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quarta-feira, 16 de maio de 2018

Como seus cuidados com a beleza podem estar prejudicando o ambiente

Imagens mostram mulher usando cotonete e lixo de plástico acumulado na areia da praiaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionCotonetes com haste de plástico estão entre os vilões que se acumulam nos oceanos e podem ser banidos junto com os canudos, nos próximos anos
Desde a hora em que você acorda e lava o rosto pela manhã, sua rotina de beleza pode estar prejudicando o meio ambiente.
Cerca de 12,2 milhões de toneladas de resíduos plásticos chegam aos oceanos todos os anos, de acordo com a organização ambiental independente The Green Alliance, sediada no Reino Unido.
Grande parte desses resíduos vem de garrafas ou embalagens - estima-se que 80% dos dejetos no mar tenham vindo de terra firme, geralmente por rios, esgotos, lixo deixado em praias ou por ação do vento e chuvas.
Mas outras parte dessa poluição, segundo especialistas, se dá por meio de artigos de higiene e de maquiagem que escorrem pelo ralo ou são descartados indevidamente.
O governo britânico recentemente proibiu o uso de microesferas - os pequenos pedaços de plástico usados em cosméticos e itens como esfoliantes, cremes dentais e géis para banho - e estuda formas de coibir a utilização de plástico na produção de lenços umedecidos. Estes são usados, entre outras coisas, para remover maquiagem do rosto.
Mas afinal, que danos o seu regime de beleza tem causado ao meio ambiente ?

Quando você limpa o rosto

Imagem mostra mulher com esfoliante no rostoDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionMicroesferas presentes em esfoliantes de rosto e em outros produtos também são poluidoras e acabaram proibidas no Reino Unido
Um dos produtos mais comuns usados na limpeza do rosto são os esfoliantes, que removem sujeira e células mortas da pele e a deixam mais macia e uniforme.
Um dos principais componentes desses produtos - obtidos na forma de cremes, géis, sabonetes, duchas de banho - são as pequenas partículas que promovem a esfoliação da pele, as microesferas.
Na indústria cosmética, é comum o uso de microesferas de plástico.
Só no Reino Unido são usadas mais de 680 toneladas dessas microesferas a cada ano.
Essas esferas podem entrar na cadeia alimentar, após serem ingeridas por peixes ou frutos do mar.
Por isso, eles forma banidas nos EUA e agora o Reino Unido decidiu proibir seu uso.
"A indústria de cosméticos é interessante para começar (com esse tipo de proibição) porque (o problema nela) é invisível", diz o diretor técnico da ONG Plastic Oceans, Geoff Brighty, à BBC.
Nos EUA, a proibição levou empresas a buscar alternativas. Um porta-voz da Clearasil, marca americana de cuidados com a pele, por exemplo, disse à BBC que as microesferas foram substituídas, em alguns produtos, por produtos naturais como areia ou cascas de nozes trituradas.
No Brasil, não há restrições ao uso das microesferas pela indústria cosmética.

Quando você retoca a maquiagem ou usa glitter

Imagem mostra mulheres sendo maquiadasDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionEspecialistas alertam para cuidados por parte da indústria, quanto às matérias-primas, e também do consumidor na escolha, uso e descarte de produtos
Se você usa cotonetes para limpar seu delineador ou rímel, sua rotina de beleza pode ser menos ecologicamente correta do que você pensa.
Os cotonetes com haste de plástico podem ser banidos junto com os canudos de bebida, no futuro.
"Os cotonetes simplesmente viajam através do sistema de tratamento de águas", diz Brighty.
"Esse sistema não é concebido para lidar com microplásticos ou plásticos pequenos como cotonetes. Todos eles simplesmente passam pelos filtros".
E não são os únicos a fazer isso.
Lavar o glitter do seu rosto e deixá-lo descer pelo ralo também afeta a vida aquática, dizem os ambientalistas.
E algumas iniciativas no Reino Unido estão tentando combater isso.
Mais de 60 festivais independentes de música, por exemplo, prometeram se livrar de plásticos de uso único (incluindo glitter) até o ano 2021. Uma rede de creches em Dorset, na Inglaterra, também resolveu banir o glitter das aulas de artes no ano passado, por causa do "dano terrível" que a substância causa ao meio ambiente.
Mulher removendo a maquiagemDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionRemover a maquiagem com lenços umedecidos é prático, mas esse tipo de produto também pode prejudicar o meio ambiente

