sábado, 12 de fevereiro de 2022

‘O Menino Azul’: como pintura do século 18 se tornou símbolo do orgulho gay




Quadro 'O Menino Azul', de Thomas Gainsborough

CRÉDITO,HUNTINGTON LIBRARY, ART MUSEUM E BOTANICAL GARDENS

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Poucos quadros na história da arte tornaram-se um símbolo tão poderoso de identidade de gênero não conformista e da atração pelo mesmo sexo quanto 'O Menino Azul', de Thomas Gainsborough

Uma fila com número recorde de visitantes formou-se em janeiro de 1922 no lado externo da Galeria Nacional, em Londres, mesmo com tempo chuvoso, para ver um único quadro: O Menino Azul, do artista britânico Thomas Gainsborough.

A obra de arte havia sido comprada no ano anterior por um colecionador norte-americano, e sua partida iminente levou 90 mil pessoas a dar uma última olhada no que a imprensa havia chamado de "a pintura mais bela do mundo".

Um artigo no jornal London Times defendeu que O Menino Azul exemplificava a "graça gentil e a postura serena de um povo que sabia que era um grande povo e não se envergonhava disso".

Para a população em geral, o Menino Azul de Gainsborough era o protótipo da alta cultura e do nobre caráter britânico


Em janeiro de 2022, o Menino Azul voltou para Londres depois de cem anos e está sendo novamente exibido na Galeria Nacional, onde ficará exposto por cinco meses

Mas quantos visitantes conhecem hoje em dia a longa caminhada da pintura como símbolo do orgulho gay?

Quadro 'O Menino Azul', de Thomas Gainsborough

CRÉDITO,HUNTINGTON LIBRARY, ART MUSEUM E BOTANICAL GARDENS

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'O Menino Azul' era um símbolo quando foi levado do Reino Unido em 1922 e assumiu um novo significado um século depois

Valerie Hedquist, professora de História da Arte da Universidade de Montana, nos Estados Unidos, escreveu extensamente sobre o quadro e seu papel como ícone da comunidade gay.

Em parte, esta é uma história de consequências imprevistas e de como os artistas perdem o controle das suas criações depois que elas entram para o imaginário coletivo.

Hedquist contou à BBC que, quando Thomas Gainsborough pintou O Menino Azul, em torno de 1770, "ele era mais uma obra de demonstração para exibir os seus talentos".

Acredita-se que o menino seja o sobrinho do artista, Gainsborough Dupont, em vestes aristocráticas do século 17, em homenagem a Sir Anthony van Dyck — um artista cujas técnicas e composições eram admiradas por Gainsborough.

Quadro ilustrando Lorde John Stuart e seu irmão, Lorde Bernard Stuart

CRÉDITO,THE NATIONAL GALLERY, LONDRES

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'O Menino Azul' foi pintado em homenagem a Sir Anthony van Dyck, autor deste quadro ilustrando Lorde John Stuart e seu irmão, Lorde Bernard Stuart, pintado em cerca de 1638

Em 1770, a pose do Menino Azul teria sido interpretada pelas pessoas como nobre, sinalizando um exemplo de futuro marido e pai.

Ele está de pé em posição de autoridade conhecida como contrapposto, muito utilizada na arte clássica.

O cotovelo saliente é outra pose muito empregada nos retratos da arte europeia, descrita pela historiadora Joaneath Spicer como "indicando essencialmente arrojo ou controle — e, portanto, o autodefinido papel masculino".

Escultura clássica

CRÉDITO,THE MINNEAPOLIS INSTITUTE OF ART

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A pose do 'Menino Azul' é a mesma de esculturas clássicas — considerada o ápice da elegância masculina no século 18


Mas, para Hedquist, a ideia de que o menino da pintura está vestindo uma fantasia e representando é fundamental para suas reavaliações posteriores. Segundo ela, "o Menino Azul é um convite à representação".

Esse processo começou no palco no século 19, com a representação do "Pequeno Menino Azul" em peças de teatro pantomimas, frequentemente vestido com as sedas, bermudas e colarinho de rendas do Menino Azul de Gainsborough. E esse personagem era frequentemente representado por atrizes.

Este, segundo Hedquist, foi o início da "feminização" do Menino Azul. "No final do século 19", explica ela, "as revistas ficaram repletas de ilustrações de meninas vestidas como o Menino Azul".

