quarta-feira, 5 de abril de 2017

As (outras) mulheres brasileiras sobre quem deveríamos aprender na escola


Niede Guidon, Carolina de Jesus, Bertha Lutz
Image captionNiede Guidon, Carolina de Jesus, Bertha Lutz: leitores da BBC Brasil sugeriram nomes de mulheres que deveriam ser mais estudadas

Há algumas semanas, a BBC Brasil publicou uma matéria sobre 10 mulheres brasileiras que deveriam ser mais estudadas nas escolas. Os perfis foram sugeridos por leitores e, de lá para cá, não paramos de receber recomendações de outras pioneiras que deveriam ter suas contribuições mais conhecidas e divulgadas.
Foram mensagens como a de Andrea Montero, que lembrou da filósofa Nísia Floresta - segundo ela, uma "precursora do pensamento feminista no Brasil"; ou a de Henrique Fracalanza, que lembrou de Anália Franco, "fundadora de mais de setenta escolas".
Tudo começou com a publicação da história de Emmy Noether - matemática alemã que desafiou as universidades em 1903 e que foi citada por Albert Einstein como "genial" por sua contribuição à Física. A partir daí, preparamos a primeira lista.
Mas as sugestões continuaram e, por isso, reunimos uma nova lista, dessa vez com 15 mulheres - brasileiras ou naturalizadas - de diversas áreas de atuação, que foram pioneiras ou que ajudaram a mudar os rumos do país nas ciências, na agronomia, na literatura, na política e na saúde.

Luzia Rennó Moreira


Luzia RennóDireito de imagemCEDOC
Image captionLuzia Rennó é considerada uma visionária

Filha de fazendeiros e natural de Santa Rita do Sapucaí - pequeno município do sul de Minas Gerais de cultura agrícola até a metade do século 20, - Luzia Rennó Moreira nasceu em 1907 e foi uma visionária ao iniciar o desenvolvimento de um polo de eletrônica em uma região rural.
Na década de 1950, "Sinhá Moreira", como era conhecida, doou terras que tinha herdado dos seus pais para construir uma escola, que viria se tornar a primeira instituição de ensino de técnica de eletrônica da América do Sul - e a sétima escola na categoria do mundo.
Com o apoio do presidente Juscelino Kubitschek, Luzia inaugurou a Escola Técnica de Eletrônica "Francisco Moreira da Costa" em 1959. Em 1965, morreu por causa de uma neoplasia mamária, antes da primeira turma se formar.
Atualmente, Santa Rita do Sapucaí é reconhecida em todo o mundo por desenvolver, produzir e exportar eletroeletrônicos para mais de 41 países.

Bertha Lutz


Bertha LutzDireito de imagemUS LIBRARY OF CONGRES
Image captionBertha Lutz seguiu carreira na política

A bióloga e feminista Bertha Maria Júlia Lutz foi a responsável pela conquista da instituição do voto feminino no Brasil.
Nascida em 1894, em São Paulo, em uma família abastada, Bertha estudou Biologia na prestigiada Universidade Sorbonne, na França. Na Europa, conheceu o movimento sufragista das mulheres inglesas.
Em 1918, retornou ao Brasil e se tornou a segunda mulher a ingressar em concurso público no país, assumindo o cargo de bióloga no Museu Nacional. No ano seguinte, fundou, junto de outras mulheres, a Liga para a Emancipação Intelectual da Mulher, iniciando as campanhas pelo direito ao voto feminino.
Bertha lutou mais de dez anos até que, em 1932, por decreto-lei do presidente Getúlio Vargas, as mulheres conquistaram o direito ao voto no Brasil. Ainda na década de 1930, organizou o primeiro congresso feminista e fundou a União Universitária Feminina, a Liga Eleitoral Independente, a União Profissional Feminina e a União das Funcionárias Públicas.
Em 1933, elegeu-se primeira suplente do deputado federal Cândido Pereira. Após a morte do deputado, assumiu a cadeira de deputada federal em 1936. Porém, a carreira política de Bertha se encerrou em 1937, quando Getúlio Vargas decretou o Estado Novo.
A passagem de Bertha pela Câmara Federal foi marcada pela luta por mudança na legislação referente ao trabalho da mulher e do menor, igualdade salarial, redução da jornada de trabalho - então de 13 horas diárias - e pela proposta de licença maternidade de três meses.

