há uma grande quantidade de adultos que admitem ter sofrido abusos na infância e conta que, na época da denúncia, não acreditaram neles", diz ela à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC.
"O caso dessa menina demonstra que não acreditamos na palavra das crianças, não as escutamos. O problema é cultural: é não querer aceitar que o abuso sexual existe."
De BBC
Professor Edgar Bom Jardim - PE