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sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Quais são os desafios para o Fórum Social Mundial de 2018?




Em janeiro de 2000, o Fórum Econômico Mundial anunciou triunfalmente o fim da História com a adoção do modelo neoliberal que supostamente levaria o mundo à prosperidade, paz e qualidade de vida para todos.
Os opositores eram tratados como ignorantes e radicais que só sabem criticar, sem poder oferecer nenhuma alternativa. Indignado, tive a ideia de criar o Fórum Social Mundial, isto é, criar um espaço, um processo, no qual organizações, lideranças e militantes da sociedade civil pudessem se encontrar, se articular, ganhar força política para levar adiante suas lutas.
Leia mais:
Diminuir a dispersão e, consequentemente, a fragilidade da sociedade civil. Dar oportunidade a propostas e iniciativas alternativas, mostrando que “outro mundo é possível” na teoria e na prática, no qual a economia e a política estariam a serviço da justiça social e do desenvolvimento sustentável.  
Convidei um grupo de organizações brasileiras que se encarregou de viabilizar operacionalmente a ideia.
Esse grupo selecionou entidades internacionais para formar o Conselho Internacional, que elaborou uma carta de princípios que consagrou a ideia do fórum como um processo, um espaço auto-organizado, no qual o protagonismo das atividades e das iniciativas políticas seria das organizações da sociedade civil. O fórum não seria uma organização, uma entidade, não teria presidente, diretoria ou porta-vozes, e o conselho, que não é eleito, trataria de zelar pelo processo.
Em janeiro de 2001, foi realizado o primeiro Fórum Social Mundial em Porto Alegre, com expressiva participação da sociedade civil, que aumentou significativamente nos fóruns seguintes. A inovação política, privilegiando o processo e a auto-organização, não se constituindo numa organização verticalizada, centralizada e controladora, permitiu a realização de encontros com relativamente poucos recursos, a participação de milhares de organizações e militantes, e a multiplicação de fóruns pelo mundo.
O sucesso do FSM, fruto principalmente de sua inovação política, começou a atrair o interesse de algumas tradicionais organizações e lideranças, que, não querendo compartilhar e democratizar o protagonismo e a visibilidade, buscam desvirtuar o processo. Querem voltar à velha prática de processos verticalizados e centralizadores, no qual lideranças determinam prioridades e caminhos a serem seguidos pela massa.
Não aceitam a diversidade e a pluralidade da sociedade civil e sua independência em relação a governos e partidos políticos. E, mais recentemente, querem mudar a carta de princípios para que o fórum se transforme numa organização regida pelo conselho ou por um grupo de organizações que tome posições e fale em nome de todos e do próprio FSM, que determine hierarquias e prioridades (vide entrevista e artigo de Boaventura de Sousa Santos em CartaCapital). 
Alegam que o conselho é omisso, que o fórum é improdutivo e que deveria tomar posição, fazer declarações, elaborar manifestos. A alegação de que não há posicionamento no FSM é falaciosa. Cada organização tem total liberdade e é, inclusive, estimulada a tomar posição e fazer declarações em nome dela e/ou de todas as organizações que queiram a ela se juntar. 
É necessário, porém, que se esforce e ganhe legitimidade para articular alianças e dar força política aos seus posicionamentos. Todos em pé de igualdade e democraticamente podem se manifestar, em nome das organizações e de lideranças que subscrevem os manifestos, e podem dar a essas iniciativas a visibilidade que quiserem ou puderem.
O que não podem dizer é que se expressam em nome de todos ou do fórum, colocando os participantes como massa de manobra a serviço de uma corporação, de um movimento, de um partido político ou de um governo. Isso seria manipulação e usurpação de poder. É repetir o mesmo e velho processo que tanto mal causou à esquerda: a luta pelo poder, a cooptação por governos e partidos políticos, o controle que sufoca a crítica e o autoritarismo que tenta eliminar a divergência e a diversidade. 
O fórum não é uma organização e o conselho, que, repito, não é eleito, ou nenhum grupo particular de organizações que têm mandato para falar em nome de todos. O protagonismo não é do fórum, mas das organizações, das lideranças e dos militantes. Foi essa inovação política que atraiu tanta gente e tantas organizações, valorizou a diversidade e facilitou articulações que resultaram no fortalecimento e na criação de movimentos que impulsionaram na década passada a chegada da esquerda ao poder em países latino-americanos.
O desafio do Fórum Social Mundial, como descreve Chico Whitaker, é continuar a criar “condições para o reconhecimento mútuo e para a superação de preconceitos, da competição e da desconfiança entre movimentos sociais, para facilitar a identificação de convergências e a construção de alianças, sem hegemonias e no respeito às diferenças nos tipos de ação e nas estratégias, evitando sua manipulação por organizações, governos ou partidos políticos”. É fundamental manter e aprofundar uma prática política inovadora, coerente com “outro mundo possível”.
Uma nova edição será realizada em Salvador, entre 13 e 17 de março de 2018. Viabilizado graças à dedicação do coletivo brasileiro e baiano, com apoio do conselho, será um evento de caráter mundial que procurará criar resistências às manobras que tentam asfixiar os processos democráticos e a participação popular, retirando direitos duramente conquistados.
Buscará também alternativas e promover articulações. No momento de grandes retrocessos éticos, políticos e sociais, é fundamental a participação de quem comunga com os princípios, valores, objetivos e as esperanças que sempre alimentaram o Fórum Social Mundial.
*Idealizador do Fórum Social Mundial, presidente do conselho deliberativo da Oxfam Brasil, foi assessor especial do presidente Lula (2003), criador da Fundação Abrinq, do Instituto Ethos, da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis.
Carta Capital
Professor Edgar Bom Jardim - PE