Quando retira sua maquiagem

Lenços umedecidos são uma das formas mais comuns de remover a maquiagem à noite, especialmente por causa da praticidade.
No entanto, esses lenços descartáveis são um componente-chave dos fatbergs - como são chamadas as grandes massas de resíduos sólidos que se formam com lixo jogado em vasos sanitários - responsáveis por 93% dos entupimentos de esgotos registrados no Reino Unido.
Os lenços podem se misturar com óleo e gordura no sistema de tratamento de água, virando essa grande massa que obstrui os esgotos.
"Você acaba com (a água) dos esgotos (voltando pelo ralo) e as casas das pessoas inundadas", diz Brighty, da Plastic Oceans.
O governo estuda proibir lenços umedecidos, uma vez que a maioria é feita de materiais não biodegradáveis, como o poliéster.
Frascos de produtos de belezaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionCerca de 13 bilhões de garrafas plásticas são usadas por ano no Reino Unido, número que inclui frascos de produtos de beleza e são riscos aos oceanos

Sua rotina noturna pode fazer maravilhas pela sua pele, mas causar grandes danos ao planeta

Por último, se a sua rotina noturna de cuidados com a pele consiste em várias etapas - ou seja, no uso de vários produtos diferentes em frascos ou embalagens plásticos - provavelmente é hora de repensar o que você está usando.
Você pode estar somando os seus frascos ao lixo plástico acumulado na Terra.
Um estudo americano de 2017 diz que o volume total de plástico já produzido no mundo é de cerca de 8,3 bilhões de toneladas e que 6,3 bilhões de toneladas desse total são agora resíduos espalhados pelo planeta.
Frascos com produtos de higieneDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionEspecialista recomenda que consumidores evitem usar miniaturas de plástico com produtos de higiene disponíveis em banheiros de hoteis

Então o que eu posso fazer?

"Se as pessoas estão usando lenços umedecidos para remover a maquiagem, certifique-se de que eles estão sendo devidamente descartados [coloque-os no lixo]", diz Brighty.
"Também tente evitar produtos em pequenas garrafas plásticas."
O especialista recomenda evitar aqueles produtos de higiene minúsculos que estão disponíveis em banheiros de hotel e experimentar xampus e desodorantes sólidos e orgânicos.
Ele vê uma grande oportunidade para jovens empreendedores criarem marcas (e dinheiro) a partir de alternativas éticas.
"Devemos encorajar as pessoas a surgirem com novas ideias e serem revolucionárias. A indústria de cosméticos é multibilionária, quem surge com essas ideias se sai muito bem", acrescenta.
*Ouça o programa Newsbeat na BBC Radio 1.

Professor Edgar Bom Jardim - PE

sexta-feira, 13 de abril de 2018

Bodocó inundada


Dezenas de famílias estão desabrigadas pela enchente que atingiu a cidade, localizada a 640 quilômetros do Recife. Foto: Reprodução/Whatsapp
Dezenas de famílias estão desabrigadas pela enchente que atingiu a cidade, localizada a 640 quilômetros do Recife. Foto: Reprodução/Whatsapp

Moradores da cidade de Bodocó, no Sertão do Araripe, amanheceram a sexta-feira com a cidade inundada. Centenas de famílias estão desabrigadas pela enchente que atingiu a cidade, localizada a 640 quilômetros do Recife. Desde terça-feira que chove no município, provocando o acúmulo de água em açudes, transbordando riachos, ligados a bacia do Brígida.

A força da água derrubou parte da Ponte sobre o Riacho do Pequi que passa sobre a rodovia PE-545. Ela corta o município e leva até a cidade de Ouricuri, também no Sertão. A pista está interditada. O Riacho do Amparo e a Cacimba do Ôco passam próximo a Zona Urbana. Segundo a Agência Pernambucana de de Águas e Climas (Apac) a previsão é de que as chuvas isoladas continuem de forma moderada a forte durante toda esta sexta-feira e ainda no sábado pela manhã.

Moradora de Ipubi, município próximo a Ouricuri, a jornalista Ana Abrantes informa que não consegue contato com nenhum amigo que reside em Bodocó. "Arrecadei roupas, alimentos, água. Eles estão sem telefone, provavelmente sem energia. A principal ponte de acesso caiu, infelizmente. Os mantimentos iremos levar pegando uma estrada por outro acesso". A outra passagem pelo município de Exu, BR 122.

