domingo, 4 de março de 2018

Mulheres têm pouca voz nos filmes premiados com o Oscar, aponta levantamento da BBC

Janelle Monae, Rachel McAdams e Lupita Nyong'oDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionAtrizes costumam ter falas menores que seus colegas masculinos de elenco
Em meio aos acalorados debates sobre igualdade de gênero em Hollywood, a indústria cinematográfica anglófona ainda não foi capaz de garantir a representatividade feminina no cinema, aponta uma análise realizada pela BBC a partir do chamado "teste de Bechdel", que mensura a participação de mulheres em obras de ficção.
Desde a primeira cerimônia do Oscar, em 1929 (a deste ano será realizada neste domingo), a influência política e social das mulheres cresceu em muitas áreas, mas não tanto no cinema - pelo menos segundo os critérios do teste.
Um filme passa no teste de Bechdel se tem ao menos duas personagens femininas que conversem entre si pelo menos uma vez sobre algo que não seja um homem.
Até agora, neste 90º ano dos prêmios da Academia, menos da metade dos vencedores do prêmio de melhor filme foram "aprovados" nessa mensuração, segundo a pesquisa da BBC.
E não houve melhora com o passar das décadas: vencedores recentes e relativamente recentes como Moonlight: Sob a Luz do Luar, Gladiador Quem Quer Ser um Milionário? não passam no teste, bem como dois dos indicados neste ano.
"Acho que está ocorrendo como sempre ocorreu - histórias contadas de forma similar a como foram contadas antes, sem questionamento", opina Ellen Tejle, que lançou um ranking para destacar, na Suécia, filmes que passam no teste de Bechdel.
Gráfico com proporção de falas com mais de 100 palavras ditas por personagens de filmes premiados com o Oscar
"Os integrantes da indústria (cinematográfica) precisam entender que têm poder e responsabilidade no processo de produção de um filme."
O Destino de uma Nação, indicado ao Oscar de melhor filme neste ano, cumpre o pré-requisito de ter duas mulheres, mas em nenhum momento do filme elas conversam entre si sobre algo que não seja um homem.
Dunkirk, que se passa durante a Segunda Guerra Mundial, sequer tem personagens mulheres com nomes - apenas intérpretes de uma "enfermeira" e uma "comissária de bordo".

Limitações

"O que eu odeio é que mulheres são enfiadas em filmes sobre homens; nós merecemos nossa própria narrativa", afirma a crítica de cinema Rhianna Dhillon. "Não é o bastante começar a fazer um filme antes de se dar conta de que apenas homens brancos são representados nele."
O teste foi batizado com o sobrenome da artista gráfica Alison Bechdel: em um cartum de 1985, duas personagens mencionam a mensuração como indicativo de se o filme deve ser visto ou não.
Ainda que a proposta nunca tenha sido criar um método oficial de mensuração, o teste é hoje amplamente utilizado na crítica cinematográfica - ainda que tenha diversas limitações.
"Adoro o fato de que o teste de Bechdel abre o diálogo a respeito do que está acontecendo (na indústria de cinema)", diz Holly Tarquini, diretora do festival de cinema de Bath, no Reino Unido.
"(Mas) a dificuldade é que muitos filmes misóginos passam no teste; ele não atesta nada a respeito de quem está contando a história. (O filme pornô) The Bikini Carwash Company passa no teste de Bechdel, mas Gravidade (em que a protagonista feminina, interpretada por Sandra Bullock, é praticamente onipresente) não passa."
Gráfico dos filmes dos anos 1970

Como os filmes foram mensurados

A BBC reviu dezenas de filmes, usando como medida de referência os padrões estabelecidos pelo teste de Bechdel. Também coletou e cruzou informações levantadas pelo site bechdeltest.com, abastecido pelo público coletivamente.
Em casos em que o revisor da BBC tinha questionamentos a respeito de como classificar determinado filme - ou em casos de discordância com relação ao bechdeltest.com -, acionavam-se ao menos outros dois revisores, até que se obtivesse um consenso.
Na Suécia, Ellen Tejle usa o teste para avaliar filmes em cartaz no país.
"Muitos filmes passam por conta de apenas uma cena", diz ela. "Recebemos diversos e-mails raivosos e contestadores, alegando que um determinado filme 'não deveria ter passado só por causa de alguns trechos'. Mas isso também é representativo de que as pessoas estão procurando por aquelas cenas - que estão prestando atenção e se importam com isso."