Em 1922 — ano em que a pintura de Gainsborough ganhou um novo lar nos Estados Unidos —, Cole Porter apresentou seu musical Mayfair and Montmartre, com Nelly Taylor vestida como o Menino Azul surgindo teatralmente de uma moldura e cantando uma música chamada Blue Boy Blues.

Marlene Dietrich também se vestiu como o Menino Azul para uma comédia teatral em 1927, enquanto Shirley Temple fez o mesmo para o filme Curly Top (A Pequena Órfã, no Brasil) em 1935.

Shirley Temple vestida como o Menino Azul no filme Curly Top (A Pequena Órfã, no Brasil), em 1935

CRÉDITO,GETTY IMAGES

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Shirley Temple vestida como o Menino Azul no filme Curly Top (A Pequena Órfã, no Brasil), em 1935

A pintura havia criado uma plataforma para ofuscar a identidade de gênero. O Menino Azul podia ser masculino ou feminino no mundo fluido das apresentações teatrais.

Para Hedquist, outra dimensão da história envolve o escritor irlandês e líder do Movimento Estético, Oscar Wilde. Wilde vestia-se com roupas extravagantes com inspiração histórica, frequentemente com bermudas, casacos de veludo, mantos e chapéus de abas largas, em homenagem a pintores como Gainsborough.

Em uma fotografia tirada pelo americano Napoleon Sarony em 1882, Wilde apresentou-se na mesma pose do Menino Azul, em elegantes sapatos com fivelas e calças curtas.

Quando Wilde foi preso por ser homossexual, em 1895, ele se tornou o mais famoso homem assumidamente gay do mundo — e suas fotografias, tiradas por Sarony, foram proibidas.

Segundo Hedquist, "elas acabaram nos primeiros livros médicos que ensinavam às pessoas como reconhecer a homossexualidade".

Estava enraizada uma visão brutal e intolerante da atração pelo mesmo sexo, com base, em parte, nas "indicações" visuais estereotipadas do Menino Azul.

Oscar Wilde

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As roupas usadas por Oscar Wilde parecem ser derivadas da estética do 'Menino Azul'

Depois que o Menino Azul chegou aos Estados Unidos, ele ficou famoso e apareceu em cerâmicas, tecidos e milhares de reproduções impressas. A forma como ele foi interpretado no seu novo país também ficou sujeita aos ventos das mudanças culturais.

Hedquist conta que um episódio formador dessa interpretação foi o chamado "terror lilás", nos anos 1950, que fez com que homens e mulheres gays fossem considerados ameaças à segurança nacional e perseguidos nos órgãos governamentais.

Estereótipos comuns de comportamento gay — que hoje são motivos de risadas pela sua ignorância — como punhos com rendas e sapatos extravagantes eram mencionados como indicadores dos "inimigos internos".

Os arquétipos

Surgiram na cultura popular paródias cômicas grotescas de comportamento considerado gay, como em tiras em quadrinhos.

Na revista Mad de setembro de 1970, uma história em quadrinhos apresentava um personagem chamado Prissy Percy, que é zombado por rapazes esportistas americanos. A cena final revela que Percy é o Menino Azul.

A sensação e mensagem velada da história é homofóbica. Hedquist considera essa história o primeiro "passeio" do Menino Azul. Em 1976, uma história de Dennis, o Pimentinha, também apresentou o Menino Azul, que novamente foi rotulado como "afeminado".

"As ideias emergentes sobre como as pessoas veem os homens gays é muito importante para a forma como o Menino Azul se tornou um ícone", afirma Hedquist, "primeiro como fonte de ridicularização e depois como reapropriação".

A reapropriação veio na forma de uma revista gay publicada pela primeira vez em 1974, chamada Blue Boy (Menino Azul, em inglês).

A capa da primeira edição apresentou uma foto de Dale, um boxeador de Ohio, nos Estados Unidos, em homenagem à obra-prima de Gainsborough, mas sem calças e com um chapéu convenientemente reposicionado.

A revista, que foi criação do empresário Don N. Embinder, foi publicada até dezembro de 2007 e anunciava produtos e serviços com o Menino Azul como símbolo recorrente.

"A primeira agência de viagens gay chamou-se 'Blue Boy'", segundo Hedquist. "Eles tinham navios e hotéis onde os homens podiam ser abertamente gays, vestindo camisetas do Menino Azul e carregando malas de viagem com o personagem. Foi uma reapropriação completa e uma celebração de que o Menino Azul era gay".