Cecília Meireles


Cecília Meireles. Acervo Revista Folclore, 1964, nº8Direito de imagemACERVO REVISTA FOLCLORE, 1964, Nº8
Image captionCecília Meireles em página da Revista Folclore

Considerada uma das principais poetas do século 20 no Brasil, Cecília Meireles publicou 50 obras, incluindo contos, crônicas, poesias, romances e literatura infantil.
Cecília nasceu no Rio de Janeiro, em 1901, em uma família grande, mas logo conheceu a solidão: o pai morreu antes do seu nascimento; a mãe, morreu quando a menina tinha 3 anos; os três irmãos morreram também na infância de Cecília. Órfã, foi morar na chácara da avó, onde começou a ler e escrever.
Aos 16 anos, formou-se professora. Aos 18 anos, lançou seu primeiro livro, Espectros.
Com o livro Viagem, de 1939, ganhou o prêmio de poesia da Academia Brasileira de Letras.
Em 1934, fundou a primeira biblioteca infantil do Brasil, em Botafogo, Rio de Janeiro. Também escreveu para jornais cariocas sobre o folclore nacional e chegou a atuar como jornalista, publicando sobre os problemas na educação. Viajou o mundo na década de 1940 fazendo conferências sobre Literatura, Educação e Folclore.
Morreu em 9 de novembro de 1964, no Rio de Janeiro.

Maria da Penha


Maria da PenhaDireito de imagemFABIO RODRIGUES POZZEBOM
Image captionA Lei Maria da Penha foi inspirada na luta dela contra a violência doméstica

A Lei Maria da Penha, que endureceu as punições para quem pratica violência contra a mulher, foi inspirada na história desta cearense.
Maria da Penha Maia Fernandes nasceu em 1945. Formou-se em Farmácia na primeira turma da Universidade Federal do Ceará. Durante a pós-graduação, conheceu o professor universitário Marco Viveros, com quem se casou e teve três filhas.
Em 1983, Marco atirou em Maria da Penha enquanto ela dormia, deixando-a paraplégica. A versão dada pelo marido é que assaltantes teriam feito o disparo. Quatro meses depois, Marco mais uma vez tentou matar a mulher. Dessa vez, ele tentou eletrocutar Maria enquanto ela tomava banho.
Somente oito anos depois, em 1991, Marco foi condenado, mas passou apenas dois anos preso. Ela então apresentou na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) uma petição contra o Estado brasileiro por impunidade à violência doméstica.
O caso se tornou mundialmente conhecido e, em 2006, o então presidente Luís Inácio Lula da Silva sancionou a Lei Maria da Penha, para proteger as mulheres contra a violência.
O caso de Maria da Penha foi considerado pela ONU Mulheres um dos dez capazes de mudar a vida das mulheres no mundo.

Johanna Döbereiner


Johanna DöbereinerDireito de imagemEMBRAPA
Image captionJohanna Döbereiner começou a trabalhar em fazendas na Alemanha

Nascida na antiga Checoslováquia, Johanna Döbereiner cresceu em meio a guerras e foi da experiência em fazendas na Alemanha que nasceu o interesse pela Agronomia.
Ela se formou na Universidade de Munique e, em 1950, imigrou para o Brasil após receber uma recomendação para o Serviço Nacional de Pesquisa Agropecuária, começando a trabalhar em um laboratório do Ministério da Agricultura.
Na década de 1960, as pesquisas dela nas regiões tropicais começaram a revolucionar o campo da agricultura no Brasil - especialmente no aprimoramento das plantações de soja, que fizeram do Brasil o segundo produtor mundial da leguminosa, atrás apenas dos Estados Unidos.
Autora de mais de 500 títulos, Johanna Döbereiner chegou a ser indicada ao Prêmio Nobel.

Anália Franco


Anália FrancoDireito de imagemRIO SUL REVISTA
Image captionAnália Franco foi uma grande educadora e incentivou causas abolicionistas

Anália Franco Bastos nasceu em 1853, em Resende, Rio de Janeiro. Foi uma grande articuladora social e política, defendendo o republicanismo e a abolição da escravidão no Brasil.
Nascida durante o período escravocrata, Anália era vista como "perigosa" por ter ajudado crianças negras e órfãs que nasceram após a da Lei do Ventre Livre - que instituiu como livres os filhos de mulheres escravizadas nascidos a partir de 1871.
Professora primária de formação e sem recursos financeiros, conseguiu fundar escolas e creches em São Paulo e em cidades do interior do Estado, onde oferecia, além de ensino, abrigo à crianças, jovens, mães e mulheres viúvas. Todos os acolhidos recebiam educação e instrução profissional.
Foi uma das principais educadoras do Brasil e defensora do ensino laico, mesmo sendo conhecida por sua fé no espiritismo. Também atuou como escritora e teatróloga. Faleceu em 1919, em consequência da gripe espanhola.