Interseccionalidade

Outros, no entanto, argumentam que o teste de Bechdel é restrito ao gênero, por não mensurar se os personagens dos filmes são bem representados sob outros critérios.
Corrina Antrobus, fundadora do site Bechdel Test Fest, diz que, se coubesse a ela pensar em novas formas de avaliar filmes, "seria de alguma forma que avaliasse a interseccionalidade", ou seja, que considerasse o modo como diferentes aspectos humanos, como etnia, classe e sexualidade, se afetam entre si.
Gráfico dos filmes dos anos 1990
"Seria uma mensuração de como poucos filmes retratam mulheres de diferentes raças, sexualidades, religiões e habilidades, para ter um retrato melhor de quem está faltando ou está mal representado", diz.
Segundo uma análise da Fundação Annenberg, dos 100 principais filmes de 2016, apenas 34 tinham uma personagem principal feminina.
Desses 34, três eram interpretadas por atrizes femininas pertencentes a grupos raciais ou étnicos subrepresentados.
"Quase a metade dos 100 filmes avaliados em 2016 não tinham nenhuma personagem mulher negra com falas (47 de 100) e dois terços ou mais não tinham mulheres asiáticas (66 de 100) e latinas (72 de 100)", aponta o estudo.
"Em contraste, só 11 dos 100 principais filmes de 2016 não tinham meninas ou mulheres brancas."
Estatuetas do OscarDireito de imagemAFP

Que tipo de falas?

Quarenta e três dos últimos 89 vencedores do Oscar de melhor filme passam no teste de Bechdel, incluindo Argo e A Lista de Schindler.
Em ambos os filmes, há bem poucas falas para personagens mulheres - só que, por acaso, essas falas cumprem os pré-requisitos do teste.
Críticos de cinema e espectadores têm debatido o quanto personagens deveriam dizer entre si, para o filme passar no teste de Bechdel.
Um exemplo é Spotlight - Segredos Revelados, que venceu o Oscar de melhor filme em 2016 abordando a investigação jornalística pelo Boston Globe do acobertamento de sacerdotes católicos acusados de abuso sexual. A obra gera debates no site do teste de Bechdel.
Uma das cenas alvo de discussão é a em que a jornalista Sacha Pfieffer (interpretada por Rachel McAdams) ouve de sua avó (cuja personagem não é nomeada no filme) um pedido por um copo d'água.
"Não acho que a (cena da) avó pedindo um copo de água ao ficar sabendo que sacerdotes cometeram abusos passe no teste", diz uma usuária do site.
Gráfico sobre representação feminina
Outra usuária discorda: "Na verdade, acho essa cena crucial e poderosa no filme. Ainda que a avó não seja nomeada, ela é um personagem importante - ela é a voz do leitor médio do (jornal Boston) Globe. O acobertamento sobre o qual ela está lendo é maior do que uma história de homens. Diz respeito a milhares de pessoas e ao fracasso de uma instituição."
Da mesma forma, uma cena de Forrest Gump - O Contador de Histórias provoca discussão: o momento em que duas mulheres conversam sobre veteranos da Guerra do Vietnã se qualifica como conversar sobre homens ou sobre questões maiores?
Ainda que esse levantamento se limite, sobretudo, a filmes americanos, é interessante notar que estudos do Instituto Geena Davis sugerem que a indústria cinematográfica de outros países tem tido maior sucesso em produzir filmes com maior equilíbrio de gênero.
Uma análise de filmes lançados entre 2010 e 2013 colocou a China com o país com o maior número de obras com igualdade de representação de gênero, seguida por Coreia do Sul, Reino Unido, Brasil e Alemanha.
Essa mesma análise apontou que, no caso brasileiro, apenas 9,1% dos diretores cinematográficos dessas obras eram mulheres.
A representação feminina nos bastidores cinematográficos, por sinal, é pequena no mundo inteiro.
Apenas um dos 89 vencedores do Oscar de melhor filme foi dirigido por uma mulher: Guerra ao Terror (2010), de Kathryn Bigleow - que também levou o Oscar de melhor diretora.
Seu filme, no entanto, não passa no teste de Bechdel.
"Por décadas, partiu-se do pressuposto de que as mulheres assistiam a esses filmes, quem quer que estivesse neles, porque eles eram tudo o que havia para assistir", afirma Rhianna Dhillon.
"Enquanto isso, homens têm mais liberdade de escolha porque estão sempre representados. Nós mulheres somos estereotipadas, mas não nos damos conta porque é tão subliminar."
Dhillon acredita que levará muito tempo até que Hollywood encare seus problemas com representação, mas ela vê esperança em filmes como Eu, Tonya e Pantera Negra (elogiado pelo Twitter pela ex-primeira-dama americana Michelle Obama - "graças a vocês (equipe do filme), jovens finalmente verão no cinema super-heróis que se parecem com eles", disse ela).
"Pantera Negra é muito animador, porque não foi feito por um estúdio pequeno; é um filme gigantesco da Marvel e da Disney", diz ela.
Ela nota que o o blockbuster tem diversos exemplos de mulheres "inteligentes e corajosas" que são representadas como "a norma". "É uma das razões pelas quais o público está tão empolgado com o filme", agrega.
Isso indica que pode haver benefícios financeiros aos estúdios que encamparem filmes mais representativos. E há pesquisas sugerindo que filmes com paridade de gênero faturam mais por dólar investido na produção.
"Ouse romper os estereótipos", diz Tejle a cineastas. "Talvez vocês acabem fazendo um filme melhor, com uma história melhor."
Professor Edgar Bom Jardim - PE

