terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Incêndio na biblioteca central da UFPE


Um incêndio atingiu a sala de almoxarifado da Biblioteca Central da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), na Cidade Universitária, na Zona Oeste do Recife.  A sala fica localizada no terceiro andar do prédio e o fogo começou por volta das 14h desta terça-feira (27), provavelmente devido a um curto-circuito.
Duas viaturas de combate a incêndio e uma de comando operacional foram encaminhadas pelo  Corpo de Bombeiros ao local, às 14h20. As chamas foram controladas por volta das 15h30. Não houve registro de feridos, e as pessoas que estudavam na biblioteca conseguiram sair sem maiores problemas. O prédio foi evacuado e a energia foi desligada.
Segundo a Assessoria de Comunicação Social da UFPE, um engenheiro de uma empresa terceirizada que estava na BC realizando a instalação de tomadas em outras salas foi quem percebeu o incêndio e deu o alarme. O diretor do Sistema de Bibliotecas, Elilson Góis, informou que somente após o término completo do trabalho dos bombeiros será possível avaliar os danos causados pelo fogo. As causas serão apuradas pela equipe de Engenharia da Superintendência da Infraestrutura (Sinfra) da UFPE e pelos bombeiros (laudo técnico).
Professor Edgar Bom Jardim - PE

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Strippers são contratadas para se apresentar em funerais na China


Dançarina se apresenta em cima de teto de carroDireito de imagemAFP
Image captionEm alguns funerais, strippers ou dançarinas de pole dance sobem em tetos de jipes para fazer suas apresentações
A música ressoa por meio de alto-falantes barulhentos e strippers dançam no ritmo, enquanto os demais participantes do evento acompanham a melodia assobiando. Mas não estamos falando exatamente de uma festa, e sim de cortejos fúnebres em alguns lugares da China.
No início deste ano, o governo do país reforçou sua oposição a essa prática não só em funerais, mas também em casamentos e templos, classificando-a como "obscena e vulgar".
No entanto, ela persiste. E não é a primeira vez que se tenta aboli-la.
Mas por que as pessoas contratam strippers para funerais?
Uma das teorias indica que essas dançarinas são usadas como isca para atrair um número maior de pessoas aos funerais, uma vez que a presença de uma grande multidão é vista como uma forma de honrar o falecido.
Em alguns lugares, essa prática também está relacionada ao "culto à reprodução".
"Em algumas culturas locais, a dança com elementos eróticos pode ser usada para transmitir os desejos do falecido de ser abençoado com muitos filhos", disse Huang Jianxing, professor da Universidade Fujian, ao jornal estatal Global Times.
Funeral tradicional na ChinaDireito de imagemEPA
Image captionOs funerais tradicionais na China envolvem uma série de rituais e atividades entre as quais se inclui o canto, o uso de instrumentos musicais e a caligrafía
Outra hipótese sugere que a contratação de strippers pode ser vista como uma demonstração de riqueza.
"As famílias das zonas rurais da China são mais propensas a mostrar que têm dinheiro gastando o equivalente a várias vezes sua renda anual contratando atores, cantores, comediantes e strippers para confortar os parentes em luto e entretê-los", disse o Global Times.

Prática recente

Ainda que seja próprio das áreas rurais da China, na verdade é em Taiwan, onde teve suas origens, que esse fenômeno é muito mais comum.
Imagem mostra dançarina de pole danceDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionO governo da China tenta pôr fim ao que qualifica como 'atos obscenos'
"A primeira vez que a prática de contratação de strippers para funerais chamou amplamente a atenção da opinião pública foi em Taiwan, em 1980", disse à BBC o antropólogo Marc Moskowitz, da Universidade da Carolina do Sul, no EUA.
"Tornou-se muito comum em Taiwan, enquanto na China o governo tem sido tão restritivo que muita gente nunca ouviu nem falar disso", disse ele.
Mas mesmo em Taiwan a prática não é muito frequente nas grandes cidades.
"Por estar em uma área obscura entre a legalidade e a ilegalidade, a presença de strippers é menos comum nos centros urbanos, embora com frequência possa ser vista nas periferias de muitas cidades", disse Moskowitz.
No ano passado, houve um funeral em Taiwan em que 50 dançarinas de pole dancing faziam suas piruetas nos tetos de jipes na cidade de Chiayi, no sul do país.
A "cerimônia" era para honrar um político local que, de acordo com sua família, havia pedido "por meio de um sonho" para ter um funeral colorido.