Ana Néri


Ana NeryDireito de imagemDOMINIO PÚBLICO
Image captionAna Nery chegou a servir na Guerra do Paraguai

Ana Justina Ferreira Néri foi uma das enfermeiras mais importantes do país, chegando a servir na Guerra do Paraguai voluntariamente.
Ana era casada com um capitão e, após ficar viúva, teve os filhos convocados para servir no conflito, em 1864. Foi então que ela decidiu escrever à autoridades locais da Bahia pedindo para ir à guerra para cuidar dos feridos.
Durante a Guerra do Paraguai, ela prestou serviços em quatro hospitais militares e viu um de seus filhos morrer.
Com o final da Guerra, foi homenageada e recebeu duas medalhas, além de uma pensão vitalícia dada pelo então imperador Dom Pedro 2º.
Em 1938, o presidente Getúlio Vargas instituiu o Dia do Enfermeiro, celebrado em 12 de maio - dia do nascimento de Ana Néri.

Tomie Ohtake


Tomie OhtakeDireito de imagemHELOISA BALLARINI
Image captionTomie manteve a atividade artística até morrer, em 2015

Japonesa naturalizada brasileira, Tomie Ohtake foi citada pelos leitores da BBC Brasil por causa da contribuição às artes plásticas.
Tomie nasceu em Quioto em 1913 e veio ao Brasil em 1936 para visitar um de seus irmãos. Impedida de voltar ao seu país após o início da Guerra do Pacífico, ela se naturalizou, casou e construiu família no Brasil.
Foi somente aos 40 anos de idade que Tomie começou a pintar, incentivada pelo artista japonês Keiya Sugano. Ela então passou a fazer esculturas e painéis gigantes, dedicando sua obra a narrar a participação dos imigrantes japoneses na formação do Brasil.
Durante a carreira, participou de 20 Bienais Internacionais e fez mais de 120 exposições individuais no Brasil, nos Estados Unidos, Europa e Japão.
Em 2000, foi fundado em São Paulo o Instituto Tomie Ohtake, em sua homenagem, que abriga um espaço para exposições e promove a pesquisa sobre artes.
Tomie Ohtake pintou até a data de sua morte, em 2015, aos 101 anos.

Carolina Maria de Jesus


Carolian de JesusDireito de imagemAUDÁLIO DANTAS, 1960
Image captionCarolina Maria de Jesus à margem do Rio Tietê. Ao fundo a Favela do Canindé.

Carolina era catadora de papel e morava em favelas até ser descoberta pelo jornalista Audálio Dantas, que leu os cadernos de anotação dela, escritos em forma de diário e publicou trechos de seus relatos na extinta revista O Cruzeiro.
Ela se tornou uma importante escritora e teve suas obras traduzidas em mais de dez idiomas.
Carolina Maria de Jesus nasceu em Sacramento, Minas Gerais, em 1914. De família pobre, começou a trabalhar na infância e frequentou a escola somente por dois anos.
Trabalhou em fazendas do interior de Minas Gerais e de São Paulo e foi ajudante de cozinha e doméstica. Em 1937, com a morte da mãe, mudou-se para São Paulo e foi morar em favelas, sobrevivendo como catadora de papel.
Ao fazer uma reportagem sobre a inauguração de um playground no Canindé, favela onde Carolina morava, Audálio descobriu os seus 35 cadernos de anotações em forma de diário.
Em 1960, esses relatos são reunidos no livro Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada. Com o dinheiro da venda do livro, Carolina se mudou para uma casa no bairro de Santana e passou a escrever.
Em 1961, lançou Casa de Alvenaria: Diário de uma Ex-favelada. Em 1963, publicou Pedaços da Fome, seu único romance, que ganhou pouca repercussão.
Em 1969, depois de desentendimentos com editores, mudou-se para um sítio. Morreu em 1977, aos 62 anos, pobre.