sexta-feira, 2 de março de 2018

O professor que viralizou com aula de computação sem computador e chamou atenção da Microsoft

O professor Akoto desenha na lousaDireito de imagemINNOCENT FRIMPONG
Image captionO professor Akoto, de Gana, desenha na lousa o gráfico explicando um programa da Microsoft; seus alunos precisam fazer um teste de informática, mas não têm computadores | Foto: Innocent Frimpong
Um professor da cidade de Kumasi, em Gana, que ensina tecnologia da computação sem computadores para crianças virou um sucesso na internet.
Em fotos que ele mesmo postou no Facebook, o professor aparece desenhando em uma lousa um gráfico que explica a interface do Microsoft Word, famoso processador de texto.
"Ensinar informática em uma escola de Gana é muito divertido", escreveu.
Após as imagens terem sido compartilhadas milhares de vezes, a Microsoft prometeu enviar a ele alguns computadores.
O professor se apresenta como Owura Kwadwo, mas seu verdadeiro nome, segundo o site Quartz Africa, é Richard Appiah Akoto.
Em sua mensagem na rede social, ele escreveu: "Eu amo meus alunos, então faço o que precisar para eles entenderem o que estou ensinando".
Segundo o Quartz, a escola onde Akoto dá aulas não tem nenhum computador desde 2011, apesar de os estudantes serem obrigados a prestarem um exame de informática para passar para o colegial.
"Esta não foi a primeira vez (que desenhei). Faço isso sempre que estou na sala de aula", disse Akoto ao site Quartz.
Sobre as fotos terem viralizado, ele afirmou ter ficado surpreso, já que sempre posta imagens na rede social. "Eu não sabia que elas ganhariam a atenção das pessoas dessa forma."
Após ver a foto, a empresária Rebecca Enonchong enviou pelo Twitter uma mensagem para a Microsoft África, destacando que o professor estava ensinando o uso de um produto da empresa sem ter acesso a ele. Ela escreveu: "Com certeza vocês podem dar a ele os recursos adequados para isso".
Dois dias depois a Microsoft disse que enviaria um computador para o professor Akoto, assim como material educacional.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

quinta-feira, 1 de março de 2018

Receita Federal começa a receber declarações do IR


A Receita Federal recebe a partir das 8h desta quinta-feira (1º) as declarações do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) 2018, ano-base 2017. O prazo para entrega vai até 30 de abril. A declaração poderá ser preenchida por meio do programa baixado no computador ou do aplicativo Meu Imposto de Renda para tablets e celulares.

Este ano, é obrigatória a apresentação do Cadastro de Pessoa Física (CPF) para dependentes a partir de 8 anos de idade, completados até o dia 31 de dezembro de 2017. Outra mudança é a possibilidade de impressão do Documento de Arrecadação de Receitas Federais (Darf) para pagamento de todas as cotas do imposto, inclusive as que estão em atraso.

Segundo a Receita, é obrigado a declarar quem recebeu em 2017 rendimentos tributáveis em valores superiores a R$ 28.559,70. No caso da atividade rural, deve declarar quem teve receita bruta acima de R$ 142.798,50. O Fisco espera receber, este ano, 28,8 milhões de declarações do IRPF, 300 mil a mais do que em 2017 (28,5 milhões).