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

O que está por trás da polêmica decisão de Trump sobre Jerusalém

Presidente dos Estados Unidos, Donald TrumpDireito de imagemREUTERS
Image captionAo reconhecer Jerusalém como capital de Israel, Trump preocupou comunidade internacional
Donald Trump prometeu em campanha e cumpriu: Jerusalém foi reconhecida pelos Estados Unidos como a capital de Israel. A decisão, anunciada nesta quarta-feira, provocou reações críticas de líderes políticos e religiosos de todo o mundo - do Papa Francisco ao governo chinês.
O temor generalizado é que a medida dificulte - e até inviabilize - os históricos esforços de negociação de paz entre Israel e Palestina. Mas especialistas ouvidos pela BBC Brasil acreditam que Trump não levou em conta esse conturbado cenário regional ao tomar a decisão.
O que estaria em jogo seriam assuntos domésticos dos próprios EUA. Especialmente a tentativa do presidente americano de agradar suas bases eleitorais. A mais importante delas é a dos evangélicos conservadores, que advogava pelo reconhecimento de Jerusalém como a capital de Israel.
"Trump foi movido por uma pressão da direita evangélica republicana. Não tem nada a ver com aproximar Israel e Palestina de um acordo. Pelo contrário, essa decisão só os separa ainda mais", afirma J.J. Goldberg, editor da Forward, revista americana voltada para a comunidade judaica.

Evangélicos

O papel dos evangélicos na política internacional americana a respeito de Israel é cada vez maior, explica Kenneth Wald, professor de ciência política da Universidade da Flórida. O grupo teria começado a ter relevância política nos anos 1980, e hoje já representaria uma das maiores e mais leais bases do Partido Republicano.
"Qualquer presidente quer manter sua base contente. Mas precisa estar atento às consequências. Por isso, os antecessores de Trump, inclusive os que eram comprometidos com Israel, viram essa medida como imprudente", continua Wald.
A influência dos evangélicos na decisão de Trump teria sido maior até que a dos judeus americanos. Primeiro, porque Trump não tem uma boa interlocução com a comunidade judaica nos Estados Unidos. Segundo, porque os judeus representam um grupo muito menor na sociedade americana que os evangélicos.
E terceiro, porque apenas os judeus ortodoxos estariam interessados na solução adotada por Trump. Os judeus mais ao centro e à esquerda prefeririam uma solução negociada. "A decisão de Trump também não tem a ver com a comunidade judaica, que é majoritariamente liberal", diz Goldberg.
Bandeiras dos Estados Unidos e de Israel hasteadasDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionEvangélicos conservadores advogavam pelo reconhecimento de Jerusalém como a capital de Israel

'Política por impulso?'