Nísia Floresta


Nísia FlorestaDireito de imagemBIBLIOTECA NACIONAL
Image captionA cidade em que nasceu hoje leva o nome de Nísia

A feminista e escritora Dionísia Gonçalves Pinto nasceu no Rio Grande do Norte em 1810 e é autora do primeiro livro feminista no Brasil.
Desde cedo, foi uma questionadora da condição da mulher no século 19: forçada a se casar aos 13 anos, abandonou o marido apenas seis meses após a união. Aos 22 anos, casou-se novamente - dessa vez, por escolha própria, e adotou o pseudônimo Nísia Floresta Brasileira Augusta.
Nunca frequentou universidade. Aos 22 anos, lançou seu primeiro livro, Direitos das mulheres e injustiças dos homens, o primeiro no Brasil a tratar dos direitos das mulheres à instrução e ao trabalho. O texto é considerado o fundador do feminismo brasileiro.
Nísia seguiu escrevendo sobre a emancipação da mulher por meio da educação e do trabalho em Conselhos a minha filha (1842); Opúsculo humanitári" (1853) e A Mulher (1859).
A cidade em que a feminista nasceu, Papari, no Rio Grande do Norte, hoje leva o nome de Nísia Floresta.

Virgínia Bicudo


Virginia Bicudo e a famíliaDireito de imagemFONTE DEDOC
Image captionVirgínia - a primeira da esquerda para a direita - ao lado da família em 1929.

Virgínia Leone Bicudo nasceu em São Paulo, em 1910, e foi a primeira pesquisadora e professora negra a ocupar um lugar de destaque na divulgação e construção da psicanálise no Brasil.
De uma família negra de trabalhadores e de poucos recursos, Vigínia cursou educação sanitária no Instituto de Higiene de São Paulo em 1932. Quatro anos depois, cursou Ciências Sociais na Escola Livre de Sociologia e Política. Conheceu a psicanalista alemã Adelheid Koch e se aproximou da psicanálise. Em 1942, iniciou mestrado com pesquisa sobre psicanálise e os conflitos raciais entre brancos e negros. Sua dissertação, Atitudes Raciais de pretos e mulatos em São Paulo, foi a primeira defendida no Brasil sobre a temática.
Foi professora do Departamento de Psicologia da USP e da Universidade de Brasília (UnB), onde fundou o Instituto de Psicanálise de Brasília. Desenvolveu para a UNESCO diversas pesquisas sobre as relações raciais no Brasil.

Lotta de Macedo Soares

Maria Carlota Costallat de Macedo Soares, conhecida como Lotta, nasceu em Paris, em 1910. Filha de pais brasileiros, veio ao Brasil com dois anos de idade. Nos anos 1940, fez cursos no Museu de Arte Moderna de Nova York, EUA, mas nunca frequentou a universidade. De maneira autodidata, se tornou arquiteta e urbanista.
A grande obra da vida de Lotta foi a criação do projeto do Aterro do Flamengo, o maior aterro urbano do mundo, inaugurado em 1965. A arquiteta foi presidente da Fundação Parque do Flamengo e lutou para que o aterro fosse tombado, nunca deixando a área ser loteada.
Foi casada com a poeta norte-americana Elizabeth Bishop. Em 1965, o casamento chegou ao fim e Lotta entrou em depressão. Dois anos depois, a arquiteta se suicidou, em Nova York. O filme Flores Raras (2013), de Bruno Barreto, conta o romance das intelectuais.

Niède Guidon


Niede GuidonDireito de imagemELISABETE ALVES
Image captionA arqueóloga chegou a estudar na França

Natural de Jaú, interior de São Paulo, Niède Guidon nasceu em 1933. Formou-se em História Natural pela USP na década de 1950. Na década de 1970, morando na Europa por causa do golpe militar brasileiro de 1964, foi pesquisadora do Centre National de La Recherche Scientifique (CNRS), em Paris. Foi assistente da grande arqueóloga Annete Emperaire, que procurava pelo homem mais antigo do mundo. Nesse mesmo período, Niède conheceu o sítio arqueológico de Coronel José Dias, região de São Raimundo Nonato, no Piauí.
Encantada com as manifestações de arte pré-histórica em mais de mil sítios arqueológicos descobertos no Piauí, Niède se mudou para o Estado. Por ironia do destino, encontrou ali os indícios de presença humana mais antigos do mundo.
Há mais de 40 anos, Niède Guidon luta para proteger a região do município de São Raimundo Nonato, Piauí, ainda hoje um lugar pobre e esquecido.