Também estão obrigadas a declarar as pessoas físicas residentes no Brasil que receberam rendimentos isentos, não tributáveis ou tributados exclusivamente na fonte, cuja soma foi superior a R$ 40 mil; as que obtiveram, em qualquer mês, ganho de capital na alienação de bens e direitos, sujeito à incidência do imposto ou que realizaram operações em bolsas de valores; que pretendem compensar prejuízos com a atividade rural; que tiveram, em 31 de dezembro de 2017, a posse ou a propriedade de bens e direitos, inclusive terra nua, de valor total superior a R$ 300 mil; que passaram à condição de residentes no Brasil em qualquer mês e assim se encontravam em 31 de dezembro; ou que optaram pela isenção do IR incidente sobre o ganho de capital com a venda de imóveis residenciais para a compra de outro imóvel no país, no prazo de 180 dias contados do contrato de venda.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Quem é Raul Jungmann, o homem de Temer para a segurança pública.No lugar certo quando tudo dá errado:

Raul Jungmann
Image captionRaul Jungmann (centro, de óculos) chefiará a área prioritária do governo: Segurança Pública | Foto: Tânia Rego / Agência Brasil
Em março de 2002, um grupo de 500 militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) invadiu a fazenda Córrego da Ponte, em Goiás, e desencadeou uma crise em Brasília, a 200 km dali: as terras eram da família do então presidente, Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Raul Jungmann, hoje ministro da Segurança Pública, ocupava então a pasta do Desenvolvimento Agrário (MDA). De Recife (PE) Jungmann despachou subordinados seus para o local. Horas depois, ele mesmo foi para lá.
"Havia tensão porque o governo enviou a Polícia Federal e o Exército e eles iam invadir o local. Jungmann tentou garantir que os militantes do MST não fossem agredidos", relembra a servidora aposentada Maria de Oliveira, à época funcionária da Ouvidoria Agrária Nacional. Depois de quase 24h de trabalho, na madrugada de domingo, Jungmann e Oliveira conseguiram um acordo para que o MST saísse, sem prisões. O acordo, no entanto, não foi inteiramente cumprido: 16 líderes do MST e a filha de um dos militantes, de 16 anos, foram deitados com a barriga na lama do chão, algemados e presos.
Estar no lugar certo na hora em que as coisas estão pegando fogo é uma das especialidades de Jungmann, de 65 anos, nomeado nesta segunda-feira pelo presidente Michel Temer para chefiar o recém-criado ministério da Segurança Pública. Natural de Recife (PE), Jungmann tornou-se ministro da Defesa em 12 de maio de 2016, quando Michel Temer (MDB) anunciou a primeira formação de seu governo.
Daquele dia até hoje, o pernambucano acumulou poder e se tornou um dos homens fortes de Temer. A nomeação como ministro da Segurança Pública mostra isso: o pernambucano será o responsável pela área que é "prioridade zero" do Planalto. Nesta terça-feira, horas depois de ser nomeado, Jungmann deu o tom de sua gestão: demitiu do comando da Polícia Federal o delegado Fernando Segóvia - que causara dificuldades ao Planalto com declarações atabalhoadas sobre um inquérito que investiga o presidente Michel Temer - e o substituiu por Rogério Galloro.
Fernando SegóviaDireito de imagemBBC BRASIL
Image captionFernando Segóvia (foto) foi demitido horas depois de Jungmann assumir o comando da PF. Agora, irá para a Itália | foto: Agência Brasil
Comandar a "prioridade zero" do governo significa também que Jungmann voltará ao foco da tensão: uma das missões dele será acompanhar a intervenção federal na área de segurança pública do Rio de Janeiro, em andamento desde meados de fevereiro.
Antes mesmo de ser alçado ao posto, distribuiu declarações fortes sobre os planos da intervenção. Em entrevista coletiva, aventou a possibilidade de "mandados coletivos de busca e apreensão" e chegou a falar em "captura coletiva" de suspeitos. Mais recentemente, culpou usuários de classe média por sustentar o tráfico de drogas.
O comportamento aguerrido não é novidade na trajetória do político, como prova outro episódio de sua carreira.
No dia 21 de setembro de 2009, o ex-presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, voltou às escondidas a seu país e foi à embaixada brasileira em Tegucigalpa, em busca de asilo político. A situação criou um impasse: as forças armadas do país cercavam a embaixada.
Jungmann, que era deputado federal à época, chegou à embaixada no fim de setembro, como o coordenador de uma missão do Congresso. Um dos seus ex-assessores diz que Jungmann "sentou na cadeira do embaixador", tomando o controle da situação. Na manhã seguinte, declarações de Zelaya estavam em todos jornais brasileiros: bastava ligar para o pernambucano para falar com o ex-presidente hondurenho.