No período após a Rebelião de Stonewall, em São Francisco (Estados Unidos), em 1969, o Menino Azul foi um símbolo de motivação e deixou um legado de diversos bares gays chamados "Blue Boy" em várias partes do mundo.

Retrato de um Jovem, do artista norte-americano Kehinde Wiley, 2021

CRÉDITO,HUNTINGTON LIBRARY, ART MUSEUM E BOTANICAL GARDENS

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Retrato de um Jovem, do artista norte-americano Kehinde Wiley, 2021

Menino Azul também causou efeitos sobre as artes visuais.

O artista norte-americano Robert Lambert criou colagens de imagens fotocopiadas e as enviou pelo correio para seus amigos. Algumas dessa imagens incluíam o Menino Azul como símbolo da sua sexualidade.

Menino Azul também foi frequentemente apropriado pelo ceramista norte-americano Howard Kottler, como opção para expressar "referências homossexuais explícitas", segundo a historiadora da arte Vicki Halper.

Mas as referências mais explícitas ao Menino Azul vieram no trabalho de outro ceramista norte-americano, Léopold Foulem.

Segundo Hedquist, ele "transformou as tímidas alusões ao teor gay encontradas no trabalho de Lambert e Kottler em um dilúvio totalmente desenvolvido de significado homossexual", com suas cenas altamente provocadoras do Menino Azul com personagens como o Papai Noel e o Coronel Sanders.

Outros artistas identificados como homossexuais, como Robert Rauschenberg e Kehinde Wiley, mencionaram o Menino Azul como influência importante sobre sua produção posterior.

Wiley criou recentemente uma homenagem direta ao quadro, que se encontra em exibição no Museu de Arte Huntington, na Califórnia (Estados Unidos) — já que, em 1921, Henry e Arabella Huntington compraram o Menino Azul do comerciante de arte Joseph Duveen, que o havia adquirido do Duque de Westminster.

A pintura de Wiley, que mostra um Menino Azul do século 21 com tranças rastafári tingidas de loiro, relógio da Apple e boné de baseball, marca o ápice da longa jornada de dois séculos do original de Gainsborough, desde quando era um pilar dos valores culturais tradicionais até tornar-se um ícone gay.

Para Valerie Hedquist, O Menino Azul é um símbolo revolucionário na história dos direitos dos homossexuais. Além do seu apelo para os artistas gays, o seu uso como marca na revista Blue Boy nos anos 1970 pareceu ter um significado histórico fabuloso.

"Foi a primeira oportunidade para uma vida aberta e aceitável", afirma ela. "Ele forneceu um meio de levar uma existência totalmente pública para os homens homossexuais — e tudo veio através do Menino Azul."

  • Matthew Wilson
  • BBC Culture

Professor Edgar Bom Jardim - PE

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

O que é a sequência de Fibonacci e o por que é chamada de 'código secreto da natureza'




BBC NEWS BRASIL - You Tube -
A sequência de Fibonacci é uma das sequências de números mais famosas da história. Ela foi escrita em 1202 por Leonardo de Pisa, mais conhecido como Fibonacci, no seu "Livro do Cálculo". Chamada de “código secreto da natureza” ou “sequência divina”, ela pode ser verificada no mundo natural em vários casos, como nas pétalas de girassol ou na casca de abacaxis. Neste vídeo, explicamos a fascinante história da sequência de Fibonacci e a sua relação próxima com um outro número também muito famoso: o número de ouro, também conhecido como proporção áurea por seu vínculo com a natureza e a beleza

Professor Edgar Bom Jardim - PE

domingo, 6 de fevereiro de 2022

5 frases famosas atribuídas a personagens históricos que nunca as disseram




Mahatma Gandhi

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Mahatma Ganhdi nunca disse uma das frases mais famosas atribuídas a ele

Inserir casualmente uma citação de uma pessoa famosa no meio de uma conversa geralmente é uma maneira rápida de comunicar o que estamos pensando. Mas você tem certeza de que a citação que você está repetindo está correta?

Abaixo, por exemplo, reunimos cinco frases populares de figuras históricas que estão erradas ou, pior, nunca foram ditas por elas.

'Seja a mudança que você quer ver no mundo' - Mahatma Gandhi

Mahatma Gandhi, líder do movimento de independência contra o domínio britânico na Índia, é a fonte de muitas citações.

