quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

Vídeo SAMARICA PARTEIRA- Luiz Gonzaga


 Oi sertão!
- Ooi!
- Sertão d' Capitão Barbino! Sertão dos caba valente...
- Tá falando com ele!...
- ...e dos caba frouxo também.
-...já num tô dento.
- Há, há, há... [risos]
- sertão das mulhé bonita...
– ôoopa
- ...e dos caba fei' também ha, ha
- ...há, há, há... [risos]

- Lula!
- Pronto patrão.
- Monte na bestinha melada e risque. Vá ligeiro buscar Samarica parteira que Juvita já tá com dô de menino.

Ah, menino! Quando eu já ia riscando, Capitão Barbino ainda deu a última instrução:
- Olha, Lula, vou cuspi no chão, hein?! Tu tem que vortá antes do cuspe secá!
Foi a maior carreira que eu dei na minha vida. A eguinha tava miada.

Piriri piriri piriri piriri piriri piriri piriri
uma cancela: nheeeiim ... pá...
Piriri piriri piriri piriri piriri piriri
outra cancela: nheeeiim... pá!
Piriri piriri piriri pir... êpa !
Cancela como o diabo nesse sertão: nheeeiim... pá!
Piriri piriri piriri piriri
Um lajedo: patatac patatac patatac patatac patatac . Saí por fora !
Piriri piriri piriri piriri piriri piriri piriri piriri
Uma lagoa, lagoão: bluu bluu, oi oi, kik' k' - a saparia tava cantando.

Aha! Ah menino! Na velocidade que eu vinha essa égua deu uma freada tão danada na beirada dessa lagoa, minha cabeça foi junto com a dela!... e o sapo gritou lá de dentro d'água:
- ói, ói, ói ele agora quaje cai!

... Sapequei a espora pro suvaco no vazi' dessa égua, ela se jogou n'água parecia uma jangada cearense: [bluu bluu, oi oi, kik' k'] Tchi, tchi, tchi.
Saí por fora.

Piriri piriri piriri piriri piriri piriri piriri
Outra cancela: nheeeiim... pá!
piriri piriri piriri piriri piriri piriri

Um rancho, rancho de pobe...
- Au au!
Cachorro de pobe, cachorro de pobe late fino...
- Tá me estranhan'o cruvina?
Era cruvina mermo. Balançô o rabo. Não sei porque cachorro de pobe tem sempre nome de peixe: é cruvina, traíra, piaba, matrinxã, baleia, piranha.
Há! Maguinho mas caçadozinh' como o diabo!
Cachorro de rico é gooordo, num caça nada, rabo grosso, só vive dormindo. Há há ... num presta prá nada, só presta prá bufar, agora o nome é bonito: é white, flike, rex, whiski, jumm.
Há! Cachorro de pobe é ximbica!

- Samarica, ooooh, Samarica parteeeeira!

Qual o quê, aquelas hora no sertão, meu fi', só responde s'a gente dê o prefixo:
- Louvado seja nosso senhor J'us Cristo!
- Para sempre seja Deus louvado.

- Samarica, é Lula... Capitão Barbino mandou vê a senhora que Dona Juvita já tá com dô de menino.
- Essas hora, Lula?
- Nesse instante, Capitão Barbino cuspiu no chão, eu tem que vortá antes do cuspe secá.

Peguei o cavalo véi de Samarica que comia no murturo ? Todo cavalo de parteira é danado prá comer no murturo, não sei porque. Botei a cela no lombo desse cavalo e acochei a cia peguei a véia joguei em riba, quase que ela imbica p'outa banda.

- Vamos s'imbora Samarica que eu tô avexado!
- Vamo fazê um negócio Lula? Meu cavalin' é mago, sua eguinha é gorda, eu vou na frente.
- Que é que há Samarica, prá gente num chegá hoje? Já viu cavalo andar na frente de égua, Samarica? Vamo s'imbora que eu tô avexado!!

Piriri tic tic piriri tic tic piriri tic tic
nheeeiim... pá!
Piriri tic tic piriri tic tic
bluu oi oi bluu oi, uu, uu

- ói, ói, ói ele já voltoooou!

Saí por fora.

Piriri tic tic piriri tic tic piriri tic tic piriri tic tic
Patateco teco teco, patateco teco teco, patateco teco teco

Saí por fora da pedreira

Piriri piriri tic tic piriri tic tic
nheeeiim... pá !
Piriri tic tic piriri tic tic piriri tic tic
nheeeiim... pá !
Piriri tic tic piriri tic tic piriri tic tic
nheeeiim... pá!
Piriri piriri tic tic piriri tic tic

- Uu uu.

- Tá me estranhando, Nero? Capitão Barbino, Samarica chegou.

- Samarica chegou!!

Samarica sartou do cavalo véi embaixo, cumprimentou o Capitão, entrou prá camarinha, vestiu o vestido verde e amerelo, padrão nacioná, amarrou a cabeça c'um pano e foi dando as instrução:

- Acende um incenso. Boa noite, D. Juvita.
- Ai, Samarica, que dô !
- É assim mermo, minha fi'a, aproveite a dô. Chama as muié dessa casa, p'a rezá a oração de São Reimundo, que esse cristão vem ao mundo nesse instante. B'a noite, cumade Tota.
- B'a noite, Samarica.
- B'a noite, cumade Gerolina.
- B'a noite, Samarica.
- B'a noite, cumade Toinha.
- B'a noite, Samarica.
- B'a noite, cumade Zefa.
- B'a noite, Samarica.
- Vosmecês sabe a oração de São Reimundo?
- Nós sabe.
- Ah Sabe, né? Pois vão rezando aí, já viu??