A Coordenadoria de Defesa Civil do Estado de Pernambuco (Codecipe) confirmou que a Ponte sobre o Riacho do Pequi foi parcialmente destruída e está interditada. Dois bairros ficaram alagados, o prédio da Escola Estadual João Carlos Locio está servindo de abrigo para cerca de duzentas pessoas,que tiveram a casa invadida pela chuva. 
Moradores de várias localidades do centro da cidade estão desabrigados. As pessoas perderam móveis, pertences pessoais e documentos. Sanfoneiro e filho ilustre da terra, o cantor Flávio Leandro gravou um vídeo pedindo a ajuda dos pernambucanos. 
       
Assista o vídeo, enviado para o Diario, onde o sanfoneiro pede ajuda:
No final da tarde, roupas e mantimentos começavam a chegar para ajudar aos que perderam tudo na enchente. A Paróquia São José está arrecadando dinheiro através da conta: 8113-2, agência 0899-0, Banco do Brasil.
Com informação do Diário de Pernambuco
Professor Edgar Bom Jardim - PE

segunda-feira, 26 de março de 2018

Marina Silva:"A liberação da cana na Amazônia é a gota d’água para sua destruição"


Junto-me aos cinco ex-ministros do Meio Ambiente e um dos principais climatologistas do país contra a proposta em análise no Senado.
“A liberação da cana na Amazônia é a gota d’água para sua destruição. Não bastasse a retomada do aumento do desmatamento, que foi de 45% de 2012 a 2017. O projeto em pauta segue o desmonte da governança socioambiental do país, usada como moeda de troca no vale-tudo da velha política. Não é necessidade econômica, é apego ao atraso. Nem interessa ao setor sucroalcooleiro, cuja agenda estratégica requer desenvolver tecnologia para aumentar a produtividade e gerar etanol com a celulose do bagaço, multiplicando a produção sem a necessidade de ampliar a área de plantio.”
Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente
“Quando fizemos o zoneamento da cana-de-açúcar, debatemos extensamente dentro do governo e com o setor produtivo e argumentamos que havia terras mais do que suficientes para duplicar a produção de cana sem invadir áreas de produção de alimentos, a Bacia do Alto Paraguai e a Amazônia. Avançar sobre essas áreas macularia todo o etanol brasileiro. Esse argumento foi acatado. É inacreditável que, nove anos depois, com todos os compromissos que o Brasil assumiu em Paris, as mesmas pessoas venham ressuscitar a mesma proposta de liberar a cana na Amazônia.”
Carlos Minc, ex-ministro do Meio Ambiente
“A proposta é um tiro no pé da política brasileira de biocombustíveis, expondo o RenovaBio e os compromissos do Brasil no Acordo de Paris. O etanol brasileiro não precisa disso. Mais do que um retrocesso, uma vergonha.”
Izabella Teixeira, ex-ministra do Meio Ambiente
“O PL 626/2011 fere de morte o zoneamento agroecológico da cana-de-açúcar e cria novo vetor de pressão sobre o bioma amazônico. Mais um retrocesso que não deve prosperar.”
José Carlos Carvalho, ex-ministro do Meio Ambiente
“É preciso condenar energicamente a tentativa de desvirtuar uma das raras iniciativas de sucesso em termos de e zoneamento racional da produção de cana e em agricultura em geral. A aprovação do projeto, desnecessário e pernicioso, constituiria brecha para desmantelar todo o zoneamento e desmoralizar esforços futuros para estender a ideia a outros setores da
produção, como a pecuária.”
Rubens Ricupero, ex-ministro do Meio Ambiente
“Este PL segue uma tendência observada nos últimos anos de retomada das decisões de políticas sobre usos da terra por interesses econômicos da agricultura e pecuária, visando à continuada expansão da fronteira de commodities da agropecuária. Se aprovado, será mais um vetor de desmatamento, direta ou indiretamente. Não há justificativa econômica, pois qualquer eventual crescimento da demanda de bioetanol ou açúcar poderá ser atendido com aumento de produtividade onde já existe a cana. Por outro lado, será uma indústria não de vida longa. Projeta-se que os veículos elétricos, inclusive embarcações, tornar-se-ão mais e mais comuns e deveram dominar o mercado mundial totalmente até, no máximo, a década de 2040. A destinação precípua dos mais de 150 mil km2 de áreas desmatadas e abandonadas pela pecuária e agricultura deveria ser a restauração florestal para desempenhar o criticamente importante papel de retirar gás carbônico da atmosfera, mitigando o aquecimento global.”