Foi Temer antes de ser "modinha"

A reportagem da BBC Brasil conversou com quase uma dezena de subordinados, ex-funcionários, correligionários e colegas de trabalho de Jungmann.
Alguns traços foram mencionados pela maioria das pessoas que o conhecem: o novo 'czar da Segurança Pública' dorme pouco (é comum que mande e-mails e faça ligações de trabalho no meio da madrugada); é rápido na tomada de decisões; tem bom trânsito dentro do Congresso e nas Forças Armadas e costuma colocar a própria carreira acima de questões partidárias (ele é filiado ao Partido Popular Socialista, o PPS).
No Palácio do Planalto, é visto também como alguém que adotou a causa de Michel Temer "antes de ser modinha" - ou seja, tomou o lado do então vice antes que o emedebista assumisse a cadeira de Dilma Rousseff (PT). A lealdade precoce justifica parte de seu atual sucesso. É de Jungmann, por exemplo, o pedido ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que impedisse a posse do ex-presidente Lula como ministro de Dilma, em março de 2016.
Jungmann e Braga Netto
Image captionJungmann cuidará para o Planalto da intervenção no Rio. Na foto, o ministro com o general Braga Netto, o interventor | foto: Agência Brasil
Mas o fator determinante para seu acúmulo de poder foi o bom relacionamento dele com as Forças Armadas - algo que ele cultiva desde antes de se tornar ministro da Defesa. No Planalto, Jungmann é visto como a melhor "ponte" disponível entre o generalato e o mundo civil.
Ao longo da trajetória política, Jungmann alterou suas prioridades de questões do campo e da reforma agrária para a segurança pública. Em 2005, quando o país realizou um referendo sobre a proibição do comércio de armas de fogo, Jungmann se engajou na campanha pelo "sim", que defendia mais restrições ao comércio de armamentos, como secretário-geral da Frente Brasil Sem Armas. O lado dele, porém, foi derrotado.
Enquanto foi deputado (de 2003 a 2011, e depois de 2015 até maio de 2016), Jungmann começou a se aproximar dos militares ao comandar comissões na Câmara que tratavam de projetos de interesse da caserna. Durante o processo de impeachment de Dilma, entre 2015 e 2016, era ele quem "tirava a temperatura" dos generais e mantinha informado o comando "pró-Temer" no Congresso. Era, por exemplo, frequentador dos jantares na casa de Heráclito Fortes (PSB-PI), em Brasília, nas quais se reuniam deputados que trabalharam pelo impeachment.

Padrinhos políticos

O pai do ministro, Sílvio Jungmann da Silva Pinto, foi um jornalista e servidor público conhecido em Recife. Militava em causas de esquerda e, por isso, teve de se mudar do Estado nordestino para São Paulo (SP) quando a repressão política da ditadura militar iniciada em 1964 recrudesceu, segundo o deputado Roberto Freire (PPS-SP). O filho, por sua vez, permaneceu na capital pernambucana e iniciou o curso de psicologia na Universidade Católica do Estado em 1976, sem se formar.
O sobrenome pelo qual o ministro é conhecido vem da família paterna, e é de origem alemã. Jungmann também tem ascendência judaica.
Mais ou menos na mesma época em que começou o curso universitário, ele se filiou ao Movimento Democrático Brasileiro, o MDB, único partido de oposição permitido no regime militar. Segundo Roberto Freire, Jungmann ajudava a organizar os comícios que o MDB fazia pelo país na década de 1970, contra a ditadura. Foi só um pouco depois, em 1990, que ele entrou oficialmente para o PPS, que na época ainda se chamava PCB - o Partido Comunista Brasileiro.
Jungmann e FHC
Image captionJungmann e Fernando Henrique em 1996, quando o pernambucano virou ministro | foto: Raul Jungmann / divulgação
"Ele era muito próximo da gente, atuava com o nosso pessoal no PCB (antes de entrar oficialmente). Não era militante nosso, mas era mais empenhado que muitos militantes", diz Freire, que é presidente nacional do PPS. "Naquele ano (1990) a gente fez um Congresso do partido no qual pessoas que não eram filiadas tinham direito a voz e voto nas teses políticas (mas não nos aspectos administrativos). Foi aí que ele entrou", conta Freire.
Jungmann teve dois grandes padrinhos políticos no começo de sua carreira política em Brasília: o próprio Roberto Freire e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC). Este último é descrito por mais de uma pessoa como uma espécie de "mentor" do pernambucano. Jungmann também era amigo da mulher de FHC, a antropóloga Ruth Cardoso.
No mesmo ano em que entrou para o PCB, Jungmann obteve seu primeiro cargo de chefia, como secretário de Planejamento do governador de Pernambuco, Carlos Wilson (um político com origem na Arena, partido que apoiava os militares).
O primeiro cargo em Brasília viria no governo de Itamar Franco, como braço-direito do então ministro do Planejamento Alexis Stepanenko (1993-1994). A indicação foi de Freire, que era líder do governo de Itamar no Congresso.