[vozes rezando]

- Capitão Barbiiino! Capitão Barbino tem fumo de Arapiraca? Me dê uma capinha pr' ela mastigar. Pegue D. Juvita, mastigue essa capinha de fumo e não se incomode. É do bom! Aguenta nas oração, muié! [vozes rezando] Mastiga o fumo, D. Juvita... Capitão Barbino, tem cibola do Cabrobró?
- Ai Samarica! Cebola não, que eu espirro.
- Pois é prá espirrar mesmo minha fi'a, ajuda.
- Ui.
- Aproveite a dor, minha fi'a. Aguenta nas oração, muié. [vozes rezando] Mastigue o fumo D. Juvita.
- Capitão Barbiiino, bote uma faca fria na ponta do dedão do pé dela, bote. Mastigue o fumo, D. Juvita. Aguenta nas oração, muié. [vozes rezando alto].
- Ai Samarica, se eu soubesse que era assim, eu num tinha casado com o diabo desse véi macho.
- Pois é assim merm' minha fi'a, vosmecê casou com o vein' pensando que ela num era de nada? Agora cumpra seu dever, minha fi'a. Desde que o mundo é muundo, que a muié tem que passar por esse pedacinh'. Ai, que saudade! Aguenta nas oração, muié! [vozes rezando alto].Mastigue o fumo, D. Juvita.
- Ai, que dô!
- Aproveite a dô, minha fi'a. Dê uma garrafa pr' ela soprá, dê. Ô, muié, hein? Essa é a oração de S. Reimundo, mermo?
- É..é [muitas vozes].
- Vosmecês num sabe outra oração?
- Nós num sabe... [muitas vozes].
- Uma oração mais forte que essa, vocês num têm?
- Tem não, tem não, essa é boa [muitas vozes]
- Pois deixe comigo, deixe comigo, eu vou rezar uma oração aqui, que se ele num nascer, ele num tá nem cum diabo de num nascer: "Sant' Antoin pequenino, mansadô de burro brabo, fazei nascer esse menino, com mil e seiscentos diabo!"
[choro de criança]

- Nasceu e é menino homem!
- E é macho!
- Ah, se é menino homem, olha se é? Venha vê os documento dele! E essa voz!

Capitão Barbino foi lá detrás da porta, pegou o bacamarte que tava guardado a mais de 8 dia, chegou no terreiro, destambocou no oco do mundo, deu um tiro tão danado, que lascou o cano. Samarica dixe:

- Lascou, Capitão?
- Lascou, Samarica. É mas em redor de 7 légua, não tem fi' duma égua que num tenha escutado. Prepare aí a meladinha, ah, prepare a meladinha, que o nome do menino... é Bastião.
Compositorr Orlando Rodrigues
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Apologia ao jumento ( Luiz Gonzaga)







É verdade, meu senhor
Essa história do sertão
Padre Vieira falou
Que o jumento é nosso irmão
Ão ão ão ão ão ão

O jumento é nosso irmão, quer queira, quer não
O jumento sempre foi o maior "desenvolvimentista"
do sertão...

Ajudou o homem na vida diária
Ajudou o homem, ajudou o Brasil a se desenvolver

Arrastou lenha... Madeira... Pedra, cal, cimento,
tijolo... Telha
Fez açude, estrada de rodagem
Carregou água pra casa do homem
Fez a feira e serviu de montaria
O jumento é nosso irmão...

E o homem... em retribuição o que, que lhe dá?
Castigo... Pancada, pau nas pernas, pau no lombo,
Pau no pescoço, pau na cara, nas orelhas.
Ha...jumento é bom o homem é mal

E quando o pobre não aguenta mais o peso
De uma carga, e se deita no chão
Você pensa que o homem chega ajuda
O "bichin" a se levantar? Hun, pois sim,
Faz é um foguinho debaixo do rabo dele
O jumento é bom...
O jumento é sagrado...O homem é mau.

O homem só presta pra botar apelido no jumento
O pobrezinho tem apelido que não acaba mais:
Babau, gangão, bregueço, fofarquichão,
Imagem do cão, musgueiro, corneteiro, seresteiro,
Cineiro...Relógio, É, ele dar a hora certa do sertão
Tudo isso é apelido que o jumento tem
Astronauta, professor, estudante...
Advogado das bestas...

É chamado de estudante
Porque quando o estudante não sabe a lição
na escola, o professor grita logo:
"Você não sabe porque você é um jumento".
E o estudante pra se vingar botou o apelido
no jumento de "professor"
Porque o professor ensina a ler de graça
Pois sim, quem ensina a ler de graça
É o jumento, meu filho! É assim:
A.. E, I, O, U, U
"Ypsilone" (Y), "Ypsilone" (Y),
"Ypsilone" (Y), "Ypsilone" (Y),
"Ypsilone" (Y), "Ypsilone" (Y)...