Carlos Nobre, membro da Academia Brasileira de Ciências, da Academia Nacional de Ciências dos EUA e ex-presidente da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).
PERGUNTAS E RESPOSTAS
O que diz o projeto em pauta no Senado sobre cana na Amazônia?
O PLS 626/2011 estabelece que “fica autorizado o plantio de cana-de-açúcar em áreas alteradas e nas áreas dos biomas Cerrado e Campos Gerais situados na Amazônia Legal, observadas as disposições do Código Florestal Brasileiro”. Uma emenda da Comissão de Meio Ambiente estabeleceu que as área passíveis de uso para essa lavoura seriam, “prioritariamente” as áreas degradadas ou pastagens assim declaradas pelos órgãos estaduais em 2010.
Qual é o argumento do autor em defesa do projeto?
Segundo o autor do projeto, senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), a “crescente demanda” por biocombustível que se seguiu à adoção do carro flex gerou a necessidade de expansão da produção de etanol. No entanto, o zoneamento agroecológico da cana-de-açúcar, estabelecido pelo Decreto 6.961/2009, excluiu os biomas Amazônia e Pantanal e a bacia do Alto Paraguai. Os estudos que deram origem ao zoneamento, queixa-se o senador, sequer incluíram os Estados de Amazonas, Amapá, Acre, Pará, Roraima e Rondônia, “atrapalhando o desenvolvimento da região”. O senador dá dois exemplos: no Pará, segundo ele, um estudo de 2006 haveria estimado que há 9 milhões de hectares com aptidão para cana; e Roraima, que “tem região agrícola propícia para a produção de cana, não pode exportar para a Venezuela. O país vizinho terá de comprar de outros”.
Mas já não tem cana na Amazônia Legal?
Sim. Três Estados da Amazônia Legal, Mato Grosso, Tocantins, e Maranhão, concentram áreas significativas de cana plantadas em áreas compreendidas no bioma de cerrado (incluídas no Zoneamento) . Em 2015, segundo dados da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) esses Estados contavam respectivamente com 300 mil, 35 mil e 47 mil hectares plantados de cana, respectivamente. O Pará vem na sequência, com 16 mil hectares, seguido do Amazonas, com 4,4 mil.
O zoneamento da cana veda a expansão do cultivo na Amazônia Legal?
Não. O zoneamento vigente só proíbe o plantio no bioma Amazônia, ou seja, na floresta amazônica e nas manchas de cerrado e campos ainda preservados (diferentemente do que afirma o projeto de lei, não existe um “bioma campos gerais” na classificação de biomas do IBGE ) existentes naquele bioma. Tanto assim que o zoneamento atual considera haver 1,1 milhão de hectares aptos a cana em Tocantins, 6,8 milhões aptos em Mato Grosso e 790 mil ha aptos no Maranhão – todos Estados da Amazônia Legal com áreas de Cerrado e com amplas áreas já desmatadas, aptas para plantio de cana. No total são 8,7 milhões de hectares onde a cana pode se expandir nesses três Estados sem converter nenhum hectare de Cerrado nem de campo natural. Para comparação, o Brasil tinha em 2015 10,8 milhões de hectares plantados com cana, segundo dados da Unica. Ou seja, há espaço mais que suficiente para dobrar a produção total do Brasil, já autorizados do zoneamento atual, somente nesses três estados da Amazônia Legal.
Por que o bioma Amazônia foi excluído do zoneamento da cana?
O zoneamento elaborado em 2009 levou em conta risco climático, vulnerabilidade de terras, potencial de produção e áreas protegidas. Devido a existência de extensas áreas aptas ao plantio em outros biomas e a ameaças de imposição de barreiras não-tarifárias ao etanol brasileiro por países europeus e ao risco de desmatamento causado pela cana na Amazônia, este bioma foi excluído, assim com o Pantanal e a Bacia do Alto Paraguai, a região de cerrados onde nascem os rios pantaneiros. O zoneamento buscou estimar as áreas remanescentes do país onde a cana pudesse ser expandida sem competir com áreas de produção de alimentos e sem afetar esses biomas. O decreto teve a coautoria do Ministério da Agricultura e do Ministério do Meio Ambiente.