Leolinda Daltro

Leolinda de Figueiredo Daltro nasceu na Bahia, em 1859. Foi uma professora, feminista e indigenista, precursora da questão indígena no Brasil.
Contrária à catequização, Leolinda defendia que os índios fossem incorporados à sociedade brasileira por meio de uma educação laica. Para isso, promovia excursões pedagógicas pelo país com esse objetivo. Dessa experiência, escreveu o livro Da Catequese dos índios no Brasil - Notícias e documentos para a História.
Como feminista e sufragista, defendeu a participação das mulheres na vida política brasileira. Em 1910, fundou o Partido Republicano Feminino. Em 1917, promoveu uma passeata exigindo o voto feminino.
Em sua homenagem, foi criado o "Diploma Mulher Cidadã Leolinda de Figueredo Daltro", da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, prêmio que reconhece todo ano 10 mulheres que são exemplos de luta em suas áreas de atuação.

Eufrásia Teixeira Leite


Eufrasia TeixeiraDireito de imagemEUFRASIA TEIXEIRA
Image captionEufrasia Teixeira deixou sua fortuna para instituições sociais

Filha de uma família de aristocratas milionários e escravagistas, Eufrásia Teixeira Leita ficou órfã aos 22 anos. Deu alforria aos escravos da família e se mudou para a Europa, onde aprendeu a negociar ações e títulos, multiplicando a fortuna que herdou.
Apesar de nunca ter se casado, manteve um romance de mais de dez anos com o político e jornalista Joaquim Nabuco, um dos maiores abolicionistas do Brasil.
Sem herdeiros, Eufrásia morreu no Rio de Janeiro, em 1930. Em seu testamento, deixou quase toda a sua fortuna para instituições sociais e educacionais de Vassouras, cidade em que nasceu. Com os recursos que doou à cidade, foram construídos o Hospital Eufrásia Teixeira Leite, colégios para moças pobres e vários outros prédios.
A casa de sua família em Vassouras, a "Casa da Hera", onde Eufrásia viveu os últimos momentos, é um importante museu sobre a época da cafeicultura do Brasil.
Laís Modelli da BBC.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Brasil tem maior diversidade de árvores do planeta, diz estudo inédito


Árvore no ButãoDireito de imagemBGCI
Image captionDigitalização de dados permitiu fazer levantamento inédito de espécies

O Brasil é o país com a maior biodiversidade de árvores do mundo, aponta um levantamento inédito.
Há 8.715 espécies de árvores no território brasileiro, 14% das 60.065 que existem no planeta. Em segundo na lista vem a Colômbia, com 5.776 espécies, e a Indonésia, com 5.142.
Publicado no periódico Journal of SustainableForestry, o estudo foi realizado pela Botanical Gardens Conservation International (BGCI na sigla em inglês), uma organização sem fins lucrativos, com base nos dados de sua rede de 500 jardins botânicos ao redor do mundo.
A expectativa é que a lista, elaborada a partir de 375,5 mil registros e ao longo de dois anos, seja usada para identificar espécies raras e ameaçadas e prevenir sua extinção.

Ameaça

A pesquisa mostrou que mais da metade das espécies (58%) são encontradas em apenas um país, ou seja, há países que abrigam com exclusividade, certas espécies - podem ser centenas ou milhares -, o que indica que estão vulneráveis ao desmatamento gerado por atividade humana e pelo impacto de eventos climáticos extremos.
Trezentas espécies foram consideradas seriamente ameaçadas, por terem menos de 50 exemplares na natureza.
Também foi identificado que, com exceção dos polos, onde não há árvores, a região próxima do Ártico na América do Norte tem o menor número de espécies, com menos de 1,4 mil.

SementesDireito de imagemBGCI
Image captionTrezentas espécies estão seriamente ameaçadas, por terem menos de 50 exemplares na natureza

O secretário-geral da BGCI, Paul Smit, disse que não era possível estimar com precisão o número de árvores existentes no mundo até agora porque os dados acabam de ser digitalizados.
"Estamos em uma posição privilegiada, porque temos 500 instituições botânicas entre nossos membros, e muitos dos dados não estão disponíveis ao público", afirma.
"A digitalização destes dados é o auge de séculos de trabalho."
Uma parte importante do estudo foi estabelecer referências e coordenadas geográficas para as espécies de árvores, o que permite a conservacionistas localizá-las, explica Smith.