De ministro a suplente de deputado

Nos anos seguintes, já no governo FHC, entre 1995 e 2002, viriam os cargos relacionados à questão agrária: presidente do Ibama, do Incra, e titular dos ministérios de Política Fundiária e do Desenvolvimento Agrário. Na época, o PPS fazia oposição a FHC. Jungmann, por isto, foi colocado numa espécie de "geladeira partidária": a sigla permitiu que ele assumisse os cargos, mas afastou-o de todos os assuntos internos do partido.
Roberto Freire
Image captionO conterrâneo Roberto Freire (PPS-SP) foi um dos principais padrinhos no começo da carreira de Jungmann, junto com FHC | foto: Agência Câmara
Discreto sobre sua vida pessoal, Jungmann teve nesta época um relacionamento com a jornalista Sílvia Faria, então chefe do jornalismo da Rede Globo em Brasília. Eles não foram casados formalmente, mas viveram juntos de 1994 até o começo dos anos 2000. Antes, fora casado com Patrícia, de quem se divorciou e com quem teve um casal de filhos já adultos: Júlia (advogada) e Bruno (administrador de empresas).
Em 2003, o PT chegou ao poder com o ex-presidente Lula e Jungmann se elege deputado federal por Pernambuco, pela primeira vez, pelo PMDB (ele voltaria ao PPS depois da eleição). O PPS, na época, apoiava o governo petista. Pessoalmente, Jungmann nunca simpatizou com o PT: em 2005, foi um dos defensores do rompimento do PPS com o governo de Lula. Ainda assim, mantém interlocutores também entre os petistas: um deles é o ex-ministro da Justiça de Dilma e advogado José Eduardo Cardozo.
Nas eleições de 2014, Jungmann concorreu a deputado federal pelo PPS, e teve apenas 36,8 mil votos. Não foi eleito e terminou como suplente. Mas quando os eleitos em outubro de 2014 começaram de fato a trabalhar, em fevereiro de 2015, Jungmann estava lá: assumiu como suplente de Sebastião Oliveira (PR), que foi chamado para ser secretário de Transportes do governo de Paulo Câmara (PSB), em Pernambuco.
O fato de ser suplente fez com que Jungmann não estivesse oficialmente deputado quando a Câmara votou o impeachment de Dilma, em maio de 2016: Oliveira tinha reassumido o cargo. Jungmann circulou pelo plenário no dia, mas não pode votar contra a petista.
A reportagem da BBC procurou Jungmann na última segunda-feira, mas ele não respondeu aos pedidos de entrevista.

Até tu, Bruto?

Nos últimos anos, Jungmann também teve que responder a questionamentos relacionados à menção ao seu nome em uma planilha de propinas da Odebrecht no âmbito da Operação Lava Jato.
Planilha da Odebrecht
Image captionOs executivos do 'Departamento de Propina' da Odebrecht resolveram apelidar Jungmann de 'Bruto' | foto: JFPR / Reprodução
Em arquivos encontrados em 2016 com o ex-diretor da empreiteira, Benedicto Barbosa Silva Júnior, o BJ, o nome de Jungmann aparece relacionado aos valores "50 + 50" ou "100" e ao apelido "Bruto". O valor seria referente a doações para a campanha de 2012, quando Jungmann se elegeu vereador em Recife. Nas eleições seguintes (2014), a Odebrecht doou R$ 384 mil à campanha de Jungmann, diretamente e por meio do PPS.
Em maio de 2017, quando o STF retirou o sigilo da delação da Odebrecht, tudo que havia em relação a Jungmann era uma petição (PET), com a recomendação do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para que a investigação sobre ele fosse arquivada. Isto porque, segundo os próprios delatores da Odebrecht, as doações ao pernambucano foram legitimas, sem contrapartidas. O caso acabou arquivado pelo STF.
Professor Edgar Bom Jardim - PE