Em relação às restrições de uso de terra, a legislação da União Europeia, por exemplo, exige que as culturas para biocombustíveis não sejam cultivadas, após janeiro de 2008, em terras com alto valor de biodiversidade ou com estoque de carbono significativo. Terras com alto valor de biodiversidade incluem florestas, áreas designadas para fins de proteção da natureza, áreas para a proteção de ecossistemas e espécies raros, ameaçados ou em perigo de extinção e campos
com alta biodiversidade.
Há necessidade de reverter o zoneamento da cana para acomodar a expansão da produção?
Não. As lavouras de cana de açúcar estão espalhadas, hoje, por mais de 10,8 milhões de hectares no Brasil, de acordo com a Unica, a União da Indústria da Cana-de-Açúcar. O zoneamento agroecológico identificou mais 64,7 milhões de hectares passíveis de expansão, dos quais 19,3 milhões possuem alta aptidão para a cultura. A produção prevista de etanol no Brasil é de 54 bilhões de litros até 2030, para cumprir com o compromisso do país no Acordo de Paris. Supondo que não haja ganhos de produtividade e uma relação linear entre a produção total de etanol atual (30 bilhões de litros em 2015/2016) e a área cultivada, seriam necessários 11
milhões de hectares adicionais para dobrar a produção, excedendo assim a meta de Paris. Não há necessidade de um único hectare de terra amazônica para cana de açúcar. Se você considerar os ganhos de produtividade e a estimativa atual para expansão, este número será muito menor.
O zoneamento da cana “emperra” o desenvolvimento dos estados amazônicos?
Não. Vejamos o caso do estado de Roraima, por exemplo. O senador Flexa Ribeiro afirma que há uma necessidade de liberar o plantio de cana de açúcar em Roraima porque o estado, hoje, “não pode exportar para a Venezuela”. Deixe de lado por um momento o fato de que na Venezuela, um dos maiores produtores de petróleo do mundo, o preço médio de um litro de gasolina é de US$ 0,01. Ou seja, não é o tipo de país com grande apetite por biocombustível. Mesmo que a Venezuela não estivesse falida e estivesse com sede de etanol brasileiro, quanta cana-de-açúcar Roraima poderia produzir? Não muito: mesmo antes de 2009, quando o zoneamento entrou em vigor, Roraima nunca cultivou mais de 559 hectares dessa cultura. Sua área máxima de colheita foi de 566 hectares em 2012, ou seja, após o decreto de zoneamento. Qualquer que seja a explicação para um desempenho tão ruim, provavelmente nada tem a ver com o zoneamento.
Mas o projeto de lei não fala nada das florestas. Ele diz que a cana de açúcar
pode ser cultivada em áreas “alteradas” e nos campos e cerrado. Por que isso
iria trazer desmatamento?
A primeira e mais simples explicação é o efeito-cascata sobre o gado. As culturas de commodities de alto rendimento, como a cana e a soja, elevam muito o preço da terra. Pecuaristas e grileiros podem se sentir estimulados a abrir mais áreas florestais para “pastagem” e vendê-las por grandes quantias para produtores de cana, e depois seguir para novos terrenos recém desmatados. Antes da moratória da soja , em 2006, esse “vazamento” de desmatamento acontecia em várias cidades com plantações de soja, em estados como Mato Grosso e Pará. Não há acordo parecido para a cana.
Um novo vetor de desmatamento dificultaria a aplicação da lei na Amazônia, onde estudos mostraram que o cumprimento do Código Florestal já é muito baixo e a maior parte do desmatamento é ilegal. Como o projeto de lei contém uma definição bastante vaga de “áreas alteradas”, há bastante espaço para fraudes e não-conformidades. Além disso, a nova infraestrutura precisaria ser instalada para processar e transportar a nova safra. Estes são, por si só, são fatores de desmatamento.
Em resumo, o projeto de lei proposto no Senado criou um problema onde não há nenhum, sem nenhuma razão econômica.
Referências:
IBGE, Geografia da Cana-de-Açúcar . 2017.
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101436.pdf
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Zoneamento Agroecológico da
Cana-de-Açúcar: Expandir a Produção, Preservar a Vida e Garantir o Futuro . 2009.
https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/CNPS-2010/14408/1/ZonCana.pdf
Unica, Unicadata. http://www.unicadata.com.br/