Já Michael Barnett, professor de assuntos internacionais da Universidade George Washington, discorda que os evangélicos tenham sido tão relevantes na decisão de Trump. Para ele, é difícil encontrar uma explicação razoável.
"Não faz sentido fazer isso. Parece ser uma política dirigida por impulso. Trump decide ignorar as recomendações e fazer o que tem na cabeça. Não há uma estratégia internacional."
Contribui para essa visão o fato de que o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel, e a futura transferência da embaixada dos EUA, foram apresentados como medidas isoladas. Parecem não fazer parte de uma estratégia política mais ampla.
Se por um lado o anúncio do presidente foi uma surpresa para o mundo, por outro não destoa de outras das suas polêmicas posturas internacionais, como a saída dos EUA do Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas, o rompimento da Parceria Transpacífico e até as ameaças públicas a Kim Jong-un, da Coreia do Norte.
"Trump mostra nenhum interesse em considerar qualquer tipo de opinião mundial", avalia Goldberg.
JerusalémDireito de imagemGELIA
Image captionJerusalém é uma cidade sagrada para judeus, cristão e muçulmanos

Por que evangélicos querem Jerusalém como capital de Israel?

Nos Estados Unidos, as razões para o apoio dos evangélicos ao reconhecimento de Jerusalém como capital são principalmente religiosas. "
Há muita diversidade no mundo evangélico, mas há uma ideia comum de que o destino de Israel é importante para o futuro religioso dos evangélicos", afirma Wald.
Alguns acreditam que, por razões bíblicas, Israel é o lugar destinado a agregar os judeus. Outros creem que o messias pode retornar para Jerusalém, vista como a Terra Sagrada e, para isso, é importante que ela esteja nas mãos de Israel, e não dos muçulmanos.
Assim, há uma espécie de ponte entre a história de Israel bíblico e a do Estado moderno de Israel.
Mas nem todos os evangélicos americanos compartilham dessa visão.
"Muitos evangélicos, como eu, não gostam do romance recente entre a igreja e a política republicana, e se preocupam com a mudança da embaixada americana. Para nós, a construção da paz e a busca de Justiça são grandes virtudes", escreveu o professor de estudos bíblicos Gary M. Burge, em artigo para a revista The Atlantic.
Palestino encara soldados israelenses
Image captionPara analistas, Trump desconsiderou esforços em busca de paz na região

Quais as consequências para israelenses e palestinos?

O representante dos palestinos no Reino Unido, Manuel Hassassian, disse à BBC que a medida será o "beijo da morte" nas negociações de paz baseadas no reconhecimento de dois Estados.
"Ele está declarando guerra no Oriente Médio contra 1,5 bilhão de muçulmanos e centenas de milhões de cristãos que não irão aceitar que os santuários sagrados estejam totalmente sob a hegemonia de Israel", disse Hassassian.
Acadêmicos também estão em alerta. "Os riscos são inacreditáveis. Quem pensava que poderia haver uma solução negociada entre Israel e Palestina, que levasse à coexistência de dois Estados, não pensa mais nisso. O que sobra para os palestinos? Não sobra muito. Vão sentir que os EUA já determinaram o futuro de Jerusalém", diz Barnett, da Universidade George Washington.
"Por isso, pode ser um ponto de inflexão na política palestina. Pode espalhar-se uma Terceira Intifada (insurreição de palestinos contra Israel). Além disso, uma medida como essa deixa os oponentes dos Estados Unidos mais dispostos a enfrentar riscos. Essa é a ferramenta de recrutamento (de militantes) que al-Qaeda, o autodenominado Estado Islâmico e Hezbollah adorariam usar", completa Barnett.
Há ainda quem tenha uma visão mais moderada e acredite que a medida de Trump possa facilitar as negociações entre Israel e os líderes palestinos. É o caso de Jonathan Sarna, professor de história judaica americana na Universidade de Brandeis, Massachusetts.
"Muitas pessoas no mundo muçulmano acreditavam que o tempo estava ao lado deles. Por isso, não queriam sentar à mesa de negociação. Mas agora a situação se inverte. É a hora de negociarem com Israel", afirma.
Sarna não acredita no surgimento de um conflito, porque, na sua visão, Israel tem forças "capazes de conter a violência árabe".
Com informações 
Professor Edgar Bom Jardim - PE