Só não aprende a ler quem não quer
Esse é o jumento, nosso irmão, animal sagrado
Serviu de transporte pro Nosso Senhor
Quando ele ía para o Egito
Quando o Nosso Senhor era "perritotinho"...

Todo jumento tem uma cruz nas costas
Não tem? Pode olhar que tem
Todo jumento tem uma cruz nas costas
Foi ali que o menino santo fez um "pipizinho"
Por isso ele é chamado de sagrado
Ah, ha...jumento meu irmão, o maior amigo do sertão

Ele é cheio de presepada sim senhor
Uma vez ele me fez uma menino,
Que eu não me esqueci mais
Quando dar as primeiras chuvas no sertão,
Agente planta logo um milhozinho
No monturo da casa da gente, porque dá ligeiro
E é milho doce, dá ligeirinho, ligeirinho
O jumento cismou de ser meu sócio
Eu disse: "Eu pego ele...".
Quando ele invadiu minha roça...he!
Eu preparei uma armadilha, cheguei perto dele:
"Comendo meu milho, hein!... Vou lhe pegar".
Ele balançou a cabeça, ligou as atenas,
"troceu" o rabo, "troceu", "troceu", "troceu"
deu corda e disparou...
Deu um pulo tão danado na cerca que nem triscou na minha armadilha
Correu uns 10 metros, fez meia volta
Olhou pra mim e me gozou:
"Seu Luiz... Seu Luiz! Comi seu milho...
E como, e como, e como, e como...".
Filho da peste, comeu mesmo

Mas eu gosto dele...
Porque ele é servidorzinho que é danado
Animal sagrado
Jumento, meu irmão, eu reconheço teu valor
Tu és um patriota, tu és um grande brasileiro
Eu "tô" aqui jumento, pra reconhecer o teu valor, meu irmão...

Agora meu patriota, em nome do meu sertão
Acompanha seu vigário, nesta eterna gratidão
Aceita nossa homenagem
Ó, jumento, nosso irmão
Ão, ão, ão, ão, ão, ão, ão,
https://www.youtube.com/watch?time_continue=14&v=h-jBeuB5osM