Combate ostensivo

A perseguição das autoridades chinesas agora é apenas a mais recente tentativa de pôr fim à prática.
Atriz profissional contratada para um funeral na ChinaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionA contratação de artistas profissionais para atuar em funerais é uma prática difundida na China
O Ministério da Cultura qualificou esse tipo de ação como "não civilizada" e anunciou que qualquer um que contratar uma stripper para atrair pessoas a um funeral será "duramente punido".
"O governo da China se vê como uma figura paterna que precisa guiar seus cidadãos. Eles estão preocupados com a exibição pública de corpos nus e a influência que isso poderia ter na sociedade, especialmente porque as crianças muitas vezes veem esses espetáculos", disse Moskowitz, advertindo que talvez não seja tão fácil eliminar essa prática.
"O fato de continuar a ser realizada, apesar de perseguida pelas leis, demonstra o quão persistente ela é", acrescenta.
Em 2006, os dirigentes de cinco empresas de strip-tease na província oriental de Jiangsu foram presos após centenas de pessoas participarem do funeral de um fazendeiro, no qual a prática foi realizada.
Em 2015, comunidades das províncias de Hebei e Jiangsu alcançaram grande notoriedade nas redes sociais quando foi descoberto que haviam convidado strippers para realizar "atos obscenos" nos funerais. O governo, mais uma vez, puniu os organizadores e as dançarinas envolvidas.
Imagem mostra pé com sandálias de salto alto encostado em uma barra, em refência às dançarinasDireito de imagemISTOCK
Image captionGoverno da China criou 'disque-denúncia' oferecendo dinheiro por informações sobre a presença de dançarinas nos funerais
Uma nova campanha do Ministério da Cultura será direcionada particularmente as províncias de Henan, Anhui, Jiangsu e Hebei.
Como parte dela, o governo colocou em operação uma linha telefônica para denúncias, por meio da qual espera que os cidadãos informem qualquer "ação errada" cometida em um funeral em troca de uma recompensa financeira.
É difícil saber se a prática desaparecerá completamente. O que é claro é que o governo chinês não vai parar de persegui-la até lá.
BBC.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Brasil tem a maior população de domésticas do mundo

Mulher limpando salaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionTrabalho doméstico respondeu por 14,6% dos empregos formais das brasileiras em 2017
Se organizasse um encontro de todos os seus trabalhadores domésticos, o Brasil reuniria uma população maior que a da Dinamarca, composta majoritariamente por mulheres negras, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Segundo dados de 2017, o país emprega cerca de 7 milhões de pessoas no setor - o maior grupo no mundo. São três empregados para cada grupo de 100 habitantes - e a liderança brasileira nesse ranking só é contestada pela informalidade e falta de dados confiáveis de outros países.
Com um perfil predominante feminino, afrodescendente e de baixa escolaridade, o trabalho doméstico é alimentado pela desigualdade e pela dinâmica social criada principalmente após a abolição da escravatura no Brasil, afirmam especialistas.
Um estudo feito em parceria entre o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ligado ao Ministério do Planejamento, e a ONU Mulheres, braço das Nações Unidas que promove a igualdade entre os sexos, compilou dados históricos do setor de 1995 a 2015 e construiu um retrato evolutivo das noções de raça e gênero associadas ao trabalho doméstico.
Os resultados demonstram a predominância das mulheres negras ao longo do tempo.
Em 1995, havia 5,3 milhões de trabalhadores domésticos no Brasil. Desses, 4,7 milhões eram mulheres, sendo 2,6 milhões de negras e pardas e 2,1 milhões de brancas. A escolaridade média das brancas era de 4,2 anos de estudo, enquanto que das afrodescendentes era de 3,8 anos.
Vinte anos depois, em 2015, a população geral desses profissionais cresceu, chegando a 6,2 milhões, sendo 5,7 milhões de mulheres. Dessas, 3,7 milhões eram negras e pardas e 2 milhões eram brancas. O nível escolar das brancas evoluiu para 6,9 anos de estudo, enquanto que, no caso das afrodescendentes, chegou a 6,6 anos.
"Ainda hoje o trabalho doméstico é uma das principais ocupações entre as mulheres, que são a maioria no setor em todo o mundo, cerca de 80%. No Brasil, permanece sendo a principal fonte de emprego entre as mulheres", diz Claire Hobden, especialista em Trabalhadores Vulneráveis da OIT.
Em 2017, o trabalho doméstico respondeu por 6,8% dos empregos no país e por 14,6% dos empregos formais das mulheres. No começo da década, esse tipo de serviço abarcava um quarto das trabalhadoras assalariadas.