Entre eles está essa acima, que enfatiza a responsabilidade pessoal como ponto de partida para a mudança globa


O problema é que não há registro de ele tenha dito ou escrito essa frase

A coisa mais próxima que ele falou a respeito foi publicada em 1913 no jornal Indian Opinion (fundado por ele): "Nós apenas refletimos o mundo. Todas as tendências presentes no mundo exterior são encontradas no mundo do nosso corpo. Se pudéssemos mudar nós mesmos, as tendências do mundo também mudariam."

'Posso não concordar com o que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo' - Voltaire

Esta citação, supostamente do escritor e filósofo francês Voltaire, é frequentemente usada por defensores da liberdade de expressão.

Em poucas palavras, ele diz que se você acredita fortemente no direito das pessoas de falarem o que pensam, você defenderá esse direito mesmo quando elas disserem algo que você realmente acha ofensivo ou não quer ouvir.

pintura do rosto de Voltaire

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Muitos defensores da liberdade de expressão confiam nesta frase que Voltaire não disse

Voltaire, que viveu entre 1694 e 1778, certamente acreditava na liberdade de expressão.

Grande parte de seus escritos atacava as tentativas da Igreja Católica de restringir a liberdade das pessoas da época. Mas é quase certo que ele nunca expressou suas opiniões nos termos dessa "frase mais citada".

A citação se origina de uma biografia de Evelyn Beatrice Hall publicada em 1906, mais de um século após a morte de Voltaire.

No livro, a autora tenta resumir o pensamento de Voltaire sobre a liberdade de expressão e escreveu essa frase para transmitir a ideia.

'Para que o mal triunfe, basta que os bons não façam nada' - Edmund Burke

Edmund Burke foi um filósofo, estadista e escritor irlandês do século 18, e um deputado por mais de 20 anos. Entre suas frases mais citadas está essa acima.

Mas o biógrafo de Burke nega que o filósofo a tenha dito.

Edmund Burke

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Edmund Burke é considerado o pai do liberalismo conservador britânico

David Bromwich, autor de The Intellectual Life of Edmund Burke (A vida intelectual de Edmund Burke), disse à Reuters: "Não sei se alguém famoso atribuiu (a frase a Burke), mas esse erro de atribuição tem tido uma vida longa", agregando que não vê sentido na frase nem acha que Burke diria algo "tolo" assim. "O silêncio dos homens bons não é a única coisa necessária para o triunfo do mal", opina.

O que Burke disse, em 1770, foi: "Quando homens maus se unem, homens bons devem se associar; caso contrário, eles vão acabar, um por um, fazendo um sacrifício impiedoso em uma luta ingrata".

A citação parece ter sido distorcida logo depois, e até foi referenciada pelo ex-presidente dos EUA, John F. Kennedy, em um famoso discurso em 1961.

'Eu não posso mentir. Eu cortei a cerejeira' - George Washington

Entre seus seguidores, George Washington (o primeiro presidente dos Estados Unidos) era famoso por sua honestidade.

George Washington

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Há quem defenda que a frase atribuída a Washington é completamente inventada

Isso é frequentemente ilustrado por uma história em que Washington, com 6 anos de idade, cortou a preciosa cerejeira de seu pai, mas, quando seu vandalismo foi descoberto, o menino imediatamente admitiu o erro.

É uma história amada e contada muitas vezes, que se tornou um símbolo das virtudes de Washington.

Ela apareceu pela primeira vez no relato do biógrafo Mason Locke Weems sobre a vida de Washington, que foi publicado um ano após a morte do político em 1799.

Mas, curiosamente, a história não foi incluída no livro de Weems até a quinta edição, publicada em 1806.

Sem nenhuma outra evidência antes disso, alguns argumentam que a história poderia ter sido completamente inventada.

'Que comam brioche' - Maria Antonieta

Diz-se que quando Maria Antonieta, rainha da França durante o período que antecedeu a Revolução Francesa (1789), foi informada de que seus súditos não tinham mais pão para comer, teria dito: "Que comam brioches!"

A frase é para mostrar como ela não tinha contato com a realidade da população pobre da França, ou que ela simplesmente não se importava.

Maria Antonieta

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Essa frase já era usada para demonstrar a falta de contato com o povo de muitos aristocratas.

A história parece ter surgido nos escritos do filósofo iluminista Jean-Jacques Rousseau por volta de 1767, mas ele só a atribui a "uma grande princesa".

Mas como Maria Antonieta era criança na época, é improvável que ela fosse a princesa a quem ele se referia.