A farra do capitalismo rentista



Foto: Reprodução 
Se você tem acesso à internet, certamente já leu alguma notícia ou presenciou discussões acaloradas sobre Bitcoins. Nos últimos tempos, a moeda digital vem surpreendendo o mundo inteiro com uma valorização surreal, causando euforia e temor. Mas a verdade é que, independente do propósito para o qual as criptomoedas foram criadas, elas repetem um fenômeno já conhecido no sistema capitalista liberal em que vivemos. E suas consequências costumam ser desastrosas.
Há muito mistério envolvendo o surgimento do Bitcoin. O que se sabe é que seu criador, ou grupo de criadores, adotou o pseudônimo de Satoshi Nakamoto, mas, apesar de muitas investigações, nunca se chegou a uma informação oficial crível de quem fosse essa pessoa. Atualmente, ela não é a única moeda digital circulando pela internet, mas, certamente, é a mais conhecida e valorizada.
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Criada em 2008, no contexto da crise econômica global, o Bitcoin é uma criptomoeda. Uma espécie de arquivo digital online que, apesar de funcionar como moeda, não é impresso por governos ou bancos tradicionais. Sua criação se dá através de um processo envolvendo computadores e cálculos matemáticos chamado “mineração”, sendo ela considerada uma moeda descentralizada, sem um poder regulador ou controlador por trás.
Todas as informações envolvendo essas moedas e suas transações são armazenadas em um espaço digital chamado “blockchain”, que se utiliza de criptografia para tanto. Isso garante o anonimato das transações, o que gera a primeira grande crítica à moeda.
Desde a crise dos subprimes em 2008, vivemos uma época de grande desconfiança em relação ao sistema financeiro mundial. Vale lembrar que esta crise, da qual o mundo ainda não se recuperou, teve início com a falta de transparência com que bancos manejavam ativos financeiros relacionados a seguros e hipotecas, criando falsos valores por meio de maquiagens financeiras.
Muitos economistas e pessoas ligadas à política criticam que, mesmo com a grande crise, pouco foi feito no sentido de forçar os bancos a terem maior transparência. Varoufakis diz que, ao contrário, foram os Estados que se curvaram ainda mais aos bancos. Já Piketty propõe que sejam aplicadas sanções, não só aos bancos, mas também aos países que facilitam as políticas obscuras dessas instituições financeiras.
Mas o mercado de Bitcoins e outras moedas digitais caminha justamente no sentido contrário. A criptografia que envolve esse sistema promete o anonimato de todas as transações que o envolvem. Não à toa, a moeda é frequentemente associada a atividades ilícitas, como a compra de drogas na rede Silk Road. Além disso, as moedas digitais são acusadas de facilitar outros ilícitos como a lavagem de dinheiro e a evasão fiscal, como alerta o Nobel da economia Joseph Stiglitz.
Porém, convenhamos, não há nada de novo até aqui. Esses mesmos atos ilícitos e a falta de transparência sempre aconteceram nos sistemas financeiro e monetário tradicionais. Quanto a isso, só o que as criptomoedas poderiam fazer é intensificar ainda mais problemas que já existem. Além disso, bastaria que tal mercado se submetesse às mesmas regulações que o sistema financeiro tradicional para supor que o problema estaria, em parte, resolvido.
Mas esse é só o problema mais óbvio que envolve as moedas digitais.
Outro grande problema que ronda o Bitcoin é que o mesmo já deixou, há muito tempo, de se portar como uma moeda propriamente dita. O fato da criptomoeda ter a capacidade de se valorizar em uma escala incomparável, chegando a ver seu valor aumentar em 1.000% em um único mês, transformou-a, essencialmente, em objeto de especulação.
Isso porque não há motivos para seus proprietários gastarem-na em qualquer tipo de compra se, em menos de uma semana, é provável que a moeda valha o dobro do que vale hoje. Desse modo, investidores têm comprado a moeda com o único objetivo de acumular renda através de sua valorização, apoiando-se, apenas, na fé que outros investidores têm nesse mercado.
É a clássica bolha, como diversos economistas já têm alertado no mundo todo. Por isso não têm faltado comparações com a crise dos subprimes de 2008 ou com a famosa bolha das tulipas holandesas do século 17.
Contra o Bitcoin, pesa, ainda, a grande instabilidade de seu valor, que oscila com grande amplitude e imprevisibilidade a depender das notícias mundiais, além do fato de que a sua produção já está bem próxima do limite de 21 milhões de unidades imposto desde o início ao sistema. Ninguém sabe dizer como se comportará a moeda quando o limite for atingido.
Porém, a empolgação com os possíveis rendimentos em investimentos no mercado do Bitcoin tem lembrado, em muito, o clima pré-crise de 2008. E vale lembrar que tal crise foi extremamente amplificada pelo fato de empresas produtoras e geradoras massivas de emprego, como a General Eletrics, por exemplo, estarem investindo seus lucros em subprimes.
Quando a bolha estourou, a crise gerou um efeito dominó que teve como consequência o endividamento público e o desemprego em escalas globais. Não seria surpresa se o mesmo estivesse acontecendo com o mercado de Bitcoins. Se grandes produtoras e empregadoras estiverem investindo neste mercado, o sinal de alerta já deveria ter sido soado.
Além disso, mesmo que o mercado de criptomoedas surpreenda e não se torne uma bolha prestes a estourar, certo é que ele está constituindo um sistema de produção de desigualdade extrema.
Ao contrário do que se prega, o Bitcoin (e as moedas digitais em geral) não são plenamente acessíveis ao mundo todo. Segundo a ONU, em 2015, mais da metade da população mundial sequer tinha acesso à internet. Pior ainda, além dos 4 bilhões de excluídos do mundo cibernético, os outros 3,2 bilhões estão concentrados em países mais desenvolvidos. Enquanto, na Europa, mais de 80% dos lares estão conectados, na África, o índice é de cerca de 10%.
Além disso, mesmo aqueles com acesso à internet não necessariamente têm a tecnologia suficiente para produzir as moedas através da “mineração”, já que o processo tem demandado cada vez mais dos computadores. Há, ainda, o grande gasto de energia nessa atividade. Hoje, com um serviço que atende apenas cerca de 3 milhões de pessoas no mundo, o Bitcoin já tem um gasto energético que representa 0,15% da demanda global.
Por certo, o investimento em Bitcoins não é para qualquer pessoa. Sobretudo agora que a moeda vale cerca de US$ 18 mil. Isso significa que as moedas digitais podem levar a prática do rentismo a um nível jamais visto.
E, conforme já se sabe bem hoje (e Piketty demonstra isso magistralmente em sua obra), o rentismo tem uma capacidade de acumular capital infinitamente maior que atividades produtivas e que a própria força de trabalho. Não à toa, foram em momentos de farra rentista, em 1929 e 2008, que a desigualdade de renda mundial explodiu. Com um investimento que pode se valorizar em até 1.000% em um mês, como os Bitcoins, esses índices de desigualdade tendem a atingir níveis estratosféricos.
Mas, mesmo que esse processo de “rentização” do Bitcoin seja revertido e ele passe a se comportar como uma moeda verdadeira, ainda existirão outros problemas a serem resolvidos no sistema.
Se o Bitcoin surgiu como uma ideia de moeda universal e independente, não podemos esquecer o exemplo mais clássico e recente de adoção de uma moeda única no mundo. Se houve muito entusiasmo com a criação do Euro por volta dos anos 2000, hoje, a moeda europeia está longe de ser uma unanimidade.
Boa parte dos problemas em se adotar uma moeda única foram sentidos após a crise de 2008. A vinculação a uma moeda que não estava sob o controle do próprio Estado foi fatal para os países menos desenvolvidos da Zona do Euro, sobretudo para os do Sul Europeu como Portugal, Espanha ou Grécia. Sem poder se utilizar de uma flutuação do câmbio, esses países ficaram sem saída quando suas economias começaram a ruir.
Aliás, essa ruína fez com que muitos, nesses países, percebessem que a política de moeda única não foi acompanhada de um mecanismo que reduzisse as desigualdades regionais dentro do próprio continente. Hoje, há um sentimento no Sul da Europa de que os europeus do Norte foram os únicos realmente beneficiados por essa política de união, principalmente a Alemanha, acusada de centralizar o poder dentro da União Europeia.
A lição que ficou da experiência do Euro, portanto, foi de que uma política de moeda única ou universal só pode surtir efeitos positivos se políticas de redução das desigualdades regionais forem implementadas em conjunto. Porém, o que se vê no mundo de hoje é justamente o contrário, com o aumento dessa desigualdade. Um ambiente nada propício para o sonho da unificação monetária.
Há, ainda, a questão do impacto ambiental, já que o gasto de energia para a produção das criptomoedas é, simplesmente, inviável para a construção de um sistema realmente global.
Com tudo isso, alguns países já têm se mexido para se proteger de um possível novo colapso econômico por conta das criptomoedas. O Equador, por exemplo, já criou sua própria moeda digital, com valor vinculado ao dólar como forma de manter a segurança. A China foi mais radical e proibiu as operações envolvendo esse tipo de moeda, embora algumas pessoas acreditem que o país deva criar a sua própria versão.
Se estes fatos chegaram a jogar o valor do Bitcoin pra baixo, por outro lado, o sistema de InitialCoinOffering e a estreia do Bitcoin no mercado futuro da Bolsa de Chicago elevaram sua cotação e deram ainda mais força à criptomoeda.
Vivemos em um mundo ainda bastante debilitado pela última farra rentista que nos acometeu. Ao contrário de 1929, porém, desta vez pouco foi feito para remediar o problema, e boa parte do mundo parece ainda se render aos mecanismos de um capitalismo liberal cada vez mais capenga.
Uma nova crise, sem dúvidas, pode causar um estrago ainda maior e forçar uma grande mudança na ordem mundial. Poderia a bolha dos Bitcoins se transformar na pá de cal da velha ordem?
Almir Felitte é advogado, graduado pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Carta capital
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Religião:Igreja Universal passa a ser investigada em Portugal por suposta rede de tráfico de crianças


