domingo, 23 de abril de 2017

Nunca fui pobre, nem rica. Sempre tive mais que o necessário para sobreviver.


Por Dra. Gabriele Fernandes.

Por muito tempo associei a noção de felicidade ao dinheiro. Tive a ambição de enriquecer para então me considerar bem sucedida.
Entrei no curso de Direito e me vi em um mundo em que, para a maioria, sucesso é sinônimo de ocupar altos cargos, ter livros publicados, ternos ou bolsas de grife, acúmulo de aprovações em concursos públicos. Confesso que, por um tempo, partilhei dessa visão. Passei a ver aqueles que não se encaixavam nesse padrão como fracassados. 
Comecei meu estágio no Judiciário no setor "rico" da vara federal. Passava o dia folheando execuções fiscais e observando o vai e vem de juizes, advogados e jurisdicionados endinheirados. Essa primeira impressão alimentou ainda mais a visão estreita de mundo que tinha.
Um dia, mudei de setor, fui para o Juizado Especial e passei a ver o outro lado da moeda. Às quartas, ajudando na realização das audiências de agricultores que pleiteavam benefícios do INSS, tive o maior choque de realidade da vida. 
Nunca fui pobre, nem rica. Sempre tive mais que o necessário para sobreviver. Apesar de saber da origem pobre dos meus pais e avós, nunca senti essa realidade de verdade. Até que ouvi os depoimentos de centenas de pessoas, que, ao contarem sua vida de trabalho na roça diante do juiz para provar seu direito à um salário mínimo, tocaram profundamente a minha alma. Percebi que muitas dessas pessoas, apesar de não terem nenhum dinheiro ou status, tinham muita paz. 
Por muitas vezes, essa realidade me bateu tão forte na cara que tive que engolir o choro. A felicidade nos olhos deles quando recebiam a notícia que, a partir daquele momento, receberiam um valor todo mês que supriria as suas necessidades mais básicas acendeu um sinal dentro de mim. Havia algo de errado com a forma com que eu idealizava a felicidade.
Depois de tirada essa venda dos olhos, reparei que muitos daqueles que me serviam como referência de sucesso eram o oposto dos velhinhos agricultores do JEF: tinham muito dinheiro ou status e nenhuma paz. 
É difícil viver em uma sociedade de consumo e abdicar totalmente das "maravilhas" que ela oferece. Mas é preciso equilíbrio. A renúncia ao superficial é um exercício diário. Sempre que confrontada com a falta de dinheiro pra alguma coisa que quero, penso se aquilo tem o poder de me trazer paz. Na iminência da formatura, submetida à pressão da sociedade para ser uma profissional bem sucedida, penso nos cargos que quero ocupar e se eles têm o poder de me trazer paz. Quase sempre a resposta é não. Essa perspectiva acalma minhas inquietações e diminui minha ansiedade.
Hoje, minha concepção de fracasso é totalmente diferente. Fracassa quem se preocupa mais em ter um celular de última geração e um carro zero do que com a sua melhora pessoal. Fracassa quem acha mais importante ostentar seus títulos que ajudar o próximo necessitado. A vida material e profissional nunca deve ser mais importante que viver com humanidade. Repito isso pra mim mesma diariamente pra não correr o risco de esquecer no meio do caminho.
A ganância é cansativa. A simplicidade pesa muito pouco. Que minha bagagem seja leve. Não quero carregar nas costas a ambição pelo descartável. Que as coisas materiais não roubem minha paz. Que assim seja.
Do Facebook Gabriele Fernandes. Professor Edgar Bom Jardim - PE

0 >-->Escreva seu comentários >-->:

Postar um comentário

Amigos (as) poste seus comentarios no Blog