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

MUNDO: cinco pontos para entender a guerra civil no Iêmen, que já matou quase 10 mil em dois anos

Rebeldes hutis após o anúncio da morte do ex-presidente SalehDireito de imagemREUTERS
Image captionRebeldes hutis após o anúncio da morte do ex-presidente Saleh; Iêmen está mergulhado em uma guerra civil
O Iêmen, um dos países mais pobres do mundo árabe, tem sido devastado por uma guerra civil que opõe duas potências do Oriente Médio: de um lado, estão as forças oficiais do governo de Abd-Rabbu Mansour Hadi, apoiadas por uma coalizão sunita liderada pela Arábia Saudita. Do outro, está a milícia rebelde huti, de xiitas, apoiada pelo Irã.
Desde março de 2015, mais de 8,6 mil pessoas foram mortas e 49 mil ficaram feridas, muitas em ataques aéreos liderados pela coalizão árabe.
Em meio à guerra, o país sofre com bloqueios comerciais impostos pelos sunitas. Em decorrência disso, estima-se que cerca de 20 milhões de pessoas não tenham conseguido receber a ajuda humanitária enviada via portos e aeroportos e criou a maior situação de fome da história recente.
A ONU classifica a situação no Iêmen como a pior crise humanitária do mundo - além da guerra civil, há milhões de pessoas morrendo de fome e uma epidemia de cólera em curso.
Nesta segunda-feira, Ali Abdullah Saleh, que governou o país por 33 anos até ser deposto durante a Primavera Árabe em 2011, foi assassinado por rebeldes. Saleh era aliado dos hutis, mas foi considerado "traidor" por se dizer disposto a dialogar com a Arábia Saudita, que apoia o governo iemenita.
A BBC listou alguns pontos desse conflito para tentar entender melhor o que acontece nesse país da Península Arábica.
Ali Abdullah SalehDireito de imagemAFP
Image captionO ex-presidente Ali Abdullah Saleh foi assassinado pelos rebeldes hutis, acusado de traição

Por que essa guerra importa para o resto do mundo?

O que acontece no Iêmen pode aumentar muito as tensões na região, além de elevar os temores do Ocidente de ataques vindos do país, à medida que ele se torna mais instável.
As agências de inteligência consideram o braço da organização extremista Al-Qaeda na Península Arábica como o mais perigoso, por causa de sua expertise técnica e alcance global. O surgimento na região de novos grupos afiliados ao Estado Islâmico também é motivo de preocupação.
O conflito entre os hutis e o governo também é visto como parte de uma batalha regional de poder entre os xiitas liderados pelo Irã e os sunitas, pela Arábia Saudita.
Os países do Golfo Pérsico, que apoiam o presidente iemenita Abdu Rabbu Mansour Hadi, acusam o Irã de apoiar os hutis financeiramente e militarmente, apesar de o Irã negar.
O Iêmen é estrategicamente importante porque está no estreito de Bab-el-Mandeb, que faz ligação com a África, e é rota de navios petroleiros.

Como tudo começou?

Rebelde huti em SanaaDireito de imagemAFP
Image captionOs rebeldes xiitas hutis entraram em Sanaa em setembro de 2014 e tomaram seu controle meses depois
Essa guerra tem suas raízes no fracasso de uma transição política que supostamente traria estabilidade ao Iêmen após uma revolta na sequência da Primavera Árabe, em 2011, que forçou a saída do poder do ex-presidente Ali Abdullah Saleh após 33 anos no poder, e passou o comando do país para o seu então vice, Hadi.
Hadi enfrentou uma variedade de problemas, incluindo ataques da Al-Qaeda, um movimento separatista no sul, a resistência de muitos militares que continuaram leais a Saleh, assim como corrupção, desemprego e insegurança alimentar.
O movimento huti, que segue uma corrente do islã xiita chamada zaidismo e travou uma série de batalhas contra Saleh na década anterior, tirou proveito da fraqueza do novo presidente e tomou o controle da província de Saada, no nordeste.
Desiludidos com a transição, muitos iemenitas - incluindo os sunitas - apoiaram os hutis e, em setembro de 2014, eles entraram na capital do país, Sanaa, montando acampamentos nas ruas e bloqueando as vias.
Em janeiro de 2015 eles cercaram o palácio presidencial e colocaram o presidente Hadi e seu gabinete em prisão domiciliar.
O presidente conseguiu fugir para a cidade de Áden no mês seguinte.
Artilharia saudita sendo disparada contra Iêmen em 2015Direito de imagemAFP
Image captionUma coalizão internacional liderada pelos sauditas interveio no Iêmen em 2015
Os hutis tentaram então tomar o controle do país inteiro e Hadi teve que deixar o Iêmen.
Alarmados com o crescimento de um grupo que eles acreditavam ser apoiado militarmente pelo poder xiita local do Irã, a Arábia Saudita e outros oito Estados sunitas árabes começaram uma série de ataques aéreos para restaurar o governo de Hadi. Essa coalizão recebeu apoio logístico e de inteligência de Estados Unidos, do Reino Unido e da França.