A Justiça e a Segurança Social de Portugal abriram inquéritos para averiguar uma suposta liderança da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) em uma rede de tráfico internacional de crianças. O processo foi aberto após o início da exibição da série de reportagens "O Segredo dos Deuses", em que a emissora de televisão portuguesa TVI mostra o resultado de uma investigação jornalística sobre o caso.
Em nota, a Procuradoria-Geral da República do país informou à TVI, líder de audiência na televisão aberta portuguesa, que "existe um inquérito relacionado com essa matéria, tendo o mesmo sido remetido ao Diap [Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa] para investigação”. 

Leia também:
Suposta rede de adoções ilegais liderada pela Igreja Universal é denunciada por TV em Portugal
Igreja Anglicana admite ter ocultado abuso de jovens

A reportagem, fruto de uma investigação de sete meses, mostra que o bispo Edir Macedo, líder máximo da IURD, está diretamente envolvido no esquema, tendo inclusive escolhido seus netos através de fotografias. Em um primeiro momento, o religioso defendia a vasectomia para os pastores, para diminuir os gastos financeiros da igreja, aponta a reportagem. Os religiosos eram inclusive obrigados a fazer a cirurgia até em clínicas clandestinas, segundo relatos do ex-bispo Alfredo Paulo Filho. Em Portugal, homens com menos de 25 anos não podem fazer vasectomia.

Quando a sua filha biológica mais nova, Viviane Cardoso, casou, o bispo mudou de opinião e passou a defender a adoção, segundo a TVI. As crianças roubadas de suas mães eram levadas a um lar ilegal de crianças em Lisboa, capital de Portugal, onde eram depois encaminhados para as casas de líderes da igreja.

Reação da IURD
Em um vídeo publicado no canal oficial da Igreja Universal no YouTube [assista abaixo], Louis e Vera Andrade, os netos de Edir Macedo apontados como roubados negaram ter sido raptados na infância. "A TVI está dizendo coisas a nosso respeito que não são verdadeiras. Estão dizendo que fomos raptados pela cúpula da Igreja Universal, mas nós não fomos raptados. Fomos adotados de forma legal", disse Louis no vídeo. Eles também pediram a não veiculação de suas imagens e nomes pela emissora, mas não foram atendidos e a reportagem foi ao ar normalmente.

Em nota, a Igreja Universal do Reino de Deus classificou a série como "mentirosa" e acusou a emissora de "promover uma campanha difamatória" que a instituição "não pode tolerar". Ainda de acordo com o texto da IURD, a TVI baseou a série em relatos de Alfredo Paulo Filho, ex-bispo da igreja, que foi expulso da instituição após "condutas impróprias que tornaram insustentáveis a sua permanência na Igreja Universal do Reino de Deus". A IURD também afirmou na nota que o ex-bispo foi condenado a pagar R$ 1,7 milhão de indenização à igreja por danos morais. 

Professor Edgar Bom Jardim - PE

Lessa defende aliança com PT e partidos de esquerda


Em entrevista à Rádio Folha FM 96,7, o deputado estadual Aluísio Lessa (PSB) falou sobre a possibilidade de uma aliança com o Partido dos Trabalhadores (PT) e legendas de esquerda nas eleições de 2018. De acordo com o socialista, a preferência da nacional da sigla é por uma candidatura com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). "Oficialmente é aliança com o PT, de preferência que a candidatura seja de Lula", disse.

