domingo, 21 de maio de 2017

Redes sociais

A pressa comanda muita coisa. Não é estranho que o trabalho se insira no cotidiano determinando ordens e excluindo prazeres. A sociedade exige que as pessoas se movimentem e busquem a sobrevivência. O importante é se localizar, construir narrativas que mostrem interesses em seguir adiante com projetos de sucesso. Estamos fazendo uma afirmação genérica, mas há quem se encante com a correria e não são poucos. O sistema sabe conduzir seus êxitos. Quem se enquadra, sofre crítica e marginalizações. As formas de rebeldia são , muitas vezes, previstas e não amedrontam os vencedores. Eles refinam suas artimanhas e seus poderes de convencimento.
Com o consumismo atingindo os desejos, as mercadorias ganham espaços privilegiados. Portanto, o mandamento da acumulação mantém sua supremacia. Há quem a confunda a felicidade com a renovação dos objetos que possui. O exibicionismo dispara o uso dos cartões de crédito. A cartografia dos sentimentos se enche de desenhos estranhos e descuidados. O discurso da servidão voluntária invade as relações entre dominantes e dominados. O capitalismo cria meios de sedução, não desprezando a tecnologia que antes significava libertação. Portanto, temos uma sociedade modernizada, porém longe dos valores tão cantados pelo iluminismo.
As análises de Freud e dos pensadores da Escola de Frankfurt não se enganaram ao afirmar que vivemos numa sociedade administrada. Quem controla não poupa ciências, pedagogias, fascínios pela grana. O fluir dos sentimentos fica atrelado ao jogo de perde e ganha dos produtos comerciais. As escolas reverenciam concepções de mundo que marcam o individualismo. Reflexões mínimas, caminhos abertos para chegar à fama, estímulo às espertezas mais sutis.  Não há, certamente, um controle absoluto, pois seria a negação da história enquanto construção da possibilidade. O sonho coletivo persiste, apesar de todos os malabarismos egocentristas.
A renovação da tecnologia  é acompanhada por transformações na cultura. A pressa diminui o cuidado, faz o afeto mergulhar em águas turbulentas. No entanto, nem tudo é um labirinto escuro e sem alternativas. Cabem invenções e outras formas de aproximação. Não dá para expulsar os mascarados, nem sacudir fora as diferenças, Surgem as redes sociais, com todas as simulações, sem,contudo, negar que há condições de não recuar diante das pressões dos monopólios. As brechas permitem que as desobediências não se intimidem. Os contrapontos dão ritmos dissonantes e quebram a apatia conformista.
As redes sociais são territórios de amplos diálogos, de exposçião de imagens pessoais, de consagração de triunfos. Outros cotidianos estão se alargando. Os celulares contribuem para a comunicação com códigos especiais. Cada época reformula cartografias, conversa com as tradições e repensa as cores da felicidade. As cartografias fogem em busca de geometrias, talvez, mais audazes. É difícil se avaliar. A luta política não é  a mesma. Há quem proteste, contaminado pela lógica do capital. O conhecer ajuda a desfazer infortúnios. Não podemos esquecer que a modernidade é também um projeto de exploração, não se rendeu às utopias mais profundas. O utilitarismo justifica desigualdades, pois preserva hierarquias e desmonta solidariedades.