O que aconteceu desde então?

Há dois anos e meio, essa guerra está em curso e nenhum dos lados parece disposto a ceder. A ONU tentou, sem sucesso, por três vezes negociar um acordo de paz.
Forças pró-governo, constituídas principalmente por soldados leais ao presidente Hadi e sunitas de tribos do sul e separatistas, conseguiram evitar que os rebeldes tomassem a cidade de Áden, mas após quatro meses de uma batalha violenta, que deixou centenas de mortos.
Tendo assegurado um espaço no porto, tropas das forças de coalizão desembarcaram lá e ajudaram a expulsar os hutis para o sul. O presidente Hadi estabeleceu residência temporária em Áden, apesar da maioria de seu gabinete continuar exilada.
Os hutis, no entanto, conseguiram manter um cerco na cidade de Taiz e lançar morteiros e foguetes através da fronteira com a Arábia Saudita.
Os jihadistas da Al-Qaeda na Península Arábica e rivais de organizações parceiras do Estado Islâmico têm tomado proveito do caos, confiscando territórios no sul e cometendo ataques mortais, principalmente em Áden.
O lançamento de um míssil em direção a Riad em novembro levou a Arábia Saudita a apertar o bloqueio no Iêmen.
A coalizão alegou querer parar o contrabando de armas para os rebeldes do Irã, mas a ONU disse que as restrições poderiam desencadear "a maior crise de fome que o mundo já viu em décadas".
Garoto iemenitaDireito de imagemAFP
Image captionGaroto iemenita aliado dos hutis carrega arma no norte de Sanaa: população vive emergência alimentícia

Qual o impacto na população?

A população tem suportado o caos da guerra e tem sido constantemente vítima do que o conselho de direitos humanos da ONU chama de "incessantes violações do direito humanitário internacional".
Os ataques aéreos da coalizão saudita foram as principais causas da morte desse civis.
A destruição da infraestrutura do país e as restrições de importação de comida, de medicamenteos e de combustível causaram o que a ONU diz ser uma situação humanitária catastrófica.
Mais de 20 milhões de pessoas, incluindo 11 milhões de crianças, precisam de ajuda humanitária imediata. Há 7 milhões de pessoas dependentes de ajuda para comer e 400 mil crianças sofrendo de desnutrição;
Ao menos 14,8 milhões estão sem cuidados básicos de saúde, e apenas 45% dos 3.500 postos de saúde estão funcionando. Eles estão lutando para conter a maior epidemia de cólera do mundo, que já resultou em mais de 913 mil casos suspeitos e em 2.196 mortes desde abril.
Dois milhões de iemenitas estão desabrigados por causa da guerra e 188 mil fugiram para países vizinhos.

Por que há uma ruptura entre os rebeldes?

Durante meses houve indicativos de que a aliança entre os hutis e os apoiadores de Saleh estava estremecida, o que se provou verdade com o assassinato do ex-presidente.
No dia 29 de novembro, conflitos entre os antigos aliados emergiram na capital Sanaa. Com cada um dos lados culpando o outro pela ruptura, no dia 2 de dezembro Saleh apareceu na televisão dizendo à coalizão saudita estar aberto a um novo capítulo nas relações.
Ele pediu à coalizão para parar os ataques aéreos e afrouxar o bloqueio no país. Também se dispôs a um novo diálogo, o que foi bem -recebido pela coalizão, mas visto como traição pelos hutis, que o assassinaram.
Professor Edgar Bom Jardim - PE