Além disso, histórias semelhantes sobre diferentes aristocratas esnobes circulavam há anos.

A frase foi especificamente ligada a Maria Antonieta pela primeira vez em um panfleto do escritor Jean-Baptiste Alphonse Karr publicado 50 anos após sua morte, o que também sinaliza que a atribuição a ela dificilmente estava correta.

BBC

Professor Edgar Bom Jardim - PE

sábado, 5 de fevereiro de 2022

Quais são os interesses da China no conflito entre Rússia e Ucrânia?



Vladimir Putin com Xi Jinping nesta sexta (4 de fevereiro)

CRÉDITO,REUTERS

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Vladimir Putin com Xi Jinping nesta sexta (4 de fevereiro); países emitiram comunicado reafirmando sua 'amizade sem limites'

Enquanto Estados Unidos e Rússia trocam ameaças cada vez mais agressivas sobre a crise na Ucrânia, um outro importante ator da geopolítica mundial também vem se manifestando com firmeza: a China.

Cerca de 100 mil soldados russos encontram-se atualmente na fronteira com a Ucrânia, e os americanos acusam Moscou de planejar invadir a ex-república soviética.

Nos últimos dias, Pequim pediu calma para ambos os lados, insistindo para que as potências abandonem a mentalidade competitiva herdada da Guerra Fria. Porém, ao mesmo tempo, o gigante asiático já deixou claro que compartilha das preocupações de Moscou.

Nesta sexta-feira (4/2), o presidente russo, Vladimir Putin, desembarcou em Pequim para acompanhar a abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno a convite do líder chinês Xi Jinping. Os dois líderes se reuniram antes da abertura do evento e, segundo o Kremlin, tiveram "discussões calorosas"

Em um comunicado divulgado após a reunião, os dois países afirmaram que "a amizade entre [Rússia e China] não tem limites, não há áreas 'proibidas' de cooperação" e que pretendem "combater a interferência de forças externas em assuntos internos de países soberanos"

É de se imaginar que, numa eventual escalada das tensões com a Ucrânia e o Ocidente, a China ficaria do lado da Rússia, país que é seu aliado de longa data e ex-camarada comunista. Mas os motivos que levaram Pequim a apoiar o governo de Vladimir Putin no atual confronto vão muito além da afinidade histórica.

Rússia e China contra o Ocidente

Na semana passada, o ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, classificou as preocupações da Rússia em relação à sua segurança nacional como "legítimas", afirmando que elas deveriam ser "levadas a sério e discutidas".

ChinXi Jinping em reunião por videoconferência com Putin, em dezembro de 2021

CRÉDITO,GETTY IMAGES

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É de se imaginar que, numa eventual escalada das tensões com a Ucrânia e o Ocidente, a China ficaria do lado da Rússia; acima, reunião bilateral entre os dois países em 2021


Já na segunda-feira (31/1), o representante de Pequim na ONU, Zhang Jun, foi ainda mais longe e disse abertamente que a China discordava das alegações dos EUA de que a Rússia está ameaçando a paz internacional.

Ele também criticou os Estados Unidos por convocar uma reunião do Conselho de Segurança da ONU, afirmando que a "diplomacia do megafone" americana "não era propícia" para as negociações.

Baseada em um discurso diplomático ponderado, a China tem tomado uma posição cautelosa e sutil em relação à crise, esquivando-se de manifestar qualquer tipo de apoio ao uso de força militar.

Mas alguns dos meios de comunicação estatais que cobrem a crise têm sido mais diretos. Com o crescimento do sentimento anti-Ocidente no país, a crise na Ucrânia foi retratada na China como mais um exemplo do fracasso da política externa ocidental.

Na opinião da imprensa controlada por Pequim, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan, aliança militar ocidental) sob o comando dos Estados Unidos está adotando uma posição agressiva ao se recusar a respeitar o direito soberano de outros países - como Rússia e China - de defender seu território.

O jornal Global Times chegou a dizer que o relacionamento e o vínculo cada vez mais próximos entre a China e a Rússia são "a última defesa que protege a ordem mundial". Já um relatório da agência de notícias estatal Xinhua afirmou que os EUA estavam tentando "desviar a atenção doméstica " e "reviver a sua influência sobre a Europa" com seu comportamento.

Segundo Jessica Brandt, diretora da área de política do centro de estudos Brookings Institution, o discurso de Pequim foi divulgado em vários idiomas no Twitter - que é proibido na China -, em uma tentativa de moldar a visão do restante do mundo em relação aos EUA e à Otan.