Apesar da inclinação a uma aliança com o PT, o atual vice-governador de São Paulo, Márcio França (PSB), deseja apoiar a candidatura do tucano Geraldo Alckmin. Os socialistas também dialogam com o ministro Joaquim Barbosa, que pode se filiar à legenda e disputar o pleito.

Lessa, no entanto, acredita que o PSB deve marchar com o PT, PCdoB, PDT e outros partidos de esquerda. "Essa é a opinião de Aluísio Lessa e da nacional do PSB; uma aliança com PT, PCdoB, PDT, com os partidos de esquerda", disse.

Em 2014, quando o ex-governador Eduardo Campos (PSB) se lançou candidato a presidente, o PSB apoiou o senador Aécio Neves (PSDB) no segundo turno se afastando cada vez mais dos petistas. Segundo Lessa, o partido vai voltar ao passado. Ainda de acordo com o deputado, Campos já havia conversado com o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa para uma eventual candidatura, fosse estadual ou até para compor a presidencial. Barbosa vem sendo sondado por socialistas novamente de olho em 2018.

"Isso é uma decisão e já foi encaminhado. Essa filiação de Barbosa foi adiada há cinco, seis anos", disse o parlamentar. Segundo Lessa, ela já tinha sido desenhada, mas hoje, por conta de uma série de pré-candidaturas, o seu nome volta à tona da discussão.
Folha de Pernambuco
Professor Edgar Bom Jardim - PE

terça-feira, 12 de dezembro de 2017

Programação comemorativa do aniversário de 260 anos da paróquia de Sant'Ana

Fique por dentro da programação comemorativa do aniversário de 260 anos de fundação da nossa Paróquia.
Também durante os dias 26, 27, 28 e 29 de dezembro, o Centro de Pastoral Cônego Antonio Gonçalves será palco da Exposição “Origens, 260 Anos da Paróquia de Sant’Ana”. Fragmentos fundamentais para a compreensão da história de um povo piedoso, que tem sabido conservar com carinho e espírito de bravura as tradições religiosas de seus antepassados.

Venha você também conhecer um pouco da nossa história de fé!

De  Matriz de Sant'Ana/Bruno Araújo..
Professor Edgar Bom Jardim - PE

Aliados do presidente Temer querem seu voto para governar Pernambuco

Circula  nas redes sociais o cartaz dos aliados do presidente Temer no Estado de Pernambuco. Eles fazem uma forte oposição ao governador Paulo Câmara. Se colocam como salvadores da" pátria", no entanto, apoiam  um governo reprovado por mais de 90% da população brasileira, só fazem aquilo que o povo não quer. Será que os eleitores irão acreditar nos aliados do presidente nas eleições de 2018. Votam nos projetos de um governo tido como corrupto, são contra os direitos dos trabalhadores, defendem o fim da aposentadoria para milhões de trabalhadores que serão afetados pelo projeto de reforma da previdência.  Eles merecem seu voto? Qual será o futuro do Estado de Pernambuco? Você acredita que essa oposição fará melhor por nosso povo? Que caminho político seguir.? Haja reflexões para se tomar decisão.



Professor Edgar Bom Jardim - PE

Calote legalizado: Bancos vão pagar até R$ 5 mil à vista a poupadores de planos econômicos


Representantes dos poupadores e dos bancos fecharam, na noite desta segunda-feira (11), os últimos detalhes do acordo para o ressarcimento de correções das cadernetas de poupança dos anos 1980 e 1990. Os poupadores receberão à vista as indenizações de até R$ 5.000.

Quem tiver a receber valores superiores a esta cifra, receberá em até seis parcelas semestrais -a depender da ação (individual, coletiva ou civil pública). As parcelas semestrais serão corrigidas por uma cesta de índice de preços, que terá como principal referência o índice de inflação oficial (IPCA).

Leia também:
Poupança tem melhor resultado para novembro em quatro anos
IPCA acumula 1,62% no ano, menor taxa desde 1994

O valor do ressarcimento sofrerá um desconto, que vai variar de acordo com o plano econômico que afetou o poupador. A partir de R$ 20 mil, os descontos variam de 8% a 19%, segundo apurou a reportagem.

A ideia é que os pagamentos possam ser feitos o quanto antes, mas a avaliação inicial é que não dará tempo para sair ainda neste ano. Isso porque o acordo ainda depende de homologação pelo STF (Supremo Tribunal Federal). O acordo valerá para os poupadores que tinham caderneta durante a vigência dos planos Bresser (1987), Verão (1989) e Collor 2.