Legado da escravidão

O professor e pesquisador americano David Evan Harris é um dos especialistas que defendem que o cenário do trabalho doméstico no Brasil atual é herança do período escravagista.
"O Brasil foi um dos últimos países do mundo a acabar com a escravidão. Se olharmos para quem são as empregadas, veremos que elas tendem a ser pessoas de cor", diz o acadêmico, formado pela Universidade da Califórnia em Berkeley, nos EUA, e mestre pela USP.
"Analisando cidades como Rio e São Paulo, percebe-se que as domésticas muitas vezes são pessoas que migraram do Norte e Nordeste para o Sul e Sudeste. E, como se sabe, o Nordeste é para onde boa parte das populações de escravos foi originalmente trazida. Há uma situação de dinâmica geográfica, histórica e social que continua até hoje."
Segundo a historiadora e escritora Marília Bueno de Araújo Ariza, mesmo após a abolição, em 1888, mulheres e homens negros continuaram sendo servos ou escravos informais, o que também deixou seu legado no mercado de trabalho.
Gravura de Jean Baptiste Debret mostrando uma casa brasileira em 1834
Image captionSegundo historiadores, sociedade brasileira criou sistema que mantinha negros no trabalho informal para impedir sua ascensão após a abolição da escravatura | Foto: Biblioteca do Congresso dos EUA
As domésticas de hoje são majoritariamente afrodescendentes porque "justamente eram essas pessoas que ocupavam os postos de trabalho mais aviltados na saída da escravidão e na entrada da liberdade no pós-abolição", afirmou ela à BBC Brasil.
A ideia de ter um servo na família era muito comum, mesmo entre quem não era rico e vivia nas regiões semiurbanas do século 19, segundo Ariza.
"A escravidão brasileira foi diversa, mas foi sobretudo uma escravidão de pequena posse. No Brasil, todo mundo tinha escravos. Quando as pessoas tinham dinheiro, elas compravam escravos com muita frequência."
Em São Paulo, por exemplo, muitas famílias - mesmo as relativamente pobres, muitas delas chefiadas por mulheres brancas - "tinham uma ou duas escravas domésticas para realizar afazeres na casa ou na rua".

'Racismo estrutural'

Ariza acredita que o Brasil do século 21 herdou do passado colonial, imperial e escravista uma "profunda desigualdade na sociedade que não foi resolvida" e "um racismo estrutural".
"Essas duas coisas combinadas nos levam a um quadro contemporâneo que usa racionalmente o trabalho doméstico porque ele é mal remunerado e, até recentemente, não tinha quaisquer direitos reconhecidos", resume.
A ratificação pelo Brasil da Convenção Internacional sobre Trabalho Doméstico (convenção 189 da OIT) ocorreu neste mês de fevereiro e foi considerada um avanço na proteção dos direitos desses trabalhadores.
O compromisso vem no lastro da adoção da emenda constitucional 72 de abril de 2013, conhecida como a "PEC das Domésticas", e da lei complementar 150 de 2015, iniciativas para coibir a exploração, dar mais amparo e formalização ao emprego.
"Apesar dos esforços dos governos recentes em trazer essas empregadas para a formalidade, o que se vê hoje é o aumento da informalidade", pondera o professor e doutor em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Carlos Eduardo Coutinho da Costa.
Na sua visão, que as relações sociais do trabalho doméstico não têm necessariamente vínculo com a escravidão em si, mas, sim, com a dinâmica racial que se estabeleceu após a alforria, a partir de 1888.
"Era muito comum tanto no pós-abolição imediato, quanto ainda nos dias de hoje, as pessoas dizerem (a negros e pobres): 'ponha-se no seu lugar'. Mas que lugar é esse ao qual os pobres pertencem?", indaga.
"Quando acabou a escravidão, todas aquelas relações de dominação caíram por terra. Foi um período muito próximo do fim da monarquia também, então todas as relações se modificaram e ficaram pairando no ar. Foi necessário criar uma ordem para manter a hierarquia, e a solução encontrada foi a racialização das relações."
Para isso, diz ele, foram criados mecanismos na sociedade brasileira "para impedir que certo grupo ascendesse socialmente, porque havia o desejo de construir no Brasil essa relação de classe".
Mulher limpando piaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionBrasil tem 3 empregados domésticos para cada 100 pessoas; Índia vem em segundo lugar, em ranking da OIT, com 2 empregados para cada 100 pessoas
Já que o trabalho formal é um meio de ascensão, as oportunidades nesse âmbito foram administradas por um viés racial, no qual negros foram encaminhados aos postos inferiores, mais precarizados, para que não evoluíssem economicamente, diz Coutinho da Costa.
"Se você pegar os anúncios de vagas daquela época vai perceber que a maior parte especificava a cor da pessoa. Eram empregos normalmente de subalternidade, de trabalho de faxineira, copeira, cozinheira, e pedia-se literalmente assim: procura-se mucama da cor preta para trabalhar em afazeres domésticos", exemplifica.
"Isso foi se perpetuando na história. Se pararmos pra pensar, até a década de 60 ainda se buscavam pessoas pela cor. Quando isso cai em desuso porque pega mal, abandona-se a terminologia cor e passa-se a usar a expressão 'boa aparência', mas o efeito é o mesmo: impedir que um certo grupo tenha acesso ao emprego formal."