Fanzine, neologismo oriundo da expressão em inglês fanatic magazine, se aplica a jornais e panfletos, escritos à mão ou à máquina de escrever, resultado de montagens com revistas e jornais, ou mesmo textos digitados em computador. Fanzine entre outras coisas é cultura, é arte, é contracultura e subversão.
Um jovem escreve fragmentos de texto. Recorta, cola, mescla com fotos, marca com caneta, complementa. São diferentes cores, e temáticas mais diversas ainda: pedaços de revistas em quadrinhos – seja de heróis das HQs norte-americanas, seja de japoneses com olhos enormes e cabelos coloridos, fotos de artistas de cinema e TV, fragmentos de notícias sobre assuntos diversos. Cultura, arte, protesto, contracultura. Fazem-se cópias em mimeógrafo ou fotocopiadoras, e está pronto. Ou não?
Antes de qualquer coisa, cabe responder a quem pergunta: afinal, o que são fanzines? O termo, um neologismo oriundo da expressão em inglês fanatic magazine, se aplica a jornais e panfletos, escritos à mão ou à máquina de escrever, resultado de montagens com revistas e jornais, ou mesmo textos digitados em computador, com conteúdo mais elaborado. As múltiplas temáticas que se apresentam nessa literatura denotam a criatividade de seus produtores, e as possibilidades de leitura e utilização prática dos mesmos.
Literatura ordinária, porém elaborada
Os fanzines chegam ao Brasil em 1965, com ‘O Cobra’, resultado da 1ª Convenção Brasileira de Ficção Científica, acontecida em São Paulo. Marcados, originalmente, por serem feitos de ‘qualquer jeito’ ou por um conteúdo ‘sem pé nem cabeça’, os fanzines ganham, com o passar do tempo, um caráter de maior elaboração e significado. A presença de computadores, programas de edição de textos e imagens, cria a possibilidade de brincadeiras com marcas, textos clássicos, letras de música, fotografias de celebridades ou de desenhos animados. Dos fanzines escritos à mão e rodados em estêncil, chega-se, nos dias atuais, aos e-zines, produzidos e divulgados em meio virtual. No caminho que leva a essa “evolução” nos meios de se fazer e difundir tal arte houve, na relação entre “zineiros” do Brasil e do mundo, a presença marcantes das caixas-postais, através das quais seus jornais e revistas eram socializados.
Na diversidade de textos componentes dos fanzines, é possível encontrar dos temáticos aos doutrinários. Muitos, marcados por fazer coro à legião de fãs de determinado artista de TV, cinema ou música; ou mesmo a personagens de novelas, seriados, desenhos animados, livros e HQs. Outros, no entanto, cuja principal característica é o conteúdo político-ideológico, e a difusão de uma contracultura, marcada pela negação do sistema. Como afirma o pesquisador Edwar de Alencar Castelo Branco, “o diferencial desses fanzines temáticos, em relação àqueles doutrinários, está principalmente no fato de submeter a noção de autor a um delírio: a partir de um tema, como a insônia, por exemplo, o zineiro força diferentes expressões artístico-literárias a expressarem seu estado de espírito”.
Fanzines na sala de aula? Como?
Resultados, em grande parte, da rebeldia adolescente, os fanzines podem se tornar um importante veículo de comunicação com diferentes segmentos da juventude. Uma das chaves para isso, segundo a pesquisadora Ioneide Santos do Nascimento, é tentar não pedagogizá-los, ou seja, não tentar torná-los veículos de controle, impondo aos seus construtores uma noção de ‘certo’ e ‘errado’, ‘bom’ ou ‘mau’, ‘bonito’ ou ‘feio’.
Através da união entre palavras e imagens, possibilitada pelos fanzines, é possível ao professor estabelecer um diálogo entre as linguagens visual e falada, levando o aluno a compreender, através de um veículo familiar a ele, a relação com as diferentes formas de comunicação. Uma estratégia possível de aplicação desse instrumento como recurso pedagógico seria a produção de fanzines em sala de aula. Práticas como estas, ainda concordando com Ioneide Nacimento, possibilitam ao educando conhecer a diversidade de opiniões entre seus próprios colegas. Permite, também, que os estudantes “assumam seu papel de sujeitos nesse processo e se envolvam com mais entusiasmo em um projeto que cada dia se torna mais autônomo”.
Dessa maneira, pode-se perceber que a utilização na escola de um instrumento de comunicação juvenil, tido como “marginal”, pode, para além de certos preconceitos existentes em seu entorno, tornar o jovem mais afeito das atividades escolares, trazendo para o campo de discussão, suas ideias, opiniões e pensares, por vezes negligenciados no trabalho docente.
Edwar de Alencar Castelo Brancohistoriador pós-moderno, autor do livro Todos os Dias de Paupéria, professor de Pós-Graduação em História do Brasil e vice-reitor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Teresina, PI.
Fábio Leonardo Castelo Branco Britomestrando em História do Brasil pela Universidade Federal do Piauí, Teresina, PI.
Fagno da Silva Soareshistoriador, professor de história do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA) e SEEDUC, Açailândia, MA.
www.professoredgar.com

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