Os detalhes do acordo deverão ser divulgados pela AGU (Advocacia Geral da União) na noite desta terça-feira (12). Todos que tiverem ações na Justiça, individuais, coletivas e ações civis públicas, poderão aderir ao acordo em um prazo máximo de dois anos. O valor total de ressarcimento é de cerca de R$ 10 bilhões e R$ 12 bilhões. De Folha de Pernambuco.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

'Virei pintor após ficar tetraplégico'

Aos 34 anos, a rotina de Ronaldo Serafim era bastante agitada. Dentista, começava cedo no consultório, de onde saía apenas à noite, diretamente para a faculdade onde dava aulas. Voltava para casa tarde e ainda assim invadia a madrugada estudando para o mestrado. Serafim queria atender às expectativas de ser um profissional de sucesso: especializações, cursos no exterior, e trabalho, trabalho, trabalho.
Não havia tempo a perder, nem mesmo com o sono. A estratégia dele era reservar apenas três ou quatro horas diárias para dormir, algo considerado abaixo do necessário por especialistas. Até que um desses dias comuns na sua rotina terminou mal: na volta para casa de madrugada, ele dormiu ao volante.
"Eu estava com tanto sono que, um minuto antes do acidente, eu tirei o cinto de segurança. Estava chegando em casa. Só deu tempo de segurar no volante. Com sono, você não raciocina. Quando bati, eu fui projetado para o painel do carro, e aí fraturei entre a sexta e sétima vértebra da medula", contou à BBC Brasil.
Após o acidente em agosto de 2009, Serafim passou 40 dias no hospital e saiu de lá em uma maca, tetraplégico. Ele não mexia as pernas, as mãos e o abdômen, e tinha apenas alguns movimentos nos punhos e nos ombros. Teve de reaprender as coisas mais básicas com seu novo corpo - tarefas "simples" como ficar sentado, se alimentar e escovar os dentes viraram grandes desafios.
Mas as limitações não trouxeram apenas obstáculos e fizeram o então dentista descobrir uma nova vocação: as artes plásticas.
Foi no Centro de Reabilitação Sarah, no Rio de Janeiro, que Serafim entendeu que poderia ter uma vida "normal" com uma rotina diferente, porém não menos prazerosa.
"Durante a reabilitação, tem um pessoal que te mostra tudo o que você pode fazer. Lá eu vi que era possível ir para uma academia malhar, conheci o esporte que pratico hoje, o rúgbi em cadeira de rodas. E descobri que eu poderia pintar", afirmou.
Ronaldo Serafim pintando
Image captionSerafim moldou adaptador para conseguir segurar pincel e descobriu nova paixão | Foto: Arquivo Pessoal

Sem controle da temperatura corporal

Ronaldo Serafim havia inaugurado seu consultório próprio de Odontologia no Rio de Janeiro apenas duas semanas antes de sofrer o acidente que o afastaria definitivamente da profissão. No começo, resistiu em se desfazer do aparato de trabalho.
"Na época, ainda no hospital, eu não entendia a gravidade. Achava que se me esforçasse bastante, com muita fisioterapia e força de vontade, seria possível reverter (o quadro de tetraplegia)", contou.
O primeiro choque na volta para casa veio justamente com as ações mais prosaicas. "Nos três primeiros dias depois de chegar em casa, fiquei sem banho. Tivemos que adaptar o banheiro para eu poder entrar. Fora o fato de que, como fiquei muitos dias no hospital deitado, quando eu sentava para tomar banho, eu desmaiava. A primeira semana é bem punk, você tem que ter paciência para absorver aquilo."
Ronaldo Serafim na praia
Image caption"O acidente me fez enxergar que muitas vezes a gente pensa muito no fator dinheiro antes dos nossos sonhos", disse Ronaldo Serafim
Tetraplégicos não conseguem transpirar, por exemplo, e isso exige um cuidado especial com a temperatura ambiente. As necessidades fisiológicas também requerem uma atenção diferente.
"Pelo fato da lesão ser alta, ela atinge uma região da medula que faz uma regulação automática de uma série de ações da gente. Então, no calor, em vez de eu ficar transpirando, eu transpiro zero e a temperatura do corpo começa a subir. Você sente um calor absurdo e não se alivia, é desesperador. Eu já saí de um jogo de rúgbi com mais de 40 graus, por exemplo. O frio também é muito ruim, porque a sua temperatura abaixa muito", relata.
Ronaldo Serafim no rúgbi de cadeira de rodas
Image captionApós acidente, Serafim passou a jogar rúgbi de cadeira de rodas e viajou o país todo em competições (Foto: Thelma Vidales)
"Esse mesmo centro regulador é responsável por contrair a bexiga, então não há a capacidade de urinar sozinho. Preciso esvaziá-la de tempos em tempos, passar a sonda de 4 a 5 vezes ao dia. E aí é preciso de um lugar higiênico para não correr riscos de se contaminar".
Foi principalmente quando começou no rúgbi de cadeira de rodas, em 2012, que Serafim teve contato com outras pessoas que tinham a mesma deficiência e aprendeu estratégias para "driblar" as limitações físicas e levar uma vida independente.
"Quando você é cadeirante, parece que fica infantilizado. As pessoas começam a falar com você como se fosse uma criança. E todo mundo quer fazer tudo para você, para te ajudar. Isso acaba até te tolhendo de certa forma."
Ronaldo na academia
"O maior ganho para mim com o rúgbi é poder estar com gente que tem o mesmo problema que eu, isso é um aprendizado constante. Eu via os caras viajando de carro para os jogos e aí fui atrás de entender como poderia dirigir. Você participa de torneio, viaja de avião, vai para lugares que não são adaptados, e isso exige mais criatividade. Vai te dando segurança, autoconfiança."