Desigualdade

Em sua tese de mestrado na USP, o pesquisador americano David Evan Harris comparou a relação da sociedade com os trabalhadores domésticos no Brasil e nos Estados Unidos. Para ele, em ambos os países os empregados são explorados, apesar das diferenças culturais.
No Brasil, diz Harris, predomina o discurso da proximidade afetiva, na qual a empregada é tratada "praticamente como se fosse alguém da família". Já nos EUA, elas costumam ser terceirizadas e recrutadas via empresas de serviços de limpeza. Essa profissionalização daria o distanciamento necessário para que a "culpa" e o "constrangimento moral" das famílias americanas por causa da desigualdade social fossem mitigados.
"Se formos observar os diferentes países ao redor do mundo e quantos serviçais eles têm, ou quão predominante a ocupação doméstica é, veremos, grosso modo, que o número de empregadas por porcentagem da população corresponde ao nível de desigualdade daquele país", afirma Evans.
"Há dois fatores majoritários que são muito importantes para avaliar se um país vai ter uma grande população de serviçais. Primeiro, desigualdade e, segundo, acesso a educação de qualidade pública, para que as pessoas consigam alcançar oportunidades que vão além do trabalho doméstico."
De acordo com a OIT, os Estados Unidos têm 667 mil empregados domésticos, cerca de um décimo do Brasil. Lá, porém, o setor também tem nichos de informalidade, e imigrantes não documentados ficam de fora das estatísticas.
Oficialmente, a segunda nação com maior número de trabalhadores domésticos no mundo é a Índia, com 4,2 milhões de pessoas. A OIT admite, entretanto, que muitos empregados não estão registrados e, considerando-se o tamanho da população, o total verdadeiro poderia chegar a dezenas de milhões, ultrapassando o Brasil.
As cinco maiores concentrações de trabalhadores domésticos ocorrem em nações com marcante contraste social. No ranking da OIT, após o Brasil e a Índia vem a Indonésia (2,4 milhões), seguida pelas Filipinas (1,9 milhão), pelo México (1,8 milhão) e pela África do Sul (1,1 milhão). É importante ressaltar que a China não fornece estatísticas confiáveis sobre o assunto.
Todos esses países que figuram entre os maiores empregadores de serviço doméstico são nações com coeficientes de desigualdade que variam entre médio e alto, segundo o ranking de desenvolvimento humano organizado pelo Programa das Nações Unidas pelo Desenvolvimento (UNDP).
A OIT não chega a afirmar que haja uma dinâmica de causa e consequência, mas reconhece que ambos os aspectos - alta incidência de trabalho doméstico e desigualdade social - estão de alguma forma relacionados.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

domingo, 25 de fevereiro de 2018

João Lira entrega calçamento em Bizarra

O prefeito João Francisco de Lira (PSD/PE), fez a entrega de obras de calçamento na Vila São pedro em Bizarra, na manhã deste domingo 25 de fevereiro de 2018.
Fotos: Lúcio Mário Cabral
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Meio Ambiente brasileiro: a segunda maior concentração de cobras do planeta