"O objetivo é minar o soft power dos Estados Unidos, manchar a credibilidade e o apelo das instituições liberais e desacreditar a imprensa livre", disse ela à BBC, acrescentando que este é um exemplo de como Pequim discute o confronto entre o Kremlin e a Ucrânia quando convém aos seus interesses.

No comunicado emitido nesta sexta, a China apoiou a posição russa em relação à Otan e condenou a "expansão" da organização. No documento, as duas nações ainda pedem que a aliança militar "abandone suas abordagens ideológicas da Guerra Fria" e respeite a "soberania, segurança e interesses de outros países".

Objetivos compartilhados, inimigo comum

Os governos de China e Rússia vêm se aproximando e, segundo especialistas, podem ter criado a conexão mais próxima entre as potências desde a era de Stálin e Mao.

A crise da Crimeia de 2014 na Ucrânia empurrou a Rússia para os braços da China, que ofereceu a Moscou apoio econômico e diplomático em meio ao isolamento internacional.

Desde então, o relacionamento floresceu ainda mais. A China é o maior parceiro comercial da Rússia há anos e atingiu no ano passado um novo recorde de US$147 bilhões em comércio bilateral.

Protesto na Ucrânia

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Ocidente advertiu que ampliaria sanções a Moscou no caso de uma invasão à Ucrânia

Os dois países também assinaram um acordo para estreitar seus laços militares no ano passado e intensificaram os exercícios militares conjuntos.

Ambos os países têm relações particularmente tensas com o Ocidente, o que é crucial para sua aliança.

"Pequim e Moscou têm um interesse comum em reagir contra os EUA e a Europa e expandir seu papel na política internacional", diz Chris Miller, professor assistente de História Internacional da Universidade Tufts.

No caso de uma escalada no conflito com a Ucrânia que resulte na imposição de sanções ocidentais à Rússia, os especialistas acreditam que a China provavelmente fornecerá ajuda econômica para Moscou, assim como já fez no passado.

A assistência pode chegar em forma de fornecimento de sistemas alternativos de pagamento, empréstimos para bancos e empresas russas, uma expansão da importação de petróleo russo ou até mesmo a rejeição total dos controles de exportação dos EUA.

No entanto, tudo isso significaria um ônus financeiro significativo para a China - razão pela qual os especialistas acreditam que Pequim, ao menos por enquanto, se contentou em apoiar Moscou apenas com palavras de aprovação.

"O apoio manifestado apenas por meio da retórica é um movimento de baixo custo para Pequim", diz Miller.

Um conflito militar na Ucrânia certamente tiraria a atenção dos EUA de outras questões, o que sem dúvida beneficia a China. Mas muitos observadores acreditam que Pequim realmente diz a verdade quando afirma não querer uma guerra.

A China busca estabilizar as relações com os EUA neste momento, aponta Bonnie Glaser, diretora do programa sobre a Ásia do centro de estudos americano German Marshall Fund. Se Pequim ampliar ainda mais seu apoio a Moscou, "poderia criar mais tensões com os EUA, incluindo uma divisão mais clara entre democracia e autocracia", afirmou a especialista à BBC.

Em um artigo publicado recentemente, o cientista político Minxin Pei afirmou que Pequim está provavelmente "protegendo suas apostas" em relação à crise, pois desconfia das verdadeiras intenções de Moscou.

Além disso, dar mais apoio à Rússia pode provocar reações negativas da União Europeia, o segundo maior parceiro comercial da China. Segundo Pei, esse descontentamento europeu poderia assumir a forma de apoio a Taiwan em sua luta por independência com Pequim.

Putin em Pequim nesta sexta

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Putin em Pequim nesta sexta; ambos os países têm relações particularmente tensas com o Ocidente, o que é crucial para sua aliança

'Taiwan não é a Ucrânia'

Americanos e chineses observam de perto o conflito na Ucrânia, que pode servir como um teste para a lealdade dos Estados Unidos com seus aliados.

Muitos questionam se os EUA poderiam intervir militarmente se a Rússia decidir, de fato, invadir a Ucrânia, ou se o país faria o mesmo caso a China decida intervir em Taiwan, uma ilha que se vê como independente e tem os americanos como maiores aliados.