Cendro-de-MulanjeDireito de imagemBGCI
Image captionPesquisa mostrou que mais da metade das espécies de árvores são encontradas em um único país

"Obter informações sobre a localização dessas espécies, como os países em que elas existem, é chave para sua conservação", diz o especialista.
"Isso é muito útil para determinar quais devemos priorizar em nossas ações e quais demandam avaliações sobre a situação em que se encontram."

Conservação

Entre as espécies em extinção identificadas pela BGCI está a Karoma gigas, nativa em uma região remota da Tanzânia. No fim de 2016, uma equipe de cientistas encontrou apenas um único conjunto formado por seis exemplares.

AmazôniaDireito de imagemKYLE DEXTER
Image captionBase de dados será fundamental para conservar espécies, diz especialista

Eles recrutaram habitantes da área para proteger essas árvores e monitorá-las para que sejam alertados caso produzam sementes.
Assim, as sementes poderão serão levadas para jardins botânicos da Tanzânia, o que abre caminho para sejam reintroduzidas na natureza depois.
A BGCI diz esperar que o número de árvores da lista cresça, já que cerca de 2 mil novas plantas são descritas todos os anos.
A GlobalTreeSearch, uma base de dados online criada a partir do levantamento, será atualizada toda vez que uma nova espécie for descoberta.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

segunda-feira, 3 de abril de 2017

Para juristas, amizade entre Temer e Gilmar levanta dúvidas sobre imparcialidade de ministro no TSE


Michel Temer e Gilmar Mendes, com Eliseu Padilha e Cármen Lúcia ao fundoDireito de imagemTSE
Image captionTemer e Mendes, que é presidente do tribunal que deve julgar a cassação de sua chapa na eleição de 2014, são amigos de longa data

Os amigos Michel Temer, presidente da República, e Gilmar Mendes, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), tomaram posses de seus respectivos cargos coincidentemente no mesmo dia: 12 de maio de 2016.
Por estar à frente da corte, Mendes é quem vai presidir o julgamento que pode levar à cassação de Temer. A partir desta terça-feira, o TSE começa a decidir se a chapa vitoriosa da eleição presidencial de 2014 - formada por Dilma Rousseff (derrubada por impeachment) e Michel Temer (eleito vice) - deve ser cassada.
Temer e Mendes reconhecem publicamente a amizade e mantêm inclusive convivência privada - foram ao menos oito as ocasiões em que eles se encontraram sem registros em suas agendas oficiais desde maio passado.
Para juristas ouvidos pela BBC Brasil, essa relação é inadequada e levanta dúvidas sobre a imparcialidade de Mendes para conduzir o processo e julgar Temer. O Código de Processo Civil prevê que juízes não podem julgar "amigo íntimo" nem "aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa (que está em julgamento)". Nessas situações, é preciso se declarar "suspeito".
"Me parece inadequado que o presidente do TSE tenha encontros não oficiais com pessoas que eventualmente serão seus jurisdicionados (julgados por ele). Todos sabemos que há um processo extremamente delicado, com enormes consequências políticas. Tem que se preservar um certo cerimonial para resguardar a imparcialidade do julgamento", afirma Oscar Vilhena Vieira, diretor da FGV-Direito SP.
"Quanto à suspeição, evidente que, dependendo do grau dessa amizade, em que medida ela possa gerar uma perda de imparcialidade, o ministro deveria se declarar suspeito. Não sei qual o grau dessa amizade. É uma situação delicada", diz ainda.
O advogado Adilson Dallari, professor da PUC-SP, destaca que relações de amizade no meio jurídico são comuns. Ele mesmo diz ter amigos contemporâneos de faculdade que são desembargadores, e nem por isso se tornam automaticamente suspeitos para julgar suas causas.
"O que a lei qualifica como suficiente para gerar suspeição é a amizade íntima, é uma convivência muito mais intensa", afirma.
Mesmo com esta ressalva, Dallari também vê problemas na conduta do presidente do TSE.
"Ele é um juiz sério, competente, tem uma boa formação jurídica, sem dúvida. Eu não gosto é do comportamento dele. Ele poderia ser mais discreto ou mais contido, porque esse comportamento errático dele acaba gerando mesmo alguma cogitação de suspeição."