Jararaca-ilhoa e Ilha da Queimada-grande
Image captionIsolamento geográfico levou ao surgimento de nova espécie de jararaca que só existe em ilha do litoral paulista | Foto: Marcelo Ribeiro Duarte
Uma pequena ilha rochosa, escarpada, sem praias e de difícil acesso, localizada a 35 km do litoral de São Paulo, entre as cidades de Peruíbe e Itanhaém, tem chamado a atenção ao longo dos último cinco séculos por uma característica insólita: é habitada quase que exclusivamente por uma espécie de cobra, a jararaca-ilhoa (Bothrops insularis).
A Ilha da Queimada Grande, conhecida como Ilha das Cobras, se destaca ainda por ter a segunda maior concentração desses animais por área no mundo: cerca de 45 cobras por hectare – mais ou menos equivalente ao tamanho de um campo de futebol –, perdendo apenas para a Ilha de Shedao, na China.
Com comprimento e largura máximos de 1.500 e 500 metros, respectivamente, e altitude que não supera os 200 metros, a Ilha das Cobras, de 43 hectares, foi descoberta em 1532, pela expedição colonizadora de Martim Afonso de Souza.
De acordo com as biólogas Karina Nunes Kasperoviczus, hoje na Universidade de Sydney, na Austrália, e Selma Maria de Almeida-Santos, do Instituto Butantan, provavelmente Afonso de Souza e seus oficiais protagonizaram o primeiro caso de depredação do local.
No artigo científico Instituto Butantan e a jararaca-ilhoa: cem anos de história, mitos e ciência, publicado nos Cadernos de História da Ciência, do Instituto Butantan, elas contam que, de passagem pela costa sudeste do Brasil, os navegadores aportaram na ilha, caçaram diversas fragatas e mergulhões e, antes de voltarem aos navios, receosos de má sorte, atearam fogo no local.
Não existe, no entanto, registro de que durante a permanência por lá Martim Afonso de Souza e seus homens tenham tido qualquer contato com a Bothrops insularis.
Segundo Karina e Selma, a prática de atear fogo à ilha se tornou corriqueira algum tempo depois. "No final do século 19, a Marinha do Brasil implantou um farol lá, cuja manutenção era realizada por faroleiros que residiam no local", escrevem.
"Com medo das serpentes, a própria Marinha colocou por diversas vezes fogo na mata na tentativa de acabar com a população excessiva delas. O nome 'Queimada Grande' é resultado dessas recorrentes queimadas, que, por vezes, eram tão fortes que podiam ser avistadas do continente."

Evolução

A história da Ilha das Cobras é bem mais antiga, no entanto. Ela se formou no final da última era glacial, há cerca de 11 mil anos, quando o nível do mar subiu, separando aquele morro (que fazia parte da Serra do Mar) do continente, transformando-o numa ilha e isolando uma população de jararacas comuns (Bothrops jararaca).
Ao longo dos milhares de anos seguintes, a espécie se diferenciou de suas parentes de terra firme e se transformou na Bothrops insularis.
Segundo o pesquisador e especialista em animais peçonhentos Vidal Haddad Júnior, da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (Unesp), o isolamento e as condições geográficas da ilha lentamente modificaram as características das cobras em relação às jararacas continentais, criando a nova espécie.
Jararaca-ilhoa engole pássaro
Image captionJararaca-ilhoa se alimenta quase que exclusivamente de pássaros | Foto: Marcelo Ribeiro Duarte
"Ela é menor e menos pesada, para facilitar sua locomoção e a caçada diurna nas árvores", explica. "Sua cauda adquiriu capacidade preênsil (ou seja, de se agarrar a algo) e a dentição ganhou um aspecto mais curvo, para prender as aves mais facilmente e não soltá-las enquanto o veneno age."
Para se tornar uma cobra que vive sobretudo em árvores (ou arborícola), a jararaca-ilhoa desenvolveu outras características evolutivas únicas.
"Para subir em árvores, sua pele se tornou mais elástica do que a de suas parentes do continente", explica Otávio Marques, pesquisador e diretor do Laboratório de Ecologia e Evolução do Instituto Butantan, que realizou várias pesquisas com essa serpente.
"Além disso, como ela ergue mais a cabeça, seu coração ficou mais próximo dessa parte de sua anatomia, para bombear com mais facilidade o sangue para o cérebro."