A preocupação em relação ao uma guerra dos EUA com a China por causa de Taiwan é vista como legítima na Ásia, já que a rivalidade EUA-China não para de crescer e Taiwan relata cada vez mais invasões de aviões militares chineses em seu espaço aéreo.

Os EUA evitam comentar sobre sua posição no caso de um ataque. E apesar do acordo que obriga os americanos a fornecer suporte militar a Taiwan em momentos de ameaça, Washington reconhece por meio de sua diplomacia a ideia defendida por Pequim de que Tibete, Hong Kong, Macau e Xinjiang (todas áreas que reivindicam autonomia perante a China) fazem parte do mesmo país.

Especialistas, no entanto, afirmam que não é correto comparar a situação de Taiwan com a da Ucrânia e argumentam que as duas crises são alimentadas por interesses geopolíticos distintos.

"A China não é a Rússia, e Taiwan não é Ucrânia. Os EUA têm muito mais em jogo com Taiwan do que com a Ucrânia", diz Bonnie Glaser.

  • Tessa Wong
  • BBC News

Professor Edgar Bom Jardim - PE

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

Governador Paulo Câmara pede que Bolsonaro respeite o povo nordestino




O governador Paulo Câmara (PSB) pediu ao presidente Jair Bolsonaro (PL) respeito ao povo nordestino. Em live, na noite desta quinta-feira (3), o presidente usou uma expressão empregada para se referir a nordestinos de forma depreciativa. Ao comentar a revogação de mais de duas dezenas de decretos de luto oficial, Bolsonaro errou o estado de nascimento do líder religioso Padre Cícero (1844-1934) e chamou assessores de pau de arara. A fala teve forte repercussão nas redes sociais.

"O presidente Bolsonaro já se referiu aos brasileiros do Nordeste como Paraíbas, cabeçudos e, agora, Paus-de-arara. Essa reiterada prática de repetir estigmas e preconceitos só contribui para manter o país dividido e ampliar a cortina de fumaça em torno de um governo que desmontou políticas públicas, desdenhou de milhares de mortes pela covid-19 e trouxe de volta a inflação, aumentando as desigualdades. Respeite o povo do Nordeste", criticou Paulo Câmara.

O termo pau de arara é usado para se referir de forma depreciativa a nordestinos. A expressão refere-se aos caminhões usados na migração, em décadas passadas, de pessoas pobres do Nordeste para outras regiões do país.

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quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

Óleo de coco resiste a altas temperaturas e não libera substâncias nocivas





Volta e meia, a utilização de gorduras em cozimento e frituras é assunto que levanta polêmica e dúvidas. Não seria diferente, portanto, com o óleo de coco, cada vez mais popular nas prateleiras de supermercados. 

De acordo com Ana Paula G. Karam, nutricionista funcional, é preciso atentar para as propriedades de cada gordura. Quando se trata de levar ao fogo, a vantagem fica com as saturadas. É o caso do óleo de coco, por exemplo, que conserva melhor suas propriedades mesmo em altas temperaturas.

Ainda segundo Karam, as moléculas presentes no óleo de coco já estão quebradas. Isso significa que ele consegue se manter estável durante todo o processo de preparo de um alimento. “A vantagem do óleo de coco é que ele conserva suas características e não libera substâncias prejudiciais ao organismo ao longo do cozimento. Além disso, ele preserva seus antioxidantes, que são essenciais para conter o envelhecimento da pele”, explica.

E o azeite?
O mesmo não ocorre com as gorduras insaturadas, como a do azeite, que sofre com a quebra das cadeias quando aquecida. Isso significa que, durante um processo de grelhar, por exemplo, o extrato da oliva libera compostos nocivos, como acroleína e hidrocarbonetos.

“Algumas dessas substâncias são fatores de risco para doenças metabólicas, como diabetes, e também para problemas cardiovasculares. Outras, podem até ser cancerígenas no longo prazo. Por conta disso, o óleo de coco é o mais indicado para esse tipo de uso culinário”, revela a especialista.

Outros benefícios
Além de ser aliado no preparo dos alimentos, o óleo de coco ainda tem ação termogênica, que ajuda, entre outras coisas, a regular nosso metabolismo e no controle do colesterol. “Podemos destacar também suas propriedades antifúngicas e anti-inflamatórias. Ou seja, o consumo de óleo de coco contribui para fortalecer nossa imunidade, ajudando a combater uma infinidade de bactérias, leveduras, fungos e vírus”, completa Ana Paula.

Folha de Pernambuco


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