Gilmar MendesDireito de imagemPEDRO FRANÇA/AGÊNCIA SENADO
Image captionJuristas dizem que Mendes deveria se declarar suspeito para julgamento do TSE por causa de relação íntima com Temer

'Incoerente'

O levantamento dos encontros não oficiais entre Temer e Mendes foi feito pela BBC Brasil a partir de notícias vinculadas em jornais e portais brasileiros (veja lista ao final da reportagem). Ao menos quatro deles ocorreram no Palácio do Jaburu, residência oficial de Temer (não está claro onde ocorreu o quinto encontro).
Dois foram confraternizações com outras autoridades na casa de Mendes, enquanto o oitavo tratou-se de um jantar na residência de um ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Solicitada a confirmar os encontros e a explicar a falta de registro oficial, a Secretaria de Imprensa do Palácio do Planalto respondeu que "não divulga informações sobre a agenda privada do presidente Michel Temer".
A assessoria do tribunal, por sua vez, encaminhou a seguinte resposta:
"Desde que assumiu o TSE, em maio de 2016, o ministro Gilmar Mendes tem ressaltado a necessidade de realização de uma mudança do sistema eleitoral brasileiro. Como chefe da corte eleitoral é fundamental que mantenha contato com integrantes dos outros Poderes e tais reuniões sempre ocorrerem com total transparência e publicidade."
Para o professor de Direito Público da UnB Marcelo Neves, que já chegou a apresentar um pedido de impeachment contra Mendes, há incoerência nas explicações do ministro e do presidente.
"Se essas reuniões são fundadas em amizade, haveria suspeição. Se não é por amizade, se trata-se de assunto público, o princípio da impessoalidade, da moralidade administrativa e, principalmente, o princípio da publicidade, previstos na Constituição, exigem que os encontros sejam formalizados na agenda", afirma.
"É incoerente", concorda a professora de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Estefânia Barboza. "Se eles admitem no Palácio do Planalto que esses encontros não são institucionais, nesse caso, ele teria que se dar por suspeito", afirma ela.
Ela ressalta que a polêmica não é totalmente nova.
Em setembro 2015, em meio à forte crise política, Dilma se reuniu com o então presidente do STF, Ricardo Lewandowski, em Portugal, num encontro que não foi divulgado à imprensa, nem constou em sua agenda oficial. Ele estava no país para um evento e ela estava de passagem, devido a uma escala do voo de volta da Rússia.
Após críticas, o ministro disse que solicitou o encontro para falar sobre o aumento dos salários do Judiciário.
"Serve para todo mundo. Não dá para ter encontro fora da agenda porque a gente tem que saber do que eles estão tratando", afirma a jurista.
Barbosa, no entanto, considera que Mendes "está exagerando" ao se reunir não só com Temer, mas com outras autoridades, principalmente do PSDB e do PMDB. Ela acredita que o "corporativismo" do Judiciário acaba poupando o ministro de críticas abertas de instituições como OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e associações de juízes.
Para o especialista em transparência e integridade Fabiano Angélico, consultor da Transparência Internacional, "é inaceitável que sejam nada transparentes os encontros entre uma pessoa que será julgada e o magistrado que terá papel fundamental nesse julgamento".
Embora não haja leis explícitas sobre quais encontros deveriam ser divulgados nas agendas oficiais, Angélico considera que essa exigência fica clara na Constituição.
"É incompreensível que um ministro da Suprema Corte e um constitucionalista (Temer) não sigam essa orientação geral, independente de normas infralegais ou leis que obriguem à publicação de agenda", diz ainda.

Michel Temer, Ministro Gilmar Mendes, Presidente do TSE, Eunício Oliveira, Presidente do Senado Federal, e Rodrigo Maia, Presidente da Câmara dos DeputadosDireito de imagemMARCOS CORRÊA/PR
Image captionDesde 2016, Temer e Mendes já tiveram pelo menos oito encontros privados não registrados em suas agendas oficiais

Amizade

Em entrevista no início de março à BBC Brasil, Mendes reconheceu mais uma vez a amizade com o presidente, mas refutou que seja suspeito para julgá-lo. Segundo ele, a garantia que a sociedade tem de que o julgamento do TSE será bem conduzido é "a institucionalidade do próprio tribunal".
Na ocasião, o ministro destacou que foi graças ao seu voto divergente que a ação que será julgada agora não foi arquivada em 2015.
Na ocasião, porém, a presidente ainda era Dilma Rousseff, de modo que ela e o PT seriam os principais afetados por eventual cassação da chapa presidencial. Mendes é constantemente acusado de ser anti-PT, o que ele nega.
"Eu sempre fui amigo do presidente Temer, antes de atividade política, por atividades acadêmicas, vivências nos seminários de direito constitucional", afirmou.
"Relações políticas, todos nós as temos, no sentido da convivência. As pessoas não acreditam, mas eu tenho amigos no PT."