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Indicadores de subdesenvolvimento nos Estados Unidos


Moradora de rua pede dinheiro nas ruas de San Francisco, nos EUADireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionMoradora de rua pede dinheiro nas ruas de San Francisco, nos EUA; dados revelam um país de contrastes

"Estamos nos tornando um país do terceiro mundo", disse Donald Trump em 16 de junho de 2015, quando anunciou sua candidatura à Presidência dos Estados Unidos.
A afirmação, que Trump repetiu em outras ocasiões durante o quase um ano e meio da campanha eleitoral, baseou-se no desempenho dos EUA em indicadores da educação na comparação mundial - algo apontado como exagerado por seus críticos.
No entanto, a realidade é que há vários indicadores de desenvolvimento social em que os Estados Unidos aparecem atrás na comparação com outros países ricos - e, às vezes, lado a lado com países em desenvolvimento.
O assunto é alvo de debates no país, onde especialistas e cidadãos diferem em sua avaliação sobre a situação dos pobres no país.
Um estudo do Centro de Pesquisas Pew aponta, por exemplo, que a maioria dos americanos de classe média e alta concorda com a ideia de que "os pobres hoje vivem situação mais fácil porque podem receber benefícios do governo sem fazer nada em troca".
Por outro lado, dois terços dos cidadãos de baixa renda concordam com a afirmação de que "os pobres têm uma vida difícil porque os benefícios sociais não são suficientes para ajudá-los a viver uma vida decente".
A BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, listou alguns dos indicadores que colocam em xeque os níveis de desenvolvimento e bem-estar nos Estados Unidos.

1. Expectativa de vida

O relatório mais recente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) indica que a expectativa de vida dos americanos é de 79,2 anos.

Uma família pobre americanaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionIndicadores de qualidade de vida das famílias afro-americanas são, em média, inferiores aos das famílias brancas

Esse dado coloca o país como o 40º do mundo, atrás de um conjunto de países desenvolvidos mas também de alguns países latino-americanos, como Chile, Costa Rica e Cuba - essa não é, no entanto, a realidade da comparação com o Brasil, onde a expectativa de vida é de 74,7 anos.
O país líder nesse indicador é o Japão, com 83,7 anos, e o lanterna é a Suazilândia, com 48,9 anos.
Mas, assim como no Brasil, essas médias nacionais variam consideravelmente quando segmentadas por escolaridade e raça.
Nos EUA, enquanto a expectativa de vida de um homem branco com educação universitária é de 80 anos, a de um homem afro-americano com baixa escolaridade é de 66 anos, segundo pesquisas do Centro Nacional sobre a Pobreza nos Estados Unidos (NPC, na sigla em inglês).

gráfico sobre expectativa de vida

"O problema nos Estados Unidos é que o bem-estar é incrivelmente estratificado", explicou à BBC Mundo um dos autores do estudo, Luke Shaefer, professor e diretor da Iniciativa para a Solução da Pobreza da Universidade de Michigan, nos EUA.
"O país aparece muito bem se você compara o estrato superior da sociedade americana com os países ricos. A questão é a incrível diferença no bem-estar entre os pobres e os americanos com mais recursos", aponta, acrescentando que, em 2008, a expectativa de vida para os homens afro-americanos sem educação superior era equivalente à dos cidadãos do Paquistão, Butão e Mongólia.

2. Mortalidade infantil

Os números sobre mortalidade infantil - o número de crianças que morrem por mil nascidos vivos - é outro indicador clássico do bem-estar social.
De acordo com o relatório mais recente do Pnud, que utiliza dados de 2015, esse indicador é de 5,6 nos EUA. Isso o coloca no 44º lugar do mundo, novamente superado pelos países ricos como um todo, bem como por Cuba, Bósnia e Croácia.

gráfico de mortalidade infantil

Nesse caso, as diferenças sociais dentro dos Estados Unidos também são evidentes. De acordo com Shaefer, em 2011, a taxa de mortalidade infantil entre os afro-americanos era semelhante à de Togo e da Ilha de Granada.
O bem-estar das crianças americanas também é colocado em xeque quando são considerados indicadores de pobreza infantil.
De acordo com um estudo do Unicef de 2012, que comparou a situação de crianças em 35 países de economia avançada, os Estados Unidos apareceram no penúltimo lugar - antes apenas da Romênia.
O indicador de pobreza infantil relativa, que mede a porcentagem de crianças que vivem em uma família cuja renda - ajustada ao tamanho e à composição da família - é inferior a 50% da renda média nacional, registrou 23,1% das crianças americanas nesta situação.