Pintura

Se voltar a se exercitar e retomar atividades cotidianas trouxe alívio na rotina, a mudança mais profunda na vida de Serafim veio com a redescoberta da pintura. Acostumado a exercer uma profissão que exigia habilidades motoras e fina precisão manual, ele entendeu pouco tempo depois do acidente que o trabalho como dentista era inviável. Mas o talento com as mãos ainda poderia ser explorado.
Adaptador criado por Serafim para poder pintar
Image captionCom adaptador, Serafim consegue segurar pincel e ter estabilidade no traço
Adaptador criado por Serafim para poder pintar
Image captionAdaptador criado por Serafim para poder pintar
"A pintura era muito esporádica para mim (antes do acidente), se eu fizesse dois trabalhos por ano era lucro. Depois (como tetraplégico), eu não conseguia ver minha mão segurando um pincel ou um lápis. A gente não sabe nosso potencial e tem que estar com alguém que nos mostre que é possível."
Ainda no Centro de Habilitação, em 2011, Serafim pode experimentar um primeiro adaptador. A ferramenta não oferecia tanta estabilidade, mas operou maravilhas na auto-estima. "Eu pensei: bom, alguma coisa na vida eu vou conseguir fazer."
Já em casa, o conhecimento como dentista lhe valeu. Ele usou as resinas que antes aplicava nos dentes de pacientes para moldar seu próprio adaptador. "Peguei a resina, manipulei, fingi a posição da mão segurando uma caneta. Fiz um protótipo que durou cinco anos", contou.
Com ele, Serafim passou a pintar com frequência, melhorou sua técnica e viu que seria possível também escrever com um traço perfeito, como fazia antes do acidente. Assim, decidiu voltar a estudar e foi fazer um curso de alemão.
pintura de Ronaldo Serafim
Image captionRonaldo Serafim gosta de se inspirar em paisagens do mundo todo para fazer suas pinturas (Arquivo Pessoal)
"Você cria uma coisa e ela te abre possibilidades que antes você não pensava, porque você estava travado", disse.
Hoje, o adaptador que ele usa é um pouco mais sofisticado e resistente. "Moldei a mão no silicone industrial e, a partir dessa empunhadura, consegui esculpir um novo adaptador com mais refinamento. Para não quebrar quando caísse, eu usei três lâminas de fibra de carbono. Comprei material, estudei. Me acidentar e parar de trabalhar como dentista me fez ver possibilidades de aprender coisas novas."

Realizações

A rotina de Serafim hoje é bem mais tranquila do que a que levava como dentista. Aposentado na profissão, ele sobrevive com o valor do benefício que recebe do INSS e alguns rendimentos dos investimentos que aprendeu a fazer estudando finanças pela internet após o acidente. Treina rúgbi de cadeira de rodas duas vezes por semana, vai à academia com a mesma frequência e reserva um tempo quase diário para a pintura. E exercita a paciência a cada vez que sai de casa.
Com carro próprio, ele consegue amenizar um pouco as dificuldades rotineiras pelas quais passa um cadeirante no Brasil, mas reforça que a falta de lugares adaptados para pessoas com deficiência ainda é um grande impeditivo que faz com que muitos fiquem "presos".
quadro de Ronaldo
Image captionQuadro que Serafim começou a pintar com a reportagem da BBC Brasil (Arquivo Pessoal)
"Quem para na vaga de deficiente na rua é multado. Mas no shopping ainda não é. Eu já parei num shopping e aquela área grande do lado que é marcada com as linhas, uma moto da prefeitura parou exatamente na minha porta. O cara acha que aquela área rabiscadinha é para moto estacionar...e o carro que está ali do lado que se dane", contou.
Ronaldo Serafim e os obstáculos no caminho para a praia
Image captionNo caminho para a praia, Ronaldo Serafim precisa ir boa parte do trajeto pela rua por causa da falta de espaço nas calçadas
Com 42 anos de idade e quase uma década de tetraplegia, Ronaldo Serafim já aprendeu alemão, morou em Heidelberg (a 600 km de Berlim) por alguns meses, viajou o Brasil todo e visitou outros vários lugares do mundo jogando rúgbi em cadeira de rodas. Agora, ele usa sua memória visual das paisagens que conheceu para transformá-las em arte nos quadros que pinta em casa.
"Eu gostava de correr e jogar futebol, isso me faz falta. Mas substituindo uma coisa pela outra, eu vejo assim: antes, apesar de eu fazer tudo isso, eu tinha uma vida muito mais presa por causa do trabalho", pondera.
"Se existisse uma super cura, eu não voltaria para a Odontologia. Eu me profissionalizaria em artes plásticas. O acidente me fez enxergar isso. Que muitas vezes a gente faz opções porque a gente se escraviza com a rotina, se escraviza com a vida financeira. Não é que o dinheiro manda na gente, mas a gente pensa muito no fator dinheiro antes dos nossos sonhos. Comparando a vida que eu tenho hoje com a que eu tinha, é até difícil de dizer qual é melhor. "
*Edição do vídeo: Ana Terra
Fonte: Renata Mendonça* B B C
Professor Edgar Bom Jardim - PE