Encontros privados x interesse público

Embora o Palácio do Planalto classifique as reuniões entre Temer e Mendes como assunto particular, reportagens indicam que os dois costumam tratar de questões de interesse público.
Há quase três semanas, por exemplo, quando o TSE colhia depoimentos de executivos da Odebrecht sobre supostas ilegalidades na campanha de 2014, ambos se reuniram em um domingo (12 de março), no Palácio do Jaburu.
Ao jornal O Estado de S. Paulo, o ministro negou que tenha tratado dessa questão com o presidente, mas disse que conversou com Temer sobre reforma política.
Na mesma semana, após um encontro oficial que contou também com a participação dos presidentes da Câmara (Rodrigo Maia) e do Senado (Eunício Oliveira), Mendes defendeu mudanças na eleição de deputados federais, com a adoção de listas fechadas formuladas pelos partidos.
Já no início de fevereiro, também em um domingo, Mendes e Temer se reuniram privadamente no Jaburu, desta vez, segundo reportagens, para discutir a nomeação do sucessor do falecido ministro Teori Zavascki. Dois dias depois, Alexandre de Moraes foi indicado para vaga.

Michel Temer, Eliseu Padilha e Gilmar MendesDireito de imagemTSE
Image captionPara especialistas, o problema é a possível discussão de assuntos de interesse público entre o presidente e o ministro

Em outubro passado, após um encontro com Temer no Jaburu, que contou com a participação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e do ex-ministro da Secretaria de Governo Geddel Vieira Lima, Mendes disse ao jornal Folha de S.Paulo que havia sido uma reunião entre amigos.
"Foi uma conversa de velhos amigos. Foi uma conversa geral, uma avaliação de momento. O pessoal está otimista com o bom resultado da eleição (municipal), da aprovação da PEC (que limita gastos públicos) para refazer a situação muito difícil do país", disse o ministro.
Além desses encontros, Mendes também viajou no avião presidencial para Portugal em janeiro, na comitiva que participaria do funeral do ex-presidente Português Mário Soares. O ministro, porém, faltou ao evento devido a uma crise de labirintite.
Ele permaneceu no país de férias por cerca de mais dez dias, gerando críticas de que teria pegado uma "carona" injustificada no avião de Temer. Ao jornal Folha de S.Paulo, o ministro disse não ter havido nenhum conflito de interesse.

As oito ocasiões em que Temer e Mendes se encontraram sem registro nas agendas oficiais:

- 28/05/16 (sábado) - Visita de Gilmar Mendes ao presidente no Palácio do Jaburu. Assessoria de Temer informou à Folha de S.Paulo que Mendes solicitou o encontro para discutir o orçamento do TSE.
- 28/06/16 (terça-feira) - Jantar de confraternização na residência do ministro do STJ João Otávio de Noronha com presença de outras autoridades.
- 01/08/16 (segunda-feira) - Temer, ainda presidente interino, participa de jantar na casa de Gilmar Mendes com outras autoridades e pecuaristas; na ocasião teriam discutido a antecipação da votação final do impeachment de Dilma.
- 12/10/16 (quarta-feira, feriado) - Temer, Mendes, Geddel e FHC almoçam no Palácio do Jaburu.
- 22/01/17 (domingo) - Jantar no Palácio do Jaburu para "conversa de rotina", segundo disse a assessoria de Mendes ao jornal Estado de S.Paulo.
- 05/02/17 (domingo) - Encontro em que teria se discutido nomeação de Alexandre de Moraes para o STF, possivelmente no Palácio do Jaburu.
- 12/03/17 (domingo) - Encontro no Palácio do Jaburu em que teria sido discutida a reforma política.
- 15/03/17 (quarta-feira) - Temer vai à residência de Gilmar Mendes para comemoração do aniversário do senador José Serra.

Fonte:BBC. Mariana Schreiber - @marischreiber
Professor Edgar Bom Jardim - PE