Nova espécie

Não é de hoje que o Instituto Butantan estuda a ilha e a jararaca-ilhoa. O primeiro lote dessa espécie foi recebido pela instituição em 1911, enviado pelo zelador do farol, que residia no local, Antônio Esperidião da Silva. Elas logo começaram a ser estudadas pelo herpetólogo João Florêncio Gomes, que não chegou a concluir o trabalho, pois morreu em 1919, aos 33 anos.
O pesquisador Afrânio do Amaral deu continuidade às pesquisas e, em 1922, descreveu cientificamente a nova espécie. "Ele logo descobriu que ela se alimentava quase exclusivamente de pássaros, ao contrário das espécies do continente, que predam pequenos mamíferos e répteis", conta Vidal Haddad.
Amaral descobriu ainda que a peçonha destas jararacas era muito mais ativa em aves e altamente potente, o que despertou o interesse sobre a espécie, que só existe na ilha.
"O veneno da jararaca-ilhoa é mais tóxico para aves do que para mamíferos", explica o biólogo Marcelo Ribeiro Duarte, do Laboratório de Coleções Zoológicas do Instituto Butantan. "O que prova a grande adaptabilidade da espécie."
Bothrops insularis mede entre meio metro e um metro, com as fêmeas sendo ligeiramente maiores. "Como a fauna da ilha é muito escassa, não existindo roedores nem outros mamíferos (com exceção de morcegos), os adultos da espécie se alimentam de aves migratórias (os pássaros residentes não são predados)", diz Haddad. "Os filhotes comem pequenos lagartos, anfíbios e artrópodes, como as lacraias, por exemplo."
Outra característica dessa serpente é que ela é vivípara (não põe ovos, mas gesta a prole de maneira semelhantes aos mamíferos) e dá à luz 10 filhotes no período quente do ano.

Mitos e lendas

Talvez por ser muito numerosa e altamente venenosa, a jararaca-ilhoa é objeto de diversos mitos e lendas. Uma delas diz que as cobras foram colocadas lá por piratas, para proteger um tesouro escondido.
De acordo com outra, um faroleiro e sua família foram mortos por suas picadas. Mas isso não ocorreu. No máximo foram mortos alguns animais domésticos, como cães, gatos e galinhas.
Jararaca-ilhoa
Image captionAo contrário das espécies do continente, ela é menor e mais pesada e tem pele mais elástica | Foto: Marcelo Ribeiro Duarte
De qualquer forma, não existe mais o risco de algum faroleiro ser morto por uma picada da jararaca-ilhoa. O farol foi automatizado em 1925 e sua manutenção é feita uma vez por ano por uma equipe da Marinha do Brasil. O acesso à ilha é estritamente controlado e requer de autorização do Governo Federal. Esta é dada principalmente para pesquisadores.
"Apesar do óbvio risco que as cobras representam para quem entrar no local desavisado, ele quase não existe na prática", tranquiliza Haddad. "(A ilha) é desabitada e quem a visita está ciente dos cuidados que deve tomar para evitar picadas."

Ameaça de extinção

De acordo com ele, hoje quem tem que ter cuidado são as cobras. Apesar de a Ilha da Queimada Grande ser uma Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) e pertencer à Área de Proteção Ambiental (APA) de Cananéia-Iguape-Peruíbe, a jararaca-ilhoa está criticamente ameaçada de Extinção.
A espécie faz parte da Lista Nacional das Espécies da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção e da Lista Vermelha das Espécies Ameaçadas da organização União Internacional pela Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês).
A ameaça de extinção decorre das queimadas, feitas por pescadores que querem desembarcar no local, e pela biopirataria, ou seja, a captura ilegal para venda. Um exemplar da cobra pode alcançar R$ 30 mil no mercado negro.
"Se pensarmos na capacidade de venenos serem a base de medicamentos e na fantástica evolução e adaptação das cobras em um ambiente isolado, elas são mais um tesouro a ser preservado do que uma ameaça aos humanos", diz Haddad.
Só isso já justificaria o interesse científico na Bothrops insularis. Mas há outras razões. "O isolamento de cobras a partir das grandes massas continentais é uma oportunidade única para se estabelecerem relações evolutivas sob condições severas na maioria das vezes, como, por exemplo, falta de fontes de água e escassez de presas", explica Duarte.
"Além disso, a presença dessa espécie isolada é um testemunho dos fenômenos de flutuação do nível dos oceanos no período Pleistoceno (1,8 milhão a 11 mil anos atrás)."
Professor Edgar Bom Jardim - PE