Professor Edgar Bom Jardim - PE

domingo, 25 de fevereiro de 2018

Meio Ambiente brasileiro: a segunda maior concentração de cobras do planeta

Jararaca-ilhoa e Ilha da Queimada-grande
Image captionIsolamento geográfico levou ao surgimento de nova espécie de jararaca que só existe em ilha do litoral paulista | Foto: Marcelo Ribeiro Duarte
Uma pequena ilha rochosa, escarpada, sem praias e de difícil acesso, localizada a 35 km do litoral de São Paulo, entre as cidades de Peruíbe e Itanhaém, tem chamado a atenção ao longo dos último cinco séculos por uma característica insólita: é habitada quase que exclusivamente por uma espécie de cobra, a jararaca-ilhoa (Bothrops insularis).
A Ilha da Queimada Grande, conhecida como Ilha das Cobras, se destaca ainda por ter a segunda maior concentração desses animais por área no mundo: cerca de 45 cobras por hectare – mais ou menos equivalente ao tamanho de um campo de futebol –, perdendo apenas para a Ilha de Shedao, na China.
Com comprimento e largura máximos de 1.500 e 500 metros, respectivamente, e altitude que não supera os 200 metros, a Ilha das Cobras, de 43 hectares, foi descoberta em 1532, pela expedição colonizadora de Martim Afonso de Souza.
De acordo com as biólogas Karina Nunes Kasperoviczus, hoje na Universidade de Sydney, na Austrália, e Selma Maria de Almeida-Santos, do Instituto Butantan, provavelmente Afonso de Souza e seus oficiais protagonizaram o primeiro caso de depredação do local.
No artigo científico Instituto Butantan e a jararaca-ilhoa: cem anos de história, mitos e ciência, publicado nos Cadernos de História da Ciência, do Instituto Butantan, elas contam que, de passagem pela costa sudeste do Brasil, os navegadores aportaram na ilha, caçaram diversas fragatas e mergulhões e, antes de voltarem aos navios, receosos de má sorte, atearam fogo no local.
Não existe, no entanto, registro de que durante a permanência por lá Martim Afonso de Souza e seus homens tenham tido qualquer contato com a Bothrops insularis.
Segundo Karina e Selma, a prática de atear fogo à ilha se tornou corriqueira algum tempo depois. "No final do século 19, a Marinha do Brasil implantou um farol lá, cuja manutenção era realizada por faroleiros que residiam no local", escrevem.
"Com medo das serpentes, a própria Marinha colocou por diversas vezes fogo na mata na tentativa de acabar com a população excessiva delas. O nome 'Queimada Grande' é resultado dessas recorrentes queimadas, que, por vezes, eram tão fortes que podiam ser avistadas do continente."

Evolução

A história da Ilha das Cobras é bem mais antiga, no entanto. Ela se formou no final da última era glacial, há cerca de 11 mil anos, quando o nível do mar subiu, separando aquele morro (que fazia parte da Serra do Mar) do continente, transformando-o numa ilha e isolando uma população de jararacas comuns (Bothrops jararaca).
Ao longo dos milhares de anos seguintes, a espécie se diferenciou de suas parentes de terra firme e se transformou na Bothrops insularis.
Segundo o pesquisador e especialista em animais peçonhentos Vidal Haddad Júnior, da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (Unesp), o isolamento e as condições geográficas da ilha lentamente modificaram as características das cobras em relação às jararacas continentais, criando a nova espécie.
Jararaca-ilhoa engole pássaro
Image captionJararaca-ilhoa se alimenta quase que exclusivamente de pássaros | Foto: Marcelo Ribeiro Duarte
"Ela é menor e menos pesada, para facilitar sua locomoção e a caçada diurna nas árvores", explica. "Sua cauda adquiriu capacidade preênsil (ou seja, de se agarrar a algo) e a dentição ganhou um aspecto mais curvo, para prender as aves mais facilmente e não soltá-las enquanto o veneno age."
Para se tornar uma cobra que vive sobretudo em árvores (ou arborícola), a jararaca-ilhoa desenvolveu outras características evolutivas únicas.
"Para subir em árvores, sua pele se tornou mais elástica do que a de suas parentes do continente", explica Otávio Marques, pesquisador e diretor do Laboratório de Ecologia e Evolução do Instituto Butantan, que realizou várias pesquisas com essa serpente.
"Além disso, como ela ergue mais a cabeça, seu coração ficou mais próximo dessa parte de sua anatomia, para bombear com mais facilidade o sangue para o cérebro."