Crianças limpam colchão sujo após inundaçãoDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionEUA têm nível de pobreza infantil mais alto do que países ricos europeus

3. Mortalidade materna

Desde o início deste século, os Estados Unidos registraram um aumento nos índices de mortalidade materna, cuja taxa passou de 17,5 mortes por mil nascimentos em 2000 para 26,5 em 2015, de acordo com um estudo publicado na revista científica The Lancet em janeiro deste ano.
É um fenômeno que vai na contramão das tendências no restante do mundo industrializado, onde houve um declínio no mesmo período. Esse foi o caso, por exemplo, do Japão (de 8,8 para 6,4), Dinamarca (de 5,8 para 4,2), Canadá (de 7,7 para 7,3) e França (de 11,7 para 7,8).
Além disso, o número registrado nos Estados Unidos é superior ao da Costa Rica (24,3), da China (17,7), do Vietnã (15,6) e do Líbano (15,3).
Nesse caso, há também uma clara desigualdade nos Estados Unidos: a taxa de mortalidade materna entre mulheres brancas é de 13, mas entre as afro-americanas é de 44.

4. Taxa de homicídios

A segurança pessoal, a possibilidade de proteger a própria vida, é considerada outro elemento básico do bem-estar social.
De acordo com o relatório mais recente do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNDOC), os Estados Unidos registram uma taxa de homicídio de 4,88 óbitos por 100 mil pessoas, o que o coloca em 59º lugar no mundo.

Mulheres deixam flores para vítimas fatais de um tiroteio em massaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionTaxa de homicídios nos Estados Unidos é muito maior do que em outros países industrializados

Esse número contrasta com o de países europeus, como Áustria (0,51) ou Holanda (0,61), mas também com o Canadá (1,68) e até a Albânia (2,28), Bangladesh (2,51) e Chile (3,59, de acordo com dados de 2014, os mais recentes).
No estudo publicado pelo Centro Nacional sobre a Pobreza, Shaefer sugere analisar não os dados nacionais de homicídios, mas sim a situação individual das cidades americanas com mais de 200 mil habitantes e taxa de pobreza de 25%.
Nelas, o número de homicídios aumenta para 24,4 (de acordo com dados de 2012), situação ligeiramente melhor que a da Colômbia (26,5) e do Brasil (26,74) - mas muito pior do que a Argentina (6,53), o Peru (7,16) e o Uruguai (8,42).

Taxa de homicídios

5. Gravidez na adolescência

Além de representar um risco para a saúde das mulheres jovens, a gravidez na adolescência é frequentemente associada à vulnerabilidade.

Campanha de prevenção à gravidez na adolescênciaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionEmbora números tenham caído nos últimos anos, EUA ainda têm índices altos de gravidez na adolescência

Segundo dados do Banco Mundial para 2015, os EUA registram uma taxa de 21 nascimentos desse tipo para cada mil mulheres entre 15 e 19 anos de idade - colocando o país no 68º lugar do mundo, mesmo nível de Djibouti e Aruba, e bem acima da média de países com altos níveis de renda.
Outros países ricos têm números bem mais baixos, como Japão (4), Alemanha (6) e França (9). No Brasil, a taxa é de 67.

6. Educação

Os EUA são sede de dezenas das melhores universidades do mundo. Mas isso não significa que a formação média dos americanos esteja à altura desses centros de excelência.
De acordo com um estudo realizado no âmbito do Programa Internacional para Avaliação de Competências (PIAAC, na sigla em inglês), entre os países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o país teve uma performance considerada medíocre.
A pesquisa mediu três níveis educacionais diferentes em termos de capacidade de leitura e habilidade numérica: pessoas que não completaram o ensino médio, indivíduos com ensino médio completo e outros com pelo menos dois anos de ensino universitário cursado.
Participaram da análise pouco mais de 20 países: Austrália, Áustria, Canadá, República Checa, Dinamarca, Estônia, Finlândia, França, Alemanha, Irlanda, Itália, Japão, Países Baixos, Noruega, Polônia, Coréia do Sul, Eslováquia, Espanha, Suécia, Estados Unidos, Bélgica e Reino Unido.