Nova espécie

Não é de hoje que o Instituto Butantan estuda a ilha e a jararaca-ilhoa. O primeiro lote dessa espécie foi recebido pela instituição em 1911, enviado pelo zelador do farol, que residia no local, Antônio Esperidião da Silva. Elas logo começaram a ser estudadas pelo herpetólogo João Florêncio Gomes, que não chegou a concluir o trabalho, pois morreu em 1919, aos 33 anos.
O pesquisador Afrânio do Amaral deu continuidade às pesquisas e, em 1922, descreveu cientificamente a nova espécie. "Ele logo descobriu que ela se alimentava quase exclusivamente de pássaros, ao contrário das espécies do continente, que predam pequenos mamíferos e répteis", conta Vidal Haddad.
Amaral descobriu ainda que a peçonha destas jararacas era muito mais ativa em aves e altamente potente, o que despertou o interesse sobre a espécie, que só existe na ilha.
"O veneno da jararaca-ilhoa é mais tóxico para aves do que para mamíferos", explica o biólogo Marcelo Ribeiro Duarte, do Laboratório de Coleções Zoológicas do Instituto Butantan. "O que prova a grande adaptabilidade da espécie."
Bothrops insularis mede entre meio metro e um metro, com as fêmeas sendo ligeiramente maiores. "Como a fauna da ilha é muito escassa, não existindo roedores nem outros mamíferos (com exceção de morcegos), os adultos da espécie se alimentam de aves migratórias (os pássaros residentes não são predados)", diz Haddad. "Os filhotes comem pequenos lagartos, anfíbios e artrópodes, como as lacraias, por exemplo."
Outra característica dessa serpente é que ela é vivípara (não põe ovos, mas gesta a prole de maneira semelhantes aos mamíferos) e dá à luz 10 filhotes no período quente do ano.

Mitos e lendas

Talvez por ser muito numerosa e altamente venenosa, a jararaca-ilhoa é objeto de diversos mitos e lendas. Uma delas diz que as cobras foram colocadas lá por piratas, para proteger um tesouro escondido.
De acordo com outra, um faroleiro e sua família foram mortos por suas picadas. Mas isso não ocorreu. No máximo foram mortos alguns animais domésticos, como cães, gatos e galinhas.
Jararaca-ilhoa
Image captionAo contrário das espécies do continente, ela é menor e mais pesada e tem pele mais elástica | Foto: Marcelo Ribeiro Duarte
De qualquer forma, não existe mais o risco de algum faroleiro ser morto por uma picada da jararaca-ilhoa. O farol foi automatizado em 1925 e sua manutenção é feita uma vez por ano por uma equipe da Marinha do Brasil. O acesso à ilha é estritamente controlado e requer de autorização do Governo Federal. Esta é dada principalmente para pesquisadores.
"Apesar do óbvio risco que as cobras representam para quem entrar no local desavisado, ele quase não existe na prática", tranquiliza Haddad. "(A ilha) é desabitada e quem a visita está ciente dos cuidados que deve tomar para evitar picadas."

Ameaça de extinção

De acordo com ele, hoje quem tem que ter cuidado são as cobras. Apesar de a Ilha da Queimada Grande ser uma Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) e pertencer à Área de Proteção Ambiental (APA) de Cananéia-Iguape-Peruíbe, a jararaca-ilhoa está criticamente ameaçada de Extinção.
A espécie faz parte da Lista Nacional das Espécies da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção e da Lista Vermelha das Espécies Ameaçadas da organização União Internacional pela Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês).
A ameaça de extinção decorre das queimadas, feitas por pescadores que querem desembarcar no local, e pela biopirataria, ou seja, a captura ilegal para venda. Um exemplar da cobra pode alcançar R$ 30 mil no mercado negro.
"Se pensarmos na capacidade de venenos serem a base de medicamentos e na fantástica evolução e adaptação das cobras em um ambiente isolado, elas são mais um tesouro a ser preservado do que uma ameaça aos humanos", diz Haddad.
Só isso já justificaria o interesse científico na Bothrops insularis. Mas há outras razões. "O isolamento de cobras a partir das grandes massas continentais é uma oportunidade única para se estabelecerem relações evolutivas sob condições severas na maioria das vezes, como, por exemplo, falta de fontes de água e escassez de presas", explica Duarte.
"Além disso, a presença dessa espécie isolada é um testemunho dos fenômenos de flutuação do nível dos oceanos no período Pleistoceno (1,8 milhão a 11 mil anos atrás)."
Professor Edgar Bom Jardim - PE