Taxa de gravidez na adolescência

No teste sobre a capacidade de leitura, entre aqueles que não haviam terminado o ensino médio, os americanos ficaram entre os cinco países com os piores resultados; entre aqueles que completaram esse nível de estudos, o país ficou abaixo da média de todos.
No caso de pessoas que tinham começado a cursar a universidade, os americanos ficaram acima de oito países, empataram com outros seis - mas foram ultrapassados ​​por sete nações.
Além disso, os Estados Unidos registraram a maior diferença entre os resultados obtidos por aqueles que não terminaram o Ensino Médio e aqueles que têm pelo menos dois anos de ensino universitário.
Na avaliação das habilidades numéricas, os americanos ficaram consistentemente abaixo da média da OCDE nos três níveis educacionais estudados. Além disso, o país ficou na lanterna em dois níveis: entre os que não terminaram o ensino médio e aqueles que concluíram esta etapa.
Para aqueles que completaram pelo menos dois anos de ensino superior, os EUA superaram a Espanha e a Itália e se igualaram a outros cinco países - ficando atrás de 15 outras nações.

As causas das diferenças em relação aos países ricos

Ao explicar por que os EUA registram indicadores de desenvolvimento tão significativamente abaixo de outros países ricos, Shaefer aponta para as peculiaridades da rede de assistência social no país.
"Os Estados Unidos sempre tiveram uma rede de segurança social menos generosa. Os programas sociais visam os pobres, em vez de serem benefícios universais, como é o caso em muitos outros países industrializados onde, além disso, você não possui essas enormes disparidades de riqueza que temos aqui", explica.
Shaefer publicou o livro Dois dólares por dia: vivendo com quase nada nos Estados Unidos, no qual acompanhou famílias americanas que sobreviviam com cerca R$ 6,4 (em valores atuais) por dia por pessoa.
"O que faz diferença nos Estados Unidos é que muitos deles também têm seguro de saúde e cupons de comida, mas não têm dinheiro em espécie. O que você faz nos EUA quando você não tem dinheiro para pagar a energia elétrica ou as coisas que você precisa em uma entrevista de emprego? Em 2011, havia 1,5 milhão de famílias e mais de 3 milhões de crianças nos Estados Unidos que viviam assim", afirma.
No entanto, essa visão sobre a pobreza no país e as falhas do sistema de assistência social não é compartilhada por todos.
Um estudo da Fundação Heritage questionou a validade dos dados do Censo dos Estados Unidos - que estimou haver quase 15 milhões de crianças vivendo na pobreza em 2014. Para a fundação, esses dados não levavam em conta muitos dos benefícios sociais que as famílias dessas crianças recebiam do Estado.
Para a instituição, famílias com crianças oficialmente listadas em estatísticas de pobreza vivem em condições favoráveis.
"A família média pobre nos Estados Unidos tem ar-condicionado, um carro ou caminhonete, TV a cabo, um computador, um telefone celular e (se houver crianças na casa) videogames. Eles têm o suficiente para comer e não são malnutridos", diz o estudo da fundação.
"Eles vivem em uma casa confortável que está em boas condições e têm mais espaço do que a média não pobre da Alemanha, França, Suécia e Reino Unido", acrescenta.
Shaefer, no entanto, questiona essa visão e adverte que, embora muitas famílias pobres nos Estados Unidos residam em casas amplas, muitas vezes elas não têm dinheiro para aluguel ou serviços básicos, como calefação.
"Se os pobres nos Estados Unidos têm tantos recursos, então por que seus resultados são tão ruins? Sabemos que indicadores como a expectativa de vida estão claramente ligados à renda e que os pobres americanos têm uma taxa muito baixa", rebate o pesquisador.
"As pessoas dizem que os pobres nos Estados Unidos são ricos pelos padrões internacionais, mas isso claramente não é verdade porque seus resultados são muito piores do que os do resto da sociedade", conclui
Fonte:BBC

Professor Edgar Bom Jardim - PE